Riscos e Controvérsias no Processo de Construção do Conceito de Alimento Saudável: O Caso da Soja

Esta tese tem como objetivo central analisar as controvérsias sobre riscos e benefícios envolvidos no processo de construção social do conceito de alimento saudável, elegendo a soja como objeto de estudo, com dois focos considerados por nós como inseparáveis: os riscos e os benefícios à saúde e ao meio ambiente. A pesquisa buscou conhecer os critérios e as influências que os sistemas peritos sofrem para construir o conceito da soja como alimento saudável (ou de risco); nesse sentido, com base na teoria construtivista da Sociologia do Conhecimento Científico, avaliou os consensos e dissensos sobre tal conceito entre os especialistas; identificou as fontes a partir das quais os especialistas constroem seus conceitos; levantou as controvérsias científicas que circundam o tema da soja para o ser humano; estudou a trajetória da soja como alimento, o contexto político que envolve a pesquisa na área, bem como as repercussões socioambientais que envolvem a sojicultura. A pesquisa teórica e o estudo de campo com médicos especialistas demonstraram que as fronteira de categorias (alimento saudável e de risco) na qual a soja parece transitar são tênues e vulneráveis a diferentes influências construídas reflexivamente. Na análise da construção social da soja como saudável, percebemos elementos que interferem em tal processo e que mereceram destaque, como as divisões políticas e transnacionais, as divisões cientificas e institucionais, além de um campo subjetivo de diversidade de estilos de pensamento que envolve os especialistas. Além da ciência, o estudo reconheceu também a mídia como uma fonte de obtenção de conhecimento entre os especialistas. Por fim, com base nas noções de democratização da ciência e de desmonopolização do sistema perito, a pesquisa ressaltou o papel do consumidor leigo em debates futuros sobre a questão. Apesar de algumas peculiaridades que dizem respeito somente à soja, acreditamos que a tese possibilitou conhecer algumas dimensões que fazem parte da construção social do conceito de qualquer alimento percebido como saudável, bem como as dificuldades para se delinear as fronteiras dos riscos.
Palavras-chave: riscos; controvérsias; alimentação saudável; soja.

ABSTRACT
This research aims to analyze the controversies surrounding the risks and benefits evident in the social construction of the concept of ´healthy food´. We have chosen to study the soybean with a dual focus: risks and benefits to human health, and risks and benefits to the environment. The study concentrated on the different ways that the expert system was influenced during the process of developing the concept of soybean as a healthy or risky food. Based on the constructivist theory of Sociology of Scientific Knowledge, the study evaluated the consensus and discord on the theme among the experts; identified the sources from which the experts constructed their concepts; highlighted the scientific controversies surrounding the human consumption of the soybean, and studied the historic development of the soybean, the political context that surrounds the research in the area and the socio-environmental repercussions of its cultivation. The theoretical research and the field research with doctors showed fragile frames of categories (healthy and risky food) and also uncovered that those experts suffer different influences, which are constructed under the contemporary concept of reflexivity. Central influences on the process of the social construction of the soybean as a healthy food include: political, transnational, scientific and institutional divisions. We also identified a subjective field of diverse thought-styles among the experts. Beyond science, the study recognized the media as an important source of knowledge acquisition among the interviewed doctors. Based on the concepts of the democratization of science, the research emphasizes the role of the lay consumer in future debates about the concept of soybean as a healthy or risky food. Although there are some specific aspects that are relevant only to the soybean, the research made it possible to learn about common aspects that contribute to the social construction of any food perceived as healthy, as well the difficulties in outlining the borders of the risks associated with the food.
Key words: risks analyses; controversies; health food; soybean

INTRODUÇÃO

Esta tese tem como objetivo central analisar as controvérsias sobre riscos e benefícios envolvidos no processo de construção social do conceito de alimento saudável, elegendo a soja como objeto de estudo, com dois focos considerados por nós como inseparáveis: os riscos e os benefícios à saúde e ao meio ambiente.
Este tema nos parece um problema específico da fase atual da modernidade - nomeada por Giddens (1991) como "alta-modernidade"1 - marcada pela emergência de incertezas em torno de constatações dos sistemas peritos.

Concordamos com Giddens (1991, p. 465) que o conceito de reflexividade2 é central para se compreender essas transformações do mundo atual. O termo reflexividade traduz o fato de que, hoje, "as práticas sociais são constantemente examinadas e reformadas à luz de informação renovada sobre estas próprias práticas, alterando assim constitutivamente seu caráter". Segundo o sociólogo, a reflexividade da modernidade "subverte a razão, pelo menos onde a razão é entendida como ganho de conhecimento certo".

A modernidade reflexiva não invoca o fim da modernidade3, mas uma continuidade dela sob uma nova perspectiva. A modernidade e, mais em especial, a modernidade reflexiva, é uma ordem pós-tradicional; porém a certeza do conhecimento racional não substituiu completamente as certezas derivadas dos hábitos e das tradições. A dúvida, como característica generalizada da razão crítica moderna, permeia nossa existência e constitui uma dimensão existencial do mundo atual (GIDDENS, 2002).

Outro aspecto central dessa modernidade reflexiva diz respeito às novas relações entre dúvidas e riscos, temática que, segundo Guivant (1998), vem sendo desenvolvida nas ciências sociais desde a década de 80; porém, só nos anos 90, mais especificamente, os trabalhos de Anthony Giddens (1991) e Ulrich Beck (1992) contribuíram para inserir a questão do risco como chave para entender a sociedade atual, envolvendo novos tipos de debates sobre conflitos sociais, novas relações entre leigos e peritos e o novo papel da ciência. Para esses autores, além de o risco aparecer como característica central da modernidade reflexiva, ele também é um subproduto das dúvidas que a ciência não conseguiu responder durante suas fases anteriores e dos problemas que não resolveu4.

A definição de risco mais simplificada e adequada para esse trabalho provém de Beck (2007) que ressalta que o risco é a antecipação da catástrofe que pode ou não ocorrer. O risco diz respeito "ao futuro, a algo que nós admitimos saber e sobre o qual temos de falar como se soubéssemos, mas que realmente não sabemos, porque ainda não aconteceu" (p.2). Por outro lado, ele "é uma força mobilizadora (...) uma noção altamente ambivalente, mas que tem uma força histórica e política interessante"(p.2).

Collindgridge, Reeve e Jasanoff, autores também analisados por Guivant 1998), destacam os limites da ciência reguladora e o papel dos peritos na formulação de políticas de regulamentação, que poderiam minimizar os riscos. Para Guivant 1998, p. 35), os peritos, "ao lidar com fatos incertos, utilizando, às vezes, paradigmas teóricos inconsistentes e com métodos de estudo questionáveis, assumem decisões carregadas de valores, como graus de aversão aos riscos ou de tolerância".

A mesma autora ressalta a diferença entre os riscos na sociedade industrial e de classes e os riscos vivenciados pela sociedade altamente industrializada, na modernidade reflexiva. Essa última enfrenta riscos que não são apenas efeitos colaterais do progresso, mas são estruturais no que diz respeito a suas fontes e abrangência. São riscos globais incontroláveis, de graves conseqüências, desconhecidos a longo prazo, que não podem ser avaliadas com precisão e que atingem a todos, indistintamente. Riscos democráticos, como diria Beck (1992, p. 36), que em seu aforismo resume a característica dos riscos contemporâneos: "a pobreza é hierárquica; a poluição é democrática". As catástrofes ambientais e tecnológicas ilustram bem o caráter desses riscos.

Paralelamente ao estudo dos riscos, o estudo das controvérsias se tornou uma ferramenta metodológica para se conhecer as dimensões sociais e políticas da ciência, nem sempre visíveis. Nesse campo, é possível aprender sobre as dinâmicas das práticas efetivas da produção científica e tecnológica, em suas relações com a sociedade.
Espaços de contestação facilitam a investigação das metáforas, dos embates e dos pressupostos embutidos em discursos aparentemente neutros (PINCH; LEUENBERGER, 2006).

A questão dos riscos, das controvérsias científicas e a prática da reflexividade podem ser analisadas na perspectiva da alimentação, o que será feito nesta tese.
Ao longo da história moderna, os hábitos alimentares culturalmente diferenciados foram sendo gradativamente substituídos por dietas padronizadas, definidas por parâmetros científicos e pela ótica do sistema alimentar De forma simplificada, por sistema alimentar se definem os meios através dos quais é possível disponibilizar alimentos aos seres humanos. O sistema alimentar engloba os modos de produção, industrialização, distribuição, transporte, comercialização e consumo de alimentos (KRAUSE; MAHAN, 2005).

O sistema alimentar moderno dominante é baseado nos avanços tecnológicos e nas descobertas científicas da agricultura, (como o uso de fertilizantes sintéticos e agrotóxicos, o melhoramento genético, a mecanização); na grande escala de produção local e global); na industrialização; na oferta de alimentos desconectada da sazonalidade; na distribuição e comercialização em grandes redes varejistas; na escolha disponível a todos que podem arcar com os preços dos alimentos; nas desigualdades nutricionais entre e dentro das sociedades; e nas repercussões socioambientais vinculadas ao modelo produtivo (BEARDSWORTH; KEIL, 1997).5
A pesquisa científica sobre produção e qualidade dos alimentos que emergiu a partir do século XVIII, permitiu o conhecimento dos nutrientes e de suas funções; as leis da química aplicadas à agricultura ajudaram a produzir alimentos em larga escala, além de utilizar alta tecnologia para criar novos produtos e conservar outros. Assim, as inovações em matéria de produção, processamento, conservação e distribuição geraram maior disponibilidade, higienização adequada e preços mais justos dos alimentos. Foram tantos os avanços proporcionados pela tecnologia no campo da alimentação, que é difícil entender que junto a esses benefícios, a população ainda tenha que conviver com riscos e inseguranças alimentares (HERNÁNDEZ; ARNAÍZ,
2005).

Grande parte dos riscos vinculados à alimentação e os questionamentos sobre a qualidade alimentar, assim como o surgimento e o agravamento de doenças relacionadas à dieta, se encontram no âmbito dos problemas criados pela agropecuária moderna. Tais problemas repercutem na saúde humana, bem como no meio ambiente. Isso não impede, entretanto, que as pessoas continuem a consumir os alimentos provenientes desse modelo.

Referindo-se ao Brasil, Guivant (2000) afirma que o país ainda sofre com os problemas da desigualdade social e, conseqüentemente, com os riscos relacionados à falta de alimentos. Por outro lado, vive igualmente as conseqüências de uma sociedade de risco, "sem a reflexividade ativa" que caracteriza alguns setores dos países desenvolvidos, no que concerne ao controle da qualidade dos alimentos (p. 297)6.

Entretanto, não há dúvidas de que a ansiedade relacionada às incertezas em torno do tripé alimentação-saúde-doença tem se intensificado ultimamente, ou pelo menos tem se expressado de forma mais intensa. Além dos riscos que já acompanham a humanidade há muito tempo, como a escassez de alimentos e as contaminações biológicas, aparecem na contemporaneidade riscos decorrentes do uso de novas tecnologias aplicadas à produção e transformação dos alimentos. Tais riscos se caracterizam na perspectiva de riscos globais, tais como descritos por Giddens (1991) e Beck (1992).

No que diz respeito à análise da construção do conceito de alimento saudável, objeto deste trabalho, além da emergência dos novos riscos é preciso considerar outros fatores que se inter-relacionam e que vêm influenciando nesse processo: as mudanças associadas à pluralidade dos estilos de vida; o caráter político das ações que influenciam na definição de dieta saudável; a desconstrução do papel da ciência e as controvérsias que envolvem as pesquisas científicas.

A questão da pluralidade dos estilos de vida também foi estudada por Giddens (1991). Para esse autor a noção de estilo de vida na vida social da modernidade reflexiva assume significados particulares à medida que a tradição perde seu domínio e a vida diária se reconstitui a partir de uma diversidade de opções inseridas entre o local e o global.

A escolha de um estilo de vida torna-se essencial na constituição da identidade, com a pluralização dos contextos e a diversidade de autoridades. Diante da grande oferta de orientações alimentares e dietas e, conseqüentemente, da variedade de escolhas que isso representa para a construção de um perfil de consumidor, os indivíduos, segundo Campbell (1995), seriam livres para assumir uma identidade. No caso, o padrão de consumo alimentar e a dieta que selecionam seriam considerados como indicativo não só dessa identidade, mas também de como eles desejam que outros indivíduos os considerem (CAMPBELL, 1995). As escolhas feitas, sempre dentro dos diferentes estilos de vida, incluiriam aceitar ou evitar determinados
riscos alimentares7.

Com relação ao caráter político das ações envolvidas na definição de dieta saudável, destacamos a contribuição de Nestle8 (2006; 2003; 2002). Para a autora, por trás do alto consumo de nutrientes e alimentos que estimulam o aparecimento de doenças crônico-degenerativas, e também da ingestão de alimentos funcionais, enriquecidos de vitaminas e minerais, light e diet, estão a indústria e o marketing agroalimentar, que manipulam a pesquisa científica, os hábitos dos consumidores e o conceito de dieta saudável. Em entrevista a uma revista mensal brasileira, a nutricionista faz afirmações polêmicas, que ilustram esse tema:
Boa parte das pesquisas científicas que indicam o poder nutricional de margarinas, chocolates ou vinhos é financiada pela própria indústria de alimentos, o que compromete sua isenção (...). A verba para divulgar uma marca de refrigerante é cem vezes maior que o orçamento que o Instituto Nacional do Câncer tem para a campanha de incentivo ao consumo de frutas e vegetais (a recomendação médica é comer cinco porções desses alimentos ao dia)(...). Há poucas evidências de que os americanos tenham deficiências em vitaminas e minerais. Quem ingere esses alimentos enriquecidos alcança a dose diária recomendada só com o café-da-manhã. Não precisaria ingerir mais nada durante o resto do dia. As empresas anunciam que os produtos têm vitaminas porque isso constitui uma estratégia de marketing fantástica (...). A propaganda dos alimentos visa vender mais, e não contribuir para uma dieta saudável (NESTLE, 2006, p.19)

O contexto de riscos alimentares entrelaçado com a dimensão política será explorado com profundidade nesse trabalho, enfocando como a ciência se posiciona nessa dimensão. Entretanto, o que já se pode afirmar aqui é que levando em conta a influência da indústria de sementes e de alimentos e do marketing alimentar, construir o conceito de alimentação saudável torna-se ainda mais desafiador.

Nesse sentido, emergem, cada vez com mais freqüência, inúmeras controvérsias científicas no campo da Nutrição. Não só os especialistas, mas também os consumidores leigos percebem que as orientações nutricionais estão cada vez mais contraditórias. Reportagens sobre alimentos saudáveis, livros com dietas milagrosas testadas por leigos e peritos, pesquisas sobre alimentos funcionais e erros alimentares circulam na mídia nacional e internacional, gerando dúvidas e questionamentos sobre como se alimentar de forma adequada. A cada dia, surgem novos estudos questionando ou contradizendo práticas alimentares que se estabeleceram como saudáveis ao longo do desenvolvimento da ciência da Nutrição. Assim, alimentos tradicionalmente aceitos como a carne, os ovos, o leite e a manteiga devem ser questionados por alguns especialistas como alimentos impróprios ao ser humano?
Alimentos light e diet, funcionais, nutracêuticos, designer food têm qualidades especiais ou não passam de termos oportunistas e estratégias de marketing alimentar?

Não parece fácil responder a nenhuma dessas questões e tornou-se corrente, nos âmbitos da ciência da Nutrição e da saúde, o convívio com as dúvidas do que é um alimento saudável e seguro9. Nesse sentido, um fato central para a pesquisa é justamente a frágil fronteira entre a categoria de alimento saudável e a de alimentos que apresentam riscos. Um alimento ou ingrediente pode estar numa categoria e após a divulgação de alguma pesquisa passar para a outra categoria. Acreditamos que tais oscilações trazem incertezas tanto para leigos como para peritos e a pergunta que melhor se ajusta a essa situação é: como se estabelecem as relações de poder entre os diversos sistemas peritos na definição do que é um alimento saudável?

Em geral, a preocupação dos consumidores leigos é diretamente proporcional ao seu grau de informação diante de tais riscos. Quanto mais se sabe, mais se teme.
E esses consumidores, indivíduos na sociedade contemporânea, desenvolvem suas avaliações de risco a partir de informações de fontes variadas. Quais são essas fontes?

Até os anos 80, a maioria das pessoas tirava suas dúvidas sobre saúde com os médicos e os nutricionistas. Desde então, um volume enorme de notícias sobre o tema passou a ganhar espaço na grande mídia e na internet, a que tem acesso o público leigo. De fato, estamos numa sociedade globalizada, na qual a circulação de informação é uma de suas características centrais. Diante de tantas notícias (e das suas contradições) é comum que surjam sentimentos de desconfiança e de dúvida diante da ciência e da pesquisa científica.

Além do desconcerto entre os leigos, os diversos setores ligados à área de saúde e de alimentos também estão tendo de lidar com tais divergências cientificas.
Ou seja, os peritos não permanecem à margem das controvérsias científicas, não só pelo contato através dos meios de comunicação de massa, mas também pelo acesso cada vez mais fácil e simultâneo a novas publicações técnicas.

Esse tema tem sido pouco estudado no Brasil, apesar de sua importância. Por isso, consideramos relevante um estudo sociológico que permita entender como os especialistas constroem suas percepções sobre as controvérsias relacionadas aos riscos alimentares. Essa é a proposta desta tese. Acreditamos que essa construção envolve um processo sócio-dinâmico de definição, negociação e legitimação dos riscos alimentares em diversas arenas públicas e privadas, incluindo órgãos governamentais e instituições acadêmicas, indústria de alimentos, mídia, entre outros.
Entretanto, nesse trabalho, vamos nos ater ao papel da autoridade científica e da ciência frente à legitimação do conceito de alimento saudável como oposto ao conceito de risco alimentar.

Acreditamos que um posicionamento frente à ciência é essencial para a construção da cidadania. Em uma época na qual se pode ser merecedor de crédito apoiando-se no termo "científico", o cidadão, para fazer escolhas sensatas, precisa ser informado de que há bons e maus usos dessa palavra. Para Irwin (2001), a ciência e os especialistas são tópicos-chaves que alimentam uma profunda discussão sociológica hoje. Já Hanningan (1995), na ótica da Sociologia Ambiental, afirma que se a modernidade reflexiva proclama o fim das certezas, então a desconstrução e a reconstrução dos riscos ambientais e do conhecimento tendem a se tornar características dessa sociedade.

Como já mencionado no início desta introdução, para entender o processo de construção social do conceito de alimento saudável, optamos por analisar o caso da soja. E porque a soja?

Escolhemos este alimento, entre muitos passíveis de serem explorados sob a mesma perspectiva, porque acreditávamos que seu consumo - que tem aumentado significativamente, estando presente em muitos alimentos da nossa dieta cotidiana - aparece diretamente ligado a benefícios à saúde. Além disto, a sojicultura envolve questões sociais, políticas e ambientais significativas.

A hipótese que orientou nosso trabalho é que as polêmicas sobre os benefícios e riscos da soja são desconhecidos pela maioria dos cientistas, julgando-se a mesma como um alimento inquestionavelmente saudável. Com efeito, observa-se, nos últimos anos, a publicação de uma grande quantidade de pesquisas que estimulam o consumo de soja e apontam seu valor nutracêutico10 e nutricional. No caso da soja, os principais apelos nutracêuticos dizem respeito à soja com ação na prevenção e no tratamento de doenças cardiovasculares em geral (CLARKSON, 2002); além de estudos que sugerem que o grão é um alimento funcional capaz de atuar na prevenção dos sintomas da menopausa (THAM et al, 1988). Tais pesquisas surgem no mesmo momento em que muitos governos e influentes corporações transnacionais estimulam o seu cultivo e que seus produtores lidam com grande quantidade de excedente de grãos no mercado interno e internacional.

De forma geral, numa primeira impressão sobre o tema parece existir quase um consenso científico de que a soja é um alimento saudável e que as pesquisas podem comprovar isso. No entanto, existem também controvérsias a esse respeito, as quais pareciam ser bem pouco conhecidas no Brasil. A partir de uma pesquisa exploratória observamos que são poucos os cientistas dedicados aos estudos de soja e saúde humana no país. Por isto a formulação de nossa hipótese, considerando que a maioria deles, bem como dos especialistas em saúde, apóia o conceito da soja como saudável. Entretanto, isto não finaliza a pesquisa, mas abre novas perguntas, que orientaram nosso trabalho. Entre elas, destacamos duas: o que justificava essa posição? Quais as suas fontes de informação?

As controvérsias emergiram quando passaram a ser publicadas pesquisas científicas que questionavam o consumo da soja para o ser humano e revelavam contra-indicações ao consumo regular de soja não-fermentada, isto é, na forma de grão, proteína texturizada e extrato de soja. Tais restrições já existiam, na verdade, dentro da cultura alimentar dos antigos chineses, que consumiam regularmente soja fermentada na forma de misso, shoyo, natto e tempeh e usavam o grão apenas para adubação verde. Atualmente, existem pesquisas científicas11 que apóiam essas restrições, procurando mostrar que a ingestão da soja não-fermentada é desaconselhável.

Há ainda outro elemento que merece atenção e que terá relevância no presente estudo: o caráter socioambiental dos riscos do consumo de soja e da pesquisa científica nessa área. Dros (2004) e outros autores que serão mais adiante explorados apontam repercussões sociais e ambientais relacionadas ao seu cultivo, as quais são freqüentemente ignoradas na definição de soja como alimento saudável e seguro. Ou seja, o tema da soja será analisado também como um risco ambiental.
A partir de tais controvérsias, acreditamos que este estudo nos permitirá explorar as discussões que emergem durante a construção do polêmico conceito de alimentação saudável, suas relações com o conceito de risco alimentar, e o trânsito entre eles.

Por um lado, a necessidade biológica de comer encontra-se inserida num sistema de valores que supera a prática natural relacionada ao ato de alimentar-se; por outro, a alimentação é uma prática comum a todos os indivíduos, que diz respeito à sociedade em seu conjunto. Como qualquer linguagem, as práticas alimentares têm regras de exclusão, rituais de uso e significados opostos (ATKINS; BOWLER, 2001).
As escolhas alimentares não são somente decisões individuais, e muito menos exclusivamente racionais, mas são resultados de uma série de situações e pressões sociais (POULAIN, 2004). A reflexividade e a percepção dos riscos parecem ser alguns dos fatores que influenciam hoje essas escolhas. Não é preciso conhecer profundamente a atual discussão sociológica sobre o tema para que leigos e peritos considerem os riscos alimentares como uma realidade concreta e angustiante. Esses riscos são difíceis de detectar e é impossível precaver-se completamente das suas conseqüências, nem mesmo à luz do também controverso conhecimento científico dos especialistas (GIDDENS, 2002).

Acreditamos que uma análise sobre a proliferação de pesquisas controversas, abordando a qualidade dos alimentos e os riscos alimentares, poderá servir para a compreensão do conceito de reflexividade e das transformações das representações dos valores da ciência e, por conseguinte, da sociedade na qual essa ciência está inserida. Um estudo que se debruce sobre a construção do conceito de alimentação saudável e de riscos alimentares poderá ainda apontar como o saber científico se constrói e se organiza dentro de um sistema perito específico. Conhecer conflitos que envolvem a ciência permite também sinalizar os papéis dos cientistas e especialistas, bem como dos leigos frente ao processo de decisão de políticas publicas e podem ajudar a compreender como as controvérsias cientificas surgem, se diluem ou persistem.

A discussão sobre os riscos traz à tona uma dimensão da estrutura e da vida na sociedade contemporânea, incluindo questões fundamentais, como relações entre sociedade e natureza (e ciência e sociedade), o caráter da democracia e da cidadania e a relação entre conhecimento e diálogo público (IRWIN; MICHAEL, 2003).

Por fim, visto que ainda se trata de uma área em construção na discussão acadêmica, concorda-se com Guivant (1998) quando ressalta que suas contribuições no mapeamento da trajetória dos riscos - no caso, alimentares - podem colaborar na identificação de alguns dos pontos de passagem importantes nos debates atuais na teoria social. A pertinência de tal estudo é apoiada por Franklin, citado por Guivant (1998, p.28), a qual defende que "a forma com que interpretamos os riscos, negociamos os riscos, e vivemos com as imprevisíveis conseqüências da modernidade estruturará nossa cultura, sociedade e política pelas próximas décadas".
Do ponto de vista teórico, a tese se apóia nos estudos realizados por Giddens, Lash e Beck (1995) sobre a modernidade reflexiva e por Beck (1992) sobre a sociedade de riscos, procurando combiná-los com a perspectiva construtivista da Sociologia do Conhecimento Científico, tal como exposta no Capitulo 2. Esse referencial teórico-metodológico, apoiado ainda por autores como Irwin, Jassanoff, Nestle, Beardsworth e Keil, parte de trabalhos realizados por Guivant e participantes do Núcleo Interdisciplinar em Sustentabilidade e Redes Agroalimentares da Universidade Federal de Santa Catarina (NIRSA/UFSC) que vem se dedicando à análise de riscos alimentares.

Do ponto de vista empírico, realizamos pesquisa documental e entrevistas.
Partimos de uma análise detalhada de documentos (relatórios de pesquisas e artigos com bibliografia específica, textos e entrevistas em sítios eletrônicos) para fazer uma recuperação histórica da noção de dieta saudável, bem como da trajetória da soja como alimento; investigamos também as várias dimensões dos debates em torno das suas definições como alimento saudável e como alimento de risco e procuramos traçar a rede de atores envolvidos nessas construções. As entrevistas, por sua vez, visaram conhecer mais de perto as opiniões de peritos componentes dessa rede.

Pretendíamos, inicialmente, entrevistar cientistas diretamente envolvidos na pesquisa sobre soja e saúde no Brasil. Porém, diante das dificuldades de formar um grupo de pesquisadores disponíveis para serem entrevistados, nosso levantamento de campo se voltou para médicos clínicos especialistas, no caso, cardiologistas, pediatras e ginecologistas, áreas nas quais se concentram grande parte das controvérsias e pesquisas desenvolvidas. Realizamos, assim, quinze entrevistas semi-estruturadas com médicos que atuam em Florianópolis (SC). Ao definir esse novo grupo, nossa segunda hipótese foi a de que, enquanto membros da rede científica, os médicos tinham um papel ativo na construção social da soja como alimento saudável frente a seus pacientes, no contexto dos desafios (nem sempre identificados) das divergências científicas que circundam tal conceito.

O primeiro capítulo desta tese aborda as transformações sociais do conceito de alimento (ou dieta) saudável para explicitar as influências que colaboram na construção de tal conceito desde o início da modernidade, com foco nas noções de risco, nas intervenções tecnológicas e na pesquisa científica.

No Capítulo 2, nos concentramos na dimensão da ciência e seu papel na construção dos riscos ambientais na perspectiva da Sociologia do Conhecimento Científico. Tal abordagem dará suporte para a análise da construção social da soja
como alimento saudável.

Dedicamos dois capítulos ao nosso objeto de estudo, a soja. O terceiro capítulo explora a sua trajetória, investigando como ela mudou seu status de consumo nas sociedades contemporâneas e as controvérsias nas pesquisas sobre o grão. O quarto capítulo vai abordar o contexto socioambiental que envolve o cultivo da soja, bem como rastrear novos atores dentro de sua polêmica rede de pesquisa.
No quinto e último capítulo, além de detalharmos a metodologia utilizada na pesquisa de campo, analisamos as entrevistas realizadas com os especialistas e discutimos os resultados que emergiram dessa pesquisa.

As conclusões mais gerais sobre o conjunto do trabalho se encontram nas Considerações Finais.

CAPÍTULO 1

AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS DAS DIETAS SAUDÁVEIS

A íntima e complexa relação entre saúde e alimentação faz parte das preocupações humanas e parece irrefutável. A natureza dessas preocupações, porém, sofre contínuas transformações e reflete mudanças culturais e sociais por que passam a humanidade.

A noção de risco acompanha e fragiliza o conceito de alimento saudável.
Apesar de autores como Fischler (1990) e Paul-Levy (1997) considerarem a ansiedade alimentar como uma invariante da relação humana com o alimento, Beck (1992), em seus estudos sobre a modernidade, enfatiza o risco alimentar (entre outros riscos) como uma das características centrais dessa época. Gaudillière (2001), de forma similar, mostra que a angústia alimentar se exacerbou com o processo de industrialização moderno.

O objetivo desse capítulo é apresentar um panorama geral de como se constroem as relações entre saúde e alimentação (ou dieta)12 e riscos alimentares, a partir da modernidade. Analisaremos com especial atenção como a noção de risco transpassa o conceito de alimento saudável e qual o papel da ciência dentro do sistema alimentar contemporâneo. Não pretendemos, naturalmente, minimizar ou desqualificar nenhum tipo de risco alimentar. Acreditamos que os conceitos de alimento saudável e de risco acompanham a humanidade e mudam suas formas de expressão segundo os contextos sociais, mas o que nos interessa centralmente é discutir tais conceitos e conhecer a influência que os mesmos sofrem das intervenções
tecnológicas e do contexto político da ciência.

O capítulo se divide em dois itens: o primeiro se atém às mudanças que ocorreram no modo de pensar a alimentação desde o início da modernidade e como a ciência da Nutrição, desenvolvida a partir do século XIX, influenciou na construção do conceito de alimentação saudável. Analisaremos o cenário norte-americano e o europeu e também as peculiaridades das modificações que ocorreram no Brasil.
Focalizaremos especialmente as políticas públicas voltadas para a Nutrição e para o combate da fome e da desnutrição, uma vez que esses dois problemas foram - e continuam sendo - centrais quando se considera a questão da alimentação das populações.

O segundo item aborda o momento atual da Nutrição. Apresenta conceitos mais universais, avalia a inserção de novos atores e discute os diferentes fatores que colaboram para construir o conceito de alimento saudável hoje, bem como as controvérsias e os riscos de caráter global vinculados a tal conceito.

1.1. Racionalização do saudável na modernidade

No início da era moderna, com o início da colonização e da exploração das riquezas dos novos mundos, os alimentos exóticos, vindos de longe, tornaram-se uma atração na Europa. A demanda por especiarias já levara os europeus ao mar, possibilitando o surgimento de impérios coloniais e o desabrochar do capitalismo. Com a chegada de novos alimentos, os europeus também superaram crises de fome, recorrentes na época. Já os povos nativos da Américas, incluindo o Brasil, incorporaram novas espécies e culturas agrícolas trazidas pelo colonizador, que diversificaram a sua dieta (FRANCO, 2000).

Segundo Cascudo (1983), o brasileiro nasce com sua cozinha (um melting pot), no século XVI. Os escravos contribuíram predominantemente com técnicas culinárias nativas, pois se alimentavam dos alimentos disponíveis na terra e plantados pelos índios. Usavam também alguns produtos que os acompanharam da África, como banana, inhame, quiabo e coco. Os portugueses, bem como os outros imigrantes que seguiram, utilizaram as reservas ameríndias e os recursos africanos aclimatados e só uma pequena porcentagem permaneceu fiel ao cardápio europeu. O cultivo do café e da cana-de-açúcar e a produção de gado influenciaram o perfil do sistema alimentar dominante por muito tempo no Brasil, com base na monocultura, nas grandes propriedades e na exportação. A produção de alimentos de uso diário, no entanto, permaneceu sob a responsabilidade dos pequenos e médios produtores rurais (CASCUDO, 1983).

De modo geral, podemos dizer que as condutas alimentares e o conceito de alimento saudável no início da modernidade ainda eram definidos pela cultura e pela territorialidade. Já a noção de risco alimentar repousava na perspectiva de contaminações biológicas de origem desconhecida e pela escassez de alimentos.
As primeiras menções que envolviam a questão de comer de forma saudável aparecem já no século XVIII quando, segundo Cascudo (1983, p. 445), o "glutão sucedeu ao gourmet" e operou-se "a decadência do saber comer, substituído pela fama pilhérica de comer muito".

Em torno de 1720, George Cheyn, médico inglês, publicou uma série de livros traduzidos para várias línguas européias, nos quais o tema central era a relação entre saúde e alimentação. Seus pacientes, sedentários, urbanos e engajados em atividades intelectuais, faziam parte da elite e da aristocracia inglesas que incluíam em sua dieta comidas exóticas, condimentadas e vinhos fortes. Suas recomendações enfocavam a frugalidade, o consumo de alimentos chamados de leves, como carnes brancas, leite e vegetais, e também a prática de exercícios regulares e a restrição no consumo de álcool, fazendo ainda prescrição de horários regulares de sono e descanso (BEARDSWORTH; KEIL, 1997).

No início do século XIX, as primeiras considerações sobre a qualidade da alimentação e a racionalização no uso de alguns alimentos na Europa, voltaram-se para a saúde das "superalimentadas elites", como sugerem Beardsworth e Keil (1997, p.142). Mais tarde, com o desenvolvimento da ciência da Nutrição, países como a Inglaterra e os Estados Unidos começaram a intervir nos padrões nutricionais das classes mais desprivilegiadas e carentes. Tais intervenções tomaram diferentes formas, desde a educação nutricional, até os subsídios e a distribuição de alimentos e suplementos para grupos nutricionalmente vulneráveis13 (BEARDSWORTH; KEIL,
1997).

O desenvolvimento da ciência da Nutrição, na sua forma moderna, a partir da descoberta dos nutrientes no início do século XIX, preconizou uma padronização das necessidades nutricionais humanas com base nos conceito de caloria e na análise quantitativa dos nutrientes. A idéia era criar a dietética como uma profissão paramédica separada. Por volta de 1842, os fisiologistas Meyer e Helmhoz descobriram a lei da conservação de energia. A caloria foi escolhida como unidade termodinâmica e teve início a análise quantitativa dos nutrientes através da balança e da bomba calorífica. O conceito de produção de energia passou a ser igualmente aplicado ao organismo vivo e ao ser humano. Carl von Voit, químico e fisiologista alemão, considerado o fundador da dietética moderna, declarou, em 1875, que a necessidade média do organismo adulto humano deveria ser de 3000 calorias, provenientes de 500g de carboidrato, 118g de proteína e 56g de gordura (SCHMIDT, 1975).

Segundo Beardsworth e Keil (1997, p.30), o processo de racionalização moderno enfatizou "a mensuração, o cálculo, a predição e a organização sistemática".
Schmidt (1975) ressalta que os tratados filosóficos históricos e os livros sagrados que abrigavam teorias sobre a qualidade de certos alimentos foram substituídos por pesquisas no campo da bioquímica, que se intensificaram a partir de 1840. Tais estudos foram desenvolvidos por cientistas e fisiologistas europeus - a partir de trabalhos como os de Lavoisier (1743-1794), Claude Bernard (1813-1878), Liebig 1803-1873) e Magendie (1783-1855) - com base na análise do metabolismo dos nutrientes e seu valor energético e nutritivo. O enfoque calórico-quantitativo irá deixar sua marca em grande parte da ciência da Nutrição atual.

A proteína foi isolada e identificada há mais de um século por Berzelius (1779- 1848). O químico sueco propôs o conceito de proteína baseado na palavra de origem grega proteios, que significa primeiro ou de principal importância. Essa descoberta iniciou uma mudança significativa nos sistemas alimentares, que se voltaram para produção da proteína animal. Tal fato, para Cannon (2005), mudou profundamente a trajetória da Nutrição humana. O conceito de Nutrição como idéia de dieta, definida pelos antigos gregos como "tipo de vida ou estado de ser", estreitou-se nessa época.
A Nutrição tornou-se menos uma filosofia de vida e mais um "instrument of state" (p. 702). A visão da bioquímica de Liebig, aliada às idéias de Pasteur (1822-1895), entre outras influências, ajudaram a modificar as visões ecológica e vitalista da Nutrição cultivadas pelos cientistas e filósofos naturais.

Ao mesmo tempo, também no século XIX, a agricultura moderna se estabelecia gradativamente, a partir do conhecimento dos nutrientes e de suas funções com base nas descobertas científicas. Tais avanços permitiram transformar variedades tradicionais de adaptação geográfica estreita em variedades novas, com adaptabilidade e alta produtividade, sem o conhecimento local da biodiversidade que sustentava os sistemas tradicionais (KATHOUNIAN, 2001).

No Brasil, o processo de modernização da agricultura tem origem na década de 1950, com o início das importações de meios de produção mais avançados. No entanto, é só na década de 1960 que esse processo se concretiza, a partir da implantação no país de um setor industrial voltado para a produção de equipamentos e insumos agrícolas. Além da pressão das indústrias de equipamentos e insumos para estimular tal processo, o incentivo governamental através do crédito rural, viabilizado principalmente a partir de meados da década de 1960, foi outro elemento essencial para o fortalecimento da agricultura moderna no país (TEIXEIRA, 2005).

De fato, o perfil do moderno sistema agroalimentar consolidou-se gradativamente em torno de uma série de alternativas industriais parciais aos processos agrícolas, em consonância com o avanço do conhecimento científico e tecnológico. Diferentes setores industriais emergiram de tendências gerais, ao se apropriaram dos processos agrícolas ou na tentativa de substituir o produto agrícola. A emergente indústria alimentar se baseava inicialmente em um processo empírico e experimental de upscaling de processos artesanais, mantendo as antigas técnicas de preservação/separação/ transformação, isto é, prensagem, secagem, limpeza, craqueamento, aquecimento, congelamento e fermentação. Embora detentora de algumas inovações notáveis, como a hidrogenação dos óleos e a desidratação e a condensação de leites, a indústria de alimentos era vista como um setor de baixa tecnologia até o início da década de setenta (WILKINSON, 2002).

Certamente o desenvolvimento técnico de processamento de alimentos contribuiu para mudanças na dieta, no barateamento e no aumento da durabilidade de alguns gêneros, e também para alguns tipos de desnutrição. O refinamento do arroz, por exemplo, está relacionado à epidemia de uma disfunção chamada beribéri14 na Ásia, em meados de 1886. Carência de vitaminas A e D também foi diagnosticada entre soldados da guerra civil norte-americana, em 1850, que se alimentavam basicamente de leite condensado desnatado (TANSEY; WORSLEY, 1995).

No final do século XIX e início do século XX, entre as maiores causas de morte estavam as doenças infecciosas, como a gastrenterite, a tuberculose e a difteria, as doenças da infância e do sistema circulatório, que se tornavam ainda mais letais quando associadas à desnutrição que prevalecia entre os mais pobres. A expectativa de vida girava em torno de 47 anos e a alimentação nos centros urbanos era pobre em diversificação e quantidade de alimentos (NESTLE, 2002; SORCINELLI, 1998).

Nessa mesma época, na Inglaterra, os problemas da relação alimentação e saúde eram especialmente visíveis na classe operária, mal nutrida e esfomeada. A noção de risco alimentar repousava na impossibilidade de acesso ao alimento. A elite começou a se preocupar com o fato de que a insalubridade dos pobres representava um perigo para a alta sociedade, por causa da possível proliferação de doenças contagiosas, e também questionava se a má qualidade da força de trabalho operária não poderia afetar diretamente a estabilidade do sistema capitalista. Assim, o governo passou a monitorar, regular e melhorar os padrões dietéticos da massa da população, criando comitês de controle da desnutrição e oferecendo alimentação para crianças carentes e apoio financeiro para centros de bem-estar infantil, com o intuito de desenvolver recomendações dietéticas materno-infantis adequadas BEARDSWORTH; KEIL, 1997).

Durante a Primeira Guerra Mundial, o governo britânico interveio também nos mercados alimentares, subsidiando alimentos básicos, como pães e leite. Entretanto, essas medidas não impediram que 40% dos soldados ingleses fossem diagnosticados como desnutridos, durante exames médicos realizados entre 1917 e 1918. Segundo Tansey e Worsley (1995), o estado de desnutrição dos soldados ingleses foi relacionado à baixa qualidade dos cereais refinados consumidos na Grã Bretanha. Durante a Segunda Guerra Mundial o governo obteve mais sucesso na prevenção da desnutrição, provendo proteína, vitaminas e minerais aos grupos mais vulneráveis, como os de crianças pré-escolares, grávidas e lactantes. Essas medidas ajudaram a diminuir a taxa de mortalidade infantil e a aumentar a taxa de nascimentos, em contraste com outros países europeus, como, por exemplo, a Alemanha (BEARDSWORTH; KEIL, 1997).

No período pós-guerra, a experiência bem sucedida da Inglaterra levou à adoção de padrões alimentares e escolhas dietéticas coerentes com as preocupações científicas ortodoxas voltadas para a relação entre dieta e saúde. Tais recomendações foram colocadas sob a responsabilidade do cidadão, no sentido de adotar essas práticas para manter sua própria saúde. Regulação e racionalização foram substituídas por educação e exortação (BEARDSWORTH; KEIL, 1997).

Nessa perspectiva, foi fundada a primeira disciplina de Nutrição em Saúde Pública por Boyd Orr, também primeiro diretor da Food and Agriculture Organization (FAO), órgão das Nações Unidas. Orr veio a ganhar o prêmio Nobel da Paz por seu trabalho em defesa da equidade do suprimento mundial de alimentação, durante os anos de 1930 a 1945. Ele abraçou as dimensões nutricionais ambientais, sociais, econômicas, políticas, éticas e de direitos humanos e pressionou políticos e mídia na construção de uma política mundial de abastecimento alimentar (CANNON, 2005).

A preocupação com a qualidade da alimentação das grandes massas também pode ser percebida nos Estados Unidos, onde a ciência da Nutrição vivia então seus tempos de glória. Nesse mesmo país fora criado, em 1862, o Departamento Americano de Agricultura (USDA), cujo objetivo central era assegurar uma quantidade suficiente de suprimento alimentar para a população. No início de 1890, o USDA começou a apoiar pesquisas que relacionavam agricultura e nutrição humana. Wilbur Olin Atwater, seu primeiro diretor de atividades de pesquisa nessa área, publicou tabelas listando o conteúdo de nutrientes nos alimentos localmente consumidos e estimou a quantidade de calorias necessárias para os diferentes tipos de atividades profissionais. Até esse momento, as vitaminas não tinham sido isoladas e sua relação com a saúde humana era desconhecida. Nessa época, o diretor já apontava os malefícios de uma dieta com grande quantidade de carnes, amido e açúcares, como era o caso da dieta americana. Em 1917, o USDA distribuiu a primeira publicação de recomendações dietéticas intitulada "Como selecionar os alimentos". Essa abordagem estabeleceu cinco categorias ou grupos de alimentos: frutas e verduras; carnes e leite; cereais e amidos em geral; doces e gorduras. O documento ignorou, porém, os alertas de Atwater e não estabelecia nenhuma restrição ou combinação dessas categorias, mas somente enfatizava o que o corpo necessitava para funcionar. Essa publicação considerava todos os alimentos como componentes de uma dieta saudável, sem restrições a grupos específicos (NESTLE, 2002).

Apesar das descobertas dos alimentos ricos em vitaminas e minerais, chamados de protetores, a política norte-americana entre 1923 e 1940 foi a de manter as recomendações não restritivas dos diferentes alimentos. Inclusive, não houve muita ênfase no consumo desses alimentos protetores (frutas e verduras), porque o governo os considerava de alto custo para o consumidor. Em 1940, a U.S National Academy of Sciences estabeleceu um comitê que veio a se tornar o Food and Nutrition Board. Sua primeira tarefa foi a de estabelecer padrões para a ingestão diária de nutrientes para toda a população norte-americana. O comitê sugeriu, já em 1941, as Recommended Daily Allowances (RDAs) - ou doses diárias recomendadas - para a quantidade de energia e de oito nutrientes. Desde 1943 até hoje, esse comitê continua revisando as RDAs em intervalos de 5 a 10 anos (NESTLE, 2002).

Em 1946, uma nova e inédita publicação do USDA indicava a seleção de apenas alguns grupos de produtos, inclusive doces e gorduras, que apoiavam uma política para estimular o aumento do consumo alimentar (NESTLE, 2002, p.32). Essa política ganhou suporte ainda em 1950, quando um grupo de nutricionistas comparou o resultado de estudos comparativos de práticas de consumo no país com os RDAs e alertou que a dieta de muitos americanos estava carente de vários nutrientes. Assim, foi decidida a elaboração de um novo guia alimentar formado por quatro grupos de alimentos: leite; carnes (e leguminosas, como alternativa); frutas e verduras; e cereais.

Para ter certeza que o guia descreveria uma dieta que fosse ao encontro dos RDAs, era especificado o número e o tamanho das porções recomendadas por dia, por pessoa. E, para atingir um consenso nessa proposta inovadora, o USDA convidou, além de autoridades em Nutrição, também representantes da indústria de alimentos e dos grupos de commmodities agrícolas para rever as recomendações nutricionais. Assim, enquanto os produtores de leite apoiavam as indicações dadas ao consumo desse alimento, a indústria das carnes questionava as porções indicadas para o consumo de proteína animal por dia. Entretanto, as queixas não foram ouvidas e o USDA incorporou as recomendações em novo guia que estimulava o consumo de mais variedades de alimentos (NESTLE, 2002).

Em 1960, outro estudo apontou má nutrição e fome entre alguns grupos de baixa renda nos EUA e a política norte-americana, durante os dez anos subseqüentes, declarou guerra à fome, incentivando o plano de intervenção disseminado por diferentes áreas da Nutrição e da saúde que estimulava o consumo aumentado de alimentos.

No Brasil, a intervenção do poder público no setor de alimentação teve início em 1918, com a criação do Comissariado de Alimentação Pública, órgão com a finalidade de controlar os estoques e tabelar os preços dos gêneros alimentícios (UCHIMURA; BOSI, 2003). Em 1940, o médico Josué de Castro idealizou, organizou e dirigiu o Serviço Central de Alimentação, transformado posteriormente no Serviço de Alimentação da Previdência Social (SAPS) 15, primeiro órgão de política de alimentação no país. Tais políticas se voltaram centralmente para minimizar o risco da fome e para propiciar a melhoria das condições nutricionais das classes menos favorecidas16.

Ainda na década de quarenta, foram criadas outras três agências da política nacional de alimentação: o Serviço Técnico de Alimentação Nacional (STAN), em 1942; o Instituto de Tecnologia Alimentar (ITA), em 1944; e a Comissão Nacional de Alimentação (CNA), em 1945. Em 1953, a CNA, seguindo as recomendações da Food and Agriculture Organization/Organização Mundial da Saúde (FAO/OMS), elaborou o Plano Nacional de Alimentação (PNA). Em 1955, surge o Programa Nacional de Merenda Escolar (PNME), transformado nesse mesmo ano em Campanha Nacional de Merenda Escolar (CNME), objetivando a melhora da qualidade nutricional da alimentação das crianças (UCHIMURA; BOSI, 2003).

A década de cinqüenta constituiu-se no marco histórico dos programas de Nutrição e do desenvolvimento de práticas de alimentação saudável na América Latina e no Brasil. Na ideologia desenvolvimentista da época, criaram-se planos que objetivavam a melhoria nutricional da população, principalmente em termos quantitativos. Por um lado, utilizavam-se práticas de suplementação alimentar e introdução e estímulo a novas fontes de proteína. Também havia programas de reabilitação através dos Serviços de Recuperação Nutricional (SERNS). No nordeste brasileiro, o Instituto de Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco, na zona da mata, conduzida por Nelson Chaves, se destacou nessas duas frentes
(suplementação e reabilitação) (ESCODA, 2006).

No início dos anos sessenta, surge no Rio Grande do Norte o Plano Integrado de Alimentação e Nutrição (PINA), um programa de Nutrição que lançou a estrutura da multisetorialidade em planejamento nutricional, uma vez que incluia componentes de saúde, educação e produção de alimentos em sua programação. Este programa obteve um largo espaço na tônica do populismo de então e obteve grande êxito e reconhecimento inclusive da FAO. A partir desse intercâmbio, a idéia do PINA foi disseminada por todo o continente latino-americano e posteriormente na Ásia e África
(ESCODA, 2006).

Nessa mesma década, outro fato importante (e bastante controvertido, pois visto como uma ameaça à soberania nacional) foi a intervenção que a Aliança para o Progresso fez no país, sob a forma de empréstimos e doações (efetivados, na verdade, em todos o países da América Latina), distribuindo excedentes da produção alimentar norte-americana17.

Outro fator a ser analisado na década de sessenta, são as modificações nos padrões de morbimortalidade da população, que vêm sendo objetivamente estudadas e analisadas pela Coordenação-Geral da Política de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde, sob o enfoque dos processos de Transição Demográfica, Transição Epidemiológica e Transição Nutricional.

Para compreender a Transição Demográfica, verifica-se que as modificações no nível do desenvolvimento de cada sociedade correspondem a alterações nos padrões de morbimortalidade das populações. Em quase todos os países, esses padrões se apresentam com redução das doenças infecciosas e crescente aumento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT). Tais enfermidades contribuem significativamente para as causas de óbitos, em virtude do aumento da vida média e do envelhecimento populacional relacionado ao estilo de vida urbano contemporâneo (PINHEIRO et al, 2004).

Aspectos da Transição Epidemiológica nutricional se confirmam frente ao quadro epidemiológico dos distúrbios nutricionais e das doenças relacionadas à alimentação e à nutrição no Brasil. Nas últimas décadas, pode-se observar um decréscimo importante da prevalência de desnutrição e de baixo peso em todas as faixas etárias e regiões, seguido de um aumento nas taxas de sobrepeso e de obesidade em todas as regiões, faixas etárias e, com especial destaque, em mulheres de estratos sócio-econômicos mais baixos (PINHEIRO et a, 2004).

Pinheiro e colaboradores (2004) definem Transição Epidemiológica como o resultado das mudanças nas tendências dos padrões de morbimortalidade e fecundidade, que determinam mudanças na estrutura populacional. A evolução gradual dos problemas de saúde que deixam de ser caracterizados por alta morbidade e mortalidade por doenças infecciosas, em detrimento da elevação e maior predomínio de doenças crônicas não transmissíveis, processam alterações na maneira de adoecer e morrer das populações, como já sinalizado acima por Nestle ( 2002) e Sorcinelli
(1998).

A Transição Nutricional é também um processo de modificações seqüenciais associadas ao padrão de alimentação e nutrição. Neste sentido, as mudanças econômicas, sociais e demográficas modificam o perfil alimentar e nutricional no contexto do processo saúde-doença das populações (PINHEIRO et al, 2004). As altas e baixas na produção de alimentos18 despertaram a atenção internacional e o Congresso norte-americano anunciou uma grande crise de alimentos para a década seguinte. Tal afirmação estimulou a convocação da I Conferência Mundial de Alimentos, pela FAO, em Roma, no ano de 1974. Um dos resultados dessa conferência, e que começou a fazer parte das políticas de Nutrição em todo o mundo, foi a criação da Vigilância Alimentar e Nutricional, um sistema de alarme precoce que objetiva evitar as crises de variação de disponibilidade de alimentos, além de detectar o perfil das carências nutricionais de cada país (ESCODA, 2006).

Pode-se afirmar, portanto, que entre 1940 até o início dos anos sessenta, a educação nutricional, no Brasil, se fundamentou no que Santos (2005, p. 682) chama de "mito da ignorância", ou seja, o mito de que o povo não se alimentava bem porque não sabia comer.

A partir de 1970, o enfoque anterior em alimentação-educação passou a ser em educação-renda e surgiram os programas de suplementação alimentar. Essa perspectiva considerava que o povo não comia bem porque não tinha condições financeiras para comprar alimentos saudáveis (SANTOS, 2005).

Em 1973, é criado o Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN), uma autarquia vinculada ao Ministério da Saúde, e, em 1976, é implantado o PRONAN (que se manteve até 1985)19. O PRONAN é criado em um momento em se percebe um novo interesse mundial pela Nutrição. Nessa mesma época, é fundada a Comissão de Nutrição nas Organizações das Nações Unidas (ONU) e o Banco Mundial estimula a criação e o fomento de organismos destinados às políticas de Nutrição nos países pobres (ESCODA, 2006; UCHIMURA; BOSI, 2003).

Para Uchimura e Bosi (2003), a proposta do PRONAN II20 incluía componentes inovadores, se comparados aos modelos de intervenção utilizados até então. O Programa concebia a política alimentar e nutricional em uma perspectiva mais abrangente, compreendendo, também, ações nas áreas de produção e de consumo de alimentos, além da utilização biológica.

Depois de 1980, surge a educação nutricional crítica, a partir dos princípios da pedagogia crítica de orientação marxista; apregoava-se o direito à cidadania e a luta contra a exploração que gerava fome e desnutrição (SANTOS, 2005). Uchimura e Bosi (2003) afirmam que durante o período de 1980-1984, as intervenções já implantadas não sofreram alterações substanciais, com exceção do severo corte orçamentário enfrentado até 1982. Foram criados, na área de complementação e apoio, diversos programas: de incentivo ao aleitamento materno e de combate às carências nutricionais e doenças diarréicas21 e surge o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SIVAN), em caráter experimental.

Durante a Nova República, o padrão de intervenção colocado em prática a partir dos anos setenta apresentou pequenas e insignificantes modificações22. No início da década de noventa, a problemática alimentar foi minimizada na agenda estatal. Extinguiram-se todos os programas de alimentação e Nutrição de âmbito nacional, com exceção do PNAE e do PAT, e somente a partir de 1993, com a criação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA)23, o tema voltou à cena política do país. Uchimura e Bosi (2003) ressaltam que, em maio de 1999, houve a aprovação, pelo Conselho Nacional de Saúde, de várias medidas para o setor, intituladas em seu conjunto Política Nacional de Alimentação e Nutrição24. Atualmente, tem havido uma mudança no conceito de alimentação saudável perceptível aqui e em vários países. As preocupações com os riscos de deficiências nutricionais e com a fome - inevitavelmente vinculadas ao contexto político-social - ainda persistem, porém convivem com os temores das repercussões do consumo excessivo de certos nutrientes e alimentos - gordura, colesterol, sal, açúcar e álcool - na dieta.

A partir de 1990, o Brasil também passa a considerar tais problemas, como já referido por Pinheiro (2004). Assim, o cerne da educação nutricional tornou-se a promoção de práticas alimentares saudáveis, aliada à discussão do acesso ao alimento de qualidade em quantidade suficiente como direito humano e à alimentação com caráter de prevenção de doenças e promoção da saúde como um todo. Tal perspectiva persevera e a atual política de educação nutricional brasileira ainda amplia os conceitos de promoção das práticas alimentares e dos estilos de vida saudáveis, levando em consideração também o fator cultural como essencial na definição de práticas saudáveis (SANTOS, 2005).

Mas a problemática do acesso desigual aos alimentos persiste e no âmbito da saúde pública os programas das agências da United Nations continuam voltados para eliminar a fome e as doenças carenciais entre os povos mais pobres e buscar atingir o estado de saúde para todos. Porém, os dirigentes de tais programas, sustentados e mantidos por nações dominantes, admitem que as desigualdades entre os países pobres e ricos só aumentam e o comércio da alimentação é utilizado para criar relações de dependência e débitos impossíveis de serem quitados. Além disso, essas agências acabam por distribuir e promover o consumo de alimentos com baixo valor nutricional e de qualidade contestável, como é o caso dos alimentos transgênicos distribuídos na África. Tais ações não cumprem a função original e acabam colaborando com a deterioração do estado de saúde dessas populações vulneráveis (CANNON, 2005, p.704).

Para Uchimura e Boal (2003), as ações no campo da alimentação e da Nutrição desenvolvidas recentemente não apresentaram originalidade ou inovação, se comparadas àquelas que as antecederam. Nos programas criados e implantados ao longo deste recorte histórico, observa-se a repetição de modalidades de intervenção.

Destacam-se as ações de educação alimentar, a consolidação da suplementação de alimentos a grupos carentes e as iniciativas de enriquecimento de alimentos. Para Escoda (2006), as políticas de Nutrição nos países pobres, incluindo o Brasil, têm-se caracterizado em estratégias que o Estado utiliza para contornar a questão nutricional, atenuando seus danos, mas não atuam nos seus determinantes econômicos.

Por sua vez, Valente (2003) afirma, de forma mais otimista, que durante o mandato do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva que iniciou em 2003, surgiram iniciativas estruturais importantes para promover mudanças no quadro da fome e da desnutrição no país como a re-instalação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA); a realização das Conferências Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional - SAN (de 2004 e 2007); bem como a decisão de recolocar a construção participativa de uma Política Nacional de SAN na agenda política do país, vinculando-a à Presidência da República.

O Programa Fome Zero25 também foi uma iniciativa do governo Lula. O Programa é uma estratégia impulsionada pelo governo federal para "assegurar o direito humano à alimentação adequada às pessoas com dificuldades de acesso aos alimentos". Essa estratégia se insere na "promoção da segurança alimentar e nutricional buscando a inclusão social e a conquista da cidadania da população mais vulnerável à fome".

No seu artigo, Valente (2003) aponta os componentes estruturais do quadro atual de políticas públicas de combate a fome e desnutrição e sugere os passos necessários ao desenvolvimento de uma estratégia de outras ações efetivas26.

Ao analisar o conceito de alimentação saudável na perspectiva das atuais políticas públicas brasileiras, percebemos que novas preocupações vêm sendo incorporadas. A questão do acesso ao alimento é ampliada pelas preocupações que envolvem a sua qualidade, bem como as condições de cultivo, os componentes socioambientais relacionados à produção de alimentos e a sua origem. Dessa forma, as discussões de riscos ambientais apresentadas na Introdução perpassam atualmente o conceito de alimento saudável.

Apresentamos abaixo as principais características de uma alimentação saudável assumida pela Coordenação Geral da Política de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde brasileiro:
1. Respeito e valorização às práticas alimentares culturalmente identificadas: o alimento tem significações culturais diversas que precisam ser estimuladas. A soberania alimentar deve ser fortalecida por meio deste resgate.
2. A garantia de acesso, sabor e custo acessível. Ao contrário do que tem sido construído socialmente (principalmente pela mídia), uma alimentação saudável não é cara, pois se baseia em alimentos in natura e produzidos regionalmente (...).
3. Variada: fomentar o consumo de vários tipos de alimentos que forneçam os diferentes nutrientes necessários para o organismo, evitando a monotonia alimentar que limita o acesso de todos os nutrientes necessários a uma alimentação adequada.
4. Colorida: como forma de garantir a variedade principalmente em termos de vitaminas e minerais, e também a apresentação atrativa das refeições, destacando o fomento ao aumento do consumo de alimentos saudáveis como legumes, verduras e frutas e tubérculos em geral.
5. Harmoniosa: em termos de quantidade e qualidade dos alimentos consumidos para o alcance de uma nutrição adequada considerando os aspectos culturais, afetivos e comportamentais;
6. Segura: do ponto de vista de contaminação físico-química e biológica e dos possíveis riscos à saúde. Destacando a necessidade de garantia do alimento seguro para consumo populacional (PINHEIRO; RECINE; CARVALHO, 2005, p. 3)

O conceito de alimentação saudável acima apresentado incorpora componentes sociais e culturais, mas ainda carece de uma abordagem ambiental.

Entretanto, percebemos que tal dimensão é contemplada na atual política nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). A SAN, que vem sendo elaborado pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), é um conjunto de ações planejadas para garantir a oferta e o acesso aos alimentos para o conjunto da população, promovendo a nutrição e a saúde (ao mesmo tempo). Entre suas diretrizes aparece a conservação da biodiversidade e a utilização sustentável dos recursos no processo de produção de alimentos e a garantia da qualidade biológica, sanitária, nutricional e tecnológica dos alimentos.

Entre os temas enfatizados na III Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CNSAN), realizada em Fortaleza, em 2007, sobressaíram-se a reforma agrária, a promoção da agricultura familiar e a produção para autoconsumo enquanto políticas estratégicas de desenvolvimento, ao lado da estruturação de uma política nacional de abastecimento que priorize esses segmentos.

Em linha com a colocação do acesso universal à água de qualidade como direito humano básico e sua preservação, a III CNSAN propôs a ampliação dos processos de captação de água das chuvas para consumo humano e para a produção no Semi-Árido. Outro tema polêmico foi a liberalização de produtos transgênicos, condenada sob a reafirmação da demanda de revisão da Lei de Biossegurança27.

Por fim, a III Conferência incorporou a questão energética com a defesa de uma política sustentável para a área, que não comprometa a SAN, ofereça oportunidades à agricultura familiar, fortaleça sua capacidade de produzir alimentos diversificados e regule e limite o avanço das monoculturas.

As últimas diretrizes do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), de 2004, também expressam as novas preocupações socioambientais e as inserem nas políticas de alimentação e nutrição. Defendem-se princípios e diretrizes pautados no direito à alimentação em detrimento de um programa de cunho paternalista para suprir necessidades de crianças carentes. Os objetivos do novo programa não visam à evasão escolar e reverberam dentro da proposta de Agricultura Familiar Orgânica.

Entre esses objetivos ressaltam-se: a contribuição para a aprendizagem e a promoção do rendimento escolar; a formação de hábitos alimentares saudáveis; a dinamização da economia local; o respeito aos hábitos regionais; e a vocação agrícola da região com base na agricultura familiar (PEIXINHO, 2008). O foco da qualidade do alimento não é somente a inocuidade biológica, mas também a química, ou seja, a contaminação por resíduos químicos (agrotóxicos, aditivos, drogas veterinárias), revelando preocupações ambientais (incentivo à Agroecologia e à Agricultura Orgânica) e sociais (apoio à agricultura local, de base familiar).

Voltando aos países mais ricos, mesmo com um controle maior da fome e da desnutrição, o perfil nutricional da população não é mais positivo. A expectativa de vida dos norte-americanos aumentou para 77 anos, em 2000. Entretanto, entre as maiores causas de morte nos Estados Unidos estão as doenças crônicas não transmissíveis - doenças cardiovasculares, câncer, diabetes, cirrose hepática - além da obesidade como epidemia (NESTLE, 2002)28. A maioria dos centros urbanos em diferentes países acompanha tais tendências. Segundo essa autora, grande parte dessas disfunções tem uma maior ou menor relação com o consumo desequilibrado de alimentos e nutrientes, e a restrição de alguns componentes da dieta poderia reduzir substancialmente as taxas de mortalidade nesses centros. Além disso, outros fatores já apontados por George Cheyne, no século XVIII, estão intimamente ligados à etiologia dessas doenças, como o consumo de álcool, o sedentarismo e o estresse.

Diante dessa realidade, a Estratégia Global para a Promoção da Alimentação Saudável, Atividade Física e Saúde foi lançada, em 2003, pela Organização Mundial da Saúde. De acordo com Santos (2005), a partir dessa iniciativa, o Programa Nacional de Alimentação Saudável tem a perspectiva de elaborar uma estratégia brasileira prevendo o estímulo a uma dieta saudável aliada a práticas saudáveis exercício físico, controle de fumo e de estresse). Ou seja, a dieta saudável aparece vinculada a outros fatores que envolvem qualidade de vida.

Por fim, um processo chamado por Beardsworth e Keil (1997, p.142) de "racionalização e medicalização da dieta" afeta todas as classes sociais em várias partes do mundo. Os autores afirmam que atualmente modelos de alimentação racionais, restritivos e de caráter dietoterápico exercem uma enorme influência sobre a percepção do público em geral. É possível perceber uma tendência entre os especialistas em Nutrição de se considerar uma dieta saudável aquela que inclua alimentos light e diet, com baixo teor de calorias, gorduras e outros nutrientes, rica em alimentos funcionais29, alimentos fortificados e complementos à base de fibras e micronutrientes. O aspecto restritivo desse enfoque segue o conceito de dieta saudável dentro da abordagem calórico-quantitativa e acompanha as modificações no estilo de vida moderno e urbano associado ao alto consumo de fumo e álcool, ao aumento do sedentarismo e do estresse.

Convivendo com os menus tradicionais30, definidos pela cultura e pela sazonalidade, Beardsworth e Keil (1997) inserem os menus racionais que se ajustam ao perfil da modernidade. Eles são baseados em princípios científicos e elementos de cálculo e mensuração e envolvem critérios designados para atingir objetivos específicos - perda de peso, bem-estar físico ou mental, prevenção de doenças ou promoção de saúde. Esses menus podem ter outros objetivos específicos, como minimizar tempo e esforço para o preparo de alimentos (menus convenientes); baixar custos na compra alimentos (menus econômicos) e maximizar o prazer gustatório (menus hedonísticos).

Acreditamos que atualmente o conceito de alimento saudável sofreu uma mudança considerável, mas não perdeu a complexidade e a perspectiva cultural que a tradição imprimiu. Os menus tradicionais convivem com novos parâmetros de qualidade alimentar e novas categorias. Como percebemos acima, na modernidade reflexiva surge o que Beardsworth e Keil (1997) chamam de menu moral, que considera fatores éticos, políticos ou ambientais na escolha dos alimentos; e o menu pluralista, que oferece vários esquemas alternativos sobre como comer, estimula novos padrões alimentares e a formação de identidade pessoal definida a partir do consumo alimentar.

Atualmente, denominações como alimento integral, natural, dito colonial, caseiro, local, fresco, ético e orgânico, entre muitos outros, competem e convivem com conceitos de alimento nutritivo, light, diet, funcional e nutracêutico. Quase todos esses termos abrem espaços para amplas interpretações no campo de alimento saudável, mas, sobretudo, exigem processos de regulação de qualidade para evitar fraudes e má interpretação por parte dos consumidores.

1.2. A dieta saudável na contemporaneidade

A década de 90 imprimiu alterações significativas no sistema alimentar mundial, certamente a partir de mudanças na sociedade que influenciaram o sistema como um todo e o conceito de alimento saudável. Entre essas mudanças, Tansey e Worsley (1995) mencionam o aumento da longevidade; a crescente urbanização; a globalização do mercado de alimentos; o desenvolvimento de novas tecnologias; o resgate de valores morais e éticos, as preocupações ambientais e a entrada da mulher no mercado de trabalho.

Para Garcia (2003, p. 483), o acesso aos alimentos na sociedade atual, predominantemente urbana, é ainda determinado "pela estrutura socioeconômica, a qual envolve principalmente as políticas econômica, social, agrícola e agrária. Assim sendo, as práticas alimentares, estabelecidas pela condição de classe social, engendram determinantes culturais e psicossociais". Segundo a autora, o comportamento alimentar é complexo, incluindo determinantes externos e internos ao sujeito, e a comensalidade contemporânea se caracterizaria pela:
(...) escassez de tempo para o preparo e consumo de alimentos; pela
presença de produtos gerados com novas técnicas de conservação e de preparo, que agregam tempo e trabalho; pelo vasto leque de itens alimentares; pelos deslocamentos das refeições de casa para estabelecimentos que comercializam alimentos - restaurantes, lanchonetes, vendedores ambulantes, padarias, entre outros; pela crescente oferta de preparações e utensílios transportáveis; pela oferta de produtos provenientes de várias partes do mundo; pelo arsenal publicitário associado aos alimentos; pela flexibilização de horários para comer agregada à diversidade de alimentos; pela crescente individualização dos rituais alimentares (p 483).

De acordo com Nestle (2002), o que complexifica ainda mais tal contexto é que o alimento ganhou no capitalismo moderno um status de produto, independente de sua função biológica de manutenção da saúde do ser humano. E como qualquer produto lucrativo, ele mobiliza um poderoso mercado capaz de ignorar considerações de saúde pública e riscos alimentares, com o intuito de encorajar o consumo e estimular vendas.

A sociedade vem convivendo com parâmetros de riscos relacionados principalmente à escassez de alimentos e à segurança alimentar31 e hoje conhece novos riscos, com novas origens. Fischler (1990) ressalta que já "não é o medo das privações, nem a obsessão pelo abastecimento que ocupam a mente". Para o antropólogo francês, a abundância e a inquietação causada pelo "medo dos exageros e dos venenos da modernidade" e pela pluralidade de escolhas, estão entre as principais preocupações do comedor contemporâneo.

Beck (1992) afirma que, na sociedade de classes, a força motriz para delinear os riscos podia ser resumida na frase: "eu tenho fome" (p.49). Por outro lado, na sociedade atual, o sentimento coletivo diante dos riscos é expresso pela afirmação:
"eu tenho medo" (p.49).

Apesar de a tecnologia moderna ter ajudado a minimizar os riscos da fome e a contornar outros, como as contaminações biológicas e a adulterações alimentares, outras ansiedades mais sutis, vinculadas ao consumo de alimentos, antes mascaradas ou de relativa baixa visibilidade, se tornaram proeminentes e ganharam a atenção do público em geral.

De fato, algumas das características das sociedades modernas contribuem para a erosão das bases tradicionais de confiança nutricional e para o sentimento de ansiedade do consumidor. A intensificação, a industrialização e a globalização do suprimento alimentar libertaram os padrões de consumo de algumas restrições de localidade e sazonalidade, que geravam um sentido de familiaridade e de participação cíclica nos ritmos anuais da agricultura. Muitas técnicas de processamento são completamente desconhecidas para o consumidor, como por exemplo, a fabricação de margarinas a partir da hidrogenação químicas de óleos vegetais que, por sua vez são produzidos a partir de grãos. E alguns itens comumente consumidos são percebidos como desconhecidos, com conseqüente perda da confiança do consumidor em seu caráter saudável (BEADSWORTH; KEIL; 1997); como exemplo, podemos citar Fischler (1988), mencionado pelos mesmos autores, que enfatiza o uso de aditivos (corantes, flavorizantes, aromatizantes, emulsificantes) usados na indústria para imitar cor, sabor, aroma e textura natural do alimento. Além de cumprir suas variadas funções na indústria alimentar, os aditivos colocam o consumidor em uma posição de incapacidade de confiar nas mensagens sensoriais oferecidas pelos alimentos como um guia seguro para sua natureza original.

Hernández e Arnáiz (2005) ressaltam que a industrialização dos alimentos gera uma idéia, cada vez mais persistente, de que o consumidor pouco sabe sobre o que come. A cadeia alimentar é cada vez mais longa, se afasta cada vez mais do consumidor e as crises alimentares (dioxina nos frangos, vaca louca, etc) contribuem para trazer à tona aspectos desconhecidos do padrão moderno de produção de alimentos, como, por exemplo, o tipo de alimentação das vacas confinadas ou a utilização de hormônios para o crescimento de aves. Mesmo que se proclame que existe uma baixa possibilidade de alguma doença grave atingir os seres humanos por causa desses procedimentos, tais problemas assumem outro significado para a população em geral: um sentimento de ceticismo diante da ciência e do modelo de gestão pública surge diante da percepção de que existem falhas e aspectos desconhecidos na cadeia alimentar, aparentemente tão segura. A população é sensível a esse tipo de experiências as quais, por sua vez, constituem as representações sociais32.

Para Michael Pollan (2007), a falta de uma cultura alimentar local deixa o consumidor contemporâneo particularmente vulnerável "às adulações do cientista ou do marqueteiro especializado em comida", para quem o dilema do que comer torna-se uma oportunidade (p.13). O jornalista norte-americano define a comida industrializada de forma muito peculiar: ela seria "toda comida cuja proveniência é tão complexa e obscura que exige a ajuda de um especialista para determinar de onde ela veio" (p.
25).

Além das substâncias estranhas e processos agro-industriais desconhecidos que geram angústia em alguns consumidores e apatia em outros, novos termos e tipos de alimentos surgem e contribuem para gerar mais dúvida. São os produtos que Nestle (2002, p. 295) chama de "techno-foods" - os funcionais, nutracêuticos, designer food entre outros. Para a autora, coletivamente essas designações referem-se a comidas e bebidas construídas para conferir benefícios à saúde, além do seu valor nutricional intrínseco. O conceito da nutricionista engloba uma variedade de produtos:
alimentos enriquecidos com vitaminas, minerais, proteínas, fibras, aminoácidos, ervas medicinais, fitoquímicos, e incluem também alimentos com baixo teor de calorias, gorduras, açúcar, sal, cafeína e adicionados de adoçantes artificiais ou substitutos menos calóricos de gordura, como a gordura sintética olestra.

A racionalidade para techno-foods é reducionista; o valor do alimento é reduzido a seu simples ingrediente funcional. E se tal componente é o responsável pelos benefícios para a saúde, então sua ação será mais benéfica se ele for utilizado isolado, purificado e em grande quantidade. Tal lógica falha por desconsiderar a complexidade da composição alimentar e a interação entre os componentes dos alimentos. Também porque quase todos os alimentos parecem ter uma ação protetora especifica e outras possibilidades só agora exploradas pela ciência. E por fim, muitos desses componentes estão em alimentos não tão saudáveis na sua origem ou no seu uso33. Esses fatos sugerem que nenhum alimento pode agir de forma isolada e que somente uma dieta equilibrada que considere a origem dos alimentos pode trazer bons resultados na promoção de saúde. Porém, com o desenvolvimento desses produtos, a indústria de alimentos tira vantagem da regulamentação precária que dificulta a reivindicação dos consumidores que exigem saúde, a ser atingida de forma rápida, descomplicada e milagrosa (NESTLE, 2007).

Outro aspecto levantado por Beadsworth e Keil (1997) que contribui para a noção de risco ou insegurança do consumidor, é a ideologia do consumismo - da qual os alimentos não escapam. Tal ideologia é baseada na busca incessante por novas experiências de consumo, novos sabores e texturas de alimentos. Sabores típicos que um dia serviram para marcar a identidade de um determinado território e criar sentimentos de confiança e familiaridade são dissociados das suas regiões e culturas de origem, criando um tipo de "vácuo cultural", como descrevem os autores (p.158).

Esse quadro de ansiedade e insegurança alimentar acompanha o que Fischler (1988, p. 288) chama de "distúrbio da identidade moderna", conhecido também pela sociedade contemporânea. Outros riscos alimentares mais específicos dessa sociedade serão analisados a seguir.

1.2.1. Era da (too much) information

Sem levar em consideração o fato de que a ciência na modernidade reflexiva perdeu seu estatuto como conhecimento certo e que agora é preciso também considerar as suas imperfeições, a mesma estimulou uma situação que as jornalistas americanas Kantrowitz e Kalb (2006, p.46) chamam de "too much information".
Estudos e pesquisas sobre os efeitos benéficos e maléficos dos alimentos - especialmente no contexto de algumas doenças cardiovascularers e de alguns tipos de câncer - inundam a mídia e os periódicos científicos. Os jornalistas generalizam conclusões de estudos para tornar as reportagens mais atraentes e os próprios cientistas se tornaram parte da máquina da mídia.

Segundo Kantrowitz e Kalb (2006), antigamente, os cientistas faziam restrições ao contato com a mídia e não havia alarde sobre os resultados das pesquisas científicas fora do círculo acadêmico. Os resultados de uma investigação eram discutidos entre os cientistas que traduziam os dados em práticas clínicas para os especialistas. Os pacientes seguiam as prescrições sem grandes questionamentos.
Hoje, a pressão dos cientistas para falar com os repórteres é enorme. Hospitais e universidades enviam releases para a imprensa e publicam revistas sobre os avanços científicos com o objetivo de gerar curiosidade e também fundos para novas pesquisas. Grandes periódicos científicos como o American Medical Association e o New England Journal of Medicine montaram um departamento de comunicação voltado para apoiar conferências públicas, preparar press releases e gravar entrevistas em vídeos para a imprensa. Indústrias farmacêuticas contratam médicos como consultores e os apresentam como especialistas, marcando entrevistas com repórteres sobre o desenvolvimento de doenças específicas, com o objetivo de promover determinadas drogas. A imagem dos cientistas ainda é relacionada a pessoas discretas e silenciosas, mas a pesquisa científica é altamente competitiva por atenção, reconhecimento e financiamento.

Não é incomum encontrar currículos de cientistas da área da Nutrição atuando como especialistas em comunicação, na relação com a mídia ou como relações públicas e responsáveis pelo gerenciamento de programas de comunicação para empresas alimentícias.34 "Assegurar patentes e envolver-se com coberturas de mídia são partes da ciência moderna (...) uma ciência em que o reconhecimento institucional e o financiamento são cada vez mais importantes", afirmam Collins e Pinch (2003, p.
114).

Em entrevista à revista Newsweek, o médico Jeffery Drazen, editor do periódico inglês New England Journal of Medicine, reporta-se à ciência como uma competição na qual interesses variados estão literalmente em jogo: "a ciência é um esporte de contato. As pessoas pensam que é um esporte elegante, mas é na verdade um árduo jogo" (DRAZEN, 2006 apud KANTROWITZ; KALB; 2006 p.45).
Não haveria problemas com esta forma de divulgação se ficasse claro que o progresso científico nem sempre apresenta respostas conclusivas e rápidas. Buscamse soluções imediatas, mas a ciência pede tempo. Para Jerome Groopman (2006 apud KANTROWITZ; KALB, 2006), pesquisador e cancerologista, a maior parte da ciência não é uma inovação, mas é construída lentamente e os resultados não podem ser divulgados logo após o final de um estudo, sem que se discuta todo o contexto da problemática.

Parecem existir constantes dúvidas pairando sobre as pesquisas em alimentação e também certa relativização dos clássicos estudos que definiram o padrão alimentar moderno, confundindo leigos e especialistas. Além das controvérsias em torno do consumo de soja, que serão estudadas em detalhe mais adiante no presente trabalho, alguns exemplos de controvérsias na campo da alimentação podem ser verificados no quadro abaixo:

- QUADRO 1. 1 -
CONTROVÉRSIAS NA PESQUISA CIENTÍFICA EM ALIMENTAÇÃO

1. Ovos contêm colesterol e seu consumo foi restrito para prevenir riscos de doenças cardiovasculares. Evidências científicas recentes indicam, porém, uma fraca associação entre a restrição de ovos e a redução dos riscos de doenças cardiovasculares e derrame. Hoje, muitos especialistas indicam o consumo moderado de ovos.

2. O consumo de café já foi relacionado à etiologia da hipertensão. Um estudo recente do Johns Hopkins University School of Medicine aponta, no entanto, que o consumo de café é associado a pequenas alterações na pressão sanguínea, mas não tem um papel central no aparecimento da hipertensão.

3. Estudo americano demonstrou que uma dieta rica em vegetais, frutas e grãos - como preconizada pelos médicos e nutricionistas para o controle de doenças cardiovasculares - não reduziu significativamente o risco de tais doenças nas mais de 48.000 mulheres estudadas. Demonstra ainda que nem todas as gorduras são nocivas e que existem também as "gorduras boas".

4. As nozes, antes consideradas prejudiciais por seu alto conteúdo de gorduras, são atualmente relacionadas à prevenção de doenças cardíacas.

5. O consumo de chocolate, já associado à obesidade, pode fazer bem à saúde.
Pesquisadores apontam que substâncias chamadas flavonóides, encontradas no
cacau, podem diminuir o colesterol nocivo (LDL).

Fontes: Quadro elaborado por nós com base em (1) HU et al, 1999; DAWBER et al, 1982; (2) KLAG et al, 2002; (3) HOWARD et al, 2006; (4) HU et al, 1998; (5) WAN et al, 2001.

O reducionismo que, muitas vezes, permeia os estudos de Nutrição também pode inibir ou maximizar o perfil do resultado de uma pesquisa. Um exemplo dessa afirmação está no estudo americano de Howard e colaboradores (2006), acima citado, que pesquisou a incidência de doenças cardiovasculares e foi realizado em mais de 48.000 mulheres entre 50 e 79 anos, durante oito anos. A divulgação pela mídia dos resultados da pesquisa - que custou US$ 415 milhões aos cofres públicos norteamericanos - centrou-se na afirmação de que o consumo de gordura não estaria relacionado ao risco de câncer e de doenças cardiovasculares. Não foi divulgado, porém, que apenas uma pequena parte do grupo conseguiu reduzir o consumo de gordura e chegar aos índices recomendados e que o aumento do consumo de frutas e verduras não foi seguido pelas voluntárias (KANTROWITZ; KALB, 2006).

Além disso, já é um consenso científico que para manter a saúde cardiovascular é necessário considerar todos os aspectos que envolvem a qualidade de vida do paciente, como a prática de exercícios físicos regulares, o controle do fumo,
do álcool e dos níveis de estresse e da saúde psicossocial do indivíduo, além da dieta. Tal estudo maximiza a importância da isenção de gorduras animais na prevenção e no controle das doenças cardiovasculares, minimizando os outros fatores etiológicos das mesmas doenças relacionados à qualidade de vida.

Tomando outro exemplo - uma pesquisa que aponta o chocolate como um alimento saudável - surge a questão da qualidade do estudo e a origem dos financiamentos das pesquisas. O instituto norte-americano de pesquisa com cacau - American Cocoa Research - apoiou financeiramente tal estudo, feito com uma amostra de apenas 23 participantes. Se é certo que o cacau contém flavonóides, também se sabe que tais substâncias saudáveis são perdidas no processo de fabricação do chocolate, que transforma o cacau em um produto - saboroso, mas pouco saudável - rico em calorias, açúcar e gordura hidrogenada.

Pesquisas de má qualidade podem ser publicadas em periódicos com padrões menos rigorosos de análise, mas a mídia não faz essa distinção e parece divulgar qualquer estudo, como se todos tivessem o mesmo grau de certeza e equanimidade.

Para Fallon e Enig (2000), a melhor estratégia de marketing para um produto alimentar é ter um parecer científico sobre saúde, e isso as empresas alimentícias sabem muito bem. Muitas pesquisas são realizadas com financiamento de instituições públicas, mas as indústrias também apóiam financeiramente pesquisas sobre medicamentos e alimentos. Nem sempre tal apoio significa exigir estudos manipulados, mas quando uma corporação financia a ciência há mais chances de se enfatizar efeitos favoráveis aos interesses das empresas e provavelmente os resultados negativos nunca são publicados.

Na área da Nutrição, indústrias de alimentos e empresas produtoras de sementes provêem informação e fundos de pesquisa para instituições acadêmicas, institutos de pesquisa e associações de profissionais, além de apoiar congressos e periódicos. Como exemplo, aponta-se a empresa Nestlé apoiando congressos brasileiros de Nutrição e os periódicos da Associação Brasileira de Pediatria; e o Instituto Becel, da empresa Unilever, patrocinando inúmeras pesquisas na área de saúde cardiovascular e eventos de cardiologia em todo o mundo. As principais pesquisas que se preocupam em aclamar os benefícios da biotecnologia são patrocinadas por empresas detentoras dessa tecnologia, como a Monsanto e a DuPont.

Entramos assim em um campo de dimensões éticas e políticas que se
entrelaça com a ciência da Nutrição de uma forma que pode ser considerada, no
mínimo, intrigante e que merece ser mais bem contextualizada.

1.2.2. A orientação das pesquisas em alimentação

Novos conhecimentos científicos e desenvolvimentos tecnológicos levaram a grandes mudanças no sistema alimentar. Para Tansey e Worsley (1995), ciência e tecnologia, apesar de permearem todo o sistema, não foram sempre consideradas a mesma coisa. Historicamente, o desenvolvimento tecnológico não dependeu necessariamente de uma razão cientifica que explicasse a razão do funcionamento de um artefato ou de um processo em particular. Incursões de tentativas e erros produziram muitas novas tecnologias, antes que a ciência por trás deles fosse compreendida. Uma das diferenças cruciais entre ciência e tecnologia é que as invenções tecnológicas eram mantidas em segredo até serem patenteadas, enquanto o conhecimento científico era considerado um tipo de herança da humanidade, devendo ser acessível a todos. Gradativamente, tal conhecimento passou a apoiar o desenvolvimento da tecnologia moderna, caso particularmente visível, hoje, da biotecnologia.

Atores dos diferentes setores financiam uma vasta gama de pesquisas recorrendo a uma sofisticada tecnologia. O uso dos resultados é de vital interesse para a indústria e aqueles que podem introduzir inovações ganham os maiores benefícios.

Tecnologia, entretanto, não é somente uma questão de ferramentas, mas inclui organização, gerenciamento e outros conhecimentos envolvidos. Esses três aspectos afetam o desempenho dos atores no sistema alimentar (TANSEY; WORSLEY, 1995). Para os autores acima, a pergunta central no sistema alimentar é: que tipo de pesquisa é feita e a quem ela beneficia? Isso também se relaciona com outras questões como: quem financia a pesquisa, quem tem propriedade sobre os resultados, onde estão as prioridades? Os precursores das novas tecnologias têm algum tipo de responsabilidade sobre seus efeitos? As forças que moldam a agenda da pesquisa e tecnologia utilizada afetam o que é descoberto, focam a direção da pesquisa e provêm produtos que servem para objetivos específicos. Para Tansey e Worsley (1995), a maioria dos cientistas é contratada e segue as regras que regem os fundos de pesquisa ou os interesses dos atores que estão contratando. Parece muito difícil, nesse âmbito de pesquisa, que os cientistas persigam seus "próprios e puros objetivos científicos" (p.170). Se as áreas de pesquisa crescentes são aquelas que aumentam a rentabilidade de um produto, a pergunta que surge é: rentabilidade de quem e como ela é definida?

O que tais questões traduzem é uma desconfiança sobre se o apoio da indústria de alimentos influencia os resultados de pesquisas e as opiniões dos especialistas. Essa é uma dúvida que dificilmente encontrará sua resposta definitiva e
o quadro 1.2, a seguir, retirado do livro de Marion Nestle (2002), pode gerar mais inquietações nesse sentido. O quadro mostra citações literais traduzidas de investigações e a origem de seus autores, todos apoiados por empresas alimentares.
Esses resultados não sugerem que a pesquisa financiada pela indústria de alimentos é sempre parcial, mas aponta a grande probabilidade de surgirem conclusões favoráveis
aos interesses comerciais dos empresários.

- QUADRO 1.2-
CITAÇÕES DE ESTUDOS CIENTÍFICOS E A ORIGEM DE SEUS AUTORES

"Alta quantidade de fibras nos cereais de café da manhã podem ajudar a reduzir riscos de câncer associados com a baixa ingestão de fibras." (O autor é empregado da Kellogs do Reino
Unido).

"Comer dois ovos por dia durante 12 meses resulta em um mensurado efeito estatístico na diminuição do colesterol LDL..." (Estudo financiado em parte pelo Eggs Nutrition Center).

O consumo de margarina comparado com o de manteiga diminui os níveis de colesterol LDL na taxa de 11% em adultos e 9% em crianças pesquisados." (Entre os patrocinadores do estudo
estão o United Soy Board Association e o National Assocation of Margarine Manufactures)

"Estudos científicos indicam que a prevalência de intolerância à lactose é altamente superestimada" (Um dos autores é membro do National Dairy Council. Lactose é o principal açúcar do leite)

"Evidências substanciais indicam que o consumo diário maior que o das doses diárias recomendadas (DDR) de cálcio, ácido fólico, vitamina E, selênio e cromo reduzem o risco de certas doenças para algumas pessoas." (O autor da revisão é um cientista do Council for Responsible Nutrition, associação comercial da indústria de suplementos)

"Existem razões para preocupações que o baixo consumo de NaCl (sal) possa levar a riscos metabólicos de longo termo que ainda não foram completamente identificados... Nós não temos sólida evidencia de que o baixo consumo de Nacl pode prevenir ou controlar pressão alta." (O revisor foi financiado parcialmente pelo The Salt Institute, uma organização comercial
da indústria do sal)

"Um consumo moderado de vinho (2 a 5 copos por dia) foi associado com uma taxa de redução da mortalidade da ordem de 24 a 31%." (Esse estudo foi financiado parcialmente pelo The French Technical Institute of Wine).

Fonte: Nestle (2002), nossa tradução.

Nestle (2002) aponta, ainda, os diferentes tipos de lobby35 das indústrias de alimentos que incluem diversas formas de parceria. Podemos citar, entre elas, o apoio financeiro à pesquisa de profissionais da área da alimentação, especialmente daqueles ligados à academia, bem como apoio a periódicos, suplementos científicos e grupos de aconselhamento sobre nutrição e saúde, congressos e conferências36. Para a nutricionista norte-americana, nessa trama de relações fica difícil determinar onde a prática da ciência transforma-se em propaganda ou business.

Por outro lado, sabe-se que é muito oneroso produzir ciência sem financiamento. A edição de periódicos é cara; produzir estudos requer patrocínio; congressos e simpósios exigem verbas e parcerias para sua viabilização e as universidades não conseguem manter laboratórios e materiais de pesquisa e extensão.

Observe-se, porém, que a própria ciência tem aberto espaço para estudos que analisam essa problemática ou sinalizam problemas que surgem a partir dessas parcerias. Exemplos citados por Nestle (2002)37 destacam que 30% de membros de universidades aceitam financiamento de indústrias; 34% dos autores principais de 800 artigos científicos na área de biologia molecular e medicina estão envolvidos com patentes e consultorias de comitês ou estão envolvidos em companhias que podem se beneficiar com a pesquisa desenvolvida. A pesquisa britânica citada por Cannon (1987) encontrou que entre 246 membros de comitês nacionais em nutrição e políticas de alimentação, 158 são consultores ou recebem financiamentos de empresas alimentares. Outro estudo farmacêutico, realizado por Wazana (2000), aponta médicos que aceitam apoio para viagens, alimentação e presentes das indústrias farmacêuticas ou que comparecem às conferências por elas apoiadas, como aqueles que mais prescrevem os seus medicamentos.

A questão, mais uma vez, é se a origem do financiamento influencia o conteúdo das conferências e do currículo universitário, o resultado das pesquisas e a publicação dos artigos científicos. Para a grande maioria dos cientistas e especialistas essa pergunta é ofensiva e o respeito à ética é, em geral, evocado. O fato é que se o pesquisador não aceita apoio financeiro, não realiza pesquisa ou acaba solitário; por outro lado, se aceita apoio, suas visões pessoais serão necessariamente comprometidas pelo perfil do financiador? O pesquisador pode trair seu "mecenas" e "cuspir no prato que come", como provoca o ditado popular? Pode, ainda, trair suas convicções e seus valores éticos? Este é um dilema de difícil abordagem.

As indagações acima podem, porém, ser avaliadas para além do âmbito da ética, em uma área muito mais objetiva: é na área da saúde pública que podemos conhecer com maior precisão as repercussões, sobre a saúde humana, do estímulo a certas orientações nutricionais equivocadas, resultado freqüente dessa arena de negociações.

Outro problema da área de pesquisa em alimentação é a necessidade de conjugar os variados interesses, que precisam chegar a uma linguagem comum.
Muitos profissionais da área de Microbiologia, por exemplo, desconsideram as questões relativas ao impacto nutricional das tecnologias alimentares, enquanto a Engenharia de Alimentos, ao desenvolver tecnologias para agilizar a morte de animais, muitas vezes, deixa de lado as questões relativas à segurança sanitária e ao bemestar animal. Já os profissionais da Tecnologia de Alimentos priorizam o desenvolvimento de técnicas de preservação dos alimentos que, além de garantir a inocuidade dos alimentos, aumentam o tempo de prateleira e barateiam seus custos. Porém, tais práticas nem sempre favorecem a qualidade nutricional do produto e a saúde dos consumidores (TANSEY; WORSELY, 1995).

Esses exemplos e problemáticas podem ser ampliados na perspectiva do embate entre os interesses comerciais das indústrias de alimentos frente às questões de saúde pública. Considerando, por exemplo, a questão de alimentos não tão saudáveis como os doces, não seria pertinente uma maior oferta de ações e recomendações interdisciplinares e de pesquisas, no sentido de prevenir a incidência de obesidade frente à população, por exemplo? O açúcar é um tipo de alimento cujo rótulo deveria alertar o consumidor sobre o perigo do seu consumo em excesso, assim como, nos EUA, no rótulo dos alimentos funcionais, como a aveia, há indicações sobre seu uso na prevenção de doenças cardíacas. Mas qual empresário da indústria de açúcar aceitaria tais condições? Quem pode regularizar essa situação? E se tais restrições chegassem à carne ou à soja?

Outra questão diz respeito ao investimento massivo em pesquisas que desenvolvem alimentos para um nicho de mercado. Tansey e Worsley (1995) sinalizam que esse tipo de pesquisa precisa ser avaliado quanto a sua legitimidade frente aos sérios problemas ambientais que emergiram nos últimos anos. Eles questionam se os fundos para desenvolvimento desses produtos e tecnologias não seriam mais bem aplicados no desenvolvimento de produção de alimentos com menor impacto ambiental. Um exemplo disso, no Brasil, são as pesquisas voltadas para o desenvolvimento do arroz dourado, um produto geneticamente manipulado, no qual foi inserido o gene do betacaroteno, para aumentar o teor de vitamina A do cereal. O arroz dourado é um transgênico criado com a intenção de reduzir a deficiência de vitamina A em populações que tradicionalmente alimentam-se com o arroz. As perguntas que surgem é se os custos da pesquisa (financeiros e ambientais, inclusive, como o risco da polinização cruzada contaminando espécies de arroz nãotransgênicas) valem a pena; se as pessoas que sofrem de hipovitamionose A terão acesso a esse alimento38; e se a educação nutricional que incentive o consumo e a diversificação de espécies vegetais ricas em vitamina A não seria uma solução mais ajustadas as reais necessidades brasileiras.

Muitos pesquisadores do sistema alimentar lidam com ciências agrícolas. Eles são vinculados aos departamentos e ministérios de agricultura e universidades públicas para encontrar maneiras mais eficientes e rentáveis de produzir bens primários. No entanto, a maior predominância das pesquisas em alimentação deve-se a pesquisadores empregados por empresas de alimentação ou de insumos e tecnologia agrícola para desenvolver novas técnicas. A maioria dos estudos é financiada por fundos públicos, através de instituições públicas ligadas ao governo. À medida que a indústria de alimentos se fortaleceu, ela começou, porém, a financiar sua própria pesquisa e uma das conseqüências disso é a baixa qualidade de estudos na área de alimentação, comparada com outras áreas de pesquisa. As empresas mantêm os resultados até comprovar seus benefícios para a indústria e isso é particularmente preocupante no caso das biotecnologias, para as quais existem tentativas de se utilizar de patentes para controlar o uso de algumas descobertas (TANSEY; WORSLEY, 1995).

Esse é um dos aspectos dos riscos da biotecnologia frente ao sistema alimentar. Nessa área, outros autores apontam novos riscos. Para Kennedy (1993), a biotecnologia na alimentação introduziu uma nova era, pode abrir novos mercados, oferecer novos produtos, alterar padrões de negócios internacionais e o espectro da ciência, além de criar novos tipos de trabalhadores e extinguir muitos outros, de perfil
tradicional.

Goodman e Redcliff (1991) também destacam como um dos resultados da biotecnologia, a mudança no perfil de vários atores do sistema alimentar, desde os agricultores até os consumidores. E acrescentam que a direção e a força dessas inovações direcionadas pelo sistema alimentar vão depender do equilíbrio das forças que controlam as agendas de política e pesquisa. Henk Hobbelink (1993), citado por Tansey e Worsley (1995), representante da Genetic Resources Action Internation, ressalta que a orientação da pesquisa e a forma de controle da tecnologia são alguns dos perigos que a biotecnologia pode oferecer. Para ele, a pesquisa em biotecnologia deveria focar em estratégias de diminuição do uso de insumos e melhorar a diversidade genética.

A habilidade para monitorar, usar e controlar informações e resultados de pesquisa é chave para o sucesso de muitos atores no sistema agroalimentar atual. As informações de especialistas precisariam ser traduzidas para se transformar em conhecimento útil. De acordo com Tansey e Worsley (1995), consumidores e agricultores tendem a buscar informações públicas, enquanto outros atores mais influentes usam fontes de informação privadas. Algumas eles próprio produzem, outras eles compram na forma de resultados de pesquisa e tecnologia, pesquisas de marketing ou conselhos de especialistas.

A pesquisa em marketing na indústria alimentícia é muito desenvolvida e usa sofisticados modelos de teorias de comportamento humano derivados da Psicologia, Economia, Sociologia, entre outras disciplinas, bem como dinâmicas variadas, como grupo focais e outras técnicas qualitativas. O marketing e a propaganda de alimentos, como atores dessa arena de riscos alimentares, merecem ser analisados com profundidade em estudos posteriores.

Nesse momento, é providencial lembrar Habermas (1994) para quem a técnica, assim como a ciência, pode assumir características de dominação ideológica. Essas considerações remetem a Irwin (2001) que aponta a necessidade sociológica de se considerar os contextos sociais e institucionais nos quais a ciência moderna é produzida e a importância de se considerar os vínculos do cientista antes de se avaliar os resultados de uma pesquisa ou de um estudo.

Nesse sentido, a dimensão da Sociologia do Conhecimento Científico será explorada com maior profundidade no capitulo 2, que segue. Este capítulo vai abordar mais especificamente a construção social do conhecimento científico e explorar áreas comuns nas quais as comunidades de leigos e especialistas podem contribuir e agir conjuntamente para fazer o que sempre se pensou ser domínio exclusivo dos cientistas e técnicos.

CAPÍTULO 2
A CIÊNCIA E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DOS RISCOS

Neste capítulo associaremos a análise dos riscos alimentares com a análise construtiva dos riscos. Tal análise pode nos ajudar a pensar nos riscos alimentares e no papel da ciência da Nutrição.

A análise de riscos, central para esse trabalho, tem mobilizado autores de diferentes áreas da Sociologia. Hanningan (1995) considera que muitos desses riscos são ameaças genuínas e sua análise não deve se limitar apenas a percepções e formulações sociais. Ele explora essa temática na perspectiva da análise construtivista dos riscos ambientais, que vai embasar este nosso capitulo e apoiar a nossa tese como um todo.

Para Hanningan (1995), uma abordagem construtivista dos riscos ambientais reconhece que eles são resultados de um processo sócio-dinâmico de definição, negociação e legitimação em arenas públicas e privadas que envolvem grupos de ativistas, cientistas e especialistas, empresas e indústrias, atores governamentais, imprensa e mídia e o público em geral. O autor define arena social de risco como "uma metáfora para descrever o estabelecimento político em que os atores dirigem as suas exigências àqueles encarregados de tomar decisões, na esperança de influenciar o processo político" (p. 134).

Nessa arena social, Palmlund (1992) propõe a existência de seis papéis genéricos na avaliação social dos riscos ligados por um conjunto complexo de elos sociais e organizacionais: os portadores de riscos (vítimas que suportam os custos diretos dos riscos); os defensores dos portadores de riscos (que lutam pelo direito das
vítimas); os geradores de riscos (protagonistas primeiros dos riscos); os investigadores de risco (que agem em nome da ciência); os árbitros do risco (mediadores, tribunais, agências reguladoras, que agem de fora do palco determinando a extensão, a responsabilidade e a forma de penalidade) e, por fim, os informadores do risco (meios de comunicação, mídia em geral). Tais tarefas se mesclam quando, por exemplo, as descobertas dos investigadores de risco ou a posição dos árbitros do risco defendem a posição dos geradores de risco, passando a atuar como tais.

Para Hannigan (1995), duas tarefas centrais na discussão dos riscos são: entender porque certas condições são percebidas como problemáticas (ou de risco); e como tornar tais riscos legítimos e reconhecidos (em termos de atenção política aos mesmos). Ele ressalta também que uma construção satisfatória para delinear um determinado risco ambiental envolve seis fatores: a autoridade científica e a validação da reivindicação; a popularidade, que construa uma ponte entre os ambientalistas e os cientistas; o reconhecimento da mídia da importância do risco; a dramatização do problema em termos simbólicos e visuais e a emergência de uma instituição patrocinadora que possa conferir legitimidade e continuidade ao problema. Cada um desses fatores merece ser analisado com profundidade, mas neste capítulo vamos nos ater especialmente ao primeiro deles - a questão da autoridade científica e o papel da ciência frente à legitimação dos riscos - por considerar sua grande influência sobre as decisões e políticas coletivas de risco. Outro aspecto que justifica essa escolha é que tal fator se envolve com todos os demais e permite a construção de uma instigante teia de análise de riscos.

Assim, num primeiro item, abordaremos o comportamento da ciência e a prática da reflexividade frente aos riscos de caráter socioambiental. Analisaremos tais riscos uma vez que eles perpassam o sistema agroalimentar moderno de produção de alimentos e a ciência é a base de legitimação desse sistema.

O segundo item explora a relação entre reflexividade, ciência e preocupações sócioambientais na perspectiva da Sociologia do Conhecimento Científico (SCC), que oferece elementos importantes para enriquecer a argumentação desenvolvida nesta tese.

A seguir, consideraremos a abordagem da SCC frente aos riscos, a partir da contribuição de autores que discutem riscos ambientais diversos. Acreditamos que tais análises poderão contribuir para a compreensão e a análise da arena de riscos na qual a soja se insere.

O capitulo se encerra com o item que discute a rede de participantes na construção do conhecimento e o tema da democratização da ciência. Dessa forma, além de definir a noção de rede, analisaremos o lugar em que se situam os protagonistas da nossa pesquisa de campo - os médicos especialistas.

2.1. A ciência e a reflexividade frente aos riscos

A partir do século XVIII, a ciência tornou-se elemento de referência para delinear a mudança no modo de aquisição do conhecimento - que deveria buscar a verdade dos fatos - e para delimitar a transição da tradição para a modernidade. Hoje, ela é objeto de debates sociais, na medida em que as incertezas científicas se multiplicam e representam um elemento central na análise sociológica dos riscos sociais e ambientais (IRWIN, 2001).

Para Yearley, citado por Hanningan (1995), é raro encontrar um problema ambiental que não tenha um suporte científico que o coloque acima de outros problemas sociais. Mas, paradoxalmente, em casos de riscos e em situações nas quais a ciência não é capaz de oferecer provas inequívocas de segurança, a própria racionalidade científica é rejeitada em favor de uma alternativa de racionalidade cultural, que apela ao conhecimento do povo e das tradições. Nesses casos, a ciência é criticada por intervir na ordem natural.

Beck (1995) é crítico quando se reporta ao papel da ciência frente aos riscos e problemas ambientais. Para o sociólogo, a ciência serve como instituição protetora da contaminação e fica ao lado das instituições e contra a ansiedade dos consumidores.
A ciência e a tecnologia não solucionam os problemas, mas se tornam suas causas.
Para o sociólogo alemão, muitos dos problemas que a ciência está enfrentando foram criados por ela que, por sua vez, não pode oferecer soluções claras. A ciência surgiu como libertação dos fatores condicionantes da natureza, mas hoje ela é percebida como criadora de riscos, com limitações cada vez mais visíveis. Assim, a ciência já não representa somente o esclarecimento, mas também "uma força adversária", como menciona Irwin (2001, p. 62; tradução nossa)39.

De acordo com Irwin (2001), a abordagem de desencantamento do mundo em
Beck não oferece soluções ou sólidos fundamentos para construir um cenário positivo. Entretanto, essa perspectiva weberiana oferece à Sociologia a possibilidade de adotar uma posição crítica nos assuntos que envolvem o papel da ciência. Irwin parece mais positivo do que Beck sobre possíveis soluções e evidencia o papel da ciência diante dos riscos da contemporaneidade. Para Irwin (2001, p. 57), ainda dependemos da ciência, não como "monopólio da racionalidade", mas como ciência reflexiva e atenta a uma redefinição de si mesma, e devemos considerar a sua pluralidade.

Esse ponto de vista nos interessa particularmente uma vez que consideramos que a modernidade reflexiva amplia o número de questões sobre o papel e a origem da ciência na solução dos riscos e problemas ambientais. Não objetivamos questionar o papel da ciência, mas, de uma forma reflexiva, ressaltar sua natureza não homogênea e as influências que ela sofre durante a construção dos riscos. Irwin (2001) ressalta que quando não existe um senso comum para saber que riscos corremos, a avaliação desses riscos é uma combinação de racionalidade cientifica, deliberação institucional e esforços de uma nova organização política e ambiental.

A reflexividade é uma conseqüência do retorno da incerteza e dos riscos e serve de instrumento não somente para questionar o papel da ciência, como também os aspectos rotineiros da vida social, tal como o modo de se relacionar, o que vestir e o que comer. "Ela se refere à suscetibilidade da maioria dos aspectos da atividade social, e das relações materiais com a natureza, à revisão intensa à luz do novo conhecimento ou informação" (GIDDENS, 2002, p. 26).

Para Beck (1995, p. 12), a reflexividade significa a possibilidade de uma (auto) destruição criativa da era da sociedade industrial e a "desincorporação, seguida da reincorporação das formas sociais industriais por outra modernidade". Tal modernidade reflexiva é acompanhada de uma dissolução do dinamismo das instituições modernas, nas quais o progresso pode ser transformado em autodestruição.

Sabemos hoje que não é possível confiar nos próprios sentidos para fazer julgamentos sobre os riscos associados ao que se deve comer, a que tipo de transporte usar, a que proposta de medicina escolher. Porém, na modernidade reflexiva, os sistemas peritos também se tornam vulneráveis diante dos iminentes riscos contabilizados e o ser humano contemporâneo faz escolhas rotineiras que geram ansiedade e insegurança (BAUMAN, 2001).

A ciência, como instrumento de legitimação ou questionamento dos riscos, é hoje, portanto, um dos principais objetos da reflexividade, pois vem sendo questionada na forma como foi concebida no início da modernidade. A modernidade reflexiva parece estar transformando a ciência em um tipo de categoria ou instituição zumbi40, para utilizar o termo de Bauman (2001).

A prática da reflexividade confunde as premissas do pensamento iluminista que acreditava que a razão superaria os dogmas da tradição. Para além dessa afirmação, Giddens (2002) enfatiza que a ciência depende do princípio metodológico da dúvida e deve estar aberta a revisão a partir do desenvolvimento de novas idéias ou descobertas. Essa condição de incerteza coloca numa condição perturbadora não somente os leigos, mas também os peritos - os especialistas e os cientistas.

A reflexividade - aliada à noção de destradicionalização e às preocupações de ordem ecológica - integra o conjunto central das preocupações de Giddens, Beck e Lasch (1995) nos seus estudos sobre a modernidade reflexiva. Podemos utilizar essa tríade para a análise reflexiva do sistema agroalimentar moderno, desenvolvido centralmente a partir de premissas científicas.

Giddens (1995) observa que sob o duplo impacto das influências da globalização e da destradicionalização, diversos aspectos da vida cotidiana ficaram esvaziados de habilidades desenvolvidas localmente. Tais aspectos foram invadidos por sistemas peritos de conhecimento, pois os sistemas abstratos incluem não só a tecnologia, mas também qualquer forma de conhecimento especializado que substitua as artes ou as capacidades locais. Acreditamos que a produção de alimentos dentro do sistema agroalimentar moderno ilustra essa noção de destradicionalização, pois ela ocorre a partir da substituição da diversificação dos modelos alimentares centrados no alimento - definidos pela tradição e cultura locais - pelo enfoque científico de valorização do nutriente e pela padronização das dietas quantitativas.

A modernidade reflexiva em Giddens (2002) é também analisada enquanto descontinuidade entre as ordens sociais tradicionais e as instituições sociais modernas. Entre as características dessa descontinuidade estão o ritmo e a abrangência global das mudanças e a natureza das instituições modernas. Além disso,
a modernidade reflexiva é caracterizada por um ceticismo em relação à razão, criandose novos parâmetros de riscos - desconhecidos e de sentido global. Certamente aí podem ser incluídos os riscos alimentares, entre eles, a utilização do hormônio BST para aumentar a produção de leite; os riscos de contaminação química nos alimentos; as crises alimentares (gripe aviária, vaca louca) e a ingestão de transgênicos, uma vez que no sistema agrícola mundial, agora globalizado, não existem provas conclusivas da inocuidade dessas substâncias e tecnologias sobre a saúde humana.

Os impactos sociais e ambientais vinculados ao sistema moderno de produção de alimentos são bem conhecidos. Ao se apoiar na alta produtividade e na monocultura, esse sistema subordina agricultores a empresas detentoras de tecnologia agrícola; prioriza o uso de insumos sintéticos em larga escala; a venda para exportação; e, mais recentemente, estimula a utilização de sementes transgênicas.

Nesse contexto, o conceito de riscos alimentares assume uma nova dimensão,
passando a integrar repercussões ambientais (perda de biodiversidade, contaminação
química da água e solos, derrubada de florestas nativas) e sociais (dependência dos agricultores das indústrias produtoras de insumos e exclusão social), freqüentemente ignoradas na definição de alimentos saudáveis41. Entretanto, tais repercussões interferem diretamente sobre o estado de saúde e segurança dos consumidores, inclusive daqueles que optam por não consumir alimentos produzidos dentro dessas condições.

Como se pode perceber nessa breve avaliação, os riscos de caráter socioambiental aliados às suas repercussões no sistema agroalimentar moderno permitiram o questionamento das bases científicas que apoiaram tal padrão produtivo. Nesse contexto, a ciência é revista à luz dos problemas por ela causados e torna-se permeada por controvérsias.

Michel Callon (1986) ressalta que o estudo das controvérsias, desenvolvido por diversos autores como Collins e Pinch, Shapin e Mackenzie, contribuiu para o descrédito da visão de que a ciência e a tecnologia são livres de qualquer influência que não a intelectual. E adiciona que elas são na verdade " impuras e heterogêneas" e "se as hesitações, mudanças e evoluções que marcam seu desenvolvimento devem ser compreendidas, então os interesses, estratégias e relações de poder que não param na porta do laboratório devem ser trazidas para o escopo da análise" (p. 19).

O próximo item pretende explorar a relação reflexividade, ciência e preocupações socioambientais na perspectiva da Sociologia do Conhecimento Científico, que tem como objeto de estudo a ciência como processo social e
institucional.

2.2. A Sociologia do Conhecimento Científico

O desenvolvimento da Sociologia da Ciência, a partir do final da década de trinta do século passado, foi motivada pelo estudo da influência de fatores externos ao desenvolvimento da ciência. O sociólogo norte-americano Robert Merton, um de seus principais representantes, concebeu a ciência como uma atividade socialmente organizada e se interessou centralmente pela relação que se estabelecia entre a sociedade e a ciência, ao considerar essa última como uma instituição social. Para Mattedi (2004), Merton se preocupava com a influência das normas institucionais sobre a interação dos cientistas e tinha uma visão essencialista da ciência.

De acordo com Rodrigues Junior (2002), apesar da Escola Mertoniana ter permanecido afastada dos debates epistemológicos e das questões internalistas da ciência e de ter defendido uma explicação normativa da mesma baseada em valores morais, ela teve o mérito de detalhar a estrutura social da ciência e dar ênfase a normas e a valores vinculados à estrutura social do fazer científico.

Depois do impacto inicial do livro de Thomas Kuhn, A Estrutura das Revoluções cientificas, publicado em 1962, alguns teóricos da Escola de Edimburgo começam a promover debates sobre a Sociologia da Ciência, para além da sua dimensão Mertoniana, funcional-estruturalista (RODRIGUES JUNIOR, 2002). Influenciado pelo trabalho de Ludwick Fleck, Kuhn demonstrou a relação existente entre a estrutura social científica e a estrutura cognitiva. Para Lamo de Espinosa e colaboradores (1994), essa obra reorientou os objetivos da Sociologia da Ciência preocupada com a ciência como instituição social42.

Além de reorientar esses objetivos, a obra de Kuhn tornou-se também um estímulo para o desenvolvimento de outras abordagens a respeito da mesma questão, como é o caso da Sociologia do Conhecimento Científico, que focalizamos aqui a partir das idéias de alguns de seus principais representantes: David Bloor (Science Studies Unit, University of Edinburgh); Bruno Latour (Institut D'études Politiques de Paris, Centre de Sociologie des Organisations); Harry Collins (School of Social Sciences, Cardiff University); e Alan Irwin (Brunel University).43

Inicialmente, a Sociologia do Conhecimento Científico (SCC) se propôs a estudar os aspectos estruturais que compreendem as influências entre fatores sociais
e cognitivos no âmbito das organizações científicas e, também as questões ligadas à gênese e validação do conhecimento científico (RODRIGUES JUNIOR, 2002). Aos poucos, a SCC inseriu-se em uma linha de estudos da ciência referendada como construtivismo social. Com a ciência reconceitualizada como atividade social, sua construção significa que quando a especialização é discutida, o foco é freqüentemente na atribuição do termo especialista e na maneira como o lócus da legitimidade é construído para se locomover entre variadas instituições: escolas, cortes judiciais, processos políticos, que envolvam questões públicas (COLLINS; EVANS, 2002).

Na década de setenta, uma das correntes construtivistas da SCC se desenvolveu dentro do chamado Programa Forte, da Science Studies Unit, na Universidade de Edimburgo, com David Bloor e Barry Barnes à frente dessa iniciativa. Bloor (1976), pretendendo desenvolver os princípios básicos44 do estudo sociológico do conhecimento, redefine o papel dos fatores sociais e do contexto social para explicar a produção dos fatos científicos. Para Barry Barnes, parceiro de Bloor na Escola de Edimburgo, uma das preocupações desse estudo era a de enfatizar a relação entre o conhecimento científico e a ordem social, dessacralizando a imagem da ciência. A partir daí, o conhecimento científico torna-se passível de ser expandido para os contextos sociais, onde se encontram os cientistas (MATTEDI, 2003).

Ainda nesta década, se fortalece outra corrente da SCC, também de caráter construtivista, cujos trabalhos mais destacados são os de Bruno Latour, Steve Woolgar e Karin Knorr-Cetina.

Essa última autora aponta a diferença entre as duas correntes construtivistas da SCC: ela repousaria na prática científica escolhida para análise. A primeira corrente enfoca as controvérsias científicas para o estudo da formação do consenso, uma vez que ele é o mecanismo pelo qual o conhecimento reivindicado torna-se aceito. Já a segunda corrente escolhe como objeto de estudo o sítio de observação direta onde o conhecimento científico é construído; assim, seus colaboradores estudam freqüentemente o laboratório científico (KNORR-CETINA, 1983 apud RODRIGUES
JUNIOR, 2002).

De fato, Latour e Steve Woolgar empreenderam um estudo etnográfico de um laboratório de pesquisa, que os levou a refletir sobre a dicotomia existente entre o social e o técnico na construção do conhecimento científico, estudo que foi originalmente publicado no livro Laboratory Life: Construction of Scientific Facts. Para Latour e Woolgar (1986), a principal atividade que acontece nos laboratórios á a de produzir fatos e, depois, traduzi-los sob forma de artigos científicos. Para esses dois autores, a ciência não se distingue de outras práticas sociais em função de uma superioridade cognitiva derivada da racionalidade intrínseca a esta atividade. O cientista, como qualquer outro ator social, é alguém que se utiliza de estratégias persuasivas que visam garantir a aceitação dos enunciados por ele produzidos. Nessa perspectiva, os autores sinalizam que o conhecimento científico é um sistema de convenções socialmente estabelecido e reproduzido. Tanto o enunciado científico verdadeiro quanto o falso assumem tais atributos, não por suas qualidades internas distinguidas pelo bom ou mau uso do método científico, mas em função de um processo social de convencimento que possibilitou que eles fossem reconhecidos enquanto tais. A tese de Latour e Woolgar é a de que o fato científico, estável e estabelecido como natural, é o resultado de um processo social de construção, que tem a peculiaridade de só se completar enquanto tal na medida em que é capaz de apagar qualquer traço de si próprio. Ou seja, a produção do fato científico depende necessariamente de estratégias e procedimentos extremamente eficazes no sentido de eliminar os vestígios da trajetória na qual ele foi produzido (KROPF; FERREIRA, 1998; RODRIGUEZ JUNIOR, 2003).

Harry Collins desenvolveu a abordagem do Programa Forte da Sociologia do Conhecimento Científico vinculado à Escola de Bath. Para Kusch (1998), um dos principais desacordos entre as duas Escolas parece ser a questão do idealismo metodológico. Enquanto a Escola de Edimburgo enfatiza abordagens históricas, a Escola de Bath focaliza os estudos microssociais de laboratórios e experimentos. Alan Irwin é um sociólogo inglês que pesquisa as áreas de ciência e tecnologia e de governança cientifica, e que também pode ser identificado com a SCC. Seus livros A Ciência Cidadã (1995), Sociology and the Environment (2001) e Science, Social Theory and Public Knowledge (2003) em parceria com Mike Michael, serão extensamente utilizadas na seqüência desse trabalho, uma vez que eles se dedicam aos temas dos riscos ambientais e das relações entre a ciência e o público.

A importância da Sociologia do Conhecimento Científico (SCC) reside no fato de que ela enfatiza a importância das práticas sociais e cognitivas na construção do conhecimento e adota uma postura crítica na apresentação da ciência frente aos problemas ambientais e a tecnologia, desafiando a rígida dualidade estabelecida entre
natureza e sociedade. O conhecimento, enquanto categoria móvel, é percebido com um processo de construir sentidos e não é separado do entendimento cultural e das experiências do cotidiano (LATOUR, 2000; IRWIN, 2001).

Ao não privilegiar as abordagens científicas como estando acima de outras produzidas por outros grupos envolvidos com uma problemática dada, a SCC oferece "uma informação simétrica e cética de reivindicações do conhecimento e do processo social de sua construção", além de focar sua atenção analítica nos aspectos particulares da "ciência em ação" (IRWIN, 2001, p.75). O contexto no qual o conhecimento científico é produzido não é irrelevante, mas é visto como um processo cognitivo, social e institucional, central para a constituição desse referido conhecimento.

Em geral, diante dos riscos e conflitos ligados à tecnologia e ao meio ambiente, a tendência é produzir mais ciência e estudos que possam tranqüilizar os especialistas e leigos. É mesmo comum, em pesquisas sobre temas polêmicos ou inconclusivos, utilizar-se a expressão final "mais estudos devem ser realizados sobre esse tema". No entanto, alguns autores sinalizam que, muitas vezes, não precisamos de mais ciência, mas de uma ciência melhor. Beck (1995) questiona a qualidade e a direção da ciência produzida para avaliar riscos ambientais e Irwin (2001), por sua vez, sinaliza que a ciência precisa mudar; admitir incertezas diante dos desafios sociais e ambientais, alguns deles criados por ela própria. E, acima de tudo, o sociólogo inglês convida a perceber a ciência como um processo que inclui relações entre cientistas, suas origens institucionais e a maneira como eles abordam temas científicos e os tornam relevantes (ou irrelevantes).

Como os cientistas constroem seus informes? Como os informes oferecidos por um cientista em particular se relacionam com as circunstâncias sociais do seu desenvolvimento? Como os cientistas conseguem persuadir outros cientistas (e também os leigos) sobre a validade de suas análises? Inspirado em Latour e Woolgar (1979) essas são questões levantadas por Irwin (2001) para explorar a vida de laboratório e toda sua heterogeneidade e complexidade social.

O processo social de construção da pesquisa científica considera a relação entre cientistas, a origem dos financiamentos e o perfil das instituições que promovem a pesquisa, e a maneira através da qual os cientistas elegem determinados riscos como tópicos essenciais de análises. A SCC não está preocupada com o determinismo ou a veracidade das pesquisas científicas, mas em analisar como as verdades atingem tal status e em interpretar de uma forma fluida e dinâmica os processos ativos através dos quais os cientistas dão sentido aos riscos (IRWIN, 2001).

O autor ainda sugere que a SCC enfatiza que os fatos dos riscos ambientais não falam por si próprios. Para eles, os riscos (...) estão sendo ativamente criados e interpretados. A partir daí, a natureza não pode ser representada como categoria externa.
Afirmações sobre o mundo natural representam construções sociais e institucionais (IRWIN, 2001, p. 74).

Dentro da SCC há, portanto, muito que explorar nos estudos de riscos ambientais e na discussão do papel da ciência frente a tais riscos. Vamos nos ater a essas questões no próximo item.

2.3. A perspectiva da SCC frente aos riscos ambientais

Os aspectos relacionados neste item estão baseados nas discussões sobre riscos ambientais45 na perspectiva da SCC, apresentadas por Irwin (2001) e por Wynne (1992), Guivant (2000; 2001; 2006), Hinchliffe (2001), além de outros autores que contribuem de forma indireta. Acreditamos que tais elementos podem ser utilizados para delinear grande parte dos riscos ambientais que ameaçam a sociedade contemporânea. Latour (1995) também contribuiu para a discussão na medida em que ressalta a importância dos híbridos, e nesse sentido, os estudos transdisciplinares revelam-se essenciais para abarcar a amplitude das repercussões relacionadas aos riscos ambientais.

O primeiro, e talvez o mais essencial, aspecto a considerar é que os riscos ambientais não são impostos às sociedades, nem podem ser percebidos como uma força externa que tem impacto sobre a estrutura social, mas são construídos socialmente dentro de uma complexa e heterogênea arena social.

Destacamos, ainda, a questão que diz respeito à variedade de especialistas envolvidos na discussão dos riscos ambientais. Cada um desses especialistas possui sua própria estrutura intelectual e institucional operando sob princípios e focos de
atenção diversos, o que, muitas vezes, dificulta a construção de consensos. No caso da energia nuclear, por exemplo, a análise epidemiológica de um especialista da saúde humana envolvido na discussão é muito diferente da perspectiva dos engenheiros ou dos ambientalistas, apesar de todas as avaliações poderem ser qualificadas como científicas.

Outro aspecto, que se mescla com o primeiro, é a localidade institucional do debate dos riscos. A SCC sugere a necessidade de pontuar a variedade social de grupos envolvidos nas argumentações técnicas sobre um determinado tipo de risco.

Por exemplo, no caso de risco de alimentos contaminados por agrotóxicos, dos departamentos governamentais até à indústria de insumos agrícolas ou de alimentos; das ONGs ambientalistas às associações de agricultores ou consumidores; de grupos internacionais de importação de alimentos até à comunidade local vivendo perto dos campos produtivos, cada um desses grupos vai produzir uma avaliação social e técnica da segurança (ou insegurança) dos alimentos contaminados. Na perspectiva da SCC, é essencial explorar os diferentes usos da ciência feitos por diferentes grupos envolvidos e também analisar as formas que cada grupo envolvido na discussão elege para gerar conhecimento sobre o tema em questão.

Ainda no contexto de localidade dos riscos, Jasanoff (1986) aponta uma perspectiva transnacional que também afeta a formulação dos riscos ambientais. Tal perspectiva inclui a organização das estruturas políticas e administrativas, as tradições históricas e crenças culturais de diferentes países que influenciam os objetivos e as prioridades na gestão do risco. Harrison e Holberg, citados por Hanningan (1995),
utilizaram as idéias de Jasanoff na Grã-Bretanha e no Canadá e demonstraram que, nesses países, os riscos são examinados através de uma mistura de processos científicos e administrativos, nos quais as incertezas não são admitidas publicamente.

Já nos EUA, a determinação de risco envolve uma dinâmica pública e democrática em um contexto heterogêneo, no qual os leigos, os cientistas e o setor administrativo acabam criando maiores conflitos e impasses políticos. Um exemplo dessa perspectiva apresentada por Hanningan (1995) é a interessante análise transnacional de percepção dos diferentes riscos (chuva ácida, perda de biodiversidade e aquecimento global) por diferentes países. Outro exemplo de divisões políticas transnacionais frente aos riscos pode ser encontrado na análise de riscos dos alimentos transgênicos, cuja abordagem no Canadá, nos EUA e na Argentina é fundamentalmente apoiada pelo princípio da equivalência; já a posição adotada pela Comunidade Européia se apóia no principio da precaução.

O principio da equivalência apóia a utilização de uma nova tecnologia, independente do conhecimento pleno de suas repercussões, até que sejam comprovados sua inocuidade ou seus possíveis riscos. A decisão de usar ou não uma tecnologia é deslocada para o início do processo de avaliação de riscos. Seguindo o exemplo acima, os três países mencionados se colocam a favor da liberação dos transgênicos, uma vez que ainda não se comprovaram seus riscos nos diferentes âmbitos (social, ambiental, sobre a saúde humana).

O princípio da precaução46, estruturalmente oposto ao anterior, foi desenvolvido na Alemanha como meio de justificar a intervenção regulamentadora para a restrição das descargas de poluição marinha na ausência de provas consensuais quanto aos danos ambientais (WYNNE, 1989). Este princípio tem sido tomado como referência em muitas discussões que envolvem riscos. Segundo o principio da precaução, as decisões sobre usar ou não uma determinada tecnologia são tomadas somente após a determinação de provas e estudos científicos que avaliem seu desempenho, em termos de eficácia, inocuidade e segurança para os diferentes atores (meio ambiente, ser humano; sociedade em geral). Assim sendo, a Comunidade Européia, apoiando-se nesse principio, veta a liberação dos alimentos transgênicos por desconhecer plenamente os riscos envolvidos na sua produção e para o consumo humano.

Essa discussão se relaciona à expressão que Irwin (2001, p.78) usa, "burden of proof", literalmente, o ônus da prova. De forma sucinta, a questão é: diante da falta ou evidência cientifica de provas, podemos concluir que o risco é inexistente? Incerteza e indeterminação47 parecem se mesclar nos processos de observação cientifica. Como mencionado, na questão dos alimentos transgênicos essa discussão pode ser ilustrada. Diante dos seus riscos para a saúde humana se deve permitir a utilização (ou restrição) de tais alimentos até que surjam provas concretas do risco (ou da ausência dele)?

Frente à utilização de novas tecnologias aparece recorrentemente a discussão sobre os princípios da precaução e equivalência, acima descritos. Para Augusto e Freitas (1998), o reconhecimento e a adoção do princípio da precaução têm como conseqüência mudar a responsabilidade das provas científicas para o gerador de riscos - passando-se a exigir que este desenvolva estudos completos antes do emprego de uma nova tecnologia. Mas o princípio também tem implicações na própria estrutura do conhecimento científico adotado nas avaliações de risco, convertendo-se em um dos pontos de referência para mudanças paradigmáticas na ciência e nos processos decisórios que envolvem riscos.

Segundo Guivant (1998), a partir do reconhecimento da indeterminação, o que Wynne propõe é que tanto a ignorância como a indeterminação sejam tratadas como potenciais fontes de risco. Desta maneira, em lugar de assumir a linguagem das políticas reguladoras e preventivas sobre os riscos, que pressupõe processos sociais facilmente controláveis e quantificáveis, a perspectiva da precaução sugere o envolvimento dos peritos num processo de aprendizagem social. Através desse processo, de caráter interativo e reflexivo, Wynne espera que os peritos reconheçam a condicionalidade do conhecimento e entendam as bases socioinstitucionais de toda definição dos riscos, incluindo conflitos, ambigüidades ou indeterminações dos conhecimentos.

Maria Fonte, citada por Pessanha e Wilkinson (2005), ao analisar os riscos relacionados aos alimentos transgênicos, sugere também que eles são resultados de vários tipos de divisões: divisões políticas transatlânticas, já abordadas acima; uma divisão cientifica entre visões reducionistas e sistêmicas da ciência; e também uma divisão institucional entre idéias de privatização e democratização da ciência; ou seja, entre aqueles que acreditam no progresso científico causado pela privatização do conhecimento e aqueles que defendem o domínio público da ciência e um sistema de acesso livre e compartilhado de produção de idéias, como base de uma sociedade de conhecimento mais democrática. Guivant (2005) demonstra como essas divisões se apresentam, ao analisar o processo decisório de liberação de transgênicos no Brasil.

Esses elementos de análise podem ser estendidos para diversos tipos de riscos ambientais.

Uma questão que se inter-relaciona com essa é o contexto social e institucional dentro do qual a ciência moderna é produzida, pois levanta discussões sobre a relação entre os fundos de financiamento e o local da pesquisa com o tipo de
pesquisa conduzida. A área dos agrotóxicos pode clarear rapidamente esse contexto, uma vez que a grande maioria da pesquisa cientifica sobre os agroquímicos (e também transgênicos) é produzida pela indústria. Nem sempre seu apoio a essas áreas significa estudos manipulados, mas como já mencionamos no capitulo anterior, quando uma corporação apóia a ciência há mais chances de se enfatizar efeitos favoráveis aos interesses das empresas e negligenciar resultados negativos.

Analisando esse caráter da produção científica, ressaltamos a contribuição de Nestle (2003), anteriormente mencionada, que, ao explorar os riscos alimentares e o conceito de alimentos saudáveis sugere que essa questão envolve uma decisão política e aponta o papel da indústria alimentar nesse processo decisório.

Kropf e Ferreira (1998), ao analisar o livro de Latour e Woolgar, ressaltam que os cientistas no laboratório podem se comportar como capitalistas. Isso porque eles podem agir com o objetivo de maximizar a lucratividade de seus investimentos e aumentar a capacidade de reprodução ampliada de seu capital acumulado. Assim sendo, eles acabam por alimentar um ciclo de busca contínua por credibilidade que permita o reinvestimento.

Cabe aqui citar Irwin et al (1997) e Salter (1988) que identificaram as chamadas regulatory e mandated science. Irwin e colaboradores (1997) definem regulatory science como formas de ciência desenvolvidas dentro da indústria a partir de suas necessidades e preocupações. Apesar de fazer uma distinção inicial entre a prática de pesquisa industrial e acadêmica, Irwin (2001) ressalta que hoje a prática acadêmica de pesquisa também mudou e em muitas universidades os fundos de pesquisa são mantidos por indústrias.

Quanto à mandated science, Guivant (1998) destaca como referência o estudo da socióloga canadense Liora Salter (1988) no contexto da Sociologia da Ciência Construtivista. Para Salter (1988 apud Guivant, 1998, p.35), a mandated science ressalta "o papel dos cientistas e da ciência na formulação de políticas reguladoras dos riscos, a partir de encomendas e pressões diversas realizadas por agentes governamentais e reguladores para ajudar na tomada de decisões". Ela apresenta certa autonomia dentro do campo científico, com suas próprias regras e características e a participação central dos peritos. Salter identifica ainda diversas escolhas valorativas nas atividades da mandated science, tais como: que estudos recomendar; como interpretar os resultados incertos, ambíguos ou não diretamente operacionalizáveis; quem é responsável pela (in) segurança de determinados produtos.

Mais uma característica da SCC frente aos riscos diz respeito às controvérsias, ou seja, à falta de consenso da ciência a respeito deles. Pode-se dizer que existem divergências e desacordos científicos frente às escalas de quase todas as avaliações de riscos, uma vez que os cientistas representam uma variedade de grupos de pressão e instituições interessados no tema.

Outro tema complexo é a dificuldade de separar o social do científico nas avaliações técnicas. Tal separação é um desafio que a SCC decidiu enfrentar. Para Irwin (2001), cálculos sofisticados de riscos dependem de julgamentos sociais e institucionais, tanto como de probabilidades de que os procedimentos de segurança serão seguidos ou de que os componentes foram corretamente fabricados. No caso da doença da vaca louca, por exemplo, as avaliações efetivas de riscos dependem de julgamentos sociais e institucionais sobre a prática de manejo animal e as condições de abate.

Discutindo alguns exemplos de riscos ambientais, Wynne (1989) define certos julgamentos sociais como uma forma de sociologia ingênua. Guivant (1988) remete a esse conceito de Wynne para se referir a uma sociologia assumida pelos peritos que realizam estudos sobre os riscos e concebem o mundo real de forma equivalente ao mundo dos laboratórios, impregnando de juízos equivocados as análises técnicas dos riscos. Guivant aponta as conseqüências desse processo:
(...) ao tentar impor uma definição de um determinado risco e uma estratégia para seu controle, (os peritos) podem gerar ansiedade social entre os leigos, face ao possível temor de descontrole institucional no seu manejo. Por sua vez, esta atitude de desconfiança é geralmente interpretada pelos peritos como ignorância, irracionalidade, ou expectativas ingênuas de margem zero de riscos. Com esta reação, pode-se iniciar um ciclo negativo de polarização, exacerbando, entre alguns setores leigos, a sensação de ameaça por parte de instituições que não respeitam suas identidades e racionalidade no problema em questão (p.12; parênteses nosso).

Reportando-se ainda ao caso da doença da vaca louca, Irwin (2001) também observa a dificuldade de fixar uma distinção entre o social e o natural, desafio da SCC frente aos riscos. Lembrando que a vaca moderna é o produto de várias gerações de modificações genéticas e controle humano de crescimento e produtividade, afirma que é muito difícil perceber onde o elemento social de produção animal industrial termina e onde a natureza intrínseca do animal começa. Nesse caso, ambos são parte de uma "rede humano-animal de interações" (IRWIN, 2001, p. 80).

Um fenômeno natural passou a ser, portanto, uma categoria ambígua na modernidade reflexiva.

Também para Haningen (1995), Castree e Braun (1998) as questões ecológicas não podem ser simplesmente reduzidas a uma preocupação com o ambiente externo - a natureza. Isso porque a natureza não está mais alheia à vida social humana. O que é natural está mais do que nunca confundido com o social e o cultural e a natureza tornou-se um espaço de decisões práticas e éticas. Em vez de apresentar uma diferença entre o natural e o social, essa perspectiva enfatiza a extensão nas quais essas categorias se mesclam.

Na mesma linha de argumentação, Irwin (2001) destaca que Beck aponta uma relação social-natural ambígua e complexa, na qual nem o social, nem o natural podem ser vistos como independentes ou auto-suficientes. O sociólogo destaca, ainda, que diante da impossibilidade de manter uma fronteira fixa entre o social e o natural, a identidade da disciplina Sociologia é diretamente afetada.

Para Irwin (1995), o que é natural está mais do que nunca confundido com o social e a natureza tornou-se um espaço de decisões práticas e éticas delineadas pela reflexividade humana. Porém, essa afirmação não dá garantia de controle humano sobre a natureza, que parece sempre reagir inesperadamente, sem que possamos conhecer a amplitude e as repercussões dos riscos ambientais.

Podemos pensar também na problemática da falta de informação ou, de forma mais elaborada, na dimensão cultural dos riscos. Douglas e Wildavsky (1982) enfatizam que a razão pela qual as pessoas realçam alguns riscos em detrimento de outros está enraizada no fator cultural. Para os autores, o risco é um fenômeno cultural relativo percebido de forma diferenciada dependendo dos interesses, ideologias e políticas que estão em jogo para determinar sua natureza e sua abrangência48.

Por sua vez, Irwin (1995, p. 77) aponta o caráter eminentemente social dos riscos: "os juízos acerca de risco e segurança vão refletir a posição pessoal na estrutura social - e também o grau pessoal de confiança nas instituições sociais que realmente decidem sobre estas questões". Se a ciência já teve mais legitimidade junto às instituições sociais, atualmente seu papel é questionado. Esse aspecto se mescla
com a questão da credibilidade e confiança do público. Problemas de legitimidade institucional não significam que as mensagens oficiais são totalmente desacreditadas ou rejeitadas, mas abrem uma discussão que envolve um público crítico e reflexivo e também a possibilidade de que afirmações governamentais sejam recebidas com ceticismo. No caso das sementes transgênicas, os interesses próximos entre as empresas produtoras de sementes e o governo estimularam reações de desconfiança em produtores e consumidores. Grande parte dos riscos ambientais é inevitavelmente conectada com assuntos que dizem respeito à credibilidade pública frente a instituições governamentais.

Guivant (1988) remete a Wynne, que resgata a centralidade do conceito de confiança na vida social e na viabilidade institucional quando explica os conflitos sobre os riscos ambientais contemporâneos:
Esses conflitos - sejam de caráter ambiental ou tecnológico, sejam entre peritos ou entre estes e os leigos - ao serem estudados a partir de tais contribuições, não são explicados pela falta transitória de critérios técnicos definitivos impossíveis de se atingir, mas pelas suas dimensões institucionais (p. 13).

Nesse contexto de dificuldade em distinguir o social do natural e o social do científico cabe referendar Latour (1992, p. 2) e seu "processo de hibridização" ou o que ele chama de colapso de categorias. Esse autor defende que Economia, Ciência, Cultura, Natureza são híbridos que ultrapassam as barreiras convencionais ou negam a validade de tais limites e não podem ser estudados independentes uns do outros (apesar de que ainda ocorre frequentemente a divisão da ciência em categorias isoladas). Como conseqüência do processo de hibridização, os assuntos relacionados à ciência e à tecnologia tornam-se centrais para compreender a vida social contemporânea.

Para Irwin (2001, p. 85), a SCC sugere a necessidade de "flexibilidade e mentes abertas frente aos riscos e problemas ambientais". Considerar separadamente as reivindicações de governantes, ambientalistas ou cientistas como determinantes é
perder um dos "mais fascinantes elementos do debate sobre riscos ambientais: a
maneira através das quais os híbridos ambientais são construídos, contestados e defendidos em arenas sociais, cientificas e institucionais".

Ainda na perspectiva da SCC, Irwin (2001) identifica não somente uma variedade de contextos institucionais e disciplinas científicas, mas também outro aspecto que diz respeito à divisão científica do trabalho. No risco por ele analisado, de contaminação dos alimentos por agrotóxicos, a ciência inclui a submissão de dossiês para aprovação e a atuação de comitês científicos que decidem que testes devem ser feitos e que tipos de evidências são requeridos antes de se liberar determinado agroquímico. Dessa forma, a especialidade cientifica influencia a forma de controle público e regulador relacionado a perigos específicos.

Para finalizar com esses aspectos da SCC, Irwin (2001) aponta o caráter altamente diferenciado da ciência na área de riscos ambientais, o que pode confundir o que habitualmente se pensa como atividade cientifica. Essa diferenciação sugere uma complexidade social para as atividades científicas, mas também uma sobreposição com preocupações sociais, institucionais e ambientais.
O quadro 2.1 abaixo resume as perspectivas da SCC frente aos riscos e
permite contemplar os diferentes elementos de análise de riscos apresentados nesse
item.

- QUADRO 2. 1 -
RESUMO DOS ELEMENTOS DE ANÁLISE DE RISCOS NA PERSPECTIVA DA SCC

Variedade de especialistas envolvidos na discussão de riscos ambientais
Localidade institucional do debate dos riscos
Perspectiva transnacional que afeta a formulação dos riscos
Princípios da precaução e equivalência
Divisões cientificas entre visões reducionistas e sistêmicas da ciência
Divisões institucionais entre as idéias de privatização e democratização da ciência
Contexto social e institucional da pesquisa científica
Controvérsias cientificas frente aos riscos
Dificuldade de separar o social do científico
Dificuldade de fixar uma distinção entre o social e o natural
Dimensão cultural dos riscos
Caráter social dos riscos
Questão da credibilidade e confiança pública frente às instituições governamentais
Caráter híbrido dos riscos ambientais
Divisão científica do trabalho
Caráter altamente diferenciado e heterogêneo das atividades científicas

Fonte: Quadro elaborado por nós, com base em IRWIN (2001); LATOUR (1992); FONTE apud
PESSANHA; WILKINSON (2005); WYNNE (1992); GUIVANT (2000; 2001; 2006); HINCHLIFFE (2001);
JASANOFF(1986); DOUGLAS E WILDAVSKY (1982)

Onde termina a ciência e começam os interesses comerciais diante da
liberação de um novo agrotóxico ou de uma nova tecnologia? As restrições diante de
um risco ambiental são baseadas na ciência ou em um senso do que é politicamente
aceito para todas as partes interessadas? A tolerância dos testes de rotina feitos com
animais é um julgamento social ou científico? Essas perguntas formuladas por Irwin
(2001) sugerem que todos os aspectos acima são inseparáveis e quanto mais nos
aproximamos das questões específicas do desenvolvimento científico, mais as
grandes categorias de sociedade, natureza e conhecimento se mesclam.
Juntando todos esses pontos de vista, percebemos que a relação entre a
ciência e a avaliação dos riscos é mais complexa e multifacetada do que parece à
primeira vista. A análise de riscos, sob uma nova perspectiva da ciência, conduz,
assim, a novas premissas.

Latour (2001, p. 47), ao proclamar que "uma ciência sempre oculta outra",
sugere a necessidade de pesquisas de caráter inter e transdisciplinares. Acreditamos
que tais pesquisas podem ajudar a minimizar a visão reducionista que impera nos
estudos de risco ambiental e qualidade alimentar. Beck (1992) também desafia a
ciência a encontrar outras formas de operar na sociedade de risco a partir de uma
nova relação entre racionalidade científica e racionalidade social.

Tudo isso leva a crer que a interpretação e a construção dos riscos são
contestáveis e freqüentemente partidárias, uma vez que os vários grupos envolvidos
usam a linguagem da ciência para defender seus interesses. Nessa perspectiva mais
pesquisas nem sempre pode resolver as controvérsias que surgem - na verdade mais
ciência pode, algumas vezes, exacerbar os desacordos existentes.

A SCC assume não somente uma perspectiva analítica, mas também uma
metodologia particular, ao insistir sobre a necessidade de examinar a contextualização
dos processos de riscos ambientais, adotando uma abordagem situacional para essas
preocupações. Essa abordagem visa justamente considerar as diferentes construções
ambientais e os diferentes grupos de atores sociais envolvidos na formulação e defesa
dos referidos riscos (IRWIN, 2001).

Para colocar em prática essa metodologia, Irwin (2001) aponta três desafios:
não limitar a análise sociológica ao estudo dos desafios e impactos sociais; considerar
a heterogeneidade e a variedade científica; e enfatizar o contexto e as situações
particulares dentro dos quais os fatos são construídos e defendidos.
Essa é uma metodologia que implica em rastrear os atores, na expressão
usada por Law e Callon, citados por Irwin (2001), e observar cuidadosamente como
todas as evidências são acumuladas e organizadas pelos diferentes grupos de
indivíduos e instituições.

Para Irwin (2001), essa perspectiva pode gerar uma série de questões
desagradáveis sobre a ciência e sua aplicabilidade nas discussões e debates de riscos
ambientais. Na verdade, a ciência torna-se uma arena legítima para o debate público e
não somente um referendo incontentável nas resoluções de disputas ambientais.

Essa nova ciência que parece emergir não dispõe de um método irrefutável e
muito menos dispensável, mas de um conjunto de instituições sociais difusas e
flexíveis, em constante negociação, e com uma característica política que não pode
ser mais ignorada. Já os opositores a essa idéia dizem que a política não pode ser
utilizada para parar a ciência, enquanto a ideologia da perícia científica relativa às
novas tecnologias ainda considera a intervenção pública como insensata. Muitos
insistem que as "decisões devem ser tomadas exclusivamente segundo o método
científico, e não com base nos critérios políticos e sociais" (HANNIGAN, 1995, p. 222).
A ciência ainda é percebida como um dos meios mais seguros de interpretar e
definir os riscos ambientais. Com suporte financeiro e técnico, a ciência continua
ampliando sua compressão sobre o tema e é uma base sólida para ações sociais e
institucionais que utilizam os parâmetros por ela definidos. Entretanto, a ciência perde
sua homogeneidade e já se pensa não em uma ciência, mas em diversas ciências que
incluam as preocupações mais amplas dos cidadãos leigos, além de outros atores, na
sua rede. Assim sendo, a ciência democratiza-se e torna-se palco de ações de
cidadania, como veremos a seguir.

2.4. A rede de participantes na construção do conhecimento -
controvérsias e a democratização da ciência

A rede de participantes na construção do conhecimento é objeto de estudo de
autores como John Law, Michel Callon e Latour. A rede, para Latour (2000, p. 180)
indica que "os recursos estão concentrados em poucos locais - nas laçadas e nos
nós - interligados - fios e malhas. Essas conexões transformam os recursos esparsos
numa teia que parece se estender por toda parte" (p. 294).

A idéia de rede, segundo Latour (2000), é uma forma nova de encarar a
problemática da produção social do conhecimento científico, porque ela se conecta ao
mesmo tempo à natureza das coisas e ao contexto social, sem, contudo reduzir-se
nem a uma coisa nem a outra.

As redes da ciência podem ser compostas tanto de pessoas quanto de seres
inanimados, objetos, máquinas, animais, textos, dinheiro. Uma rede é mais forte do
que suas partes sozinhas, e serve para homogeneizar um conjunto de materiais
heterogêneos. Assim, a teoria do ator-rede (Actor Network Theory ou ANT) é uma
forma de controlar os resultados de um processo para formar algo único e manter
unidos atores e organizações em torno de um tema. Na ANT, a noção de rede referese
a fluxos, circulações, alianças, movimentos e não admite uma entidade fixa e nem
vínculos estáveis, previsíveis e definidos. As entidades das quais a rede são
compostas, sejam elas naturais ou sociais, podem, a qualquer momento, redefinir sua
identidade e mútuas relações, trazendo novos atores para dentro de sua estrutura
(LATOUR, 2000).

No caso da trama que envolve a pesquisa em alimentação (ou, mais
especificamente, em soja), como seria essa rede? Utilizando a noção de tecnociência
de Latour (2000, p. 174) que "descreve todos os elementos amarrados à matéria
científica, por mais inesperados ou estranhos que possam parecer", pode-se afirmar
que o pesquisador da soja não está só, mas conectado ao seu objeto de estudo (a
soja); aos instrumentos produzidos para seus estudos; aos financiamentos de
empresas ou governos; a universidades ou a institutos estatais ou autônomos de
ciência; aos seus colegas; aos periódicos e às revistas cientificas; à mídia que
divulga os resultados dos estudos; aos médicos, nutricionistas e outros especialistas
que utilizam esses resultados; aos consumidores leigos e pacientes que recebem tais
informações traduzidas e fazem suas escolhas alimentares49.

Para Andrade (2006), a rede como representação de conectividade,
simultaneidade e interdependência pode ajudar na resolução de problemas do espaço
público em geral. No caso da análise de riscos ambientais, a rede se torna essencial
para demonstrar a dinâmica e a complexidade da associação de diferentes atores
envolvidos no problema. Uma rede coesa e fortalecida de diferentes atores (inclusive
os inanimados) pode ajudar a dissolver as controvérsias que surgem na ciência. Além
disso, a rede torna mais transparentes as abordagens transdisciplinares, essenciais
para se dar conta da análise dos riscos ambientais. Por fim, a inserção de diferentes
atores numa rede complexifica sua dimensão e dinamiza os papéis de tais atores,
como veremos nos sub-itens a seguir: o primeiro trata dos médicos e nutricionistas
como especialistas da rede da ciência em Nutrição; e o segundo aborda o lugar dos
leigos, consumidores e pacientes na mesma rede, além de discutir a noção de
democratização da ciência.

2.4.1. Os especialistas e as controvérsias na rede de ciência

Médicos, engenheiros, arquitetos, bioquímicos, professores e outros podem ser
considerados especialistas que pertencem à rede da ciência. Mesmo sendo atores que
nem sempre produzem pesquisas ou lideram grupos de estudos, eles dependem dos
mesmos para exercer suas práticas. Entre os conhecimentos e as práticas
desenvolve-se um processo de trocas em que uns legitimam os outros; ou seja, os
especialistas utilizam-se do resultado produzido pela ciência e colocam esse
conhecimento em prática. Os resultados da prática, por sua vez, alimentam novos
estudos e produzem novos conhecimentos.

Analisar tais processos de expansão da rede científica significa acompanhar a
ciência em ação e estudar o que Latour (2000) chama de ciclos de acumulação. O
autor cunhou esse termo ao analisar a função repetida de geógrafos explorando novas
terras e, a cada expedição, construindo mapas cada vez mais precisos. Mas ele
ressalta que o termo pode ser aplicado para diferentes especialistas que sempre
constroem seus conhecimentos pelo processo de acumulação de informações
previamente estudadas.

A definição de Latour (2000) de conhecimento como um ciclo de acumulação
incorpora as variadas dimensões do desenvolvimento do conhecimento.
Conhecimento não pode ser definido sem a compreensão do que significa ganhar
conhecimento.

Conhecimento não é algo que poderia ser descrito por si próprio ou
por oposição a ignorância ou crença, mas somente considerando
todo o ciclo de acumulação: como trazer coisas de volta para um
lugar para que alguém o veja pela primeira vez de modo que outros
sejam enviados novamente, para trazer outras coisas de volta
(Latour, 2000, p. 220).

Na rede considerada em nosso estudo, a da ciência da Nutrição, acreditamos
que um consultório voltado para orientações alimentares pode ser analisado na
mesma perspectiva que um laboratório. Médicos e nutricionistas (assim como
cientistas) constroem suas redes a partir dos seus consultórios, utilizam dezenas de
instrumentos e aparelhos para auxiliar seus diagnósticos, além de livros e publicações
especializadas para a construção do seu saber e para orientar sua prática clínica. O
termômetro, o aparelho de medir pressão, a balança, os testes laboratoriais, o
adipômetro, a fita antropométrica, todos chegam ao especialista, passando antes
pelos cientistas nos laboratórios e pela indústria. Esses instrumentos tornam-se
símbolos de uma atividade especializada, embasada na ciência, sendo vistos como
inseparáveis da identidade científica de seus usuários .

Latour (2000) define instrumento como qualquer tipo de utensílio que provê
qualquer tipo de visualização a ser apresentada em um texto científico (por exemplo,
uma balança, a partir da qual pesagens sistemáticas levam à construção de
inscrições, como um gráfico ou uma tabela). Por trás de todos os textos científicos
estão as inscrições, produzidas através do uso de instrumentos. A noção de prática
cientifica sendo associada a inscrições é central na abordagem de Latour para se
entender os caminhos da ciência. As inscrições são produtos de dois objetos, o mundo
real e o espírito científico (refletindo-se um no outro), "são imagens virtuais produzidas
pelas humildes práticas da escrita e da produção de registros" (p.26.) Para o autor, o
que os cientistas (e, na nossa interpretação, os especialistas) fazem é produzir
inscrições em seus laboratórios (e/ou consultórios). Os especialistas em saúde e
Nutrição, ao utilizar instrumentos como a balança ou o adipômetro, produzem
inscrições (no caso o peso, o índice de massa corporal) que servirão de base para
futuros procedimentos (orientações dietéticas), que gerarão, talvez, novos estudos.
Fazendo ainda uma analogia com Latour (2000), os instrumentos são uma
interface entre a natureza e o especialista, e se desejamos estudá-lo, é importante
também analisar que tipo de instrumento ele usa e o que faz para e com o
instrumento.

Outro tipo de ator (este, não-humano) da rede da ciência a que os especialistas
da área da saúde estão associados são os artigos. Eles se baseiam em estudos de
qualidade e evidências científicas creditados pelo prestígio de seus autores e pelo
reconhecimento dos periódicos. O nível de credibilidade dos artigos se constrói
através do uso de metodologia reconhecida, linguagem especializada e referências
renomadas que acabam por isolar o leigo, conferindo ao artigo maior legitimidade
cientifica. Quanto mais termos especializados e inovadores são utilizados nos artigos,
mais se isola o leitor leigo e mais se aproximam os clientes centrais da ciência:
cientistas e especialistas, para quem a ciência é produzida (LATOUR, 2000)50.

Em afirmação que remete à Medicina baseada em evidências cientificas como
metodologia51, Attallah (1997) sinaliza o caminho do especialista moderno, que ao
trilhar a via da ciência rompe com as formas de aquisição do conhecimento tradicional:
A Medicina baseada em evidência tira a ênfase da prática baseada na intuição, na experiência clínica não sistematizada e nas teorias fisiopatológicas para se concentrar na análise apurada de métodos por meio dos quais a informação médica foi ou será obtida.

Além de conquistar seu lugar na modernidade, todas as ferramentas utilizadas
pelos especialistas são uma forma de construir conhecimentos consistentes, ou seja,
menos passíveis de serem questionados e que afastam possíveis opositores. Através
destes artefatos, os especialistas se tornam mais poderosos para construir suas
próprias redes e garantem seu espaço de atuação. Sem ler artigos, usar instrumentos
e fazer inscrições, o especialista poderia exercer sua profissão, mas certamente sua
credibilidade seria questionada. Tais elementos simbólicos definem os especialistas
como parte da cultura científica moderna.

Na verdade, e mesmo se pode parecer o contrário, os cientistas estão nas
mãos dos especialistas, pois são eles quem escolhem os resultados das pesquisas
que levarão em conta, não só pela credibilidade a elas conferidas pelo prestígio dos
seus autores52, mas também por fatores subjetivos. Os especialistas, como atores
sociais, recebem informações de outras redes das quais eles podem tirar suas
certezas; eles têm ainda um saber tácito, que lhes permite formar suas opiniões a
partir de suas experiências prévias ( cientificas e não cientificas).

Para Jones (2005), a pesquisa também é uma forma de traduzir a natureza. A
ciência seria um tipo de prática semiótica, que lida com símbolos em vez de abordar
diretamente a natureza física do objeto estudado. Não se pode lidar com a natureza
real para fazer afirmações sobre ela. No caso dos alimentos (representantes da
natureza), para examiná-los é preciso reduzi-los e inscrevê-los para serem
examinados como fato científico. A pergunta que Jones faz é como estabelecer uma
conexão não arbitrária e significativa entre o mundo físico e o mundo inscrito em
papéis. Afinal, essa conexão existe?

A pesquisa em alimentação é uma forma de legitimar um alimento fora do seu
contexto (natureza) e trazido para um laboratório (sociedade). O alimento torna-se, no
caso, a natureza reinterpretada. Como construir uma verdade sobre tal alimento dentro
do laboratório é uma das tarefas da ciência, assim como definir qual o melhor método
para inscrever a natureza. É o que Latour (2000) chama de construir o centro agindo
à distância, através de ciclos de acumulação repetidos. Mas também é importante
ressaltar que um centro nem sempre consegue agregar consensos, e pode levar ao
seu contrário, que é formar controvérsias.

As controvérsias têm implicações sociais, políticas e econômicas e
caracterizam desacordos entre peritos das áreas científica, médica ou técnica.
Disputas entre peritos provocam dificuldades para a implementação de políticas e os
confrontos são, algumas vezes, rancorosos e insolúveis (MARTIN; RICHARDS, 1995).

Para esses autores, o expert (o perito) neutro, desinteressado e objetivo (perfil
construído dentro da própria rede da ciência) foi tradicionalmente designado como o
árbitro racional e autorizado para resolver disputas públicas que se sobrepõem a
assuntos técnicos e científicos. Entretanto,
o ultrapassado ideal de apelo aos fatos e sua interpretação por
peritos acreditados foi corroído pelas óbvias limitações dos mesmos
e do seu conhecimento em solucionar assuntos de controvérsias
públicas. Existe agora uma difundida percepção pública de que os
peritos não são infalíveis em virtude do acesso especialista a
metodologias cientificas de rigor que poderiam garantir sua
objetividade. Sabe-se que uma aparente opinião desinteressada pode
estar influenciada por considerações profissionais, econômicas ou
políticas (MARTIN; RICHARDS, 1995, p.507).

As controvérsias técnicas e cientificas que atingem também a área médica
são um campo de análise legítimo entre historiadores e cientistas sociais e Martin e
Richards (1995), no seu artigo Scientific Knowledge, Controversy, and Public Decision-
Making, propõem que elas sejam estudadas a partir de quatro abordagens: a
abordagem positivista; a abordagem de políticas de grupo; a abordagem construtivista
(ou SCC, já apresentada); e a abordagem sócio-estrutural.53
Na análise das controvérsias na área da saúde, percebem-se disputas internas,
ou seja, dentro do próprio meio científico, sobre evidências no campo da segurança e
da eficácia de práticas médicas que envolvem o uso de drogas e alimentos ou
procedimentos, exames e condutas médicas em geral.

No caso das controvérsias entre os peritos da área da saúde, as estratégias
metodológicas mais comumente utilizadas são a já mencionada Medicina Baseada em
Evidência e as revisões sistemáticas de evidências e metanálises.54 As influências
políticas e econômicas também devem ser mais uma vez consideradas, e são
particularmente claras quando a ciência e os peritos defendem um ponto de vista que
não é compartilhado pelas agências reguladoras, devido a interesses políticos55.

E como se resolvem as controvérsias na área da saúde ou na ciência em geral?
Para Nelkin (1995), os meios para dissolver controvérsias dependem da natureza de sua
percepção. Se a disputa foca em questões relacionadas ao controle político do
desenvolvimento e a aplicação da ciência reflete interesses competitivos,
negociações e medidas compensatórias podem reduzir o conflito e levar a uma
resolução. Mas quando princípios morais estão em jogo, argumentos técnicos nem
sempre afetam a posição dos protagonistas. Para a autora, a resolução dos conflitos
reflete necessariamente o poder político dos interessados que competem na arena das
controvérsias e a argumentação racional dos peritos, baseada em dados científicos e
supostamente neutros e objetivos, interfere menos na sua dissolução.

Neste quadro, acreditamos que pode prevalecer o interesse das indústrias ou
empresários, de associações de minorias, de ONGs ou podem simplesmente prevalecer
idéias de um grupo da ciência mais fortalecido em termos de reconhecimento ou poder
econômico. Mesmo o público leigo, ao aceitar, ir contra ou ser indiferente pode ser levado
em consideração nos processos de resolução das controvérsias.

Entre os peritos, as controvérsias podem terminar quando uma maioria vence os
demais e impõe seu ponto de vista sobre o tema em debate. Dascal (1994) ressalta
que, neste caso, as controvérsias não acabam, mas são apenas resolvidas. Os cientistas
e especialistas que continuam defendendo seu ponto de vista contrário são
desconsiderados ou deixam a arena da negociação (ou da ciência como um todo). As
controvérsias podem também ser mantidas, assim como podem ser ignorados ou,
simplesmente, esquecidas. A posição de Latour (2000) coincide com a de Nelkin sobre
o caráter político que envolve a resolução das controvérsias, mas o autor acredita que
todas as controvérsias terminam num determinado momento. Para Latour (2000), uma
controvérsia se torna um fato indiscutível quando é possível construir uma rede coesa
de aliados em torno da polêmica que passa, então, a ser percebida como uma caixa
preta.

Outro fator importante é a questão da percepção pública das controvérsias, que
podem se formar mesmo quando há consenso científico entre cientistas e
especialistas. Irwin (2003) oferece vários exemplos disso, na sua análise sobre as
diferenças de percepção de riscos ambientais entre leigos e peritos.

De qualquer modo, driblando as controvérsias e escolhendo os estudos nos
quais acreditam, os profissionais da área da saúde legitimam sua atuação. Nesse
momento, eles traduzem e tornam acessível o conhecimento científico para o
paciente-leigo, que neste momento passa também a integrar a rede da ciência.

2.4.2. Os leigos na rede da ciência

A inclusão do leigo na rede da ciência - e pensando especialmente na relação
entre consumidor e pesquisa em alimentação - define um novo papel para o
consumidor, que vem se tornando a cada dia menos passivo. O reconhecimento e a
ativação do consumidor se tornam essenciais para o processo de democratização do
acesso ao conhecimento e acaba por delinear novas formas de ações políticas.
Em sua publicação sobre consumo sustentável, Portilho (2005) destaca a
contribuição de inúmeros autores que percebem o fortalecimento da autoridade do
consumidor e a "politização do consumo"56 e da esfera privada como uma
possibilidade de extensão de novas práticas políticas e de democratização desse ator
e da ciência como um todo.

Para Irwin e Michael (2003), foi-se a época na qual a visão do público frente
aos riscos era dispensada como irrelevante ou considerada como um desafio para a
ciência da educação. Essa época deu lugar a um diálogo público que se traduz na
forma de um maior engajamento do público com a ciência e a tecnologia.

Wynne (1987) é outro autor que vem se dedicando ao estudo dos conflitos que
envolvem o conhecimento perito e as percepções dos leigos em relação aos diversos
tipos de risco, no sentido de reconhecer tais percepções como legítimas. Tal
reconhecimento permite que a opinião do consumidor, assim como as decisões de
base cientifica, sejam respeitadas no âmbito das decisões de avaliação de riscos.

Para Guivant (2005), a demanda por uma democratização da ciência e uma
quebra do monopólio da opinião dos peritos ganha força nas discussões das
Sociologias da Ciência e Ambiental e da teoria social em Beck e Giddens. Segundo a
autora, o tema dos riscos da biotecnologia fortaleceu o debate sobre o processo
decisório de definição de riscos e do papel da ciência, bem como as discussões em
torno do envolvimento público e do empowerment do cidadão frente às decisões
cientificas.

Análises como essa de Guivant (2005), sugerem que a questão dos riscos
(socioambientais ou ligados a novas tecnologias) exige muito mais do que estudos
científicos e desenvolvimento de práticas de manipulação seguras. Ações políticas que
envolvam o consumidor passam a ser consideradas na definição de riscos, bem como
o incentivo a estudos acadêmicos que investiguem a problemática sob uma análise
crítica dos diversos interesses envolvidos na geração do conceito de risco ambiental.

Tais estudos podem servir de base para que os consumidores organizados
ajam como cidadãos em um dinâmico contexto de "chain-related processes" como
aponta Spaargaren (2005). O autor ressalta que um grande desafio para as ciências
ambientais sócio-políticas é desenvolver novas políticas emancipatórias para ampliar
os direitos de cidadãos-consumidores ecológicos e estimular comportamentos de
consumo sustentável.

Spaargaren (p. 156) aponta algumas características dessas novas arenas
políticas que costuram o público e o privado de forma não convencional: "abertas para
a auto-expressão, informais e igualitárias". Para esse autor, essas formas de
governança merecem atenção das ciências políticas e sociais frente à erosão das
políticas baseadas no Estado Nação e à emergência da política-vida. Spaargaren
(2005) também se atém ao processo de hibridização dos papéis dos cidadãos e
consumidores na modernidade reflexiva e ressalta uma dicotomia entre o cidadão e o
consumidor.

Nesse contexto que mescla redefinição ou ativação do papel do consumidor e
popularização da ciência, é preciso considerar que a ciência e seus resultados são
recebidos de modo diferente pelos especialistas e pelos leigos. Assim sendo, faz-se
necessário ressaltar a diferença entre eles na definição de riscos. A SCC considera
que a percepção dos leigos não é irracional e que, além disso, ela permite
compreender certos aspectos das situações de riscos que os cientistas excluem de
suas análises. As crenças subjetivas e o conhecimento objetivo podem estar de
acordo ou pelo menos podem ser consideradas como relevantes. Guivant (2002, p. 6)
argumenta que para Wynne os leigos têm "avaliação acurada dos riscos, [e são] mais
abertos a mudanças circunstanciais e a novas informações e vítimas das
desconsiderações dos sistemas peritos". Já os peritos são apresentados "com
dificuldades de incorporar o conhecimento leigo e de ajustar o científico a novos
contextos"57.

Collins e Evans (2002) introduziram uma fértil discussão que diz respeito ao
campo das questões técnicas. Eles chamam essa abordagem de SEE - Studies of
Expertise and Experience, cuja pergunta principal é: quem decide sobre os riscos da
tecnologia, de grande relevância para o público leigo em geral, que se mesclam com o
domínio político? No nosso caso, frente à tecnologia dos alimentos a pergunta seria:
quem decide o que é um alimento saudável? Até pouco tempo essa área de discussão
era limitada aos especialistas, mas hoje envolve um público bem mais amplo.

O trabalho desses dois autores inicia com uma importante questão que nos
interessa particularmente: "deve a legitimidade política de decisões técnicas no
domínio público ser maximizada, referindo-se a ela nos mais amplos processos
democráticos, ou tais decisões deveriam estar baseadas em conselhos de
especialistas?" Para eles, a primeiro opção pode levar a uma paralisia tecnológica,
enquanto que a segunda convida a uma oposição popular e propõe uma discussão
sobre o valor do conhecimento e da experiência dos cientistas tecnólogos,
comparados com outros conhecimentos e experiências. Por outro lado, Collins e
Evans perguntam: por que o conhecimento dos cientistas e especialistas é
especialmente considerado diante dos riscos e questionamentos frente à ciência e a
tecnologia? A partir dessa questão, os autores passam a focar no problema da
extensão (problem of extension) expresso pela pergunta: "qual deveria ser a extensão
da participação (pública) durante o processo técnico decisório?"58 (COLLINS; EVANS,
2002, p. 237; tradução nossa).

Entre grande parte dos sociólogos que discutem riscos ambientais, fica claro
que o público é central no debate, mas Irwin e Michael (2003, p. 9; tradução nossa)
apontam o desafio de como definir e capturar a opinião publica e de como delinear
exatamente esse público e seus pontos de vista: "(...) quem são exatamente estas
pessoas e como se pode levar suas opiniões em conta?".

Como contribuição a esse desafio, Guivant (2005) analisa o contexto de
redefinição da arena pública e a construção de uma governança de riscos, tomando
como exemplo o processo de liberação de transgênicos no Brasil. Em artigo de grande
interesse, a autora apresenta diversas formas de participação pública através de
métodos já formalizados em outros países (de Rowe e Fremer, 2000), além de dois
modelos de governança dos riscos e da inovação59, de Joly (2001). Um desses
modelos, o standard, atribui aos peritos o domínio do conhecimento e das decisões
que envolvem os riscos; o outro apresenta novos espaços de negociação que
desmonopolizam o conhecimento perito, a partir do domínio público da ciência. O
artigo também demonstra, com base nos objetivos traçados por Mac Gregor (2003) e
Rowe e Frower (2000), algumas razões que justificam o crescente interesse na
participação pública nos assuntos técnicos: o "reconhecimento de direitos humanos
básicos numa democracia ou o reconhecimento pragmático da importância de evitar
políticas impopulares", além do "aumento da confiança pública nos processos
decisórios e no compartilhamento de informações" (GUIVANT, 2005, p. 52-53).

Para finalizar o artigo e concluir o tema dos desafios da inserção do público no
debate científico, Guivant (2005) explora como o envolvimento do cidadão não se
contrapõe necessariamente ao conhecimento perito. O processo de democratização
de tal conhecimento não deve ser uma ameaça aos avanços científicos, mas pode ser
usado como a base de novas formas de envolvimento público. Resumindo, a
educação científica é um componente importante nas novas formas de governança
pública, uma vez que muitas tensões que envolvem riscos e tecnologia têm como
fundamento a falta de conhecimento do assunto por parte dos leigos.

Para Irwin (1995), a sociedade reflexiva pode ajudar a formar indivíduos mais
ativos que não sigam simplesmente padrões de comportamento pré-estabelecidos. A
noção de política é alterada e substituída por uma diversidade de ações de cidadãos
menos passivos, que questionam antigas estruturas e estão conscientes das
possibilidades de escolhas que existem na vida diária. Tal mudança influencia também
a noção de cidadania.

Mais ligados à temática do presente trabalho, Atkins e Bowler (2001) ressaltam
que esse momento atual é importante para determinar a extensão em que o conceito
de alimento saudável será direcionado pelas forças do mercado ou pela
democratização do cidadão. Podemos igualmente prever um embate entre o modelo
standard de governança de riscos e a desmonopolização do sistema perito. A análise
da soja como alimento saudável, apresentada a seguir, pretende contribuir para
demonstrar as implicações que envolvem cada um dessas opções. Tal análise
também ilustra a complexidade da rede da ciência da Nutrição e contextualiza o papel
dos diferentes atores que fazem parte dela.

CAPÍTULO 3

A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO CONCEITO DA SOJA COMO
ALIMENTO SAUDÁVEL

Diante de muitas evidências de crescimento do cultivo e do consumo da soja,
bem como da proliferação de persquisas científicas sobre seus beneficios, esta
pesquisa elegeu esse alimento como foco de análise. Assim, neste capítulo,
pretendemos mostrar sua trajetória desde a antiguidade até os dias de hoje; o
contexto político da sua produção e de seu consumo; as controvérsias que envolvem a
pesquisa em soja e saúde humana; e os riscos socioambientais da sojicultura. Por fim,
faremos uma análise dos riscos e controvérsias que envolvem a soja transgênica.

O consumo de soja cresceu de forma vertiginosa e o que era uma cultura de
pouca relevância no início da década de 90 tornou-se, hoje, um produto industrial. Na
agricultura, a soja é percebida como um alimento cujo cultivo, ajustado a todos os
tipos de ecossistemas, pode beneficiar o solo.

O Brasil é o segundo maior produtor mundial de soja. Os EUA aparecem em
primeiro lugar (com cerca de 35% da produção total do mercado) e a Argentina, o
Paraguai e a Bolívia têm participações de mercado de 17%, 2% e 1%,
respectivamente. Outros grandes produtores são a China e a Índia (9% e 2%), porém,
suas produções são inteiramente consumidas pelo mercado interno. Os EUA, o Brasil
e a Argentina são os principais fornecedores de soja para o mercado mundial,
respondendo por quase 90% do fornecimento. Devido ao contínuo aumento de suas
produções, a Argentina e o Brasil têm obtido crescimentos estáveis de participação de
mercado, sendo que o Brasil assumiu, em 2003, a posição de liderança, anteriormente
dos EUA, como maior exportador de soja do mundo. A União Européia é o principal
importador de soja do mundo, seguido pela China. Devido ao crescimento da
população e ao aumento de renda per capita, espera-se que a demanda mundial de
soja aumente em 60%, atingindo 300 milhões de toneladas até 2020 (DROS, 2002;
(INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA, 2006).

A produção brasileira, na safra 2006/2007, ficou na faixa de 58,4 milhões de
toneladas, em uma área plantada de 20,687 milhões de hectares, número duplicado
em pouco mais de 10 anos. Em 2005, mais de ¾ da soja produzida no Brasil foi
vendida ao exterior, o que representou 24% do comércio mundial da oleaginosa, tendo
rendido U$9,47 bilhões. Esse número corresponde a 22% dos resultados dos
agronegócios e 8% do total gerado pelas exportações brasileiras (INSTITUTO DE
ECONOMIA AGRÍCOLA, 2006).

Apesar da imprecisão dos dados referentes ao consumo humano de soja no
Brasil, Panizzi (2006) estima que a quantidade alcance 1,6 milhão de toneladas
anuais, cerca de 3% da produção, e com tendência de crescimento, na medida dos
novos usos pelo setor alimentício. Segundo Barbosa (2007), a EMBRAPA-Soja
contabiliza 21 empresas voltadas aos alimentos derivados da soja nas mais diversas
formas. Para avaliar o interesse da indústria de alimentos60 pelo grão, a EMBRAPA
utiliza os registros de patentes do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).

Esses registros de patentes de processos e de produtos à base da leguminosa, para a
alimentação humana, passaram de 17, entre os anos de 1998-2000, para 33, em
2004-2006, dobrando a produção (Figura 3.1). Esse crescimento é considerado
indicativo de que o segmento no país é promissor. Além disso, esses dados sinalizam
o domínio tecnológico durante o cultivo e produção e nas etapas de processamento e
de extração de produtos específicos (BARBOSA, 2007).

FIGURA 3.1 - NÚMERO DE PATENTES DE PROCESSOS E DE PRODUTOS
ALIMENTÍCIOS À BASE DE SOJA, BRASIL, 1998-2000 A 2004-2006.

(Nosso sistema operacional não permite a inserção de gráficos, figuras ou tabelas. Para ter acesso a esta figura, entre em contato conosco que enviaremos por e-mail: contato@portalorganico.com.br)

Fonte: BARBOSA (2007), elaborada a partir de dados do Instituto Nacional de Propriedade Industrial
(INPI)

Segundo Franco (1992), a quantidade de proteína presente no grão de soja é
superior a de algumas carnes e às demais leguminosas. Além disso, no grão se
encontram quantidades consideráveis de ácidos graxos poliinsaturados e
micronutrientes como cálcio, ferro, fósforo, magnésio, manganês e vitaminas do
complexo B, o que a tornariam um produto de bom valor nutricional.

Devido a essas qualidades nutricionais, à grande oferta e ao baixo custo, novos
produtos alimentares à base de soja surgem no mercado; dentre eles, o extrato de
soja e a proteína texturizada são apontados como alimentos nutracêuticos, substitutos
do leite e da carne. Inclusive a agência norte-americana Food and Drugs
Administration (FDA) deu permissão às indústrias locais de alimento para rotular
produtos com altas taxas de proteína de soja com a indicação de que tais alimentos
preveniriam doenças cardíacas. Segundo a agência, essa recomendação teria base
em sólida informação científica sobre os benefícios da soja e poderia ajudar
consumidores a optar por uma heart healthy diet, ou uma dieta saudável para o
coração (HENKEL, 2000).

Pesquisas na língua inglesa sobre os benefícios da soja para a saúde humana
estão expostas em mais de 1.000.000 sites especializados, especialmente em
empresas e instituições de pesquisa agropecuária de diversos países, que se
empenham em divulgá-las em periódicos científicos e revistas.

De fato, não há como negar que a área de pesquisa da soja está entre as mais
dinâmicas nos estudos contemporâneos de Nutrição. Especialistas da área da saúde
são quase unânimes em afirmar que a soja é um alimento saudável, cujo consumo
deve ser incentivado desde a mais tenra idade. Assim, nesse contexto tão favorável,
as perguntas que surgem são: como se deu a construção social que transformou a
soja em um alimento saudável em todo o mundo? Qual o papel da ciência e da
reflexividade contemporânea nessa construção? Por que essa leguminosa ocupa um
lugar tão priviliegiado na opinião de tantos especialistas? Por que o seu consumo na
dieta humana tem aumentado tanto? Quem consome soja e quanto de soja vai para a
alimentação humana?

Esse capítulo se propõe a explorar estas questões e as muitas controvérsias
com relação ao valor da soja como alimento humano, verificando como elas aparecem
ao longo de sua trajetória histórica.

3. 1. A trajetória da soja e a sua multipresença no mercado de alimentos

Os antigos chineses denominavam a soja de jóia amarela. As primeiras
citações sobre ela aparecem no período entre 2883 e 2838 AC e apontam uma
leguminosa que, junto com os cereais arroz, trigo, cevada e milheto, era considerada
um grão sagrado. Os caracteres dos chineses para os cereais mostram grãos
comestíveis, enquanto que para a soja mostravam uma planta que preparava o solo
para o plantio dos cereais. Isso sugere que a soja era utilizada para enriquecer a
fertilidade do solo, uma vez que desenvolve uma relação simbiôntica, em suas raízes,
com bactérias fixadoras de nitrogênio proveniente da atmosfera (LIU, 1997; KATZ,
1987).

Para outros autores, as referências à soja são ainda mais antigas; elas
remetem ao Livro de Odes, publicado em chinês arcaico e também a inscrições em
bronze (EMBRAPA, 2007a). Porém, Liu (1997), Shurtleffe e Aoyagi61 (1976)
asseguram que mesmo que existam textos e lendas sobre a soja com datas anteriores
a 2838 anos AC, ela só passou de um grão fixador de nitrogênio para alimento cerca
de 2500 anos atrás. Até então, a soja não era utilizada largamente como alimento.
Um dos primeiros registros de indicação do consumo do grão fresco e verde
está nos Anais do Verão e Primavera (Ch'un ch'iu) do segundo século AC. Também se
encontram referências a esse tipo de soja nas matérias médicas Ming I Pieh Lu,
escrita por Tao Hung-ching entre os anos 452-536 e na Pen Ts'ao Kong U, escrita por
Li Shih-chen, em 1597, que descrevia as plantas da China ao Imperador Sheng-Nung
(SHURTLEFF; AOYAGI,1976).

Shurtleffe e Aoyagi (1976) ressaltam que a maneira mais simples de utilização
da soja foi a partir de grãos inteiros, no Oriente. De duas maneiras, na realidade; uma
delas, já citada acima, na forma fresca e verde (chamada edamame pelos japoneses,
e largamente consumida in natura na China, Japão e Coréia), e a outra como semente
seca. Nessa forma, o consumo mais comum eram os derivados, como a farinha
torrada (primeiras referências nos Rituais de Chou, Chou li, em 300 AC); tofu (primeira
referência no Ch'ing I Lu, escrito por T'ao Ku em 950, mas evidências arqueológicas
de preparo de tofu datam do ano 220); e os fermentados, como misso, tempeh, shoyo,
natto (as referências variam para cada tipo de fermentado, mas esses produtos
parecem remeter à época anterior a dinastia Chou, 722-481 AC).

Para os historiadores do Soyfoods Center, na maior parte da Ásia Oriental, a
soja não era consumida como grão inteiro seco, cozida ou torrada, mas quase sempre
transformada em comidas que não remetiam ao gosto e a forma dos feijões originais,
como extrato, tofu e os fermentados, ou como edamame. Também não usavam o óleo,
apesar desse ser utilizado como fonte de energia em pequena escala.

Já para Fallon e Enig (2000) e Daniel (2004), a leguminosa passou a ser
utilizada como alimento somente após a descoberta das técnicas de fermentação,
durante o final da Dinastia Chou. Para as autoras, os primeiros alimentos de soja
foram produtos fermentados, sendo o misso e o shoyo os mais conhecidos. Na China,
fabricava-se também um tipo de tofu, também fermentado (hoje a maioria do tofu
consumido não é mais fermentado). Além de produzir outros alimentos, como o
tempeh e o natto, a técnica de fermentação modifica o sabor e o odor característico da
soja e aumenta a digestibilidade da mesma. Esses produtos fermentados têm um bom
valor nutricional e as autoras atestam que é somente dessa forma que as culturas
tradicionais orientais preconizavam o consumo de soja.

Os chineses descobriram ainda que o purê de soja integral cozido poderia ser
precipitado com nigari, um tipo de cloreto de magnésio encontrado no mar para fazer o
tofu, ou coalhada de soja, rica em proteína. O alimento foi incorporado à dieta dos
mosteiros e os monges percebiam que, após o consumo regular de tofu, o
comportamento sensual dos iniciados equilibrava-se. Fallon e Enig (2000) enfatizam
que os monges passaram a usar o alimento como uma forma de estimular o
desenvolvimento espiritual e favorecer a abstinência sexual. Para Shurtleff e Aoyagi
(1976), o tofu era então chamado nos mosteiros como meat without a bone, ou carne
sem ossos, e foi amplamente utilizado entre os zen budistas chineses como alimento
ideal, relacionado a nobres sentimentos como simplicidade, honestidade, frugalidade e
franqueza.

Depois da experimentação dos chineses, a utilização de produtos de soja
fermentados se espalhou por outras regiões do Oriente. O misso chegou ao Japão
através de missionários chineses, mas no interior do país já se fabricava um tipo de
soja fermentada. No século 12, os samurais tomaram o país e popularizaram uma
dieta frugal à base de cereais, misso, vegetais cozidos e pequenas porções de peixe,
moluscos e tofu (SHURTLEFF; AOYAGI, 1976).

Apesar dos indícios de que a soja era largamente consumida na Ásia, Daniel
(2004) afirma, com base em estudos de desenvolvimento do uso de soja na região,
que os produtos fermentados eram usados em pequena quantidade entre os povos
tradicionais. Para a autora, o tofu era utilizado somente como substituto da carne e
peixe em épocas de escassez ou entre os mais pobres.

A origem do extrato de soja (doujiand, em chinês e popularmente conhecido
como leite de soja) é confusa mesmo entre historiadores e suas possíveis restrições a
saúde do ser humano aparecem já em antigos livros chineses. Alguns atestam que o
extrato surgiu muito antes do tofu (pois era a base dele); outros contestam que os
chineses tradicionais não usavam a soja como extrato e o tofu era feito não a partir do
extrato do grão seco, mas originado do purê de soja fresca. E uma terceira corrente
afirma que o extrato de soja não era utilizado, mas somente servia de base para fazer
o tofu. Shurtleff e Aoyagi (1976) ressaltam que os primeiros viajantes a terra da soja
não mencionam o uso de extrato e, somente em 1866, aparece a primeira referência
histórica de extrato de soja na China. O pioneiro divulgador dessa bebida, Li Yu-wing,
foi a Paris, em 1905, proferir palestras sobre os benefícios do produto e, em 1910,
iniciou uma linha produtiva de extrato de soja. A partir de 1920, seu consumo
aumentou na China e o extrato ganhou o ocidente, aliado a um conceito de alimento
mais saudável que o leite de vaca. Entretanto, em 1928, Tso, um especialista chinês
em soja, alertou que o extrato de soja era um produto nativo usado em algumas partes
do país no café da manhã, mas pouco utilizada na dieta das crianças. Outra referência
ao tofu não fermentado como produto impróprio para crianças, idosos e doentes
aparece na Enciclopédia Alimentar Chinesa, escrita por Wang Su-Hsiung.
(SHURTLEFF; AOYAGI, 1976).

Um fato interessante apontado pelos pesquisadores da Soyfood Center pode
ajudar a compreender parte das controvérsias atribuídas ao real valor de produtos não
fermentados à base de soja. Em 1923, dois estudiosos norte-americanos Charles
Piper e Willian Morse (fundador da American Soybean Association, considerado o pai
da soja nos EUA) publicaram uma tabela comparativa entre o valor nutricional do leite
de vaca e do extrato de soja e veicularam uma imagem de crianças chinesas
vendendo esse extrato em Changsha. Baseados aparentemente em correspondência
com ocidentais vivendo na China, eles divulgaram que esse extrato era consumido
extensivamente por crianças chinesas, apesar de vários autores chineses negarem tal
afirmação. Mesmo assim, a partir de então o interesse no extrato de soja aumentou
entre os ocidentais e, apesar das ressalvas de Tso, em 1928, os chineses
desenvolveram sua própria fórmula de extrato de soja para bebês, descoberta por um
médico norte-americano alguns anos antes.

No Japão, esse produto da soja só se popularizou nos anos 60, e nos anos 70
iniciou-se sua industrialização no país. Nos anos 80, o produto se tornou uma bebida
muito popular na China; a indústria passou a produzir em larga escala e o produto se
tornou de interesse comercial. O consumo se espalhou também entre as crianças,
mas segundo Shurtlleff e Aoyagi (1976), os chineses mantêm o hábito de adicionar à
bebida um ovo, como forma de equilibrar sua carência no que diz respeito ao conteúdo
de triptofano, um tipo de aminoácido essencial.

3.1.1. A soja no Ocidente
Até aproximadamente 1894, término da guerra entre a China e Japão, a
produção de soja ficou restrita à China. Apesar de já ser conhecida e consumida de
forma fermentada pela civilização oriental, a leguminosa só foi introduzida na Europa
no final do século XV, trazida por botânicos e missionários para os jardins botânicos
da Inglaterra, França e Alemanha (EMBRAPA, 2007a; DANIEL, 2004).

De acordo com Daniel (2004), em 1770, Ben Franklin trouxe mudas de soja
para os Estados Unidos. O cultivo espalhou-se gradativamente e, em 1925, já existia a
American Soybean Association (fundada originalmente em 1920, como National
Soybean Growers Association). Entretanto, somente a partir de 1935, grandes áreas
de soja para produção de óleo começaram a se igualar às áreas de plantio de milho e
de outros cereais nos EUA. John Harvey Kellogs (1852-1943) foi um dos primeiros
americanos a divulgar publicamente o vegetarianismo e os benefícios da soja. Kellogs
foi seguido por outros entusiastas, como o cientista russo-americano Arthemy Alexix
Horvath, que lançou um manifesto da soja como alimento nacional, em 1931; e Henry
Ford, que estabeleceu, em 1929, um laboratório para desenvolver a fibra de soja como
uso industrial e, mais tarde, o grão como alimento. Até o final da Segunda Guerra
Mundial o consumo de soja nos EUA era incipiente e, por muito tempo, a soja
desenvolvida pela tecnologia norte-americana na forma de extrato, proteína
texturizada e farinha foi percebida como alimento de classes menos favorecidas (e,
posteriormente, de hippies). Entretanto, tal tecnologia foi rapidamente assimilada até
mesmo pela China e pelo Japão, depois de 1945. Daniel (2004, p. 27) fala de um
processo de "americanização da soja no mundo, via tecnologia e indústria norteamericanas", que mudou o padrão e o modo de consumo da leguminosa até mesmo
nos seus locais de origem.

Tal tecnologia é criticada por Christopher Dawson, tecnólogo de alimentos. Em
entrevista a Lawrence (2006), publicada no jornal The Guardian, Dawson descreve
que o método tradicional de fermentação da soja para fazer shoyo e misso era muito
mais complexo do que a tecnologia utilizada atualmente. Para o tecnólogo,
antigamente os produtos fermentados eram produzidos a partir do grão inteiro e com
esporos de bactérias, e durante um longo período, que podia chegar a 18 meses, no
caso do shoyo. O resultado é um produto cuja composição química original é alterada
radicalmente. A indústria acelera esse processo, fazendo a fermentação a partir de
uma fração química extraída do grão, a proteína desengordurada, misturada com
ácido hipocloridrico à alta temperatura e pressão para criar a proteína vegetal
hidrolisada. Sal, caramelo e aditivos químicos são adicionados para prover cor e
sabor. O método de hidrólise rápido usa a enzima glutamase como reativo e uma
quantidade indesejável de glutamato monossódico é formada. Por isso, segundo
Dawson, o shoyo e o misso industrializados são de menor qualidade, além de
apresentar baixa digestibilidade.

Na segunda década do século XX, o teor de óleo e proteína do grão começa a
despertar o interesse das indústrias mundiais. No entanto, as tentativas de introdução
comercial do cultivo do grão na Rússia, Inglaterra e Alemanha fracassaram,
provavelmente, devido às condições climáticas desfavoráveis. Na Europa, líderes
como Hitler e Mussolini indicavam a soja como substituta da carne e o Partido
Comunista Russo, a partir de 1950, apoiou a margarina e a proteína de soja como
uma solução para alimentar as massas. Cuba começou mais tarde, em 1984, a
produzir extrato de soja em larga escala para a alimentação escolar (DANIEL, 2004).
A introdução da soja no Brasil deu-se por volta de 1882. O professor Gustavo
Dutra, da Escola de Agronomia da Bahia, foi o responsável pelos primeiros estudos
sobre a cultura no país. Cerca de dez anos depois, o Instituto Agronômico de
Campinas (IAC), no Estado de São Paulo, também iniciou estudos para obtenção de
cultivares aptos à região. Naquela época, porém, o interesse pela cultura foi pela
espécie a ser utilizada como forrageira e na rotação de culturas. Os grãos eram
administrados aos animais, já que ainda não havia o seu emprego na indústria
(CENTRO DE INTELIGÊNCIA DA SOJA, 2007).

Segundo dados da Embrapa (2007a), no final da década de 60, dois fatores
estimularam a percepção da soja como produto comercial e influenciaram o cenário
mundial de produção do grão. Na época, o trigo era a principal cultura do sul do Brasil
e a soja surgiu como uma opção de verão, em sucessão ao trigo. O primeiro estado
que plantou soja foi o Rio Grande do Sul. Também nesse momento, o Brasil iniciava a
produção de suínos e aves confinados, gerando demanda por farelo de soja para
produzir ração. Em 1966, a produção comercial de soja já era uma necessidade
estratégica, sendo produzidas cerca de 500 mil toneladas no país. A explosão do
preço da soja no mercado mundial, em meados de 1970, estimulou os agricultores e o
governo brasileiro. O país se beneficiou de uma vantagem competitiva em relação aos
outros países produtores: o escoamento da safra brasileira ocorria na entressafra
americana, quando os preços atingem as maiores cotações. Desde então, o país
passou a investir em tecnologia para adaptação da cultura às condições brasileiras.
Os investimentos em pesquisa levaram à chamada tropicalização da soja, permitindo
que o grão fosse plantado em outras regiões do país. Essa conquista dos cientistas
brasileiros revolucionou a história mundial da soja e seu impacto começou a ser
notado pelo mercado a partir do final da década de 80 e, mais notoriamente, na
década de 90, quando os preços do grão começaram a cair e a produção aumentou
(EMBRAPA, 2007a).

Parte da soja cultivada no Brasil começa a fomentar experiências de fabricação
de recursos renováveis para usos industriais não alimentares, como o caso do
biodiesel. Entretanto, grande parte da colheita - 23 milhões de toneladas dos 60
milhões produzidos na safra 2006/2007 - é destinada à alimentação de galinhas,
perus, porcos, vacas e salmões na forma de farelo de soja. Assim, muitos dos
alimentos de origem animal - leite, ovos e carne - que ingerimos hoje, têm a soja como
base de produção. Outra larga porção é prensada para produzir óleo vegetal - 29
milhões de toneladas de grãos produzem 5,8 milhões de toneladas de óleo - que é
base da margarina e da gordura vegetal presente em produtos lácteos, sorvetes,
massas, bolachas, pães e chocolates. O resíduo dessa prensagem também é
transformado em proteína texturizada, utilizada em produtos industrializados. O
restante dos grãos, 31,8 milhões de toneladas, é destinado à exportação.

Aproximadamente 3,5% desse valor vão para o mercado interno como alimentação
humana, consumida como grão in natura, farinha e bebidas à base de soja; os
isolados e concentrados protéicos e a farinha de soja industrial são utilizados como
ingredientes pela indústria de alimentos. Tais derivados da soja entram na composição
de massas, produtos de carne e embutidos, bolos, alimentação para bebês e
alimentos dietéticos (EMBRAPA, 2007a; IEA, 2005; ABIOVE, 2007).

De acordo com Fallon e Enig (2000), 60% dos alimentos processados nos
supermercados norte-americanos contêm soja. Entre esses produtos estão sucos à
base de extratos de soja, hambúrgueres vegetarianos, embutidos de carne e frango,
bolos, sorvetes, milkshakes, barras de cereais e até uma água com sabor de frutas à
base de soja. Segundo Peter Golbitz, presidente da Soyatech62, o caminho do
mercado norte-americano ainda é muito promissor:
O mercado para alimentos à base de soja nos EUA evoluiu em um
verdadeiro fenômeno de comida new age, movendo-se através de
todos os canais de distribuição à medida que esses produtos
saudáveis vêm sendo aceito pela main stream de lojas norteamericanas
em todo o país. O mercado, avaliado em 4 bilhões de
dólares, está mostrando sinais de maturidade (...) e categorias como
extrato de soja, chips, salgadinhos, bebidas funcionais, massa,
cereais, iogurte continuam apresentando altas taxas de crescimento
(GOLBITZ, 2005a, p. 4 tradução nossa).

As vendas de bebidas à base de soja (BBS), nos EUA, atingiram ganhos
elevados, passando de 2 milhões de dólares, em 1980, para 300 milhões em 1998
(URQUHART, 1999). Esse aumento no consumo foi resultado de uma forte estratégia
de marketing, baseada em pesquisas científicas, com base no novo consumidor de
soja.

O mercado europeu reagiu de forma similar. De acordo com dados coletados
em 2005, em cinco países, Alemanha, Itália, França, Espanha e Reino Unido, o
consumo de soja e bebidas à base de soja aumenta 20% ao ano, desde o final da
década de 90. No início, a demanda era para pacientes portadores de algum tipo de
intolerância ao leite, mas atualmente as BBS se tornaram uma alternativa considerada
saudável, que substitui o consumo de bebidas lácteas 63.

Os estudos científicos sobre o valor nutricional da soja não começaram até
1880, mas antes disso Shurtleff e Aoyagi (1976) levantaram pontos importantes
divulgados por asiáticos tradicionais sobre o consumo de soja e saúde humana.
Primeiro, a necessidade de cozimento adequado para maximizar o valor nutricional da
leguminosa (apesar de que até 1930 os ocidentais não compreenderam bem a
importância de cozinhar a soja, especialmente para ração animal) e também as
técnicas de processamento para aumentar a digestibilidade do grão (como, por
exemplo, a combinação cozimento e fermentação). Depois, a necessidade de
combinar a soja com um cereal 64 (no caso do Oriente, soja e arroz) para maximizar a
qualidade da proteína e para minimizar os custos de uma dieta baseada no alto
consumo de proteína animal, como é o caso da dieta moderna. Outro ponto, é que os
japoneses e chineses, considerados povos com boas condições de saúde e longevos,
tinham uma dieta diversificada, na qual a soja respondia somente por 15% da
quantidade de proteína ingerida.


3.1.2. A pesquisa em soja

Em 1855, um pesquisador francês fez a primeira análise nutricional da soja e
do óleo extraído dela. Em 1872, Senft, pesquisador alemão, realizou análises químicas
e nutricionais de sementes de soja, publicadas por Haberlandt, em 1877. Em 1880,
Pellet, um químico francês, publicou detalhada análise química e nutricional de três
variedades de soja cultivadas na China, Hungria e França. As sementes continham
9,6% de umidade, 31,7% de proteína, 15,7% de gordura, além de uma avaliação de
minerais, fósforo e potássio. Em 1881, Lavallois, na França, publica estudo sobre
carboidratos e amido da soja e em 1883, Meissl e Boecker publicam o estudo mais
sistemático até então produzido, relacionados minerais, tipos de gordura e proteína e
ausência de glúten. A partir de 1885, surgem os primeiros estudos em soja e nutrição
humana, realizados por cientistas japoneses. Todos esses estudos demonstraram alta
digestibilidade da proteína de produtos de soja processados. Em 1905, essas
pesquisas foram compiladas por Oshima e publicadas em inglês. Muitas outras
pesquisas se seguiram, avaliando inúmeros derivados da soja, feitas por
pesquisadores da Europa, Japão e Rússia. Em 1886, Paillieux faz a primeira relação
do uso funcional da soja para diabéticos, devido ao tipo de carboidrato encontrado no
grão. Tal ação impulsionou o consumo de soja para diabéticos na Europa e, mais
tarde, nos EUA. Em 1922, com o aumento do uso da insulina diminuiu a urgência de
soluções dietéticas para a enfermidade (SHURTLEFF; AOYAGI, 1976).

No ano de 1909, registra-se a primeira pesquisa realizada nos EUA e o
primeiro estudo com fórmulas infantis à base de soja e leite de vaca. O primeiro estudo
relacionando soja e vitaminas data de 1915. O período de 1914 a 1918 foi o marco de
intensificada pesquisa de soja como fonte de proteína e óleo. A ação dos aminoácidos
da soja no desenvolvimento e crescimento de cobaias foi verificada por Osborne e
Mendel, em 1915. Em 1917, Daniels e Nichols, duas pesquisadoras da Universidade
de Wisconsin, estudaram o valor nutricional da soja e indicaram seu uso como
complemento da farinha de trigo, tendo analisado a biodisponibilidade dos minerais na
soja e a vitaminas do grão. No mesmo ano, Osborne e Mendel publicaram The Use of
Soy Bean as Food (O uso da soja como alimento). A publicação continha os
fundamentos da futura tecnologia do grão, o tratamento à base de calor úmido, e
detalhes da avaliação da qualidade da proteína da soja. Entre 1917 e 1929, muitos
outros estudos foram desenvolvidos em instituições norte-americanas, asiáticas e
européias com diferentes produtos e nutrientes da soja. (SHURTLEFF; AOYAGI,
1976).

A década de 30 foi um tempo de crises no sistema alimentar norte-americano,
por causa da Grande Depressão e da Grande Seca. O impacto da seca e a economia
devastada estimularam uma migração em massa de fazendeiros para os centros
urbanos. O governo federal interveio com subsídios durante esse tempo e a
preocupação com fontes de proteína barata continuou estimulando a pesquisa em
soja. Durante a Segunda Guerra Mundial, com o racionamento de alguns alimentos
(fontes de gordura, açúcar, frutas e verduras) o governo norte-americano estimulou o
consumo de produtos à base de leite, ovos e soja. Com o advento da fortificação dos
alimentos e da função dos micronutrientes, a pesquisa se voltou especialmente para a
descoberta de novas vitaminas na soja. Na Europa, a pesquisa declinou e concentrouse
nos EUA (SHURTLEFF; AOYAGI, 1976).

Nas décadas de 50 e 60, o rápido desenvolvimento econômico norteamericano
levou ao consumo de uma dieta afluente, rica em proteína animal, que
minimizou o interesse na soja, vista como aliada da desnutrição infantil e alimento
base para ração animal. Como o consumo de gordura animal aumentou muito, aliado
a um padrão de qualidade de vida eminentemente urbano, surgiram as doenças
coronarianas e as preocupações com o colesterol. Em 1958, o National Health
Education Commitee e os membros da American Society for the Study of
Atherosclerosis nos EUA e também pesquisadores de países da Escandinávia
iniciaram campanhas de alerta contra a ingestão de gordura e proteína animais.
Concomitantemente, apareceu também o interesse por alimentos saudáveis, com
baixo teor de gorduras saturadas e o interesse pela soja ressurge. As primeiras
pesquisas sobre os fatores antinutricionais da leguminosa aparecem no final da
década de 60 e início da de 70, bem como o alerta sobre a necessidade de desativar
tais fatores pelo cozimento adequado (SHURTLEFF; AOYAGI, 1976).

Nas décadas de 70 e 80, o aumento das doenças crônico-degenerativas, como
câncer, doenças coronarianas, obesidade e diabetes, foi determinante para o
estabelecimento do interesse pela nutrição como aliada à promoção da saúde. Livros
de dietas se tornaram best sellers e o interesse em soja como fonte alternativa de
proteína aumentou consideravelmente. Shurtleff e Aoyagi (1976) apontam três fatores
determinantes para estimular a pesquisa nessa área: (1) a introdução de uma potente
linha industrial de produtos à base de proteína de soja, que abriu um grande mercado
de novos alimentos; (2) eventos iniciados por pessoas e instituições interessadas em
disseminar a soja, as quais apoiaram pesquisas e estudos e (3) tendências de
desenvolvimento que incitaram nos consumidores uma maior demanda para produtos
à base de soja e, indiretamente, esse fator levou à pesquisa nutricional. Como
tendências de desenvolvimento, podemos pensar no estímulo ao plantio da soja e seu
status de commoditie e produto de exportação.

Em fevereiro de 1971, produtos à base de proteína texturizada de soja (PTS)
foram autorizados a ser utilizados como substitutos da carne no National School Lunch
Program, abrindo assim um novo mercado institucional de alimentação escolar. Nesse
mesmo ano, estabeleceu-se o Soy Protein Council, uma associação comercial que
ajudou a promover a soja. Em 1973, foram introduzidos no mercado norte-americano
bifes de carne, contendo 25% de PTS. Em 1973, a Primeira Conferência Mundial em
Proteína de Soja ocorreu em Munique, com participação de estudiosos de 45 países.
Muitos estudos foram apresentados e em seguida publicados pelo Journal of American
Oil Chemists Society, em janeiro de 1974. Em 1978, acontece outra conferência no
Colorado, seguida de outros encontros de alto prestígio e grande público em
Singapura (1978), Amsterdã (1978) e Acapulco (1980). A produção cientifica na área
era intensa e a Soyfoods Association of North America, fundada em 1978, ajudou a
estimular a pesquisa e o interesse em produtos à base de soja por parte dos
consumidores. A maior parte do trabalho de comunicação para informação nutricional
ao leigo foi feita através de livros e pela mídia. Muitas empresas de proteína de soja
fizeram extensiva publicidade utilizando a televisão e outros recursos da mídia.

Gradualmente, o consumo de proteína animal começou a cair entre os consumidores
norte-americanos. No final dos anos 70, pesquisas de opinião mostravam que 3 a 5%
da população (7-10 milhões de pessoas) se consideravam vegetarianas, número três
vezes maior que na geração passada. A causa da mudança era sempre associada ao
fator saúde e, desde então, os produtos à base de soja se tornaram uma parte
importante da dieta norte-americana (SHURTLEFF; AOYAGI, 1976).

Mais recentemente, a pesquisa científica em soja, bastante fortalecida, se
voltou para o seu aspecto funcional, frente a outras doenças como câncer,
osteoporose e sintomas da menopausa.

Diante do contexto apresentado, fica evidente o papel da pesquisa cientifica no
incentivo ao consumo de soja. Segundo Henkel (2000), nos EUA as vendas de
alimentos à base de soja aumentaram devido a decisão do Food and Drugs
Administration de permitir a rotulagem de tais produtos como benéficos para prevenir
alguns tipos de doenças cardiovasculares (FDA,1999). Tal tipo de suporte de agências
reguladoras, com base em estudos científicos, traz atenção ao produto, apoio da mídia
e o conseqüente aumento de vendas, fato percebido com outros alimentos
previamente rotulados pelo FDA, como a aveia, considerada como alimento funcional
para problemas cardíacos e dislipidemias.

Como já mencionado, Daniel (2004) mostra que o consumo de soja foi, durante
muito tempo, restrito a comunidades ditas hippies e alternativas, nas quais muitos dos
membros eram vegetarianos ou faziam restrições ao consumo de leite e carnes em
geral. Mais recentemente, estudos de Gilbert (2001), Fass e Mount (2001)
relacionados por Daniel (2004) identificaram um novo consumidor de soja
especialmente preocupado com questões de saúde: 13% das mulheres e 11% dos
homens entrevistado na pesquisa de Fass e Mount consomem soja para prevenir
doenças e a identificam como um alimento saudável.

No Brasil, não existem dados concretos do perfil do consumidor, e segundo o
pesquisador José Marcos Gontijo Mandarino, da Embrapa Soja65, a quantidade de
soja invisível consumida no país não é muito diferente dos Estados Unidos. Com
relação aos alimentos industrializados, provavelmente 60% deles contenha algum
derivado de soja como ingrediente.

Não encontramos nenhum histórico das pesquisas que questionam o consumo
de soja, mas elas existem e no próximo item apresentaremos as controvérsias sobre
esse tema, que se acirram na época da reflexividade contemporânea.

3.2. Soja, food or fraud?

A arena de controvérsias científicas que cercam o tema da soja como alimento
saudável estimulou a reprodução aqui da expressão utilizada por Tansey e Worsely
(1995, p. 210), "food or fraud"? (comida ou fraude?). Tal uso se deve ao fato de que,
na realidade, não existe um consenso entre os pesquisadores da soja sobre a
questão, como parece ser o caso no quadro descrito no item acima. Se a história é
sempre contada pelos vencedores, como diz o ditado popular, vamos nos ater agora a
outros pesquisadores, os cautelosos, que parecem pouco considerados nessa arena.
Em pesquisa feita por nós em sites especializados, encontramos muitos
estudos favoráveis e contra a soja, capazes de confundir qualquer pessoa, leiga ou
especialista, quanto à inocuidade do consumo desse alimento. Parece haver muitas
desavenças e desafetos entre os pesquisadores, o que se configura como uma
dimensão muito interessante para ser avaliada.

Vários dos estudiosos que se posicionam contra a soja relacionam vínculos dos
pesquisadores e fundos de pesquisas com empresas produtoras de sementes e de
alimentos que a têm por base, sinalizando manipulação de dados, resultados
questionáveis e a formação de um lobby agroindustrial científico. Os pesquisadores a
favor da soja rebatem e questionam a qualidade dos estudos que se posicionam
contra seu consumo irrestrito. Essa arena está localizada, sobretudo nos Estados
Unidos, onde se concentram os maiores questionamentos sobre o tema.

No lado das pesquisas desfavoráveis ao consumo de soja, destacam-se três
autoras, nos EUA. A rigor, elas não são pesquisadoras, no sentido de trabalharem em
laboratórios, mas compilam pesquisas realizadas por autores que questionam a soja
como alimento saudável. Elas tornaram-se, porém, referência dentro do círculo de
discussão que questiona os benefícios da soja para consumo humano, divulgando
resultados de pesquisas e promovendo debates sobre o tema, especialmente nos
EUA, Austrália e Nova Zelândia. A mais conhecida, Sally Fallon, é autora do livro
Nourishing Traditions. May G. Enig é nutricionista, diretora do Nutritional Sciences
Division of Enig Associates, doutora pela University of Maryland, faz parte do American
College of Nutrition e do American Institute of Nutrition e da equipe de edição do
Journal of American Nutrition. Trabalha em conjunto com a nutricionista Kaayla Daniel,
doutora em Nutritional Science and Anti Aging Therapies, vinculada ao Union Institute
e à University of Cincinnati e autora do livro The Whole Soy Story. Além de seu capital
científico, acumulado em instituições acadêmicas, Daniel também atua em instituições
engajadas em ações de mobilização política a favor de uma alimentação de qualidade,
assim como Fallon, presidente da West A. Price Foundation, instituto situado em
Washington que promove pesquisa e educação nutricional com foco para o resgate de
práticas tradicionais de alimentação.

Compartilhando com essas autoras as preocupações sobre o tema, podemos
citar ainda Mike Fitzpatrick, bioquímico e toxicologista da Nova Zelândia, que iniciou
estudos sobre a toxicidade do grão em 1991, em um laboratório independente,
investigando a morte de pássaros raros em cativeiro alimentados com ração à base de
soja. Junto com a Dra Sue Dibb, da Food Commision em Londres, publicou um
paper66 e alguns artigos que questionam o consumo de soja, especialmente nas
fórmulas infantis (FITZPATRICK, 1998; 2000).

No outro lado do debate encontramos três importantes pesquisadores
dedicados aos estudos sobre soja e saúde humana, também nos EUA: Dr. Stephan
Barnes, Dr. Mark J. Messina e Dr. Kenneth Setchell.

Quando se busca o nome do Dr Stephan Barnes, relacionado ao tema da soja
e saúde humana, o número de referências em sites especializados chega a 66.300.
Barnes é professor nas áreas de Farmacologia, Toxicologia, Bioquímica e Genética
Molecular e de Ciências da Saúde Ambiental, na University of Alabama. É ainda
diretor do Purdue-UAB Botanicals Centers for Age-Related Disease Centers, centro de
estudos dos componentes da soja e outras plantas, apoiado financeiramente pelo The
NIH's Office of Dietary Supplements em colaboração com o National Center for
Complementary and Alternative Medicine, e recebeu o prêmio Lifetime Achievement
Award, no V International Symposium on the Role of Soy in the Prevention and
Treatment of Chronic Disease.

Já os sites relacionados à questão soja e saúde humana envolvendo o Dr.
Mark Messina superam a marca de 19.400 páginas disponíveis na rede. No site da
Soy Connection 67, Messina é apresentado como nutricionista formado pela Michigan
State University, em 1982. Ele dirigiu o departamento de Dieta e Câncer dos Estados
Unidos, o National Cancer Institute (NCI), e durante sua gestão organizou o I e II
International Symposium on the Role of Soy in Preventing and Treating Chronic
Diseases.68. Após esse simpósio, o NCI arrecadou fundos de pesquisa na área de soja
e saúde humana no valor de três milhões de dólares. Atualmente, trabalha como
palestrante e consultor devotado ao tema dos benefícios da soja para a saúde e
ministra aulas na Loma Linda University. Além disso, é consultor científico da Archer
Daniels Midland Company, da United Soybean Board e da fundação Produce for
Better Health, sendo co-autor do livro The Simple Soybean and your Health.

Kenneth Setchell, por sua vez, tem PhD em bioquímica dos esteróides pela
University of London e é considerado um dos pioneiros da pesquisa em soja e saúde
humana no mundo. Atualmente trabalha no Cincinnati Children's Hospital Medical
Center como professor do departamento de Pediatria, tendo recebido premiações no
III International Symposium on The Role of Soy in Preventing and Treating Chronic
Disease, em 1999, por sua contribuição no campo dos benefícios da soja para a saúde
humana e na área de pesquisa em soja e saúde da mulher. Em 2003, recebeu o
Roche International Award for Innovative Research in Human Nutrition (Prêmio Roche
de Pesquisa Inovadora em Nutrição Humana) por sua descoberta das diferentes
classes de fitoestrógenos. Entre suas publicações, consta a co-autoria do livro The
Simple Soybean and Your Health, junto com Virginia Messina e Mark Messina.

As conexões desses cientistas com a indústria de sementes e de alimentos à
base de soja parecem evidentes e são questionadas pela corrente que discorda dos
benefícios da soja não-fermentada. Para ilustrar o teor da rede de intrigas que envolve
pelo menos dois desses pesquisadores da soja, apontamos o site Political Friendstar,
uma paródia da rede social de relações internacionais Friendster. A sua versão
anônima denuncia jogos políticos e redes de relações e nela aparecem referências
aos nomes de Medina e Setchell e suas conexões políticas e jogos de interesse com
as indústrias de sementes de soja e associações como a National Cancer Association,
American Heart Association e United Soybean Board. Esse site de "fofocas políticas e
científicas" alardeia maliciosamente que "esses dois homens estão constantemente
citados como especialistas imparciais da soja. Na realidade, eles são pagos, e muito
bem pagos, para dizer o que eles dizem sobre a soja"69.

Assim, uma busca por pesquisas sobre a relação soja e saúde humana
denuncia tanto riscos iminentes, como aponta grandes vantagens da soja para
promover a saúde humana, tornando a questão uma caixa preta70 difícil de abrir.
Existe inclusive certa peculiaridade ao redor desses estudos, porque parece que
alguns cientistas já lacraram essa caixa preta, como se só houvesse certezas a seu
respeito.

Este é o caso, por exemplo, da relação entre soja e prevenção de doenças
cardiovasculares, propriedade assumida pelo FDA (1999) com base em pesquisa
como a de Clarkson (2002). O consumo diário da leguminosa tem sido também
associado à prevenção e ao tratamento de disfunções como hipertensão (CUTLER;
OBARZANEK, 2005); hipercolesteronemia (ZHUO et al, 2004; STEINBERG; BRAUN,
1999; KUROWSKA et al, 1999) e osteoporose (MESSINA, 2003). Na mesma linha,
pesquisa de Tham et al (1988) sugere que a presença de fitoquímicos na soja faz dela
um alimento funcional, capaz de atuar na prevenção dos sintomas da menopausa,
enquanto outros estudos afirmam que o consumo da soja ajuda a evitar o
desenvolvimento de alguns tipos de tumores como o de próstata (ZHUO et al, 2000;
HEMPSTOCK et al, 1999); de mama (WOOD et al, 2006; LAMARTINIERE, 2000; DO
et al, 2007); e do trato urinário (SU et al, 2000).

Ao lado, porém, dessas pesquisas que apontam os benefícios da soja para a
saúde humana, coexistem muitas controvérsias cientificas e conflitos que acreditamos
ser ainda pouco veiculados como tais. Assim, apresentaremos a seguir algumas
pesquisas contra o consumo a soja, bem como ressalvas e afirmações de
pesquisadores que lhe são favoráveis e de agências regulatórias como o FDA, cenário
que se configura em uma verdadeira rede de controvérsias.

3.2.1. Controvérsias da pesquisa em soja

Para ilustrar o cenário das principais controvérsias, compilamos neste item
estudos variados sobre os problemas relacionados ao consumo de soja para a saúde
humana.

Pesquisas científicas identificaram diferentes distúrbios nutricionais - como
interferência na absorção de minerais (LIENER, 1981; ERDMAN; FORBES, 1981);
inibição da enzima tripsina (RACKIS et al., 1985; ROEBUCK, 1987; ANDERSON;
WOLF, 1985; LIENER, 1979,1986; LIENER et al, 1988); acúmulo de cálculos renais
(MASSEY et al, 2001); e alergenicidade (VAN SICKLE et al, 1985; SAMPSON,
SCANLON, 1989) - que têm sido atribuídos à presença de oxalatos, fitatos e
inibidores endógenos de enzimas digestivas da soja não-fermentada. A fermentação,
utilizada pelos antigos chineses, desativaria parte dessas substâncias indesejáveis no
grão, uma vez que em produtos precipitados, os inibidores enzimáticos, concentramse
mais no líquido do que na massa do coalho.

As enzimas quimiotripsina e tripsina, produzidas pelo pâncreas, são
necessárias para a digestão das proteínas. No grão de soja são encontrados os
chamados fatores antinutricionais, que inibem a ação dessas enzimas, dificultando o
processo digestivo das proteínas no organismo. Por isso, atribui-se ao grão de soja
uma qualidade de baixa digestibilidade e alergenicidade. Os fitatos e oxalatos,
substâncias encontradas na soja, contribuem para inibir a absorção de minerais
durante o processo digestivo e, no caso específico do oxalato, ele pode vir a se
acumular em partes moles, como nos rins, formando cálculos renais (MASSEY et al,
2001).

Além da fermentação, a tecnologia dos alimentos também ameniza os fatores
antinutricionais da soja. Para melhorar a qualidade nutricional dos alimentos à base de
soja, procura-se desativar ou eliminar tais fatores através de tratamento térmicos ou
pela técnica de fracionamento químico durante o processo de industrialização.

Entretanto, os inibidores de enzimas que digerem a proteína são termoestáveis e
resistem ao calor. Por isso, a maioria dos alimentos industrializados à base de soja
mantém até 20% do Bowman-Birk (BBI), um inibidor das enzimas quimiotripsina e
tripsina, e do inhibitor de Kunitz (KT) que inibe a tripsina (FRIEDMAN; BRANDON,
2001). Para esses pesquisadores, entre os benefícios do consumo de soja estão sua
ação no controle do colesterol, o efeito anticarcinogênico do BBI e sua ação protetora
conta obesidade, diabetes, irritantes do trato digestivo e doenças dos ossos e rins.
Entre os efeitos adversos estão a baixa digestibilidade e a alergenicidade da proteína
da soja, a ação dos inibidores de enzimas e minerais, além do papel dúbio das
isoflavonas71. Porém, segundo esses autores, a tecnologia alimentar pode reduzir
esses efeitos indesejáveis.

O FDA, ao avaliar diversos estudos de Liener e colaboradores de 1986, 1988,
1995 e 1996 que sinalizam a relação entre a soja, o fator antitripsina e disfunções
como hiperplasia e formação de nódulos no pâncreas, decidiram que tais estudos
teriam efeitos limitados a animais, questionando se freqüentes exposições a níveis
baixos de inibidores de tripsina consumidos na dieta rica em soja teriam o mesmo
efeito apresentado nos estudos com animais.

A relação de fitatos na soja e sua ação bloqueadora de ferro apresentados em
estudos como o de Cook et al (1985) e Hurrel et al (1992) é questionada em estudos
como o de Lynch et al (1985) e Bodwell et al (1987) que não encontraram problemas
na absorção do ferro total a partir de uma dieta rica em soja, tornando a questão
inconclusiva. Também com relação à influência dos fitatos da soja na absorção de
zinco, a FDA (1999) assume que as pesquisas realizadas por Solomons et al (1992) e
Lo et al (1981) são de difícil interpretação de evidência; algumas por serem realizadas
em animais e outras ainda por não considerarem uma dieta mista que poderia suprir o
zinco eventualmente bloqueado pelos fitatos. Além disso, a agência reguladora norteamericana alega que muitos fatores da dieta influenciam na absorção de zinco.

Mesmo diante da afirmação de Friedman e Brandon (2001), citada acima, e do
documento do FDA (1999) com relação à inocuidade da soja, existem autores
intranqüilos que apontam outros problemas relacionados ao seu consumo.

Fitzpatrick (1998) ressalta que uma exposição maciça às isoflavonas tem
ocorrido nos últimos trinta anos através da incorporação de proteína de soja na
indústria alimentar. Ele aponta estudos dos anos 60 que mostram que bebês
alimentados à base de soja desenvolveram disfunções da tireóide, mas ainda não
identificavam quais eram os agentes causadores do distúrbio (VAN WYK et al,1959;
HYDOVITZ,1960; SHEPARD, 1960; RIPP, 1961; PINCHERA,1965). Pesquisas mais
recentes de Fort (1990), Ishizuki (1991), Chorazy (1995), Jabbar (1997), Divi (1997) e
seus colaboradores identificaram a isoflavona como um potencial agente na etiologia
das disfunções da tireóide em crianças. Outros estudos, como o de Keung (1995),
Cline et al (1996) e Cassidy et al, (1994), sugerem que a isoflavona inibe a síntese do
estradiol e de outros hormônios esteróides e podem causar distúrbios hormonais. Tais
estudos sugerem que a inocuidade da isoflavona precisa ainda ser comprovada.

No 63º Encontro Anual da American Society for Reproductive Medicine72, de
2007, o pesquisador norte-americano Jorge Chavarro apresentou uma investigação
sobre o efeito de alimentos derivados da soja e de isoflavonas na qualidade do sêmen
humano. O pesquisador alertou que o consumo de alimentos à base de soja estaria
relacionado à baixa concentrações de esperma, fato relacionado à diminuição da
fertilidade. Recentemente, o estudo de Chavarro e colaboradores (2008) foi publicado
na revista Human Reproduction. O estudo foi realizado com 100 homens, membros de
casais com problemas de fertilidade, que responderam a questionários sobre seu
consumo de soja nos três meses anteriores à pesquisa. Durante seis anos, foi
analisado o consumo de 15 alimentos à base de soja por homens em tratamento para
infertilidade. Os que ingeriam maiores quantidades apresentaram cerca de 41 milhões
de espermatozóides por ml a menos do que os que não comiam soja. A ingestão diária
do equivalente a meio copo (100 ml) de extrato de soja chegou a diminuir pela metade
a contagem de espermatozóides no sêmen. Nessa publicação, os pesquisadores
ressaltam que o grão aumenta a atividade de estrogênio, hormônio que pode ter efeito
negativo sobre a produção de gametas masculinos, principalmente dos homens
obesos, os quais produzem naturalmente mais estrogênio que os homens mais
magros. A obesidade, porém, poderia ser um dos fatores que modifica a relação entre
a ingestão de fitoestrógenos e a qualidade do sêmen dos homens ocidentais
estudados. O pesquisador aponta estudos que mostram que homens asiáticos, apesar
de consumirem mais fitoestrógenos e terem menor peso testicular e menor
concentração de esperma, não apresentam comprovado decréscimo em sua taxa de
fertilidade (e isso talvez por terem menor prevalência de obesidade, quando
comparados aos norte-americanos, apontam os estudiosos).

Pesquisadores também estão preocupados em estudar a ação de
fitoestrógenos da soja em bebês. Segundo pesquisa da equipe de Irvine (1998), o uso
de fórmulas infantis à base de soja é desaconselhável pela presença dos fatores
antinutricionais inibidores de crescimento e dos fitoestrógenos naturalmente
encontrados na soja. Esse estudo alerta que uma criança alimentada exclusivamente
com fórmulas à base de soja recebe o equivalente estrogênico (em base de peso do
corpo) de, pelos menos, cinco pílulas anticoncepcionais por dia. Setchell e
colaboradores (1998) ressaltam que a isoflavona da soja é rapidamente absorvida pelo
ser humano e que a exposição diária dos bebês à isoflavona, através do consumo de
alimentos infantis, está entre seis a onze vezes maior, em termos de peso do corpo,
do que a dose que provoca efeitos hormonais em adultos que consomem alimentos de
soja. As concentrações de isoflavonas circulando no organismo das crianças
alimentadas com fórmulas infantis à base de soja são de 13 a 20 mil vezes maiores do
que as concentrações de estradiol nas crianças alimentadas com fórmulas que levam
leite de vaca. A equipe de Santell (1997) completa dizendo que o nível de isoflavonas
no plasma dos neonatais alimentados com fórmulas à base de soja são comparados
aos níveis que causam efeitos estrogênicos significantes em animais de laboratório.
A partir desses estudos, a American Academy of Pediatrics (1998) e o
Ministério da Saúde Neozelandês publicaram diretrizes para o uso seguro das
fórmulas infantis à base de soja (FDA, 1999). Um comitê de especialistas em
toxicidade de alimentos do governo britânico, o Committee on Toxicity in Food(CoT)73,
publicou um parecer expressando preocupação acerca do uso de fórmulas infantis por
causa de seus potenciais riscos, com base nos estudos avaliados pelo toxicologista
Fitzpatrick. A Agência Food Standards, no Reino Unido, alerta sobre esses potenciais
riscos no desenvolvimento hormonal de bebês, assim como o Dr Richard Shape, do
Medical Reserarch Council`s Human Reproductive Science na Edinburgh University
(LAWRENCE, 2006).

Daniel Sheehan, diretor do Estrogen Knowledge Base Program do National
Center for Toxicological Research do FDA, também pede cautela na liberação do
consumo da isoflavonas da soja. Junto com seu colega Daniel Doerge, o pesquisador
alerta que a isoflavona, como qualquer estrogênio, pode conferir riscos e benefícios,
dependendo da idade:
Enquanto as isoflavonas podem ter efeitos benéficos em algumas
idades e circunstancias, tal fato não pode ser assumido como
verdadeiro para todas as idades. Isoflavonas são como qualquer
estrógeno, como uma faca de dois gumes, conferindo benefícios e
riscos (SHEEHAN apud HENKEL, 2000, p.2; tradução nossa ).
Apesar desses alertas, o pesquisador da Embrapa e especialista em
isoflavona, José Marcos Gontijo Mandarino, enfatiza que as isoflavonas são
eliminadas durante o processo de fabricação das fórmulas infantis à base de soja. No
extrato de soja, isso não aconteceria, pois ele é feito a partir do grão inteiro; no
entanto, nas fórmulas infantis feitas a partir da proteína, as isoflavonas seriam
desativadas, pois elas são solúveis no álcool utilizado para separar a parte protéica do
restante do grão74.

Uma segunda preocupação de pesquisadores foi explorada em estudo
realizado por médicos israelenses que encontraram séria carência de tiamina
(vitamina B1) em bebês alimentados exclusivamente com fórmulas à base de soja. Tal
carência foi a causa de um tipo de encefalopatia com danos cerebrais, que afetou
bebês israelenses e deu origem ao estudo. Os pesquisadores informaram seus
resultados ao Ministério de Saúde de Israel e a fórmula à base de soja utilizada por
todos os bebes afetados foi retirada do mercado. O ministro de Israel encaminhou
denúncias à Organização Mundial da Saúde, em 2003, mas até o final da publicação
do estudo, em 2005, nenhum outro detalhe adicional foi disponibilizado (FATTALVALEVSKI et al, 2005; WHO, 2003). Mais tarde, com base em uma análise de
pesquisas realizadas por um comitê de treze especialistas contratados pelo Ministério
da Saúde, o ministro de saúde de Israel encaminhou artigo publicado no British
Medical Journal. O artigo recomenda restrições no consumo de soja para o ser
humano e veto à utilização sem receita médica de fórmulas infantis à base de soja
(SIEGEL-ITZKOVICH, 2005). O parecer do CoT, bem como o do Ministério de Saúde
de Israel, tem base no princípio da precaução e não em evidências conclusivas.

Durante nossa pesquisa, tivemos a oportunidade de contatar o Dr. Gerald
Moy75, especialista da Organização Mundial da Saúde, que afirmou que a deficiência
de tiamina apontada na pesquisa israelense foi um problema isolado de controle de
qualidade e não deveria ser estendida a todas as fórmulas infantis à base de soja
existentes no mercado. Ele mencionou que a OMS/ WHO (2007) está consciente dos
problemas relacionados a bebês e fitoestrógenos na soja e sinalizou que alguns
países, como o Reino Unido, estão se mobilizando para retirar os fitohormônios
dessas fórmulas, mas que não existe nenhuma iniciativa no Codex Alimentar
relacionada a esse tema.

Parecem existir ainda mais controvérsias em pesquisas no campo da soja e
câncer de mama. Enquanto alguns estudos como o de Do et al (2007) e o de
Lamartiniere (2000) mostram que a soja oferece um efeito protetor contra câncer de
mama, outros mostram que os efeitos estrogênicos da isoflavona podem ser
perniciosos para mulheres com propensão a esse tipo de câncer (NISHIO et al, 2007;
PETRAKIS et al, 1996; DEES et al, 1997; LEE et al, 1991).

Com base nesses últimos estudos, algumas agências governamentais
pedem cautela sobre o tema risco de câncer e consumo de soja. O Ministério de
Saúde de Israel orienta mulheres com risco de câncer de mama a diminuir o consumo
de alimentos à base de soja; a French Food Agency pede rótulos em extrato de soja e
outros alimentos à base de soja advertindo seu uso em mulheres com histórico de
câncer de mama anterior ou na família; e a US Cornell University`s Center for Breast
Cancer and Environmental Risks recomenda cautela a mulheres com câncer de mama
que se automedicam com suplementos e alimentos à base de soja (DANIEL, 2004).

Clarkson e colaboradores (2004) rebatem as pesquisas e orientações acima
mencionadas, afirmando que a isoflavona é um fitoestrógeno de fraca ação
estrogênica, que atua como uma pílula anticoncepcional no organismo e, apesar de ter
estrutura química similar ao estrogênio, ela não age da mesma forma que o hormônio.
Além disso, esses cientistas defendem que as isoflavonas têm uma ação de
prevenção no câncer de mama e que as pesquisas que mostram crescimento tumoral
em fêmeas são feitas com animais e os seus resultados não podem ser estendidos à
raça humana.

Tal afirmação só aumenta a controvérsia, pois muitos estudos sobre a
inocuidade da isoflavona citados foram realizados em roedores. As diferentes espécies
de animais variam em sua absorção, distribuição, metabolismo e excreção, bem como
no seu tempo de desenvolvimento fetal, neonatal e puberal e na sua fisiologia
endócrina e funcional (DANIEL, 2005). Todos esses aspectos complexificam ainda
mais o tema, realimentam as controvérsias e demandam mais pesquisas - que são
realizadas em cobaias - tanto a favor, como contra a soja. Parece que quando os
efeitos são desfavoráveis (para ambos os lados), essa questão do estudo em cobaias
versus seres humanos, há muito discutida nos estudos de toxicologia, vem à tona.

Analisando os estudos disponíveis e as controvérsias, pesquisadoras do
Sprecher Institute for Comparative Cancer Research, Warren e Devine (2001)
ressaltam que alguns estudos da relação soja e câncer de mama em humanos não
sugerem nenhum risco. Entretanto, outros estudos apontam uma diminuição no risco
desse tipo de tumor em mulheres que ingerem soja, comparadas a mulheres que não
ingerem soja. Nenhum estudo em humanos sinaliza que o consumo de soja pode
aumentar a relação de risco de câncer de mama. Porém, as pesquisadoras relatam
que há problemas nesses estudos, pois só existiam, até então, dez pesquisas
referenciadas, e com um pequeno número de mulheres; além disso, a maioria delas
(oito) havia sido realizada com mulheres asiáticas, que têm menor tendência a câncer
de mama (não apenas por consumirem soja, mas pela sua qualidade de vida, como
um todo). No caso de estudos realizados com animais, alguns resultados apontavam
um aumento de incidência de tumores, e outros uma redução de incidência,
dependendo da idade e do tipo de animais. Isso sugere que a ação hormonal da
isoflavona da soja tem que ser avaliada em um contexto de maturidade sexual. Mas, o
final de todas essas discussões tende a conduzir sempre à mesma recomendação:
"mais estudos devem ser realizados". Enquanto a polêmica não se resolve, a indústria
de alimentos seleciona os resultados que lhe convém, para usá-los como estímulo à
venda à consumidores e especialistas da área da saúde desinformados.

O Food and Drugs Administration (FDA) e também a ANVISA, a Agência
Brasileira de Vigilância Sanitária, orientam o consumo diário de 25g de proteína de
soja por dia para prevenir doenças cardíacas e câncer (HENKEL, 2000). Daniel (2004)
rebate tais orientações, afirmando que nenhum povo jamais ingeriu tamanha
quantidade de soja não fermentada como a preconizada pela FDA e que os efeitos
desse alto consumo não são totalmente conhecidos. A nutricionista relembra que o
incentivo ao uso da soja começou a ser pesquisado a partir da avaliação dos
benefícios das dietas japonesa e chinesa, teoricamente ricas nesse alimento; porém,
um estudo de Nagata e colaboradores (1998) constatou que a quantidade de soja
ingerida pelos japoneses está muito abaixo da quantidade preconizada entre os
ocidentais. Esse levantamento detectou que a média diária do consumo de proteína de
soja, no Japão, situa-se em torno de oito gramas para homens e sete para mulheres,
valores próximos ao que Golbitz avalia (10,0 gramas). A Organization for Economic
Cooperation and Developments (1991) fala em 18g por pessoa por dia e Junshi e
colaboradores (1990) apontam 12 g por dia.

Um grupo de especialistas de Honolulu - Honolulu Asia Aging Study -
reportou um aumento de casos de demência entre idosos que consumiam grandes
quantidades de tofu. Essa constatação, aliada a estudos prévios de cultura celular
que apontam os fitoestrógenos como agentes protetores de declínios cognitivos,
estimulou uma pesquisa na região para esclarecer se o consumo de soja estaria aliado
aos casos de demência. Pesquisadores liderados por Hogervorst (2008) fizeram um
estudo entre idosos da região que confirmou os resultados do relatório. O estudo
também sinaliza que o grupo de idosos que ingeria tempeh (soja fermentada), ao invés
de tofu não apresentava a mesma taxa de demência.

Sem que tal fato nos surpreenda, há controvérsias a respeito da quantidade de
soja consumidas ente os chineses. Há regiões de baixo consumo, como aquela
delineada por Ye e Taylor (1995) e regiões de alto consumo, de até 300gr per capita,
segundo informações referendadas pelo pesquisador da Embrapa Soja, José Marcos
Gontijo Mandarino76.

Independente da real quantidade de consumo de soja entre os chineses, é
importante ressaltar que a China não escapa hoje do processo mundial de
urbanização acelerada, aliado à descaracterização da sua dieta tradicional e ao
agravamento de problemas de saúde relacionados a tal contexto. O país está
passando por uma notável e indesejada transição em direção a altas taxas de diet
related non communicable diseases ou doenças não transmissíveis relacionadas à
dieta, como diabetes, obesidade e hipertensão, processo que preocupa pesquisadores
e os ministérios da saúde e da agricultura (ZHAI et al, 2006). De qualquer forma,
parece existir uma pluralidade de realidades na China, especialmente quando
remetemos à dicotomia China urbana e rural, mas o estudo pode embasar o
questionamento sobre o real papel da soja em manter a proclamada saúde
cardiovascular dos chineses.

Se a soja chamou a atenção dos ocidentais a partir da dieta dos japoneses e
chineses, esse erro deve ser redimido, porque com certeza não era graças a um único
tipo de alimento que esses povos se mostravam saudáveis. Entre os orientais, a soja
não visa à substituição da proteína animal, pois eles também a incluem na dieta
através de fontes como ovos, algas, frutos do mar, carne de porco e frango. O efeito
positivo de baixas taxas de alguns tipos de cânceres, comuns nos países ocidentais,
entre os chineses da área rural, é relacionado por Yang (1997) aos benefícios da dieta
tradicional chinesa como um todo. Essa dieta incentiva o consumo de vegetais
grelhados e no vapor e restringe o uso de açúcar, carne e alimentos industrializados.
Outro fato que preocupa Fitzpatrick (1998) diz respeito ao tipo de soja
consumida na Ásia (Glycine soja), espécie de maior digestibilidade e mais baixo teor
de fatores antinutricionais, diferente da planta utilizada comumente pela indústria de
alimentos no Ocidente (Glycine max), facilmente ajustada a diversidade dos solos,
porém menos saudável como espécie alimentar. O FDA (1999) não pensa que esse
seja um fato relevante e replica afirmando que embora a composição da soja possa ter
mudado com o passar do tempo, as espécies modernas são cultivares adaptadas
dentro de um período suficientemente longo, o que garante a inocuidade do seu uso.

Diante desse cenário de controvérsias, a cientista responsável pelo centro
norte-americano de Segurança Alimentar e Nutrição Aplicada do FDA (Center for Food
Safety and Applied Nutrition - FDA), Elizabeth A. Yetley, tranqüiliza os consumidores
norte-americanos, dizendo que à medida em que novas pesquisas forem divulgadas,
as controvérsias serão resolvidas. Ela afirma que o FDA monitora as pesquisas em
andamento e à medida em que surgem mais estudos, novos ajustes são feitos para
que o público receba informações corretas: "nós assumimos essa responsabilidade
seriamente", diz a cientista (HENKEL, 2000, p.1, tradução nossa).

3.2.2 Do natural ao industrial

O uso da soja como fonte de proteína sempre foi enfatizado entre os adeptos
da alimentação natural e do vegetarianismo, substituindo formas animais de proteína -
carne, leite e ovos, apesar de que esse perfil do consumidor de soja vem mudando,
como acima mencionado (DANIEL, 2004). Porém, tanto o extrato como a proteína
texturizada de soja são produtos manipulados industrialmente e estão muito distantes
da imagem de natural que a eles é conferida.

No caso do extrato de soja, flavorizantes, corantes e adoçantes artificiais são
adicionados ao produto final para mudar seu gosto (amargo, com gosto de feijão) e cor
(acinzentada) originais. A proteína texturizada de soja, considerada um resíduo da
indústria de óleo, tornou-se hoje ingrediente chave em muitos produtos
industrializados e em alimentos à base de soja que imitam a carne. Sua produção tem
lugar em complexos industriais, onde uma pasta fluida de soja é misturada com uma
solução alcalina para remover sua fibra, que é então precipitada e separada utilizandose
um banho ácido em tanques de alumínio, sendo finalmente neutralizada numa
solução alcalina. Os coalhos resultantes são borrifados para serem secados sob altas
temperaturas para a produção de um pó rico em proteína. O processo final de
extrusão da proteína isolada da soja, sob altas temperatura e pressão, produz então a
proteína vegetal texturizada (WALLACE, 1971). Rackis et al (1979) sinalizam que
nitritos, potentes carcinogênicos, aparecem durante o processo de secagem por
borrifação e uma toxina chamada lisinoalanina é formada durante o processamento
alcalino da proteína de soja.

O FDA (1999) rebate tal afirmação, afirmando que muitas outras comidas
processadas contribuem para a ingestão total de nitrato em seres humanos e que
existe uma contribuição potencial secundária de proteína de soja em formar nitrito. A
agência ainda ressalta que nenhum estudo que documente os níveis de nitrito em
proteína de soja foi apresentado e que não percebe a necessidade de estabelecer
especificações para níveis aceitáveis desses componentes na proteína de soja.

Com relação à lisoalanina, o FDA (1999) afirma que os comentários sobre a
lisoalanina no documento de Rackis e colaboradores sinaliza a formação dessa
substância em proteína de soja utilizada para fabricar caixas de papelão, e não em
proteína de soja comestível. No alimento, não existem dados mensuráveis de taxas de
lisoalanina. Também levanta o fato de que se utilizando boas práticas tecnológicas
durante o processamento alcalino da proteína é possível minimizar os efeitos danosos
da lisoalanina e que pequenas quantidades dela aparecem também em
processamentos alcalinos de caseína e lactoalbumina (proteínas do leite).

Daniel (2004) ressalta, ainda, que muitos outros produtos industrializados à
base de carne, ovos, leite, grãos e verduras também sofrem tais processos que
incluem alta temperatura e pressão, solventes químicos e outras tecnologias
agressivas, mas tais produtos não conseguiram o rótulo de alimento saudável que a
soja carrega.

Outra questão polêmica é a de que a soja - especialmente o seu óleo - é rica
em ácidos graxos ômega-6 e pobre em ômega-3. Esse desequilíbrio entre os dois
ácidos levaria a diversas disfunções77. Muitos produtos (como batatas fritas, fast foods
em geral, sorvetes, maioneses e margarinas) à base desse óleo vegetal,
freqüentemente associado à promoção da saúde, podem estar relacionados a diversas
doenças indesejáveis, como apontam os autores na referência abaixo.

Diante dessas controvérsias parece apropriado lembrar que todos os
alimentos, inclusive a soja, são fórmulas químicas complexas, que podem ser
benéficas para muitas pessoas sob determinadas circunstâncias e condições de uso,
mas também podem ser prejudiciais se usadas de forma inapropriada. Nesse fato,
repousa um dilema científico central para nosso estudo: quando e em qual contexto os
estudos científicos podem assegurar que um alimento é seguro ou quando apresenta
riscos para a saúde?

3.3. O contexto político da produção e consumo de soja

Há que se considerar que questões políticas atravessam todo esse debate,
relacionando-se diretamente ao crescimento do mercado consumidor de soja, bem
como ao complexo técnico-científico que o legitima. Assim, apresentamos neste item a
rede política de apoio à pesquisa, vendas, marketing e consumo desse alimento.
Interessa-nos particularmente conhecer o contexto político que envolve a pesquisa e o
consumidor, contexto que leva a se reconhecer a soja como alimento saudável.
Para Martin e Richards (1995), quando a ciência e os cientistas - percebidos
tradicionalmente como neutros - são colocados dentro de uma disputa, isso se
caracteriza como um processo de politização da ciência, do perito e de seu
conhecimento. Mas o que pode também ocorrer é um tipo de "cientifização" da política,
ou seja, utilizar-se dela com interesses políticos. Isso pode ser percebido no caso da
soja. As pesquisas favoráveis sobre a soja foram determinantes para embasar
algumas propostas de políticas públicas no Brasil78, e também para justificar o fato de
que 60% dos alimentos industrializados contenham algum tipo de soja (prática que
estimularia o consumo). Nos EUA, tais estudos embasaram decretos e práticas de
rotulagem a favor dos alimentos à base de soja, não sem antes gerar alguma
polêmica, como será visto a seguir.

3.3.1. O contexto político da produção e consumo de soja no Brasil

No Brasil, é possível perceber a força da propaganda e do incentivo à pesquisa
e ao consumo de soja na alimentação humana, a partir dos anos 80. Para a rede de
pesquisadores em soja da Embrapa, muitos fatores contribuíram para que essa
leguminosa se estabelecesse como importante cultura, primeiro no sul do Brasil (anos
60 e 70) e, posteriormente, nos Cerrados do Brasil Central (anos 80 e 90). Dentre
aqueles que contribuíram para seu rápido estabelecimento, a Embrapa destaca:
(...) a semelhança do ecossistema do Brasil, fator que favoreceu o
êxito na transferência e adoção de variedades; os programas de
correção da fertilidade dos solos; os incentivos fiscais disponibilizados
aos produtores; o mercado internacional de farelo de soja para rações
em alta; a substituição das gorduras animais por óleos vegetais; o
estabelecimento de um parque industrial de processamento de soja e
de facilidades de mecanização total da cultura; o alto nível econômico
e tecnológico dos produtores de soja especialmente do Brasil central,
oriundos, em sua maioria, da Região Sul; e o estabelecimento de
uma bem articulada rede de pesquisa de soja, envolvendo o poder
público federal e estadual, apoiado financeiramente por empresas da
indústria privada como a Swift, a Anderson Clayton e a Samrig
(VIDOR et al, 2003, p. 2).

De acordo com Vidor e colaboradores (2003), o crescimento da produção e o
aumento da capacidade competitiva da soja brasileira sempre estiveram associados
aos avanços científicos e à disponibilidade de tecnologias ao setor produtivo, como
aconteceu em todo mundo. Até o final dos anos 60, a pesquisa com a cultura da soja
no Brasil era pouca e concentrava-se na adaptação de variedades introduzidas dos
EUA.

O primeiro programa consistente de pesquisa com a soja estabeleceu-se na
década de 50, no Instituto Agronômico de Campinas. O rápido desenvolvimento do
cultivo da soja no país, a partir dos anos 60, fez surgir um novo setor produtivo,
altamente demandante por tecnologias; entretanto, a pesquisa ainda não estava
estruturada para oferecer resultados na quantidade e na qualidade desejadas.
Consequentemente, os poucos programas de pesquisa com soja então existentes
foram fortalecidos e novos núcleos de pesquisa foram criados no sudeste e no centrooeste, principalmente (VIDOR et al, 2003).

De todas as iniciativas para incrementar e fortalecer a pesquisa com soja no
país, implementadas a partir dessa época, destacamos a criação da Embrapa Soja,
em 1975, que patrocinaria, já a partir do ano seguinte, a instituição do Programa
Nacional de Pesquisa de Soja. Além do programa de pesquisa da Embrapa Soja no
Paraná, outros programas de pesquisa com a cultura estabeleceram-se nessa mesma
década em diferentes instituições79. Com o advento da Lei de Proteção de Cultivares,
na década de 90, novos programas de pesquisa privados, dentro de empresas
produtoras de sementes, estabeleceram-se aqui, dentre os quais merecem destaque o
da Monsoy (do grupo norte-americano Monsanto), o da Syngenta (empresa suíça) e o
das multinacionais Pioneer e Milênia (VIDOR et al, 2003).

Segundo Vidor et al (2003), até 1970, a preocupação maior dos programas de
pesquisa de soja brasileiros era com a produtividade. No entanto, estudos mais
recentes sobre características nutricionais e nutracêuticas da soja levaram à promoção
do seu consumo via incorporação desse grão na dieta alimentar da população
brasileira. Ao perceber, porém, o limite de aceitabilidade do brasileiro devido ao sabor
do grão (e por ser uma planta exótica), o programa da Embrapa Soja se voltou para o
melhoramento das suas características organolépticas, com o apoio da genética e da
tecnologia de alimentos. A empresa se esforça hoje para propagar as qualidades
gastronômicas da soja e divulgar pesquisas científicas que destacam os benefícios
terapêuticos desse grão, através do apoio a pesquisadores em parcerias com diversas
instituições, treinamentos de culinária para grupos organizados, palestras sobre os
benefícios da soja em escolas, faculdades, entidades sociais e eventos técnicos e
promoção de visitas às instalações da Embrapa Soja, para se conhecer seus
laboratórios de pesquisa, considerados vitrines de tecnologia (EMBRAPA, 2007a).

Esse programa foi necessário para "mostrar ao leigo que a soja era um alimento
viável", como afirma a Dra Mercedes Panizzi (2007), pesquisadora da Embrapa Soja80.
Observe-se que a Embrapa dispõe de uma forte assessoria de comunicação,
com jornalistas que estimulam a veiculação, na mídia, das pesquisas desenvolvidas na
instituição sobre soja, e de reportagens sobre o tema.

3.3.2. O contexto político norte-americano da produção e consumo de
soja

O contexto político norte-americano de incentivo à produção de soja é
igualmente articulado e conhecendo-o podemos ter uma idéia da estrutura que
sustenta a rede de pesquisa científica nos EUA.

O reconhecimento da soja como alimento saudável pelo Food and Drugs
Administration (FDA, 1999) passou por um rigoroso processo de avaliação que
resultou na aprovação do grão como alimento saudável que previne doenças
cardiovasculares:
O caminho foi longo e exigente, constituindo-se numa detalhada
revisão dos dados clínicos humanos, coletados em mais de 40
estudos científicos conduzidos por mais de 20 anos. A proteína da
soja seria um dos raros alimentos que apresentam suficiente
evidência científica não só para qualificar o propósito do parecer da
FDA, mas para ultrapassar finalmente o rigoroso processo de
aprovação (ZREIK, 2000, p. 53).

A DuPont Protein Technology International81 encaminhou uma petição
submetida ao FDA requerendo um parecer, em termos de saúde, sobre as isoflavonas
da soja. Tal petição era baseada em afirmativas de que somente a proteína da soja
processada de maneira pela qual os fitohormônios isoflavonas se mantivessem ativos,
poderia resultar em um alimento com atividade hipocolesteronemica (que baixa os
níveis de colesterol no sangue). Evidência científica suficiente quanto às propriedades
da soja como redutora dos níveis de colesterol foi extensamente moldada pelo método
de metanálise, desenvolvido em 1995, pelo Dr. James Anderson e colaboradores
(1995), numa pesquisa financiada pela DuPont Protein Technologies International e
publicada no prestigiado periódico científico New England Journal of Medicine. A partir
desse episódio, Fallon e Enig (2000) apontam desvios ocorridos nesse caminho longo
e exigente.

Em 1998, a FDA fez um movimento para reescrever a petição da PTI.
O órgão federal removeu quaisquer referências a fitohormônios e
substituiu o parecer para proteína de soja. Um movimento
completamente contrário às regulamentações do órgão federal, uma
vez que a FDA está autorizada a emitir pareceres somente sobre as
substâncias apresentadas pela petição. A mudança abrupta de
direção foi, sem dúvida, devido ao fato de que um número de
pesquisadores, incluindo cientistas vinculados ao governo dos EUA,
encaminhou documentos indicando que as isoflavonas são tóxicas. A
FDA também recebeu, no início de 1998, o relatório final do governo
britânico82sobre fitoestrogênios que malogrou na busca de evidências
benéficas e adverte em relação à potencialidade de efeitos adversos
(Fallon; Enig, 2000).

Segundo as autoras, mesmo com a troca para a proteína isolada de soja, o
FDA foi forçado a rever as preocupações de cientistas quanto aos efeitos de outras
substâncias encontradas na soja. Uma das mais veementes contestações veio de
pesquisadores públicos ligados ao National Center for Toxicological Research83,
centro de pesquisa toxicológica do próprio FDA, que questionavam o método utilizado
na pesquisa e pediam rótulos de advertência nos produtos à base de proteína isolada
de soja. Entretanto, tais apelos foram rejeitados como injustificados.

O foco das estratégias de marketing apoiadas pela United Soybeans Board
(USB) é atingir empresários da indústria alimentar, chefs de cozinha e nutricionistas,
além de pessoas com bom nível de educação e de alto poder aquisitivo, uma vez que
uma maneira rápida de expandir a aceitabilidade de um produto é difundi-lo entre
membros bem informados e influentes. Considerando o perfil do consumidor de soja, a
ciência se torna uma estratégia de marketing e a indústria disponibiliza grandes somas
para apoiar pesquisas médicas que demonstrem os efeitos positivos de soja para a
saúde humana.

O Soy Health Research Program é um programa mantido pelo United Soybean
Board que estimula a pesquisa científica através da oferta de bolsas para
pesquisadores qualificados que se proponham a estudar o consumo de soja e seu
impacto sobre a saúde humana. Os cientistas submetem suas pesquisas à USB e, se
forem escolhidos, recebem premiações de U$10 mil. Em 2000, no primeiro ano do
programa, foram oferecidos U$1,2 milhões e, desde então, U$4 milhões já foram
investidos na área de pesquisa de soja.

A maioria dos estados americanos tem seus próprios centros de pesquisas
chamados de State Soybean Boards, que financiam estudos na área de soja e saúde
humana. Entretanto, segundo o Soy On Line Service84, as bolsas oferecidas por tais
centros são insignificantes quando comparadas ao incentivo que o Departamento de
Agricultora norte-americano oferece.

O Programa Norte-Americano de Promoção ao Consumo e Pesquisa de Soja
(USDA Soybean Promotion and Research Program) foi estabelecido pelo Soybean
Promotion and Research Order e autorizado pelo Soybean Promotion, Research, and
Consumer Information Act. Esse decreto foi legalizado em 9 de julho de 1990 e
autorizou o estabelecimento de um programa nacional de informação ao consumidor e
de promoção da pesquisa nacional sobre a soja. O objetivo do programa foi fortalecer
a posição do grão, manter e expandir o mercado local e estrangeiro e todos os
produtores devem obrigatoriamente destinar de 0,5 a 1% do preço líquido de mercado
da soja para tais programas. O total desse valor gira em torno de U$80 milhões
anualmente que contribuem para fortalecer e expandir o consumo de produtos à base
de soja.85

Segundo Fallon e Enig (2000), os Conselhos Estaduais da soja de diversos
estados americanos entram com outros U$2,5 milhões para pesquisas; também
companhias privadas contribuem nesta parceria. Firmas de relações públicas auxiliam
convertendo projetos de pesquisas em artigos para jornais e para propaganda e,
paralelamente, escritórios de advocacia fazem pressão para regulamentações
governamentais favoráveis. Dinheiro do Fundo Monetário Internacional financia
plantas industriais para processarem soja em países fora dos EUA, além de políticas
de livre mercado, permitindo um fluxo abundante de soja para destinos internacionais.
Tais investimentos têm tido um bom retorno e isso pode ser percebido no
aumento do consumo de soja e derivados em geral, já mencionado anteriormente.

O grupo responsável pelo site neozelandês acima mencionado, Soy on Line
Service, buscou contato com o ministro da saúde da Nova Zelândia, e endereçou, em
1994, um ensaio com pesquisas sobre a soja e suas repercussões na saúde humana
(focando especialmente na ação dos fitoestrógenos nas fórmulas infantis à base de
soja). Um memorando interno enviado pelo toxicologista responsável no Ministério da
Saúde, Dr. Jenny Shipley, indicava preocupação sobre o caso, mas ressaltava que tais
evidências, uma vez expostas, poderiam causar danos, especialmente na mídia.
Trechos dessa carta estão disponíveis no site da instituição e apontam a soja como
"um grande negócio, especialmente nos Estados Unidos e um produto comercializado
em redes internacionais".

Um memorando anterior, disponível na mídia local, já deixava claro que o
governo da Nova Zelândia desejava recuperar o controle da situação. Mais tarde, o
ministro continuou a afirmar no Parlamento e em público de que não havia razão para
preocupações. Mas, em novembro de 1998, outro fato colocou o ministro em uma
situação delicada. Grandes manchetes intituladas Soy Alert apareceram no NZ Herald,
o maior jornal do país. No artigo, foram veiculadas advertências sobre riscos
relacionados ao consumo de soja e doenças da tiróide e comprometimento no
desenvolvimento de bebês. O médico responsável pelo artigo, Dr. Tuohy, foi advertido
pelo primeiro-ministro, Jenny Shipley, e pelo ministro da saúde, Bill English, por
permitir a veiculação dessas informações.

Simpósios específicos que discutem o tema da soja na saúde humana são
promovidos regularmente e o foco das apresentações são pesquisas que incentivam
seu consumo, alegando-se sempre seus benefícios para a saúde humana, como o
International Symposium on the Role of Soy in Preventing and Treating Chronic
Disease anteriormente mencionado. As publicações do terceiro simpósio foram
apoiadas por bolsas educacionais originárias da Publication da United Soybean Board
e da Soyfoods Association of North América (MEDINA; ERDMAN, 2000). Mesmo com
a polêmica causada por estudos apresentados no simpósio, contraditórios à versão da
soja como alimento saudável, como os de Daniel e Doerge (1999)86 e por entrevistas
com representantes de entidades que questionam esses resultados87, o evento foi
considerado pelas indústrias de alimentos como um sucesso. A quarta, a quinta e a
sexta versões do evento já aconteceram em sucessivos anos.

Como o contexto europeu não pôde ser incluído nessa nossa pesquisa, ele não
será explorado nesse trabalho. No entanto, vale a pena informar que a União Européia
também dispõe de uma rede de incentivo à produção e ao consumo da soja,
especialmente na forma de BBS. Relatórios atualizados do mercado europeu de
bebidas à base de soja oferecem informações fundamentais para companhias que
buscam oportunidades nesse ramo. Informações competitivas (canais de distribuição,
tipo de marketing eficiente, perfil dos consumidores, produtores e varejistas) e
estratégias de marketing são oferecidas para todo tipo de empresas que produzem
bebidas à base de soja e non daires drinks.88

O quadro descrito nesse capítulo ilustra a complexidade política da arena onde
se constroem os termos de definição da soja como um alimento saudável. As
controvérsias aqui apresentadas não objetivam questionar a validade da ciência e
mesmo se apontam como nebulosas algumas das suas "verdades", revelam, por outro
lado, que a ciência contemporânea é construída e estimulada pelo debate. É
interessante ressaltar que tal debate é mantido por diferentes e inusitados atores que
fazem parte da rede da ciência e que, por muito tempo, foram desqualificados frente a
seus representantes mais evidentes. Para ilustrar tal afirmação, pretendemos, no
próximo capítulo, focar o contexto socioambiental que envolve o cultivo da soja, bem
como rastrear novos atores dentro da polêmica rede da pesquisa em soja.

CAPITULO 4

A SOJA COMO RISCO SOCIOAMBIENTAL

Este capítulo pretende se ater a aspectos de riscos não explorados até agora
nesta tese, e que contextualizam o tema da soja como um risco ambiental. Tratam-se,
na verdade, de riscos de caráter socioambiental vinculados ao padrão produtivo
moderno, que podem ser observados em vários tipos de cultivos de alimentos, e que
indiretamente, influenciam na saúde do consumidor e deveriam formatar o conceito de
alimento saudável, uma vez que "o equilíbrio do ambiente está irremediavelmente
ligado ao conceito de saúde humana" (SFEZ, 1996). Segundo esse autor, a prática da
saúde implica em uma percepção do meio e das condições positivas ou negativas
deste ambiente, ampliando as preocupações acerca do mundo ao nosso redor e
exigindo uma postura ética que regule os problemas identificados pelas novas
condições ambientais. Os vários conceitos de ecologia colaboram para expandir a
noção de saúde ambiental, voltada para essas preocupações. De acordo com a
Organização Mundial da Saúde, a saúde ambiental é "a parte da saúde pública que se
ocupa das formas de vida, das substâncias e das condições em torno do homem que
podem exercer alguma influência sobre a sua saúde e bem-estar" (WHO, 1999).
Considerando os conceitos de saúde ambiental e social como perspectivas que
formatam e ampliam o conceito de saúde humana, ressaltamos que o conceito de
alimento saudável (e também de saúde e qualidade de vida) está intimamente ligado
ao padrão produtivo. A necessidade de produzir alimentos saudáveis e, ao mesmo
tempo, preservar o meio ambiente e promover a inclusão social, frequentemente entra
em conflito com o modelo de produção de alimentos dominante.

Em trabalho anterior89, questionamos quão saudável é um alimento produzido
dentro de um sistema que polui as águas, o ar e o solo; que produz alimentos com alto
nível de contaminação química; que destrói florestas e afeta a biodiversidade; que
estimula a exclusão social e interfere indiretamente na saúde e na qualidade de via
urbana:
Estudos mais recentes sobre saúde, à luz de uma perspectiva socioambiental e
cultural, ampliam sensivelmente seu conceito e o direcionam para a noção de
qualidade de vida. (...) Analisando-se o meio rural sob a ótica da agricultura,
percebeu-se que o padrão produtivo vinculado a ela determina mudanças
significativas na qualidade de vida dos habitantes desse meio. (...) O padrão
moderno de produção e alimentos, com base no estímulo à modernização da grande
propriedade tradicional, apoiou a redução da demanda relativa de mão-de-obra
agrícola, inflacionou o preço da terra e expulsou agricultores da fronteira agrícola,
contribuindo para agravar as desigualdades sociais no meio rural. No plano
ambiental, a abordagem produtivista desse padrão ignorou a diversidade local e
interveio no meio ambiente, gerando conseqüências desastrosas sobre a
biodiversidade e qualidade dos alimentos, do ar e das águas. Essas conseqüências
repercutem sobre a saúde humana devido à contaminação dos alimentos e do
ambiente. Considera-se também que a incidência de algumas doenças concentra-se
especialmente entre a população socialmente vulnerável e excluída, a qual o
referido padrão contribuiu significativamente para formar (AZEVEDO, 2004, p. 57).
A partir da inclusão dessas dimensões no conceito de alimento saudável, este
capítulo segue explorando as controvérsias vinculadas ao padrão produtivo mais
disseminado da soja, abordando ainda o tema da soja transgênica, uma dimensão
legitima e atual de riscos e controvérsias cientificas.

4.1. As controvérsias na discussão socioambiental da sojicultura

Os maiores questionamentos sobre os impactos e risco socioambientais do
cultivo da soja aparecem veiculados por ONGs ambientalistas como o Greenpeace e a
Forest Conversion Initiative (WWF). Pensando que a problemática mundial da soja
requer soluções também mundiais, a Articulação Soja Holanda90 trabalha junto com
organizações na América do Sul, Europa, EUA, Índia e China. Desta maneira, essa
instituição tem contato com ONGs, movimentos sociais e ambientais sul-americanos,
organizações representantes de populações locais vítimas da expansão das lavouras
de soja, entidades representativas de agricultores familiares que cultivam soja,
organizações e movimentos que fazem campanha contra a política agrícola da
Organização Mundial do Comércio, além de organizações voltadas para as discussões
sobre a introdução e as conseqüências da soja transgênica.

Nesse sentido, a WWF contratou um estudo de impacto socioambiental da
soja, o qual foi desenvolvido pelo cientista holandês Jan Maarten Dros (2004) da
AIDEnvironment (agência de pesquisa e assessoria) e financiado pela Coop
Naturaplan Fund Switzerlan, (empresa suíça de alimentos orgânicos produzidos com
baixo impacto ambiental, que apóia projetos ambientais e de agricultura orgânica). Em
sua pesquisa, Dros (2002) afirma que a cultura da soja - uma commodity de grande
importância - se enquadra dentro do padrão produtivo moderno de agricultura que tem
por base a monocultura, o uso de insumos sintéticos em larga escala, a maciça
mecanização e a venda para exportação. A adoção de práticas agrícolas de grande
impacto ambiental na produção da leguminosa prevê conseqüências perceptíveis na
fertilidade do solo; na diversidade biológica da flora e da fauna; na poluição de
recursos hídricos; na destruição das florestas para dinamizar áreas de plantio; no
desequilíbrio do clima e, mais recentemente, no uso de sementes transgênicas, com
conseqüências sobre os habitats naturais e a saúde e qualidade de vida dos seres
humanos.

Para o pesquisador holandês, com a população mundial em crescimento, a
demanda por soja e seus derivados continuará em expansão. Portanto, a área
cultivada com soja deve aumentar, em detrimento de outras colheitas e à custa de
ecossistemas naturais. Como a China e os EUA têm pequenas reservas de terras
cultiváveis, as futuras expansões da produção de soja acontecerão, principalmente,
em países produtores da América do Sul: Argentina, Bolívia, Brasil e Paraguai. Com a
perspectiva do desenvolvimento do biodiesel em larga escala e uma promessa de
alavanca no cenário econômico do país, a situação da monocultura de soja tende a se
agravar ainda mais.

Nas décadas de 1970 e 1980, a expansão do cultivo da soja aliada a outras
monoculturas, causou o quase desaparecimento da Mata Atlântica no sul do Brasil.
Atualmente, a Mata Atlântica no Paraguai também está ameaçada pela expansão da
leguminosa, assim como as florestas baixas Yungas e Chiquitano, na Argentina e na
Bolívia. Tais ecossistemas representam uma grande diversidade biológica,
apresentam elevadas taxas de endemismo e são mundialmente singulares. A soja
constitui uma importante ameaça indireta para a floresta Amazônica (junto com o gado
e outras monoculturas) e sua expansão extrapola as fronteiras das florestas tropicais,
pondo em risco os biomas de savana da América do Sul. Ao contrário das florestas, as
savanas podem ser diretamente convertidas para o cultivo de soja, e milhões de
hectares do Chaco argentino e do Cerrado brasileiro, foram convertidos na última
década (DROS, 2002; FACCIO; SIJBRANDIJ, 2006).

Na Amazônia, tal impacto pode ser visto ao longo da BR-163, a rodovia que
liga a capital do Mato Grosso, Cuiabá, à Santarém, no Pará. A produção de soja ao
longo da parte pavimentada da BR-163 saltou de 2,4 mil hectares, em 2002, para mais
de 44 mil hectares, em 2005 - um crescimento de quase 20 vezes em três anos.
Segundo o estudo do Greenpeace (2006), Comendo a Amazônia (2006), as empresas
produtoras de soja, Cargill, ADM e Bunge são parceiras no financiamento do projeto
para pavimentar o restante da estrada, acelerando o acesso ao novo porto graneleiro
construído ilegalmente pela Cargill em Santarém. Uma segunda rodovia da soja,
construída ilegalmente, se estende por 120 quilômetros, saindo da cidade de Feliz
Natal, no Mato Grosso, até a fronteira oeste do Parque Indígena do Xingu. Tanto a
Cargill quanto a Bunge construíram silos com capacidade para armazenar grandes
quantidades de grãos e oferecem crédito e mercado garantido para qualquer fazenda
já desmatada na região.

A área plantada com soja no Brasil cresce ano a ano. Em 1990, a
leguminosa ocupava 9,7 milhões de hectares. Em 2006, era cultivada em 23,3 milhões
de hectares, a mesma área destinada ao cultivo de arroz, feijão, milho e algodão,
somados. As duas principais regiões produtoras de soja são o Sul e o Centro-Oeste,
ocorrendo nesse último o novo ciclo de expansão da soja, onde o clima e o relevo são
adequados para seu cultivo em grandes extensões e as áreas estão aptas para
agricultura em menos de um ano após o desmate (ver Figura 4.1, abaixo). Ao mesmo
tempo, o Centro-Oeste é uma região ecologicamente sensível e detentora de uma
grande biodiversidade. Segundo a ONG Conservação Internacional91, o cultivo de soja
no Cerrado acarreta na perda de 25 toneladas de solo por hectare ao ano, além de
afetar nascentes de rios e a qualidade de vida de 250 mil pessoas na bacia do Rio
Xingu. Até 2005, foram derrubados nessa área mais de 270 mil hectares de matas
ciliares, vegetação que margeia e protege os cursos de água (FACCIO; SIJBRANDIJ,
2006).


FIGURA 4.1 - ÁREA DE SOJA CULTIVADA NO BRASIL , 2003

(Nosso sistema operacional não permite a inserção de gráficos, figuras, fotos ou tabelas. Para ter acesso a esta figura, entre em contato conosco que enviaremos por e-mail: contato@portalorganico.com.br)

Fonte: CONAB. Disponível em: www.conab.gov.br
Acesso em: 5 mar. 2006

A dimensão socioeconômica também pode ser considerada na definição de
riscos, uma vez que tal padrão produtivo causa dependência dos agricultores das
empresas de tecnologia agrícola, evasão de povos nativos das áreas cultivadas e de
pequenos agricultores excluídos desse processo produtivo economicamente
insustentável.

No Brasil, pequenos produtores de soja utilizam a técnica de rotação com
outras colheitas anuais e as fazendas têm, em média, 30 ha (embora fazendas
familiares, situadas nas fronteiras agrícolas da região central do país e na Amazônia,
possam medir até 200 ha). O cultivo é parcial ou completamente mecanizado e quase
sempre na forma de monocultura. A agricultura familiar no Brasil gera um emprego a
cada 8 hectares (DROS, 2002).

A partir da década de 1980, porém, a produção de soja, em larga escala,
tornou-se a prática de produção dominante no país. Uma fazenda de soja no Mato
Grosso, o principal estado produtor no Brasil, é de 1000 ha, em média. Entretanto,
algumas fazendas de 10.000 a 50.000 ha foram, recentemente, estabelecidas naquele
estado, beneficiando-se de economias de escala. Este tipo de agricultura gera, em
média, apenas um emprego a cada 200 ha (DROS, 2002).
O comércio e o processamento mundial de grãos de soja estão concentrados
em um pequeno número de empresas multinacionais. Archer Daniels Midland, Bunge
e Cargill, nos EUA, e Louis Dreyfuss, na França, controlam 43% da capacidade de
processamento de soja no Brasil, e quase 80% na União Européia. Já as três
primeiras empresas norte-americanas acima citadas controlam 75% do mercado de
soja dos EUA (DROS, 2002).

Embora a soja seja geradora de riquezas, os recursos provenientes da sua
produção nem sempre chegam à base da pirâmide social. Para Dros (2002), a
segurança alimentar e os direitos de propriedade da terra de populações menos
favorecidas não apresentaram melhorias nas áreas onde houve a expansão da soja.
Nesse contexto, é possível questionar quão saudável é um alimento que promove a
poluição ambiental, a perda da biodiversidade e a exclusão social.

FIGURA 4.2. - FOTO DE PROPRIEDADES PRODUTORAS DE SOJA NO
BRASIL

(Nosso sistema operacional não permite a inserção de gráficos, figuras, fotos ou tabelas. Para ter acesso a este quadro, entre em contato conosco que enviaremos por e-mail: contato@portalorganico.com.br)

Pequena fazenda de soja, Santa Catarina Colheita mecanizada de soja em larga escala, MT
Fonte: www.koeller.com Disponível em Dros (2002).

Outra questão polêmica é a denúncia veiculada pelo Instituto Observatório
Social92 quanto ao emprego escravo em fazendas produtoras de soja na Amazônia. O
estudo do Greenpeace (2006) aponta a ligação entre multinacionais e fazendas que
plantam soja, explorando mão-de-obra escrava.

As Relatorias para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada, Água e
Terra Rural e para o Direito Humano ao Meio Ambiente, em decorrência de missão
realizada em 25 e 26 de agosto de 2005 em alguns municípios do Baixo Parnaíba,
levantou alguns aspectos que contribuem para as preocupações sociais relacionadas
ao cultivo da leguminosa. O objetivo de tal missão era averiguar denúncias de
violações de Direitos Humanos das comunidades da região devido à expansão do
agronegócio monocultor, principalmente a soja. Tais denúncias foram enviadas ao
governo federal, e entre outros problemas, verificou-se o alto grau de devastação
ambiental promovido pela sojicultura; a desagregação sócio-cultural da população
nativa da região, também promovida por esta monocultura; o intenso processo de
concentração de terras, inclusive através de ações de grilagem. Tais problemas
compõem um cenário de violação aos direitos humanos entre a população do Baixo
Parnaíba, como sintetizado no quadro a seguir, construído com itens retirados do
Relatório DhESC BRASIL (2005).

- QUADRO 4.1 -

RESUMO DO RELATÓRIO PARA OS DIREITOS HUMANOS À ALIMENTAÇÃO
ADEQUADA, ÁGUA E TERRA RURAL E PARA O DIREITO HUMANO AO MEIO
AMBIENTE, NA MISSÃO REALIZADA EM BAIXO PARNAÍBA

1. As famílias de trabalhadores rurais que tradicionalmente ocupam as terras do Baixo
Parnaíba há várias gerações, vêm sofrendo diferentes formas de ameaças a suas vidas, seja
pela intimidação que coloca em risco sua integridade física (uso da violência, verbal e
armada), seja pela que retira delas a possibilidade de sobrevivência (pressão fundiária e
degradação ambiental, incluindo mortes de animais, aspersão de agrotóxicos, utilização do
"correntão" no desmatamento, entre outras), por parte de produtores rurais que supostamente
compraram grandes extensões de terra para expulsar essas famílias do campo a fim de
permitir a instalação de projetos de agronegócio.

2. Essas famílias também têm sido vítimas de práticas de discriminação não só por parte dos
representantes do agronegócio, como também de alguns representantes do poder público
estadual, como membros da Polícia civil e militar, juízes e outras autoridades locais, conforme
diversos depoimentos realizados em audiência pública.

3. Foram constatados fortes indícios de problemas, tais como grilagem de terras públicas,
falsificação de títulos de propriedades de terra, intimidação de famílias com o objetivo de
expulsá-las de terras que vêm explorando de forma sustentável há várias gerações.

4. Foram constatadas: a exploração ilegal dos recursos naturais; desmatamento e destruição
do cerrado e das cabeceiras de rios; transformação indiscriminada de espécies nativas,
protegidas por legislação ambiental, em carvão para fins comerciais; utilização ilegal de
agrotóxicos, contaminando os rios e as plantações das comunidades locais, dentre outros.

5. Tais ilegalidades têm gerado conflitos fundiários e trabalhistas, concentração fundiária e de
renda, problemas ambientais que afetam diretamente a saúde e a segurança alimentar e
nutricional das comunidades, além da contaminação e assoreamento dos recursos hídricos
que abastecem a região do Baixo, além da destruição da vegetação nativa que serve às
populações tradicionais para fins nutricionais e medicinais.

6. Muito embora haja fortes indícios de fraude, com envolvimento de órgãos públicos,
autoridades locais e de Notários e Oficiais de Cartórios de Registro de Imóveis, na expedição
de títulos de propriedade e em análises da cadeia dominial de terras no Baixo Parnaíba, o
poder público estadual tem permanecido inerte.

Fonte: Relatório DHESC(2005)

Com objetivo de reduzir os impactos ambientais e sociais na produção de
volume significativo no mercado internacional de soja, e criar parâmetros e meios que
os implementem, através dos mecanismos de mercado, a Articulação Soja- Brasil93
realizou um debate nacional entre ONGs e movimentos ambientais e sociais, em 2004,
para determinar critérios que devam ser atendidos na produção dessa commodity (ver
quadro 4.2, abaixo).

- QUADRO 4.2 -

PROPOSTA DE CRITÉRIOS DE COMPRA PARA
REDUÇÃO DE IMPACTOS NEGATIVOS NA PRODUÇÃO DE SOJA

1.Só adquirirem produção de soja originada de áreas legalmente desmatadas antes de 31 de
dezembro de 2003. No bioma Amazônia, como definido pelo IBGE, só deve ser adquirida
produção de soja originada de áreas legalmente abertas/desmatadas até outubro de 1999.

2.Para a agricultura familiar será aberta uma exceção ao critério 1, acima, para plantios
originados de desmatamentos em propriedades de até 04 módulos fiscais (no Brasil), limitados
a 25% de sua área útil agricultável; propriedade produtora de soja não pode ter sido
constituída ou ampliada com a agregação de glebas inferiores a 200 ha, que tenham sido
adquiridas após outubro de 1999, principalmente se oriundas de lotes originalmente
produzidos para assentamentos da reforma agrária.

3.Os fornecedores de soja devem assinar uma declaração de que cumprem a legislação de
seus países no tocante ao meio ambiente e às relações de trabalho com seus empregados.
4.Não adquirirem de fornecedores que produzam em áreas onde existiu - sem que se
chegasse a uma solução considerada satisfatória pela parte mais fraca - ou ainda persista
conflito social pela posse da terra. Devem ser evitados fornecedores/produtores que
desalojaram populações tradicionais que ocupavam terras recebidas de seus ancestrais, mas
que não dispunham de título de propriedade.

4. Deverá haver total transparência quanto às operações comerciais realizadas em toda a
cadeia produtiva da soja; com os compradores produzindo e divulgando anualmente um
balanço social de suas ações. Nele deverá ser especificado o volume de compras de
produção originária da agricultura familiar brasileira.

5. No mínimo 20% das compras totais anuais desse grão devem originar-se preferencialmente
da produção da agricultura familiar e comercializadas através de suas próprias cooperativas.

6. Somente se enquadrarão como fornecedores para a cota acima mencionada, aqueles cuja
área cultivada com soja na agricultura familiar somente ocupar até 2/3 (dois terços) do total de
uso legalmente permitido da propriedade, evitando com isso o monocultivo que a
descaracterizaria enquanto forma de produção familiar.

7. A produção não pode ser originária de áreas onde existiam culturas perenes que tenham
sido desmatadas após 31 de dezembro de 2003.

8. A produção não pode ser originária de áreas úmidas, de alagados e banhados que sofreram
drenagem, após dezembro de 2003, para permitir seu uso agrícola.

9. Só devem ser adquiridas sojas convencional (não modificada geneticamente) ou orgânica.

10. Devem ser adotadas o que se denomina de "boas práticas agrícolas" (conforme padrões
da FAO, EMBRAPA, ATER, FMT, etc).

11. A partir de 2005, o plantio de soja deverá ser limitado a talhões de até 200 ha.

12. Ampliação da largura das matas ciliares, com objetivo de preservar a biodiversidade,
torná-las abrigos para avifauna e, mesmo, criar corredores ecológicos.

13. Nenhum empregado na produção agrícola deve receber menos de 04 salários mínimos
mensais. Os empregados devem ter participação nos resultados, com 2% do faturamento
sendo a eles distribuídos através de mecanismos de participação e incentivo.

14. Empresas fornecedoras de insumos (agroquímicos, sementes, etc) que sejam do grupo
empresarial, comprador de soja devem adotar, na concessão de créditos ao produtor, os
mesmos critérios acima preconizados.

Fonte: http://www.cebrac.org.br/forumnovo/docs/CriteriosResponsSoja.pdf
Acesso em: 5 nov. 2007.

Até o momento não se sabe se ou como esses critérios foram incorporados na
prática produtiva da leguminosa, mas eles podem ilustrar a discussão de caráter
socioambiental que envolve a produção de soja.

Observe-se que as controvérsias que permeiam essa discussão socioambiental
aparecem não somente entre os ambientalistas e as instituições de incentivo ao cultivo
de soja, mas também dentro das próprias instituições de pesquisa e fomento a
produção.

De acordo com a apresentação de Fábio Trigueirinho94, durante a Mercosoja
realizada na Argentina, em 2006, a visão ambiental ignora as discussões que se
perpetuam desde a época da revolução verde sobre a necessidade de suprir a
demanda de alimentos, face ao crescimento populacional; nesse sentido, afirma que a
discussão atual sobre sustentabilidade está desequilibrada. Segundo Trigueirinho, as
ONGs ambientalistas atuam sobre elos isolados da cadeia produtiva para pressionar
os produtores e exportadores a adotar critérios de responsabilidade e sustentabilidade
ambiental. Tais critérios incluem certificação de produtores que seguem as normas
ambientais e sociais para evitar os fatos denunciados, como utilização de trabalho
escravo; perda de biodiversidade; destruição de florestas; ameaça às populações
tradicionais; contaminação de água e solo; erosão e degradação do solo; aquisição
ilegal de terras e violência no meio rural causada pelo cultivo de soja. Para o
secretário da ABIOVE, tal demanda promove a perda de competitividade de produção
de soja brasileira que, por sua vez, também geraria outros riscos em várias
dimensões: comercial (perda de importantes mercados importadores de soja); social
(diminuição de emprego e renda nas regiões produtoras); institucionais (crescimento
da imagem negativa da empresa produtora de soja e de seus produtos no mercado
internacional, no caso de não seguir a certificação proposta); e econômicos
(implementação de sistemas de certificação não remunerados com impactos nos
custos de produção).

Trigueirinho (2006, p. 31-32) utiliza afirmações de impacto no seu discurso -
"quando o agricultor está no vermelho, não tem como cuidar do verde" - e aponta a
necessidade de co-responsabilidade do Estado: "o governo brasileiro não concede
subsídios para manter o meio ambiente, a renda do produtor (seguro agrícola) ou para
cobrir os prejuízos com condições climáticas adversas (garantia de preço)".

O secretário da ABIOVE afirma que a sustentabilidade pode se transformar em
uma grande barreira técnica ao comércio internacional. Ele menciona que a discussão
está desequilibrada, porque os fatos denunciados (acima expostos) são exceção, não
representam a realidade da maioria dos produtores de soja, além de que há distorções
nos fatos sobre a produção de soja no Brasil e que os aspectos positivos dessa
produção são omitidos.

Com relação à ação da soja na destruição da floresta, Trigueirinho (2006)
utiliza dados do Instituto de Pesquisas Especiais e de outras fontes, como uma
entrevista de Antonio Ermínio de Moraes95, em que ele afirma que a Amazônia ainda
conserva mais de 70% de sua área preservada; que as áreas de preservação ao redor
dos rios aumentaram e que o uso do solo foi sensivelmente restringido. Ele ainda
acrescenta que o código florestal não consegue conter o desmatamento por causa da
dificuldade em se definir direitos de propriedade na Amazônia (e outras regiões nos
país) e que algumas ONGs superestimam o papel da soja no desmatamento da
floresta Amazônica. Segundo Trigueirinho, a agricultura local de subsistência, a
pecuária e a extração de madeiras são aspectos que se equiparam ao nível de
desmatamento provocado pela agricultura mecanizada de soja (e também a de
algodão, ressalta). A soja, segundo dados do IBGE e do INPE utilizados na
apresentação do secretário da ABIOVE, ocupa somente 1,2% (6 dos 510 milhões de
hectares) da área total da Amazônia Legal, basicamente em cerrados ou áreas de
transição entre o cerrado e a floresta.

Quanto à erosão dos solos, Trigueirinho (2006) afirma que o plantio da
leguminosa não degrada o solo e sinaliza que 43% da soja brasileira são cultivadas no
esquema de plantio direto96 e outras técnicas que evitam a erosão. Além disso, para
ele, os agricultores protegem as áreas próximas aos rios, fazem processos benéficos
de correção da acidez do solo e utilizam a soja para equilibrar a fertilidade do solo
entre o plantio de cana e pastagens, criando um ciclo produtivo saudável e equilibrado.
O uso dos defensivos97 por parte dos agricultores é equilibrado e eles estão
conscientes dos problemas causados por essas substâncias. A extensão rural orienta
a utilização do controle integrado de pragas98 que minimiza o uso de agrotóxicos e
somente um pequeno número de aplicações de agrotóxicos é feito com aviões, mas
todo cuidado é tomado quanto à direção dos ventos para evitar disseminação do
veneno. Trigueirinho afirma também que são necessários estudos científicos que
comprovem a contaminação da água causada pelas aplicações aéreas, e que se elas
fossem realmente perigosas os Ministérios do Meio Ambiente, da Saúde e da
Agricultura, que controlam o uso de defensivos, já teriam suspendido esse tipo de
aplicação. E finaliza afirmando que "a preservação da biodiversidade transcende a
qualquer programa especifico de soja e passa necessariamente pela criação de
incentivos financeiros para a preservação do meio ambiente" (p. 35).

Contradizendo algumas das afirmações de Trigueirinho, a cartilha de
orientações para o plantio de soja da Embrapa (2007b, p.21) indica que a monocultura
da soja "tende a provocar a degradação física, química e biológica do solo e a queda
da produtividade das culturas e proporciona condições mais favoráveis para o
desenvolvimento de doenças, pragas e plantas daninhas". Segundo dados da
empresa de pesquisa, o ideal na produção deveria ser a rotação da soja com outras
culturas, mas nas regiões dos Cerrados predomina a monocultura de soja entre as
culturas anuais; o método mais utilizado para controlar as invasoras é o químico, isto
é, o uso de herbicidas. O manual apresenta 37 pesticidas utilizados para o controle de
plantas daninhas na soja, assim como as técnicas e as quantidades adequadas de
uso. Suas vantagens, diz a cartilha "são a economia de mão-de-obra e a rapidez na
aplicação" (EMBRAPA, 2007b, p. 123). Já no controle de insetos, o método de
controle integrado de pragas99 também é priorizado pelos técnicos da Embrapa, que
não deixa de apresentar também outra lista de 10 tipos de herbicidas. Para outros
tipos de doenças causadas por bactérias, vírus, fungos e nematóides que atacam a
cultura são fornecidas especificações de uso de drogas como fungicidas e nematicidas
(EMBRAPA, 2007b).

Sobre as questões sociais, Trigueirinho (2006, p. 33) afirma que há um efetivo
controle do Ministério de Trabalho quanto ao trabalho escravo na produção de soja,
porque o trabalho é "altamente especializado e bem remunerado". Porém, "por
precaução, as indústrias processadoras de soja estabeleceram nos contratos de
compra de matéria primas que os mesmos serão nulos caso haja uso de trabalho
escravo". Ele ainda mostra dados do IBGE que ressaltam que os municípios do estado
do Mato Grosso com maior índice de IDH têm como base econômica a agricultura
empresarial com foco para a soja. Seu texto termina com a afirmação de que, por ser
a fonte de proteína mais barata do mundo, a soja exerce um papel de destaque no
desenvolvimento social e econômico dos países em desenvolvimento.
Essa não é a opinião da Associação Brasileira dos Produtores de Soja
(APROSOJA), uma associação que estimula o cultivo da leguminosa e que se mostra
preocupada com questões socioambientais que envolvem seu plantio no estado do
Mato Grosso. A APROSOJA desenvolveu um programa de sustentabilidade
socioambiental que tem como objetivos: elaborar um plano estratégico ambiental,
definindo estratégia de abordagem de temas críticos e ações de curto, médio e longo
prazos; participar e discutir soluções para o tema em entidades estaduais, nacionais e
internacionais de meio ambiente; avaliar ações pontuais na área e analisar sua
replicabilidade para todo o estado; buscar aproximação com organizações moderadas
de sustentabilidade e formatar e executar estratégias para educação ambiental dos
associados. A Associação tem um planejamento em construção que objetiva adotar
medidas e estratégia para melhorar a imagem socioambiental da cadeia de soja até o
final de 2009 (APROSOJA, 2007).

Percebem-se resultados de ações efetivas para o controle do desmatamento
da Amazônia para o plantio a soja no ano de 2008, que foram veiculados no site do
Greenpeace100. O Grupo de Trabalho da Soja (GTS)101 anunciou em março desse ano,
os primeiros resultados do monitoramento de áreas recém-desmatadas em regiões
produtoras da soja na Amazônia brasileira, com evidências de que a referida safra não
viria de novos desmatamentos no bioma. O GTS foi criado para viabilizar a
implementação da Moratória da Soja, anunciada pelas grandes traders do setor em
julho de 2006 para combater o desmatamento no bioma Amazônia.


A moratória da soja é um compromisso da Associação Brasileira da Indústria
de Óleos Vegetais (Abiove), Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec)
e suas empresas associadas (responsáveis por mais de 90% da soja comercializada
pelo Brasil) de não comercializar a soja da safra plantada a partir de outubro de 2006,
oriunda de áreas que forem desflorestadas dentro do Bioma Amazônico. Tal decisão
representa um ganho dos que lutam em um dos lados que alimentam as controvérsias,
as quais, porém, estão longe de se encerrarem.

4.2. A soja transgênica

A questão da transgenia é outra abordagem de riscos relacionados à soja que
merece ser discutida nesse trabalho. Apesar de se constituir em uma dimensão de
risco legítima, ela não tem sido central na discussão sobre as conseqüências da soja
na saúde humana anteriormente apresentada. Por outro lado, acreditamos que o
debate em torno dos transgênicos suprimiu a importância de muitos dos riscos
inerentes ao cultivo e ao consumo de soja em geral.

Há quem defenda que o cultivo de soja orgânica pode minimizar alguns tipos
dos riscos ambientais e sociais acima explorados, especialmente se ela não for
cultivada como monocultura e estiver vinculada à agricultura familiar102. Entretanto, as
controvérsias relacionadas às pesquisas científicas sobre soja e saúde humana se
estendem igualmente a soja orgânica.

A modificação genética da soja transgênica mais comercializada atualmente -
soja RR ou Roundup Ready - tem por objetivo o aumento da resistência da planta ao
herbicida glifosato. Tal mudança objetiva facilidade no manejo da cultura, ao permitir
um menor número de aplicações do glifosato, que resultaria em menores custos de
produção e menor impacto ambiental. Apesar da grande difusão de soja transgênica
em alguns países, os resultados econômicos dessa cultura apresentam-se ainda muito
controvertidos, principalmente se vistos sob dois aspectos: o pagamento de royalties à
empresa que detém a patente das sementes, onerando os custos de produção, e a
perda de produtividade em comparação com as sementes convencionais (PELAEZ et
al, 2005).

Para ampliar a discussão, esse item vai abordar os alimentos transgênicos em
geral, pois acreditamos que a arena de controvérsias a respeito do tema transcende a
soja transgênica, mas que nela se ajusta perfeitamente. Assim, apresentaremos duas
posições antagônicas sobre os transgênicos, que não esgotam o assunto, mas que
oferecem uma visão das posições em confronto.

4.2.1. Análise de riscos dos alimentos transgênicos

Como já mencionado anteriormente, os tipos de riscos relacionados aos
alimentos transgênicos, incluindo a soja, expressam resultados de divisões políticas
transatlânticas (EUA versus União Européia); científicas (ciência sistêmica versus
reducionista) e institucionais (domínio público da ciência versus sistema de acesso
livre e compartilhado de produção de idéias).

Os tipos de riscos relacionados aos alimentos transgênicos, de forma geral,
dependem do local. Nos países do hemisfério norte, as repercussões ambientais e
sobre a saúde humana relacionadas à perda de biodiversidade e danos a outras
espécies, além das possíveis alergias e novas formas de toxicidade nos alimentos
produzidos transgenicamente, dominam o debate dos riscos. Os críticos da transgenia
estão preocupados principalmente com o potencial dano ambiental causado pelo
cruzamento de colheitas de transgênicos com espécies relacionadas ou pelos seus
efeitos em outras partes do ecossistema. Outros discutem que os alimentos
geneticamente modificados não foram avaliados com profundidade e tempo suficientes
quanto à presença de possíveis substâncias tóxicas e alergênicas. A luta por uma
regulação é compreensível, não só por causa dos grandes problemas relacionados a
riscos alimentares recentes, como a BSE (doença da vaca louca), mas também
porque a definição de normas é sempre um valioso território político. A discussão tem
por base as incertezas que envolvem a regulação baseada na ciência - science-based
regulation - e o principio da precaução103 (TRIPP, 2000).

No hemisfério sul predominam as questões de ordem socioeconômica
referentes à incapacidade dos transgênicos de mudar o cenário da fome no mundo e
por estimular ainda mais o cenário de dependência e exclusão social dos agricultores,
já conhecido e construído frente às tecnologias agrícolas modernas (uso de híbridos,
agrotóxicos, fertilizantes, enfim, o pacote da Revolução Verde).

O quadro abaixo resume as preocupações dos transgênicos em uma variedade
de tópicos:

- QUADRO 4.3 -

RESUMO DOS RISCOS DOS TRANSGÊNICOS

1. A biotecnologia não pode prometer melhora no acesso a alimentação por parte de
populações carentes, uma vez que a restrição maior diz respeito à distribuição de
recursos e não a produção de alimentos.

2. As lavouras transgênicas representam significativos perigos ambientais e podem
também impor alguns riscos inaceitáveis para a saúde dos consumidores.

3. A disseminação das lavouras transgênicas irá, no futuro, aumentar o uso de agentes
químicos externos, que são perigosos do ponto de vista ambiental e impróprios para
utilização pelos pequenos agricultores

4. Culturas transgênicas levarão a dependência por parte de empresas produtoras de
sementes que podem tirar proveito dos agricultores; regimes de propriedade
intelectual emergentes tendem a limitar a habilidade dos agricultores de salvar e
reutilizar suas próprias sementes.

5. A tecnologia de plantio de transgênicos desconsidera as técnicas de agricultura
tradicionais e a noção de biodiversidade, noções base da agricultura que manteve os
agricultores por muitas gerações.

Fontes: CHRISTIAN AID (1999); ACTIONAID (1999); ACTIONAID (2000); CORNER
HOUSE (1998) apud TRIPP (2000).

Voltando à soja, dados de pesquisa mostram que para o consumo humano, os
norte-americanos utilizam mais a soja convencional. Os principais mercados
consumidores de soja (Europa e Japão) têm-se mostrado relutantes em aceitar
produtos geneticamente modificados. Esses mercados estariam inclusive dispostos a
pagar mais pela soja convencional na forma de um prêmio, que constituiria um
incentivo ao cultivo dessa variedade. Ao mesmo tempo, alguns países rejeitam
completamente a soja transgênica (PELAEZ et al, 2004).

A Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Paraná divulgou um artigo em
2004 que mostra que os Estados Unidos estavam perdendo mercado, porque sua soja
é basicamente transgênica. As exportações norte-americanas, em 2004,
(janeiro/agosto) tiveram uma queda de 41,5% em volume, caindo de 16 milhões de
toneladas para 9 milhões de toneladas, em comparação a igual período de 2003.
Tiveram também uma redução de 14,7% no preço médio por tonelada. Mais
significativa ainda é a redução de vendas dos Estados Unidos para a União Européia
no mesmo ano. As exportações caíram de 2,2 milhões de toneladas para apenas 937
mil toneladas. O mesmo aconteceu com as vendas para a China, com dramática
queda de 5 milhões de toneladas para 2,2 milhões de toneladas (SEAB, 2004).

Apesar da expectativa inicial de menor utilização de herbicidas nas variedades
transgênicas, na prática o consumo de herbicidas na cultura da soja RR tende a ser
superior ao da soja convencional. No caso dos EUA, tais valores apresentam grande
variabilidade entre os diferentes estados produtores, situando-se entre -30% e +60%,
enquanto na Argentina esse valor chega a ser de +180%. Alguns estudos têm
mostrado que a soja transgênica utiliza em média 11% mais herbicidas que os
sistemas convencionais. Dados de Qaim e Traxler (2003) apontam o número de
aplicações de herbicida na soja transgênica como sendo 16% maior que na soja
comum. A quantidade de litros de herbicida por hectare aplicado na soja transgênica
chega a ser 248% maior do que na soja convencional. No caso do Brasil, os
produtores gaúchos, para plantar soja transgênica, tiveram que aumentar o consumo
de glifosato em 94%, nos últimos quatro anos, embora sua área semeada tenha
crescido apenas 19,5%. Enquanto isso, o Paraná, que não planta soja transgênica,
teve um incremento de 27,5% em sua área semeada e só aumentou a utilização de
glifosato em 12,7% (SEAB, 2004; PELAEZ et al, 2004). Segundo Benbrook (2001),
citado por Pelaez et al (p. 209), "o uso de herbicidas em culturas de soja RR está
aumentando gradualmente em função da variabilidade das ervas daninhas,
crescimento tardio de algumas ervas daninhas e perda de susceptibilidade ao glifosato
em algumas dessas espécies".

A soja transgênica apresenta, por sua vez, custos de produção de 7% a 20%
menores do que os da soja convencional. Já a produtividade dessa variedade
mostrou-se até 12% superior à da transgênica. A soja não geneticamente modificada
brasileira tem maior produtividade que a soja transgênica americana, produzindo na
safra 2004 a média de 2.820 kg/ha, enquanto os americanos produziram 2.280 kg/ha.
No Brasil, os sojicultores gaúchos que plantaram soja transgênica na safra 2003/2004
produziram apenas 1.400 kg/ha, produtividade muito menor que a da soja
convencional do Paraná que, na mesma safra, teve rendimento de 2.550 kg/ha (SEAB,
2004; PELAEZ et al, 2004).

Ainda com relações aos aspectos econômicos, a SEAB (2004) apresenta três
dimensões de risco a serem analisadas. O preço da semente de soja transgênica é
maior que o da soja convencional. Nos últimos anos, em todo o mundo, o preço da
semente transgênica vem subindo mais que o da comum. Quando a soja transgênica
começou a ser plantada nos Estados Unidos, o produtor pagava US$ 6,00 por bushel
(saca de 27,5 quilos). Em 2004, o preço chegou a US$ 33,00 por bushel.

A patente também tem custos elevados para o produtor que paga os royalties
na compra das sementes ou na fase de comercialização. No Rio Grande do Sul, os
royalties levaram cerca de 50% dos lucros dos produtores gaúchos, representando um
custo de 3,8% no preço de cada saca comercializada, em 2003. Nos Estados Unidos,
este custo já chega a 18% por saca vendida. Os agricultores do Paraná, que só
plantaram soja convencional na safra de 2003/2004, produzindo 10 milhões de
toneladas, deixaram de pagar R$ 60 milhões de royalties para a Monsanto (SEAB,
2004).

Prevê-se que na safra 2008-2009, os produtores de sementes geneticamente
modificadas terão um aumento significativo nos custos de produção, puxado pelo
incremento nos preços dos defensivos à base de glifosato. O preço da embalagem de
20 litros do Roundup aumentou de R$ 249,56, em agosto de 2007, para R$ 348,00,
em agosto de 2008. O produtor de soja transgênica também arcou com um custo
maior na aquisição de sementes, já que são impedidos de multiplicá-las pela lei de
patentes. Para essa safra, a Monsanto anunciou que aumentará em 17% o royalty da
soja transgênica. A cobrança da taxa passará de R$ 0,30 para R$ 0,35 por quilo, já os
agricultores que plantarem soja modificada a partir de semente própria deverão
repassar 2% do valor de sua colheita para a empresa. Só no Rio Grande do Sul a
empresa deve recolher mais de R$ 100 milhões dos agricultores. Em Cruz Alta (RS), o
preço da semente (já com o custo do royalty incluído), subiu de R$ 69,95 para R$
85,29 por hectare104.

Por fim, o mercado da soja brasileira corre outro tipo de riscos com a soja
transgênica. O Brasil conquistou os mercados europeu e asiático pela qualidade de
sua soja convencional e pelos custos competitivos. O país pode perder esse mercado
e ficar na dependência de vender apenas para quem compra soja transgênica,
perdendo competitividade por deixar de produzir um produto diferenciado. Além do
mais, com a soja transgênica os agricultores locais ficarão na dependência tecnológica
das sementes patenteadas e herbicidas produzidos por empresas dos EUA, país que
é o principal concorrente brasileiro. Ou seja, a tendência é o país se colocar nas mãos
de seu maior concorrente pelo mercado mundial. Como os Estados Unidos plantam
soja transgênica em larga escala, eles podem controlar as cotações de soja
transgênica em épocas de maior produção. Mas, não podem influir no mercado de
soja convencional. Além disso, o governo norte-americano subsidia o seguro agrícola
de seus produtores com 40% do valor e garante, no local da colheita, um preço
mínimo consistente. O Brasil não tem condições de oferecer as mesmas vantagens.
Logo, se o Brasil continuar a plantar a soja transgênica, os produtores não poderão
competir em igualdade com a soja transgênica norte-americana.

A partir desses resultados, que parecem revelar a inexistência de um impacto
econômico favorável à adoção da soja resistente a herbicida105, Pelaez e
colaboradores (2004) compilam diversos estudos que apontam algumas razões da
rápida difusão da soja RR pelos agricultores: expectativa de facilidades de manejo das
culturas com o uso do glifosato, permitindo, por exemplo, maior flexibilidade de
controle das ervas daninhas; redução do número de aplicações; e redução da
necessidade da combinação de outros herbicidas, em conseqüência das variedades
de ervas daninhas identificadas. São justamente essas expectativas que
provavelmente não serão atendidas, se as condições mostradas anteriormente
persistirem.

Hipoteticamente, a principal razão para adoção da soja resistente a herbicida
seria a redução dos custos de produção, oriunda da facilidade de manejo da cultura,
em razão de melhor controle de ervas daninhas. A empresa produtora das sementes
de soja RR, Monsanto, continua a propagar que as sementes de soja transgênica
reduzem o uso de herbicidas em média 22% a 26%, o que diminuiria
significativamente o custo de produção (PELAEZ et al, 2004). Para esses autores,
Os interesses e as incertezas do mercado, decorrentes da relutância
dos consumidores europeus e asiáticos decidirem sobre a compra de
grãos e produtos desses grãos transgênicos, parecem ser menos
importantes do que variáveis do desempenho da colheita, como
custos e rentabilidade. (...) Pode-se inferir, nesse caso, a eficiência do
marketing realizado pelas empresas produtoras de sementes
transgênicas entre os produtores agrícolas, cuja decisão pela adoção
desse tipo de sementes estaria baseada muito mais em expectativas
anunciadas pelos fornecedores de sementes do que em análises
prévias de custos/benefícios (p. 297-298).

A falta de pesquisas conclusivas e outros riscos potenciais sobre o meio
ambiente (como, por exemplo, a contaminação pela polinização das lavouras de soja
convencional, a partir das plantações de soja transgênica) e as conseqüências para a
saúde do consumidor apontam outras dimensões da arena de risco que podem ser
apoiadas e discutidas à luz do princípio da precaução, uma vez que tais riscos não são
ainda totalmente conhecidos e ainda menos pesquisados.

No que diz respeito à saúde humana, destacam-se as ameaças que estão
relacionadas com a integração imprecisa e aleatória dos transgenes no genoma da
planta recebedora e a incerteza relacionada com os efeitos diretos e indiretos dos
polipeptídios produzidos pelo transgene. São, portanto, dois tipos de incertezas: a
primeira é relacionada aos tipos e circunstâncias que promovam a absorção e a
instalação do DNA exógeno no trato gastrointestinal dos mamíferos; se o DNA e as
proteínas dos organismos geneticamente modificados persistirem e forem absorvidos
pelo trato gastrointestinal dos mamíferos, isso poderia conduzir ao desenvolvimento
de condições de doenças crônicas. A segunda categoria de riscos é aquela que pode
vir da produção de ameaças potenciais, tais como os alergênicos, já experenciadas
por consumidores que utilizaram o suplememto alimentar transgênico L- triptofano e o
milho StarLink (TRAAVIK; HEINEMANN , 2008).

Para Traavik e Heinemann ( 2008), os estudos delineados para revelar efeitos
psicológicos ou patológicos são muito poucos, e eles demonstram uma tendência
preocupante: os estudos realizados pela indústria não encontram problemas, enquanto
que estudos de grupos de pesquisa independente seguidamente revelam efeitos que
deveriam merecer imediata repetição, confirmação e análise de sua extensão. Tais
repetições de estudos não têm sido realizadas. Há dois fatores principais
contabilizados para esta situação: a inexistência de fundos para a pesquisa
independente e a relutância das indústrias produtoras em entregar material GM para
análise.

O único estudo de longo termo (24 meses), realizado por pesquisadores
italianos, encontrou que o consumo de soja transgênica Roundup Ready pode afetar
órgãos do organismo, modificando a estrutura e funcionamento de células do fígado,
do pâncreas e dos testículos, como observado em ratos em laboratório. Outros efeitos
em animais podem ainda ser citados: diminuição no tamanho dos rins das cobaias que
receberam milho transgênico Mon863 e efeitos nocivos na formação das células do
sangue (MALATESTA et al, 2002, 2003, 2005; VECCHIO et al, 2004)

Dentro de toda essa movimentação, porém, o consumidor está se informando
melhor sobre os riscos de produtos transgênicos e exigindo o direito de saber se o
está ou não consumindo, na busca por mais segurança (SEAB, 2004). Se essa
tendência de rejeição, já verificada em outros países, se mantiver e se alastrar, a soja
transgênica perderá mercado na indústria de alimentos e seu preço deve baixar,
enquanto que a soja convencional terá preço diferenciado.

4.2.2. Transgênicos: argumentos de positividade

Este item tem como fonte de informações o conteúdo de um documento
produzido pelo Departamento Técnico e Jurídico da Associação Brasileira das
Indústrias de Alimentação (ABIA)106, que expõe o outro lado da controvérsia, ou seja,
traz uma visão positiva dos transgênicos.

Segundo a ABIA, o tema da oposição aos transgênicos tornou-se uma bandeira
de certos setores da sociedade nacional e estava exigindo uma abordagem técnica, à
luz do conhecimento médico, nutricional, ambiental e epidemiológico. No caso, a ABIA,
em 2004, produziu o texto em questão, que reforça que não há registro de evidências
nocivas dos transgênicos ao ser humano, do ponto de vista científico, e nem registro
de ocorrências nesse sentido. Afirma, ainda, que as possibilidades da biotecnologia
são inúmeras e aponta ganhos nas áreas da nutrição e da saúde,
Quanto aos benefícios dos transgênicos, o texto registra um notável incremento
da produção de alimentos com essa característica, particularmente de culturas
resistentes à herbicidas, e uma decorrente e saudável redução do emprego de
insumos químicos, minimizando impactos ambientais.

A ABIA lembra que a Organização Mundial da Saúde (OMS) e diversas outras
respeitadas instituições internacionais já divulgaram manifestos concluindo pela
segurança dos alimentos geneticamente modificados e que a produção de
transgênicos avança a passos largos em todo o mundo, propelida, inclusive, pela
economia no desembolso destes insumos químicos - o que interessa a produtores,
consumidores e meio ambiente.

A Organização Mundial da Saúde havia divulgado um relatório em favor da
segurança dos transgênicos à saúde humana e animal. Nele, a OMS afirma que os
alimentos geneticamente modificados atualmente disponíveis no mercado
internacional passaram por avaliações de risco e não prejudicam a saúde humana
(WHO, 2002).

A Royal Society107 do Reino Unido reconhecera, em manifesto de 8 de maio de
2003, que o potencial que os ingredientes geneticamente modificados têm de
reduzirem a qualidade nutricional dos alimentos ou causarem reações alérgicas não é
diferente dos ingredientes não-transgênicos. O manifesto afirma que não há
evidências críveis de que a saúde humana possa ser prejudicada pela ingestão de
seqüências de DNA criadas pelo melhoramento genético de ingredientes alimentares.
Dois livros lançados no Brasil também contestaram as alegações de que os
transgênicos são maléficos à saúde: o livro de Franco Maria Lajolo, da USP, e de
Marília Regini Nutti, da Embrapa (2003), e o livro de Costa e Borém( 2003), ambos da
Universidade Federal de Viçosa. As duas publicações reiteram a equivalência dos
organismos geneticamente modificados em relação à sua segurança quando
comparados aos convencionais e ainda ressaltam a importância dos transgênicos de
segunda geração, que podem aumentar o valor nutritivo dos alimentos.

O documento da ABIA expõe também a opinião de Steve Taylor, uma das
maiores autoridades mundiais em alergias e professor da Universidade de Nebraska
(EUA), que menciona ser muito remota a possibilidade de os alimentos geneticamente
modificados atualmente comercializados causarem alergia, pois foram testados. Os
princípios de avaliação são suficientes para checar o potencial alergênico dos
alimentos. Segundo o pesquisador, as plantas em que foram encontrados agentes
alergênicos estão fora do mercado e Taylor aponta os benefícios que trarão os
transgênicos já em desenvolvimento, como a soja antialérgica.

Existiriam ainda estudos que comprovam que, além de não haver impactos
ambientais negativos dos organismos geneticamente modificados, estes podem
beneficiar o ecossistema de diversas formas. Um deles é do Centro de Informação de
Tecnologia de Conservação (CTIC - Conservation Tecnology Information Center), que
concluiu que as plantações geneticamente modificadas dos Estados Unidos têm
beneficiado o meio ambiente. Segundo o documento da ABIA, os cultivos de soja e
algodão tolerantes a herbicidas, em conjunto com a prática do plantio direto, reduziram
a necessidade de aragem, pois o controle de ervas daninhas é mais eficiente, e tais
práticas diminuíram a erosão em cerca de um bilhão de toneladas por ano. Além
disso, os transgênicos contribuíram para a redução no uso de agrotóxicos, o que
gerou uma economia com tratamento de água, só em 2002, de 3,5 bilhões de dólares.

Outro estudo - realizado pelo Conselho de Ciência e Tecnologia da Agricultura (CAST
- EUA) também avaliou os cultivos de soja, milho e algodão transgênicos.108
Para a ABIA, o Brasil travava uma discussão sobre o assunto, focada
principalmente sobre a soja, que vinha a ser o principal item da pauta de exportação
do país. Devido à falta de provas consistentes e na ausência de fatos negativos, a
campanha contra os transgênicos vinha sendo calcada em especial sobre o princípio
da precaução, que para os autores do texto representa uma abordagem
preconceituosa e um medo que poderia imobilizar o desenvolvimento a ciência.
Pesquisa realizada dentro do Serviço de Pesquisa Agrícola (ARS), do
Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), contestou em 2002, um
estudo da Universidade de Cornell (EUA), feito em 1999, e que indicava possíveis
riscos do milho Bt à borboleta monarca. O ARS demonstrou que, para haver qualquer
efeito danoso sobre as larvas das borboletas, seriam necessário mais de mil grãos de
pólen por centímetro quadrado. Os cientistas concluíram que em menos de 1% das
vezes as lagartas das borboletas são expostas, no meio ambiente, a níveis que
chegam apenas próximo dessa quantidade, ou seja, não haveria riscos ambientais
significativos que possam afetar a biodiversidade109.

Para a ABIA, os transgênicos não se caracterizavam como uma questão
política. A questão seria puramente científica, pois o ponto central era avaliar a
qualidade dos OGMs e saber se eles prejudicavam ou não o ser humano e a natureza.
A questão pairava exclusivamente no campo da biotecnologia. No entanto, a
Associação reconhecia que era preciso agir em consonância com as diretrizes legais
do país e também atentar para os interesses e as demandas do consumidor soberano
em suas decisões. Por esse motivo, a ABIA defendia (e defende ainda hoje) a
rotulagem dos alimentos, de forma a fornecer informações que subsidiem a tomada de
decisão dos consumidores.

Guivant (2006) aponta diferenças entre os críticos aos transgênicos - que
endossam o principio de precaução - e os proponentes - que assumem o principio da
equivalência. A autora mostra também que em ambas as coalizões se encontram
argumentos que apelam ao modelo standard de ciência e classificam "posições
contrárias como ideológicas e as próprias como cientificas" (p.78).

A liberação da primeira soja transgênica, em 1998, havia ocorrido antes da Lei
de Biossegurança, e foi contestada na Justiça. Após essa aprovação, o Greenpeace e
o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) entraram com um processo na Justiça
Federal contra a Monsanto e o governo. Esse processo marcou o início da moratória
judicial para liberações comerciais de transgênicos no Brasil e fez com que as
variedades transgênicas permanecessem fora do mercado entre 1998 e 2003. Assim,
a soja geneticamente modificada ficou proibida, embora continuasse sendo plantada
com sementes contrabandeadas. As safras de 2003 a 2005 acabaram tendo a
comercialização autorizada por medidas provisórias.

Em 2005, com a entrada em vigor da Lei de Biossegurança (Lei 11.105/05), as
controvérsias entre os enfoques reducionista e sistêmico das duas redes envolvidas
na discussão dos transgênicos no Brasil foram legalmente fechadas. Tal lei autoriza
definitivamente o plantio da soja transgênica e acaba com a necessidade de medidas
provisórias e com a realização de estudos de impacto ambiental e sobre a saúde
humana, que na verdade nunca foram realizados. As instituições que se posicionaram
a favor da liberação da soja geneticamente modificada formaram alianças mais
articuladas e coesas e foram capazes de promover a liberação oficial do seu plantio e
da comercialização110. Entretanto, mesmo diante dessa nova realidade, Guivant
(2006, p.80) lembra que devido ao "alto conteúdo político, ético e social das decisões,
qualquer regulação não será definitiva e as coalizões continuarão a tentar sua
mudança".

Concluindo esse capítulo, que procurou discutir diferentes posições relativas
aos riscos socioambientais da soja, verificamos que a questão envolve diversos atores
notadamente indústria agroalimentar, agências reguladoras, órgãos governamentais,
pesquisadores, ONGs, consumidores - e ilustra, mais uma vez, a complexidade da
arena na qual se constroem os termos de definição da soja como um alimento
saudável.

De uma maneira geral, as situações apresentadas até agora, neste trabalho,
tiveram um caráter mais global, focalizando casos nacionais ou regionais, e tendo por
fontes trabalhos realizados por diversos pesquisadores. O capítulo a seguir pretende
mudar esse enfoque e considerar como se reproduz, num nível local, através do saber
dos médicos - especialistas vistos como legítimos integrantes da rede científica - a
construção da soja como alimento saudável.


CAPÍTULO 5

A PERCEPÇÃO DOS ESPECIALISTAS FRENTE À SOJA E
À SAUDE HUMANA

O objetivo deste capítulo é apresentar os resultados de pesquisa realizada por
nós junto a especialistas111 da área de saúde, no nosso caso, médicos clínicos, para
avaliar sua percepção sobre a relação entre o consumo de soja e a saúde humana. A
pesquisa explorou especialmente a fronteira das categorias alimento saudável e
alimento de risco, na qual a soja parece transitar, investigando também as fontes
através das quais o conhecimento dos médicos é construído.

Nos capítulos anteriores, este estudo fez uma análise do campo da ciência e
da autoridade científica como um dos fatores que contribuem para a construção do
conceito de soja como alimento saudável ou de risco. Mesmo focalizando no papel da
ciência, foi possível construir uma rede ilustrativa de outros componentes que também
agem em direção à legitimação do conceito de soja como alimento saudável ou de
risco, rede essa que inclui os especialistas da área de saúde.

Cada um dos componentes da rede tem suas próprias questões que, num
processo comunicativo constante, poderão traduzir-se em orientações para a
pesquisa. Mesmo os profissionais não diretamente associados à pesquisa em si -
como os profissionais da área da saúde - podem acompanhar os seus resultados, que
são constantemente divulgados na forma de artigos em periódicos ou revistas
científicas, os quais lhes conferem credibilidade.112 Outro elemento importante da rede
são os congressos, simpósios e encontros de especialistas e pesquisadores, nos
quais ocorrem trocas de informação e debates. Os cursos de graduação,
aperfeiçoamento e pós-graduação veiculam igualmente os avanços que são
realizados, oferecem informações e promovem discussões técnicas. Por uma
característica própria de sociedade que se moderniza, o aumento da demanda por
informações faz com que a mídia passe a integrar essa rede, tornando-se legítimos
veículos de divulgação das pesquisas e fazendo com que se estreitem as relações
ciência-vida cotidiana, peritos-leigos.

Os nossos entrevistados, médicos clínicos, estão nas franjas da rede de
autoridade científica. Os pacientes e leigos em geral não fazem propriamente parte da
mesma, mas se beneficiam dela e interagem com seus elementos. Sendo assim, tais
atores foram inseridos de forma menos visível no esquema abaixo, através do qual
buscamos sintetizar o conjunto de associações presentes na rede de pesquisa
cientifica da soja.

FIGURA 5.1 - FIGURA ILUSTRATIVA DA REDE DA PESQUISA CIENTÍFICA COM SOJA

(Nosso sistema operacional não permite a inserção de gráficos, figuras, fotos ou tabelas. Esta figura, da forma em que foi elaborada, não permite o envio por e-mail)

Fonte: Figura elaborada por nós

Este capítulo contém dois itens: o primeiro expõe a metodologia adotada para a
pesquisa, narrando, inclusive, as dificuldades que enfrentamos para a coleta de dados
e os ajustes que tiveram que ser feitos para superá-las. O outro item centra-se na
análise dos dados das entrevistas que fizemos com 15 médicos da cidade de
Florianópolis, Santa Catarina, em três especialidades: Cardiologia, Pediatria e
Ginecologia, procurando identificar suas posições a respeito da soja como alimento,
bem como as fontes que os ajudaram a construir seus conhecimentos sobre o tema
proposto.

5.1. Metodologia da Pesquisa

Na nossa proposta inicial, deveríamos realizar entrevistas com pesquisadores
em soja, ou seja, com cientistas que estudassem a relação consumo de soja (como
alimento) e saúde humana. Essa opção, porém, revelou-se inviável, como
explicaremos a seguir.

5.1.1. Problemas iniciais no campo da pesquisa de soja e saúde humana

As primeiras entrevistas113 foram feitas com pesquisadores da Empresa
Brasileira em Pesquisa Agropecuária (Embrapa), mais especificamente a Embrapa-
Soja, em Londrina, PR.

A Embrapa Soja é uma das 41 unidades de pesquisa da Embrapa. Ela tem
como objetivo viabilizar soluções que contribuam para o desenvolvimento dos
agronegócios da soja "por meio da geração, adaptação e transferência de
conhecimentos e tecnologias". A empresa é referência mundial no desenvolvimento
de tecnologias para a cultura da leguminosa em regiões tropicais114.

O contato foi feito via email, consultando se algum pesquisador da instituição
poderia conversar conosco e responder a questões cujo foco central era a relação
entre soja e saúde humana. A resposta, positiva, informou que dois pesquisadores se
disponibilizariam para essa conversa. Agendamos nosso encontro para o mês de maio
de 2008 e viajamos até Londrina para realizar as entrevistas.

Durante o encontro, porém, descobrimos que a pesquisa com soja que eles
realizavam não estava relacionada à saúde humana. A primeira entrevistada era
doutora e especialista em composição química, promoção do sabor e processamento
de soja e melhoramento genético para qualidade do grão. O outro pesquisador era
mestre e atuava na área de análise das sementes e grãos e no laboratório de
qualidade, além de realizar análise de composição química da soja e a divulgação e
compilação de pesquisas sobre os benefícios da soja.

Os dois pesquisadores nos informaram sobre a incipiência da área de pesquisa
de soja e saúde humana no país, revelando que essa questão é conhecida e difundida
pela Embrapa Soja, sobretudo a partir da compilação de pesquisas realizadas por
instituições e cientistas estrangeiros. Procurando colaborar, eles indicaram, porém,
dois cientistas das Universidades Federais de Viçosa e de São Paulo que se
dedicavam ao tipo de estudo desejado por nós. Mencionaram também três conhecidos
pesquisadores norte-americanos com quem a Embrapa tem relações, um deles tendo
inclusive participado de um encontro promovido pela Empresa sobre o tema da soja e
saúde humana115.

Visando dar continuidade à pesquisa, contatamos os pesquisadores indicados,
mas nenhum deles se dispôs a ser entrevistado. O sistema do servidor de emails dos
dois cientistas brasileiros acusou o recebimento das nossas mensagens, mas nenhum
deles as respondeu. A mesma foi reenviada, sem sucesso. Dos três pesquisadores
norte-americanos contatados, um deles se dispôs a ser entrevistado via email, mas
não respondeu efetivamente às questões do roteiro. Uma terceira pesquisadora
brasileira, da Universidade de Viçosa, contatada posteriormente, se prontificou a ser
entrevistada, mas diante do quadro das dificuldades aqui exposto, concluímos que a
nossa amostra seria insuficiente para conseguirmos as informações desejadas.
Estas frustrações iniciais levaram a um redirecionamento do nosso trabalho
empírico, mas também nos trouxeram um ensinamento muito importante: verificamos
que no Brasil a pesquisa com soja visa, essencialmente, o desenvolvimento de
cultivares adaptadas às regiões de baixas latitudes, o controle biológico de pragas, as
técnicas de manejo e de conservação do solo. Ou seja, as controvérsias em torno dos
seus riscos para a saúde humana não estão entre os interesses dos pesquisadores
nacionais.

5.1.2. Redefinindo os informantes no campo da saúde

Visando a continuidade da nossa pesquisa, optamos, depois de avaliar
cuidadosamente a questão com as orientadoras deste estudo, por entrevistar
especialistas da área da saúde, mais especificamente médicos clínicos. Concordamos
que seria relevante conhecer a opinião dos participantes da rede responsáveis pela
tradução das pesquisas científicas, aqueles que repassam seus resultados para os
pacientes, através do incentivo ou da restrição ao consumo do objeto pesquisado, no
caso, a soja.

No início, nos questionamos se seria melhor entrevistar nutricionistas
(profissionais especialistas em Nutrição) ou médicos clínicos. Observamos que a
especialidade da Nutrição era muito genérica para permitir a avaliação das
especificidades das controvérsias que envolvem a pesquisa em soja. Existem cursos
de especialização em Nutrição em áreas clínicas específicas (como a Endocrinologia,
a Cardiologia, a Oncologia), mas em outras áreas importantes na discussão sobre a
soja, a Ginecologia, por exemplo, não existe uma formação especifica. Além disso, a
Nutrição acadêmica é generalista e tende a abordar a relação saúde e alimentação em
uma perspectiva predominantemente calórico-quantitativa, com base em nutrientes,
enquanto que o enfoque das controvérsias que optamos por explorar está voltado para
a soja como alimento funcional116. De qualquer maneira, para testar esta possibilidade
e eventualmente descartá-la com mais segurança, fizemos uma entrevista-piloto com
uma nutricionista - professora do curso de Nutrição da Universidade Federal de Santa
Catarina, da área de Nutrição Clinica e Dietoterapia - a qual confirmou nossas
considerações sobre o perfil deste tipo de profissional.

Assim sendo, concluímos que a melhor alternativa seria a de entrevistar
médicos clínicos nas áreas de Ginecologia, Cardiologia e Pediatria, mesmo não sendo
a alimentação seus focos de tratamento. A escolha por esses especialistas deveu-se
ao fato de que as controvérsias nas pesquisas e a maior parte do apelo ao uso (ou
restrição) da soja são bastante específicas e se concentram nessas três áreas.
Na área de Ginecologia, estudo de Tham et al (1988) sugere que a soja é um
alimento funcional capaz de atuar na prevenção dos sintomas da menopausa; já
outros estudos, como o de Keung (1995), Cline et al. (1996) e Cassidy et al. (1994),
sugerem que a isoflavona inibe a síntese do estradiol e de outros hormônios
esteróides e podem causar distúrbios hormonais e infertilidade. Existem também
controvérsias em pesquisas que associam soja e câncer de mama. Enquanto alguns
estudos, como o de Do et al. (2007), Wood et al. (2006) e Lamartiniere (2000),
mostram que a soja oferece um efeito protetor contra câncer de mama, outros
mostram que os efeitos estrogênicos da isoflavona podem ser perniciosos para
mulheres com propensão a esse tipo de câncer (NISHIO et al., 2007; PETRAKIS et
al., 1996; DEES et al., 1997; LEE et al., 1991).

Na área da Cardiologia, encontramos pesquisas que demonstram que a soja é
importante para a prevenção e o tratamento de disfunções relacionadas a algumas
doenças cardiovasculares, como a hipertensão (CUTLER; OBARZANEK, 2005) e a
hipercolesteronemia (ZHUO et al., 2004; STEINBERG; BRAUN, 1999; KUROWSKA et
al., 1999), além de ser importante no tratamento de doenças cardiovasculares em
geral (CLARKSON, 2002). Apesar de a soja estar relacionada à infertilidade em
homens adultos (CHAVARRO et al., 2008), demência em idosos (HOGERVORST,
2008) e câncer de mama (NISHIO et al., 2007; PETRAKIS et al., 1996; DEES et al.,
1997; LEE et al., 1991), na área específica da Cardiologia as controvérsias são
inexistentes.

Na área de Pediatria, a soja é percebida como uma importante alternativa no
tratamento de um tipo de intolerância à lactose e da alergia à proteína animal.
Entretanto, pesquisas de Fort (1990), Ishizuki (1991), Chorazy (1995), Jabbar (1997),
Divi (1997) e seus colaboradores identificaram a isoflavona como agente na etiologia
das disfunções da tireóide em crianças. Segundo pesquisa da equipe de Irvine (1998),
o uso de fórmulas infantis à base de soja é desaconselhável pela presença de fatores
antinutricionais inibidores de crescimento e de fitohormônios de ação estrogênica.

Essas controvérsias, mais detalhadamente apresentadas anteriormente117
estão resumidas no esquema a seguir.

FIGURA 5.2. RESUMO DAS ALEGAÇÕES E CONTROVÉRSIAS CIENTÍFICAS QUE
ENVOLVEM A RELAÇAO SOJA E SAÚDE HUMANA EM ÁREAS DE ESPECIALIZAÇÃO

ALEGAÇÕES CIENTÍFICAS QUE ENVOLVEM A RELAÇAO SOJA E SAÚDE HUMANA:

I - ÁREAS DE ESPECIALIZAÇÃO:

1 - GINECOLOGIA
Soja na prevenção de câncer de mama e de distúrbios da
Menopausa X Promoção de distúrbios da tireóide, de câncer de mana e
Infertilidade

2 - PEDIATRIA
Uso de extrato de soja na intolerância à lactose e alergia à proteína animal
X Fatores anti-nutricionais da soja associados à inibição do crescimento e
ação estrogênica da soja em crianças

3 - CARDIOLOGIA
Prevenção de doenças cardíacas, hipertensão e hipercolesteronemia

(Grifo nosso: Transcrevemos em texto a Figura 5.2 proposta pela autora, pois nosso sistema operacional não aceita gráficos, figuras ou tabelas)

Uma vez definidas as especialidades que poderiam trazer informações
conseqüentes para nosso trabalho, partimos para a definição de uma amostra, que
não foi intencional nem representativa do ponto vista quantitativo. Entretanto, tentamos
constituir de um grupo capaz de emitir opiniões qualificadas. Depois de uma média de
quatro ou cinco clínicos entrevistados por área, percebemos que as falas estavam se
tornando repetitivas e decidimos encerrar as entrevistas. Assim, o número total de 15
clínicos formou nosso grupo de informantes.

Iniciamos com médicos que vivem em Florianópolis, com a possibilidade de
entrevistar também médicos clínicos fora da capital catarinense. Porém, já nas
primeiras entrevistas, descobrimos que muitos dos médicos escolhidos tiveram sua
formação acadêmica, sua residência médica ou seu mestrado realizados em outros
estados do país (como Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e Pará). Assim,
ficou claro para nós que eles integravam redes que se estendem para além do espaço
local, tornando desnecessária a realização de entrevistas fora de Florianópolis.

Os primeiros 11 profissionais contatados foram indicados por um grupo de três
médicos recém-formados (turma de 2007-2) no curso de Medicina da Universidade
Federal de Santa Catarina. Tal estratégia teve por base a suposição de que ex-alunos
recentes estariam mais capacitados para apontar profissionais atualizados e bem
informados em suas áreas de especialização, com algum tipo de atuação acadêmica
(professores, supervisores de estágio ou de residência médica), além de atuação
clínica. Nossa hipótese era que, ao exercer atividades acadêmicas, a chance de o
médico se manter em constante atualização sobre assuntos da sua área de
especialização era maior.

Para explorar opiniões fora do ambiente acadêmico da UFSC, mais quatro
clínicos ligados a hospitais e centros de saúde da cidade foram incluídos no grupo de
pesquisa, a partir de indicações dos primeiros entrevistados. Também foram
apontados alguns profissionais vinculados a locais considerados centros de referência
de tratamento das especialidades mencionadas, todos na capital. Alguns desses
entrevistados, mesmo não vinculados formalmente à UFSC, mantêm vínculos em
coordenações de residência médica ou em grupos de estudo de suas áreas
específicas. Apenas dois médicos atuam somente na área clínica.

Os onze médicos inicialmente indicados foram contatados por diferentes meios:
através de suas secretárias em seus consultórios particulares; por email, telefone
residencial ou celular particular, mas apenas quatro se disponibilizaram a ser
entrevistados118. Durante estas entrevistas, mais três colegas foram indicados e assim,
gradativamente, numa técnica chamada de "bola de neve", os entrevistados foram
apontando outros possíveis colaboradores, até que o grupo de 15 profissionais se
formou.

Uma vez esclarecida a razão da pesquisa e marcada uma data e o local 119
para sua realização, seguiu-se uma entrevista pessoal, gravada em áudio, com
transcrição subseqüente para posterior interpretação e análise. O tempo médio das
entrevistas variou de 30 a 60 minutos e as mesmas foram realizadas entre os meses
de abril e novembro de 2008. Os médicos foram entrevistados em seus locais de
trabalho - hospitais, ambulatórios, clínicas e postos de saúde, essencialmente.

Para os médicos, foi feita uma adaptação do primeiro roteiro das entrevistas,
ou seja, daquele utilizado com os pesquisadores da Embrapa Soja. Essa fase
preliminar, na verdade, serviu como um pré-teste para o roteiro, que se revelou muito
longo e exaustivo, além de um tanto dirigido. Assim, ele foi ajustado e sintetizado,
passando a contemplar os seguintes aspectos120:

? Identificação, formação e atividades extra-clínica ou administrativa -
nome, local e ano de graduação e nível de especialidade (residência
médica, mestrado e doutorado); participação em alguma entidade
associativa regulamentada como membro efetivo, com representação ou
cargo diretivo.

? Considerações sobre soja e saúde - aqui, questionamos de forma geral,
e depois por área de especialização, como o profissional percebia a relação
soja - saúde humana.

? Fontes de informação - esse aspecto procurou identificar qual(is) a(s)
principal(is) fonte(s) que permitiu(ram) aos médicos construir seu ponto-devista
sobre a soja e concluir que a(s) evidência(s) científica(s) eram
suficientes para convencê-los/as sobre a opinião que tinham a respeito da
questão. Também o especialista foi questionado se recomendava soja para
a alimentação de seus pacientes.

? Controvérsias - aqui avaliamos o conhecimento do especialista sobre as
controvérsias que atravessam o tema da soja e saúde humana, explorando
suas opinião sobre elas (no caso de conhecê-las).

5.2 Que assim Soja...: a análise de dados
Visando organizar os dados obtidos, inicialmente criamos uma tipologia capaz
de reunir as diferentes percepções dos entrevistados a respeito da relação soja-saúde
humana. Em seguida, analisamos essas percepções por especialidade e procuramos
mostrar quais as fontes de construção do conhecimento dos entrevistados e seu nível
de informação frente às controvérsias em torno do tema.

5.2.1. Tipologia e percepção dos especialistas frente à relação soja e
saúde humana

Dois tipos de médicos clínicos foram encontrados na pesquisa: os Favoráveis
(E1), que consideram a soja como alimento saudável, com algum aspecto terapêutico;
e os Neutros (E2), que consideram a soja como um alimento como outro qualquer,
sem qualquer qualidade especial. Uma terceira categoria poderia ter sido construída,
dizendo respeito àqueles que consideram a soja como alimento de risco ou
inapropriado, porém nenhum entrevistado pode ser enquadrado nela.

Considerando, porém, as nuanças encontradas na categoria E1, ela foi
subdividida entre aqueles que parecem apenas convencidos dos benefícios da soja,
sem mencionar nenhum tipo de risco relacionado ao seu consumo, que nomeamos de
Favoráveis Incondicionais (E1.1); e os que consideram a soja como um alimento
saudável, que deve fazer parte da alimentação humana, que tem alguma ação
funcional e conhecem alguns dos riscos relacionados ao seu consumo, chamados aqui
de Favoráveis Reticentes (E. 1.2).

Sumarizando, pudemos classificar nossos entrevistados em três tipos:
E1.1 - Especialistas Favoráveis Incondicionais
E1.2 - Especialistas Favoráveis Reticentes
E2 - Especialistas Neutros

Estes rótulos não têm um sentido valorativo, mas visam enquadrar as
declarações dos médicos pesquisados dentro de determinadas perspectivas e usar os
conteúdos de suas falas e atitudes para ilustrar como um mesmo objeto de estudo
pode ser enfocado com ênfases diferentes, dependendo das crenças e opiniões dos
diferentes clínicos121.

a). E1.1. Especialistas Favoráveis Incondicionais
Fazem parte desta categoria cinco médicos que foram claramente a favor da
soja, fizeram afirmações categóricas a respeito dos seus benefícios e desconsideram
ou desconhecem qualquer tipo de risco a seu respeito. Alguns deles também indicam
seu consumo aos seus pacientes.

Não tenho dúvidas de que é um bom alimento. As pesquisas são
unânimes. Elas (as controvérsias científicas) não mudam minha
opinião sobre a soja como alimento saudável (Cardiologista 2,
parêntesis nosso) 122.

Indico acrescentar na alimentação, principalmente a pacientes na
pós-menopausa (Ginecologista 4).

Parece que com a soja como alimento você atenua esses sintomas
(da menopausa), desde que a ingestão seja de muito tempo, não
como algo necessário só quando iniciam os sintomas. Eu uso a soja
como alimento, especialmente porque tem osteoporose envolvida na
menopausa e a gente passou a orientar seu uso como alimento nas
suas variedades: Ades, tofu, grão, etc (Ginecologista 3, nosso
parêntesis)

É um alimento bastante completo, pode-se dizer assim (...). Eu acho
que sim (que a soja é saudável) e acho que é uma coisa muito antiga
né? Muito antiga e acho que tem efeito (Cardiologista 4).

(...) eu nunca tive muita dúvida que a soja é saudável e boa para a
nossa vida (Ginecologista 2).

E1.2 - Especialistas Favoráveis Reticentes

Nessa categoria, os médicos orientam a utilização da leguminosa na dieta, mas
não atribuem nenhuma qualidade de superioridade a ela:
Bem, eu percebo a soja como um alimento saudável, mas sem
nenhum aspecto milagroso (Pediatra 2).

Então, agora é que a gente está tendo uma idéia um pouco melhor,
mas utilizar a soja na alimentação principalmente depois do 1º e 2º
ano de vida é um hábito que deveria ser mais estimulado (...). Para
crianças maiores, a soja entra nas recomendações, mas como todas
as leguminosas (...). A soja é um alimento bastante saudável e tem
que ser utilizado junto com outros alimentos (...)(Pediatra 3).

A gente não utiliza (fórmulas infantis) até o 1º ano de idade. Depois
do 1º ano, alguns locais a utilizam como opção à alergia a proteína,
que pode ser tolerada. Pra promoção de saúde, na alimentação
global, a soja pode entrar proporcionalmente como os outros
alimentos, as leguminosas, a partir do 6º, 7º mês de vida (Pediatra 4,
parêntesis nosso).

Fazem parte desse grupo três médicos Eles assumem a soja como um
alimento saudável, que deve fazer parte da alimentação humana, pois tem alguma
ação funcional. Eles também conhecem alguns riscos da utilização da soja, e daí a
certa reticência em recomendar seu consumo, restringindo-a a certa faixa etária. No
entanto, esse conhecimento está limitado à sua própria área de especialização, a qual,
não por coincidência, vem a ser a Pediatria. Com efeito, nesta especialidade a
preocupação com a alimentação dos pacientes é mais acentuada.
Conheço alguma coisa com relação ao uso de soja e a ação de
fitoestrógenos em bebês do sexo masculino (Pediatra 2).

Então acho que tudo que é consumido exageradamente a gente não
tem noção a médio ou longo prazo das repercussões que pode ter.
Então, alterações tanto no menino quanto na menina de um uso
exagerado de fitoestrógeno pode ter repercussão (Pediatra 3).

A nossa preocupação reside na soja em relação exclusiva ao primeiro
ano de vida com relação à fórmula, quando a criança tem alergia, por
causa dos fitoestrógenos (Pediatra 4).

c) E2. Especialistas Neutros

Nesta categoria se inserem sete médicos que consideram a soja como um
alimento como outro qualquer, sem qualquer qualidade especial, ou que têm dúvidas
quanto a sua eficiência. Para alguns deles, outros aspectos do tratamento e a dieta
como um todo - principalmente o consumo de frutas e verduras - seriam o verdadeiro
fator de promoção da saúde e de prevenção de doenças. Nesse sentido, não
consideram que a soja em si possa ter qualidades especiais. A maioria desse grupo
também não indica o consumo da soja aos seus pacientes.

Sei que na área de Cardiologia ela já foi indicada como alimento
funcional, mas ninguém fala mais dela nos Congressos atualmente. E
eu até usei. Mas nunca percebi nenhuma melhora em pacientes pelo
consumo específico da soja. Eu só acredito numa mudança a nível
macro, em vários aspectos do tratamento (Cardiologista 1).

A soja é um alimento de origem vegetal, como qualquer feijão e tão
bom quanto qualquer proteína animal; ela é simplesmente mais um.
Nada especial na soja. (...) Eu não acredito que um alimento seja
prevenção de alguma coisa. Eu sempre acho que é a variedade, a
multiplicidade... É isso que pode prevenir as doenças. Eu não
acredito em um alimento milagroso (...). Não existe o alimento pra
prevenção. Todos são. Todas as frutas e verduras têm essa ação e
não precisam de um rótulo pra dizer que todo tomate, ou cereal
integral, ou qualquer outra verdura é funcional (...). Eu não vou deixar
de ter câncer porque como soja (Pediatra 1).

Se a gente for falar em reposição hormonal, parece que é tudo de
bom na soja; mas, com relação à criança a gente ainda não sabe os
efeitos dessa parte hormonal na criança, e por conta dos benefícios
que está tendo com relação à saúde da mulher, as pessoas leigas
tendem a achar que a soja também é ótimo pra tudo. Que a soja é um
alimento natural, que é saudável, que é melhor que o leite de vaca,
que a soja é um alimento que resolve tudo... E isso não é verdade.
(Pediatra 5).

Acho que é um alimento muito bom, muito rico, mas ainda hoje muito
pouco explorado. Agora que ela vem vindo mais, que a gente tem
acesso maior, com o aparecimento das isoflavonas (...) acho muito
importante o uso em casa, mas não com tanta freqüência, pois o
hábito tu traz da infância, de certos alimentos. Na Ginecologia, acho
que ela é importante, mas não a soja somente. Todos os grãos
(Ginecologista 5).

A maioria dos médicos dessa categoria considera alguns riscos da soja, mas
acha que a ciência ainda não oferece subsídios consistentes para apontá-los, nem
para afirmar seus benefícios:

Bem, eu penso que toda vez que a ciência foca numa substância, ela
erra. É um erro crasso pensar que uma substância pode ser
responsável por algo. (...) A soja não cola. (...). Eu acho que se
construiu um mito sobre isso. Como a gente que quer colocar numa
pilulazinha a solução de um câncer ou de uma doença. E ai
descarregou em cima da soja toda uma angústia, uma ansiedade de
querer resolver um problema, seja dos sintomas da menopausa, do
risco de câncer de mama, e se criou o mito e colocou toda a
responsabilidade em cima de um produto. E isso foi construído com o
apoio da indústria, que quer vender a soja no comprimido, na
cápsula, no leite, mas isso não tem embasamento e é uma bobagem
colocar tanta responsabilidade em cima de um produto. Só pode ser
de origem comercial (Pediatra 1).

Pra mim é uma coisa muito incipiente ainda (soja como alimento
saudável). Porque na minha área, por exemplo, de Ginecologia, são
poucas as pesquisa e pesquisas de uma qualidade do ponto de vista
do desenho delas, epidemiológico, muito fraca. Então, na verdade,
ainda existe um questionamento muito grande da eficácia (da soja)
enquanto terapia (Ginecologista 1, nosso parêntesis)

Não tem tanta pesquisa na área de soja como alimento, mas já existe
bastante evidência de que seria um complemento importante.
Esquecem que a maior parte da soja hoje é transgênica, não sabem
do poder hormonal ou esquecem do poder hormonal que ela tem.
Nem a gente sabe. Esquecem que a soja não tem cálcio, não tem
todos os aminoácidos essenciais para a criança e é um alimento que
deve ser utilizado com critério e com conhecimento. E essa confusão
acontece entre os profissionais da área médica também (...). De
forma geral, acho que tem muita confusão ainda. Acho que tem muita
desinformação, informação não verdadeira e incorreta no meio. Muita
confusão e não se consegue ainda separar o joio do trigo (Pediatra
5).

Bem, o problema é que os estudos são antigos e mal organizados.
Não se pode confiar neles e há muito problema com a pesquisa na
área de alimentação (Cardiologista 1).

Sei que é bom, que deve ser usado, mas nunca peguei algo assim
científico. A ponto de dizer realmente "ele deve ser usado e é muito
bom". Não (indico soja) especificamente (Cardiologista 3, parêntesis
nosso).

Dois desses médicos dizem não conhecer nada sobre os benefícios da soja,
por não se tratar da suas especialidades:

Te confesso que tenho dificuldade de orientar alimentação. Eu vejo
uma alimentação péssima nas adolescentes e mulheres e tento
mostrar que frutas e verduras são importantes. Até porque eu não sei
direito porque que tem que comer soja (Ginecologista 5).

Eu não tenho lidado com essa esfera porque a gente deixa sob a
responsabilidade da nutricionista. No passado além das
preocupações clínicas, tinha preocupação com o apoio dietético. (...)
Até esse momento, eu passei pra passar essa parte do tratamento
para as nutricionistas. Por causa do Ato Médico essa parte de
alimentação ficou toda pras nutricionistas. (...). Mas eu vejo com bons
olhos essa parte da soja como mais uma fonte para a reeducação
alimentar (Cardiologista 5).

5.2.2. As especialidades e a soja
Os médicos especialistas em Pediatria foram os que mais apresentaram
conhecimento dos benefícios e riscos da soja na saúde humana, dentro da sua área
especifica. Talvez isso se deva ao fato de que essa especialidade tem na sua
formação uma grande ênfase em alimentação; assim, o pediatra parece ser o
especialista mais próximo dos conceitos de Nutrição. Além disso, três dos cinco
médicos entrevistados fizeram também uma formação adicional em Nutrologia. O
único que conhece outros riscos tem especialização em Oncologia Pediatrica e, por
isso, mencionou riscos relacionados ao câncer.

Os pediatras são, ainda, os médicos que apresentaram idéias mais
convergentes. Há entre eles um consenso de que os fitoestrógenos das fórmulas
infantis apresentam riscos durante o primeiro ano de vida e que só depois de seis
meses a soja pode ser utilizada como alimento na dieta. Essa é, na verdade, uma
indicação que a Sociedade Brasileira de Pediatria assumiu, o que facilita o consenso
entre os profissionais da área. Entretanto, os pediatras focam nos riscos da sua área
de origem (associados aos fitoestrógenos e ao valor nutricional da soja) e
desconhecem riscos em outras áreas ou faixas etárias. Isso indica que a
especialização profissional pode limitar o conhecimento mais amplo sobre os usos da
soja como alimento para o ser humano.

(...) a questão de produtos à base de soja... A gente tem que ter uma
preocupação a médio e longo prazo sobre os efeitos de
fitoestrógenos nas crianças (Pediatra 3).

Mas hoje em dia, pra bebês jovens não se recomenda soja, só após
um ano de idade e em alguns países; e também hoje há uma
preocupação do uso de soja pra criança, por causa dos efeitos
posteriores em relação à parte hormonal, pelos fitoestrógenos. Então
isso ainda não está bem documentado (...). (Pediatra 4).

A soja é um alimento bom? É. É utilizada pelos asiáticos há anos sem
problemas, mas a gente ainda não tem produção científica suficiente
pra dizer que aqueles fitoestrógenos em crianças não vão trazer
problemas no futuro (...). Tem o problema do cálcio também, que a
soja é pobre. E pode ser responsável pela osteoporose, osteopenia,
se eu dou soja na primeira infância, por exemplo (Pediatra 5).

Apesar de a área de Cardiologia não dispor de pesquisas contraditórias ao
consumo da soja - ou seja, pesquisas que se posicionem claramente contra o seu
consumo - e de fomentar pesquisas que fortalecem a leguminosa com alimento
promotor da saúde cardiovascular, entre os cardiologistas pesquisados não existe
consenso sobre a questão.

Dois deles se mostraram entusiasmados com os efeitos da soja na prevenção
de doenças coronarianas:

A soja é um alimento saudável especialmente para vegetarianos.
Tem proteína de boa qualidade, fibras e pode baixar o colesterol (...)
Não tenho dúvidas de que é um bom alimento. As pesquisas são
unânimes (Cardiologista 2).

Eu uso e procuro indicar bastante (a soja) (...) Pelo fato da soja ser
um grão, rica, em fibras, e fibras naturais, isso ai já é como se fosse
um quelante de colesterol LDL. E pelo fato de ter as proteínas. Pode
ser também utilizada na forma de óleo (Cardiologista 4).

Dois deles se mostraram céticos e dizem não orientar seu consumo entre os
pacientes, sinalizando que as pesquisas consensuais não são suficientes para
convencer os médicos sobre os benefícios da soja.
Percebo que a soja, na área da Cardiologia, não representa nenhum
alimento especial. Ela já foi indicada há alguns anos atrás, mas hoje
em dia não se fala muito na soja em congressos. O foco é mais para
dietas asiática e mediterrânea e para o peixe. Eu já indiquei, mas hoje
não indico mais (Cardiologista 1)

Eu participei do Congresso Brasileiro de Cardiologia, em 2007, fui a
várias palestras e não ouvi a palavra soja lá. Em congressos de
Cardiologia pouco é mencionado sobre soja (Cardiologista 2).

Um deles ressalta que a soja não tem nenhum beneficio para o sistema
cardiovascular. Ele enfatiza que tal relação (soja e saúde cardiovascular) é inexistente:
No último congresso de Cardiologia que eu participei, não ouvi
nenhum assunto relacionado com a soja. Nós vimos assuntos
relacionados, sim, com café, chocolate e muitas mesas sobre o vinho.
Mas sobre a soja especificamente, no último Congresso Brasileiro de
Cardiologia, nada. (...) Mas, por outro lado, na condição do café; na
condição do vinho e do chocolate amargo, têm outras conseqüências,
outros desdobramentos para a Cardiologia que nos são
interessantes. Diferentemente da soja, esses alimentos têm
desdobramentos em relação ao coração. Isso a gente consegue
estudar um pouco mais; mas no caso da soja não. Mas a soja é
saudável, tanto é que as nutricionistas indicam bastante. Eu é que
não tenho conhecimento no nível que tem a nutricionista, que é
especialista pra abordar pra ti com detalhamento. Mas se a soja não
tem nenhum desdobramento e conseqüência pro lado do coração
então não vou me ater isso. Agora, os outros alimentos a gente sabe
das repercussões para coração, para pressão, para o sistema
cardiovascular... A gente acaba se atendo mais a eles. Mas a soja
especificamente, não. É uma coisa pontual para o nutricionista. Eu te
garanto que no momento que a soja for comentada em qualquer
trabalho científico com desdobramento para a esfera clinica e
cardiológica, todos os congressos brasileiros e mundiais de
Cardiologia vão trazer o assunto da soja. Em anteriores, eu nunca
ouvi falar ( Cardiologista 5).

Os ginecologistas se ativeram mais às controvérsias relacionadas ao
consumo de isoflavonas como medicamento e tiveram como consenso que essa
intervenção medicamentosa não oferece tudo o que as pesquisas apontam, mesmo se
elas podem ser eficazes na atenuação de alguns sintomas da menopausa. Alguns
citaram que a ingestão de soja como alimento só mostra seus efeitos em longo prazo,
desde que a mulher a consuma na dieta há muito tempo. Mesmo assim, a maioria
indica a soja na prevenção e no tratamento das disfunções da menopausa (com
exceção de um médico, o último citado a seguir):

Não tem tanta pesquisa na área de soja como alimento, mas já existe
bastante evidência de que seria um complemento importante
(Ginecologista 1).

Quanto mais grão, melhor a alimentação. Mas, não vai ter o benefício
sobre os fogachos como as orientais, que usam soja desde a
mamadeira. É diferente. Mas como alimento, sem dúvida, eu vejo a
soja como saudável (Ginecologista 2).

Parece que com a soja como alimento você atenua esses sintomas
(da menopausa), desde que a ingestão seja de muito tempo, não
como algo necessário só quando iniciam os sintomas. Eu uso a soja
como alimento, especialmente porque tem osteoporose envolvida na
menopausa e a gente passou a orientar seu uso como alimento nas
suas variedades: Ades, tofu, grão, etc... (Ginecologista 3).

Vejo a soja como um alimento rico em proteínas, sem colesterol, rico
em sais minerais e vitaminas, saudável. Indico acrescentar na
alimentação, principalmente pacientes na pós-menopausa, para
reposição hormonal (Ginecologista 4).

Na Ginecologia, acho que ela é importante, mas não a soja somente.
Todos os grãos. No geral mulheres que usam grãos, não tão
especificamente a soja, me parecem mais saudáveis, mas elas têm
também outros hábitos, com relação à alimentação, com relação ao
corpo, com exercícios físicos, não têm tanta preocupação com a
questão estética, têm outros valores com tudo. (...) Eu oriento a
comer mais frutas e verduras, mas não oriento comer soja
(Ginecologista 5).

5.2.3. Percepção dos especialistas frente às controvérsias que envolvem
a soja

Onze entre os quinze médicos afirmaram não conhecer as controvérsias do
uso da soja na alimentação humana e responderam negativamente ou com respostas
evasivas do tipo:
Tóxico, né? Toxicidade, toxinas e a questão de transgênico, etc., etc.,
sei... (Cardiologista 4).

O que eu conheço das controvérsias estão baseadas na eficácia do
uso da isoflavona como medicamento (Ginecologista 3).

Tem o problema do cálcio também, que a soja é pobre (Pediatra 5).

Alguma coisa... A gente acaba lendo e tal... Uma cogitação que eu
senti no consultório a partir de algumas famílias foi com relação aos
fitoestrógenos. Que tudo que é feito de uma maneira muito radical, a
gente corre alguns riscos (Pediatra 3).

Sim, conheço. Bem, o problema é que os estudos são antigos e mal
organizados. Não se pode confiar neles e há muito problema com a
pesquisa na área de alimentação (Pediatra 2).

Bem, eu penso que toda vez que a ciência foca numa substância, ela
erra. É um erro crasso pensar que uma substância pode ser
responsável por algo (...). Mas ciência é separar pra tentar entender e
há muito problema com a pesquisa na área de alimentação (Pediatra
1).
Alguma coisa com a questão da soja transgênica... Pode, não pode...
Essas coisas me assustam um pouco (Ginecologista 5).

A soja está se voltando pra aquela situação que eu te falei, talvez
pelo fato de que a gente esteja dividindo essa responsabilidade com
as nutricionistas. A gente esta deixando que elas se envolvam mais
com isso ( Cardiologista 5).
.
Os outros quatro clínicos, como já mencionado anteriormente, são da área de
Pediatra e apontaram questões das controvérsias de sua área especifica, com foco
para a preocupação com os fitoestrógenos nas fórmulas infantis à base de soja e com
a qualidade dessas fórmulas, no que diz respeito ao conteúdo adequado de nutrientes.
Vale ainda observar que seis entre os 15 médicos das três especialidades
manifestaram insegurança quanto a riscos que envolvem o sistema produtivo, com
foco para a monocultura e os transgênicos. O curioso é que, entre eles, estão três que
classificamos como pertencentes à categoria E1.1 (Especialistas Favoráveis
Incondicionais), pois recomendam o consumo da soja como alimento, sem restrições,
e sem reconhecer os riscos relacionados à saúde dos pacientes:

Na minha concepção, eu fico na dúvida, não tenho nenhuma clareza, principalmente
em relação aos transgênicos. Eu fico com uma pulga enorme atrás a orelha, mas é
falta de clareza mesmo. Insegurança... (Ginecologista 1).

O que mexe com a gente na questão da soja é a exportação, essas coisas... E
depois, é uma monocultura e como toda monocultura é uma coisa péssima.
Segundo, é o alto percentual de soja transgênica que nós temos e não temos
estudos claros mostrando o que isso vai gerar pra gente a curto, médio e longo
prazo (Ginecologista 3).

Me preocupa a questão da monocultura. Na minha cidade, na época de colheita, a
gente só vê soja por todos os lados e sei que isso não é bom (Cardiologista 3).
E tem a questão do transgênico... (Cardiologista 4).

Conheço controvérsias em relação aos transgênicos. Que o pessoal tem
preocupação do que é geneticamente induzido, que possa também contribuir para a
indução e doenças neoplásicas, que é a principal preocupação. Isso é bastante
controverso ainda. Acho que o principal (risco) é com relação à transgenicidade
mesmo. Acho que a gente não sabe o que poderá acontecer (Pediatra 4).

Alguma coisa com a questão da soja transgênica... Pode, não pode... Essas coisas
me assustam um pouco (Ginecologista 5).

Apesar de algumas menções aos riscos dos transgênicos, poucos médicos
consideraram o contexto socioambiental da sojicultura e as noções de saúde
ambiental e social na construção do conceito de saúde humana.

5.2.4. Fontes de construção do conhecimento científico

A grande maioria dos médicos - 10 deles - relatou ter obtido conhecimentos
sobre a soja através de literatura médica, periódicos via internet, cursos de educação
expandida e congressos. O curso de graduação em Medicina ou a residência não
foram mencionados, com exceção de três médicos entrevistados que, como já
mencionado acima, fizeram uma especialidade adicional de Nutrologia.

Todos os classificados no grupo E1.2 - Especialistas Favoráveis Reticentes
- afirmaram ter tido contato com pesquisas científicas, as quais serviram como base
de suas afirmações; nenhum deles apontou fonte não científica, como a mídia, como
origem de suas informações.

Entre os quatro médicos que relataram conhecer as qualidades da soja através
de outras fontes de informação que não a literatura médica (mídia, amigos, personal
training), três deles afirmaram desconhecer pesquisas científicas sobre a questão e o
quarto referenda fonte mista, a mídia e leigos, além de congressos e pesquisas na
Internet.

O que eu sei de soja é muito pouco, o que eu sei é que existe a
lecitina de soja, que está entrando no mercado uma série de
medicamentos fitoterápicos com soja, chás, essa coisarada toda... E
o pouco que eu sei é que a soja é um alimento muito saudável, mas
nunca peguei um artigo que pudesse se aprofundar mais nisso ai. Sei
que é bom, que deve ser usado, mas nunca peguei algo assim
científico. Não conheço nenhuma evidência científica sobre uso da
soja. Minhas fontes são por ouvir falar, na mídia; e a primeira vez que
ouvi sobre medicamento à base de soja é que foi dada uma
medicação para minha mãe à base de soja. Minhas fontes são por
ouvir falar, na mídia. (...) Meu personal training indica muito o uso da
soja. Mas tudo é escuta. São conversas. Ele fala muito em soja,
inserir Ades, diz que está sendo comentadíssimo que soja é bom pra
pele, pro envelhecimento, pro coração, como complemento alimentar,
não tem coisa melhor... Mas eu nunca li nada sobre o assunto, mas
muitas pessoas estão falando sobre soja (Cardiologista 3).

Desde 18 anos minha irmã mais velha fala que a gente devia tomar
misso, que a proteína da carne animal não era interessante e que a
de vegetal era interessante. Então eu já tomava sopinha de misso,
que eu nem sabia o que era, que é na verdade uma pasta de soja, e
que ela só dizia que aquilo era muito rico em proteína e muito bom
pra saúde. Depois a minha sogra, de origem árabe, aos meus 18, 19
anos já comprava soja, descascava, me lembro que saía aquele
plasticozinho, aquele negócio todo, e desde então eu sempre procurei
usar soja no alimento (...). Tenho um irmão que é engenheiro e
conhece muito de alimento. (...) Fontes? De tudo. Congresso de
obesidade, que eu sou muito relacionada, estudo bastante (...). Tenho
um irmão que é engenheiro e conhece muito de alimento. Eu procuro
também no Up to date, um programa médico, no próprio Google
saúde. Mas a pesquisa mesmo foi na Internet, para uma entrevista
sobre soja e cardiologia que dei na TV. (...) O que procuro na Veja,
procuro ver a referência dela pra saber quem esta veiculando, o que
é de verdade, o que não é (Cardiologista 4).

Não são pesquisas que eu tenho, mas eu nunca tive muita dúvida
que a soja é saudável e boa para a nossa vida. Mas não vou te dizer
que tem na literatura. Não sei. Pesquisa ou comprovação científica
para dizer que ela é saudável, eu não tenho (Ginecologista 2).

Dos congressos o que vem não é muito bom. A gente não sabe, tem
pouca informação, é quase que meio assim... Pois parece coisa dos
naturebas... (...) O resto acho que foi através da mídia, que é a maior
propagadora da soja (Ginecologista 5).

Quase todos esses clínicos sensibilizados pela mídia ou outras fontes não
científicas se colocam a favor da soja, sem restrições. Nesse contexto, a pergunta que
surge é se a retórica desses outros meios de informação é mais persuasiva do que a
retórica da ciência, a ponto de conseguir convencer o especialista sobre os seus
benefícios.

Diante de tantos fatos levantados, o que exatamente esta pesquisa pode
verificar? O item a seguir se propõe a estabelecer algumas conclusões, bem como a
abrir outras questões associadas ao tema estudado.

5.2.5. Considerações sobre a pesquisa de campo

Apesar de o estudo teórico ter levantando um grande campo de controvérsias
que envolve a soja desde seu cultivo, a pesquisa empírica, demonstrou que, de
maneira geral, os médicos clínicos entrevistados desconhecem tal dimensão. De
forma geral, houve pouco interesse nas controvérsias entre todos os médicos
pesquisados. Somente uma médica sinalizou certo interesse, ao afirmar: "não
conheço, mas gostaria de conhecer" (Ginecologista 4).

Um aspecto que pode influenciar no desconhecimento dos informantes com
relação à soja é que apesar da área de pesquisa em soja ser muito produtiva no
contexto norte-americano, ela é incipiente no Brasil. Quando buscamos a palavra soja
em títulos de periódicos nacionais das três áreas pesquisadas, poucos estudos foram
encontrados. No caso, a busca envolveu os anos 2000-2008.

Assim, na publicação científica oficial da Sociedade Brasileira de Cardiologia, a
revista denominada Arquivos Brasileiros de Cardiologia, aparece somente uma
pesquisa que relaciona o consumo de soja fermentada e a diminuição de níveis de
colesterol em coelhos. (Rossi et al., 2000).

No periódico da Associação Brasileira de Pediatria, o Jornal de Pediatria, foi
encontrado somente um estudo (Freitas et al, 2004), que tem como objetivo comparar,
em ratos, o efeito do polissacarídeo de soja em relação à celulose e a fórmula de soja
sem fibra alimentar sobre o peso e a umidade fecal desses animais.

Na Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, publicada pela Federação
Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia, também não encontramos
nenhum artigo referente ao consumo da soja, mas somente alguns abordando o uso
de isoflavona como medicamento.

Como já sinalizado por alguns médicos cardiologistas, nos últimos Congressos
Brasileiros da especialidade, também não se observou nenhuma palestra sobre a soja
como alimento funcional da área de doenças cardiovasculares123.

Outra explicação para a desinformação encontrada entre os médicos talvez se
deva ao fato de que sua ferramenta de intervenção clínica ainda é o medicamento.
Esse procedimento legitima sua atuação profissional com base no conceito de
tratamento e cura de doenças, em detrimento da abordagem de prevenção de
doenças e da promoção da saúde. Sob tal dimensão curativa, os alimentos não
desempenham o papel central que assumem na dimensão preventiva.

Se os médicos parecem conhecer tão pouco sobre a relação existente entre
consumo de soja e tratamento de doenças ou saúde humana, quais os especialistas
que estão assumindo a divulgação e a disseminação da soja como alimento
saudável124? Existem outros profissionais envolvidos na disseminação desse conceito?

Nutricionistas, profissionais da educação física, profissionais do marketing, jornalistas?
Ou estariam os leigos (não especialistas) assumindo este papel: vendedores de
indústrias de produtos à base de soja, empresários, cozinheiras, naturalistas,
consumidores.

Dentro dessa rede, acreditamos que seria especialmente importante buscar
compreender qual a extensão do papel da mídia na divulgação de conceitos
associados à alimentação saudável, inclusive no meio médico. Uma das médicas
entrevistadas assegura que esse papel é centralizador:

A mídia tem um papel fundamental de regular, mais do que os
médicos. Os médicos deveriam ser formadores de opinião, mas não
se comparam com a mídia. Adultos, por exemplo, vão ao médico
talvez uma vez no ano, mas assistem TV ou lêem revistas com
grande freqüência. Têm uma força muito grande, 80-90% da
população vê TV. Agora, não é 90% da população que vai ao médico
todo ano. As classes mais favorecidas vão, mas 70% usam o SUS e
só vão quando estão doente. Assim, a chance do médico conversar e
dar esse tipo de informação é pequena, em geral (Pediatra 1).

O senso comum nos leva a crer que os médicos clínicos se baseiam na ciência
e nos resultados de pesquisas científicas para fazer suas recomendações
profissionais. No entanto, as entrevistas mostraram que alguns médicos acabam por
receber informações sobre a soja também através da mídia, como qualquer leigo. E
outros meios também os influenciam.

Já citamos uma médica que assumiu conhecer muito pouco sobre a soja e que
essa pouca informação veio através da mídia, mencionando que seu personal trainnerr
"indica muito o consumo de soja para mim" (Cardiologista 3). Tal constatação é, no
mínimo, peculiar e se configura como uma expansão das áreas de especialização e
uma troca de papéis. No momento da sua aula de ginástica, a autoridade migra para o
personal trainner, que indica o que a especialista deve inserir na dieta.

De qualquer modo, se aqui as controvérsias não permeiam as discussões dos
médicos clínicos, no contexto norte-americano elas já migraram para a esfera dos
leigos. Numa busca na Internet sobre o tema controvérsias cientificas que envolvem a
soja, encontramos muitos sites na língua inglesa125, envolvendo especialistas e leigos
num debate onde também não parece haver nenhum tipo de consenso.

A participação do leigo em questões como a aqui discutida se deve ao fato de
que o perfil do paciente contemporâneo também mudou. Na atual fase da
modernidade, ele tornou-se mais informado, mais consciente e reflexivo; ele atua,
discute, questiona e traz pesquisas e sugestões para o médico que consulta.
Este é, na verdade, um fenômeno que já ocorre no Brasil, como as entrevistas
realizadas por nós deixaram transparecer:

Eu acabei prescrevendo uma fórmula à base de soja, a mãe veio
com uma lista monstruosa de pesquisas contra. O senhor vai deixar
meu menino gay? Então, acho que, de fato, a gente precisa de
conhecimento (Pediatra 3, grifo nosso).

As pacientes chegam e perguntam: doutor, posso usar isoflavona?
Elas já têm idéia do tratamento (Ginecologista 2, grifo nosso).

A grande maioria das mulheres vem com conceito formado e sabem o
que querem: tomar isoflavona, fazer exames disso e daquilo. Às
vezes eu pergunto pra elas se a gente não devia trocar de lugar
(Ginecologista 5, grifo nosso).

Observe-se que na área da alimentação é muito comum encontrar uma
diversificação de especialistas-leigos. Os indivíduos parecem saber sempre algo sobre
alimentação, que é uma área na qual todos nós, de alguma forma, produzimos
conhecimento; em geral sabemos dos resultados da ação dos alimentos em nosso
organismo ou preparamos refeições e combinações alimentares. Nossa casa é,
potencialmente, um laboratório de pesquisas em Nutrição, simplesmente porque
comemos, cozinhamos e utilizamos alimentos na nossa prática cotidiana.

Outro fato importante que o trabalho sinalizou foi que, tendo em vista a divisão
do trabalho médico por áreas de especialização, torna-se difícil encontrar um
profissional que possa conhecer mais aprofundadamente a ampla questão das
influências da soja na saúde humana e abarcar toda a discussão dos riscos a seu
respeito. Algumas áreas não apresentam controvérsias, como no caso da proteína de
soja atuando no controle e prevenção de doenças cardiovasculares; mas a Cardiologia
não considera a ação do fitoestrógeno, também presente na soja, acusada de causar
infertilidade, disfunções na tireóide e demência em adultos. Já a Pediatria questiona a
ação desses mesmos fitoestrógenos nas crianças, bem como o valor nutricional da
soja que melhora se for fermentada. Isso permite endossar ambigüidades, já que o
que faz bem para uma determinada disfunção, área de especialização ou fase da vida,
pode prejudicar a outra. Fruto do reducionismo na ciência, o aprofundamento das
especializações pode, portanto, obscurecer os riscos e favorecer as controvérsias.

Nesse sentido, Beck (2006), entre muitos outros autores, bem ressalta que a análise
de riscos requer um enfoque interdisciplinar.

Diante dessa constatação, pode-se perguntar: é possível confiar totalmente
num especialista? Ele está apto para fornecer as respostas certas para quem busca a
promoção de saúde e uma alimentação saudável? Se ele não está, quem pode
assumir este desafio? Onde estão os limites para a extensão dos diferentes e
contraditórios conhecimentos especialistas? As diferentes dimensões que envolvem o
conceito de alimentação saudável e da pesquisa em Nutrição indicam a pertinência
dessas questões.

No caso da soja, o contexto dos riscos socioambientais torna essas questões
ainda mais relevantes. As afirmações dos médicos que espontaneamente
expressaram preocupações ambientais relacionadas à sojicultura sinalizam que para
eles as questões envolvidas nesse cultivo ampliariam os riscos dos grãos consumidos
na alimentação humana. Porém, essa noção de risco ambiental parece não interferir
na opinião desses médicos sobre a soja como alimento saudável. Apesar de
mencionarem esse tipo de risco vinculado à sojicultura, alguns mantêm a prática de
indicar a leguminosa aos seus pacientes.

Ou seja, os médicos elegem a soja (e muitos outros alimentos) como saudável,
mesmo quando reconhecem que o sistema produtivo no qual ela se insere degrada o
ambiente em que vivemos e o torna insalubre (e a nós, que nele vivemos também).
Isso pode ser, porém, explicado, uma vez que a perspectiva de saúde socioambiental
faz parte de uma visão sistêmica e, de forma geral, a formação dos profissionais da
área de saúde se apóia na visão biológica da Medicina Cientifica.

Para finalizar, devemos reconhecer que estamos diante de um dilema ainda
não esclarecido: uma arena de controvérsias, diante da qual moderação e cautela no
uso da soja parecem ser as atitudes mais adequadas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As diferentes opiniões científicas que envolvem a soja como alimento saudável
ou de risco tornam-se uma legítima construção social quando admitimos a
complexidade do contexto em que se formaram os riscos e as controvérsias
pesquisadas126. Sem tal consideração, qualquer posição assumida - favorável ou
desfavorável ao seu consumo - pode ser tomada como irracional.

Isso acontece porque cada um dos conceitos emitidos carrega consigo uma
parte da verdade, uma vez que a ciência e seus representantes utilizam recursos que
só podem ser compreendidos numa perspectiva sociológica. Latour (2000, p. 311)
revela um deles (que chama de "truques"), que consiste em: "(...) contar outra história,
construída na mesma estrutura, mas que se aplique à sociedade de quem contou a
história (...)". Ou seja, a história da soja como alimento (saudável ou de risco) pode
mudar, dependendo do vínculo do cientista, do financiador ou de seus interesses. E
quem ouvir uma das versões da história também pode reproduzi-la como verdadeira
ou inconsistente, dependendo de suas crenças, de seus conhecimentos ou de suas
convicções científicas. Assim, a acusação da "irracionalidade" de uma versão pode ser
sempre revertida, enquanto a acusação de "ilógica" pode passar a ser avaliada
simplesmente como "um distanciamento das nossas próprias idéias". (p. 311).

Para Latour (2000), na verdade, a questão não é pensar na perspectiva lógica
ou ilógica, mas sociológica. Nela, nenhum caminho é certo ou errado, porém é
importante analisar o perfil de quem escolhe cada caminho; aonde as pessoas
chegam; e como elas o percorrem. Buscando manter seguir tal perspectiva, o nosso
enfoque, para finalizar esta tese, será centrado na noção de reflexividade, na teoria
dos riscos e na questão das controvérsias da ciência, que nortearam o nosso estudo.
A prática da reflexividade, motor de muitas das transformações sociais na
atual modernidade, é o primeiro elemento de destaque a ser considerado no processo
de construção social analisado neste estudo. Na condição de indivíduos
potencialmente reflexivos - leigos ou peritos - torna-se hoje mais difícil tomar uma
posição frente ao que é realmente um alimento saudável. As variadas escolhas
alimentares da modernidade têm sido objeto de uma constante reformulação, a partir
de novos estudos e de novas informações sobre o que comemos. Diante de tantas
opções, aparecem também as incertezas. Assim, podemos dizer que as dúvidas sobre
o que é um alimento saudável ou de risco são um produto da reflexividade e fazem
parte da "radicalização da modernidade", para usar uma expressão de Giddens (1990,
p.45). Portanto, uma primeira conclusão que esta tese aponta é que as fronteiras
entre estes dois conceitos são tênues e vulneráveis a diferentes influências
construídas reflexivamente.

Além disso, considerando-se a amplitude do conceito de qualidade de vida e de
dieta saudável, bem como o contexto metodológico em que a pesquisa cientifica em
Nutrição é realizada - utilizando cobaias em situações artificiais e controladas ou
pesquisando os alimentos fora do contexto da dieta como um todo - o conceito de
alimento saudável (ou de risco) torna-se ainda mais suscetível. Qual o sentido do
rótulo de alimento saudável, com apelos funcionais, se sabemos que a dieta como um
todo e o conjunto de práticas de vida saudáveis, incluindo nele o contexto
socioambiental, são o verdadeiro fator determinante de uma condição de saúde?

Sumarizando as controvérsias e os riscos em torno da soja, levantados no
estudo teórico, relembramos que eles estão centrados em quatro questões: sua forma
de processamento127; a questão da quantidade consumida128; a supervalorização de
algumas de suas qualidades funcionais129; e os riscos ambientais que envolvem seu
processo produtivo130. As controvérsias da pesquisa em soja são também permeadas
por interesses políticos e econômicos e apresentam, ainda, componentes sociais131
referentes ao seu modelo produtivo.

No caso da soja, os riscos que envolvem seu consumo tornaram-se também
controvérsias. No entanto, na pesquisa de campo, os riscos do consumo de soja se
revelaram, de forma geral, desconhecidos pelos médicos especialistas entrevistados,
apesar de terem sido identificados na literatura analisada para o estudo teórico. Nesse
sentido, a soja não apresentava um risco na percepção dos referidos médicos, porque
um risco só pode ser considerado como tal, na medida em que o individuo se torna
consciente dele. Risco sem informação se dilui.

A pesquisa em soja é mais um exemplo de debates não solucionáveis e esta
tese enfatiza que isso faz parte da ciência. Diante do quadro exposto, acreditamos que
é possível afirmar que a discussão que envolve a soja para consumo humano no
Brasil não parece caminhar em direção a um consenso em curto prazo, e
provavelmente vai permanecer como uma controvérsia em expansão. Em expansão
porque, ao mesmo tempo em que se percebe uma incipiência da discussão entre
peritos (e leigos) no cenário brasileiro (ao contrário do cenário norte-americano, por
exemplo), a mídia local vem replicando as pesquisas que questionam a soja e as
repercussões socioambientais da sojicultura vêm se tornando mais conhecidas.

Apesar de Nelkin (1995) afirmar que são exatamente os componentes morais (no caso
da soja, os sociais) que podem dificultar a resolução das controvérsias, acreditamos
que, gradualmente, a discussão poderá envolver mais atores, e o reconhecimento dos
riscos irá promover a reflexividade e vir a contribuir para diluir as controvérsias.

Na ausência do consenso, outras reflexões sobre a soja podem ser feitas e
ampliadas para outros alimentos. A análise construtivista dos riscos ambientais
mostrou a questão das divisões frente às controvérsias e riscos. No contexto
estudado, percebemos as divisões políticas e transnacionais expressas pelos
interesses dos países produtores e exportadores do grão que têm também um papel
importante na construção do que é um alimento saudável.

Consideramos igualmente as divisões cientificas estreitamente relacionadas
às questões das especialidades. Questionamos se dentro de áreas especializadas
seria possível abarcar a complexidade do conceito de alimento saudável que surge na
contemporaneidade, o qual exige uma abordagem sistêmica para a avaliação dos
produtos. Se um novo conceito de alimento saudável for estendido para além do seu
valor nutricional ou de suas propriedades funcionais, e passar a incorporar noções de
risco ambiental ou de saúde social, ou ainda, as definições de alimento integral, local,
isento de contaminantes químicos, fresco ou pouco processado, acreditamos que
dificilmente a soja possa ser inserida nessa categoria. Tudo isso é certamente
pertinente, mas complexifica e amplia sensivelmente o conceito. Sempre resta uma
pergunta que se pode fazer: o alimento é saudável para quem?

Por fim, há que se considerar ainda as divisões institucionais. Percebemos a
contraposição de resultados de pesquisas realizadas por instituições formais, mantidas
pelos interesses dos produtores e das indústrias de alimentos e daquelas realizadas
por instituições independentes, de caráter ativista ou movidas por preocupações
socioambientais. Esse aspecto precisa ser mais aprofundado em futuras pesquisas no
Brasil, sendo já um legitimo objeto de estudo no contexto norte-americano, como é o
caso de investigações como as de Marion Nestlé.

Acreditamos que nossa tese também demonstrou que a discussão que envolve
o tema do alimento saudável ou de risco não é um simples embate entre
pesquisadores. Além destas divisões, o conceito de alimento saudável vai permear o
campo subjetivo das individualidades e da diversidade de estilos de
pensamento, que envolve leigos e especialistas e que ultrapassa a dimensão das
recomendações alimentares de base cientifica ciência e também da análise de riscos.

As pessoas se comportam de forma diferente frente às descobertas científicas e
tecnológicas. Indivíduos mobilizados por questões socioambientais ou um grupo de
produtores destituído de suas terras pelo avanço da sojicultura, por exemplo, podem
naturalmente questionar o título da soja (ou de qualquer outro alimento produzido
dentro do padrão moderno de agropecuária) como saudável. Outras pessoas pensam
que tais questões são irrelevantes frente aos benefícios de se ter um alimento de
baixo custo, durável, de alto valor nutricional e de fácil obtenção e preparo. Conceitos
ainda mais subjetivos - muitas vezes distantes das recomendações alimentares
científicas - de "comer pelo prazer"; "comer por vontade; ou "comer o que se está
acostumado", também mobilizam as escolhas alimentares e são objeto de estudo da
Psicologia Social, da Antropologia e de algumas áreas da Sociologia. Existem os
indivíduos que aceitam melhor as novas tecnologias e os avanços da ciência,
enquanto outros, mais cautelosos, se mantêm mais reticentes e menos entusiasmados
frente ao novo. Assim, cada grupo vai fazer escolhas diferentes e formatar o seu
conceito de alimento saudável a partir de suas experiências e trajetórias pessoais.

Entre os peritos que fazem parte destes variados grupos, tais opções podem
influenciar a construção de seu conhecimento e se expressar nas suas práticas
profissionais (no caso dos especialistas) e no direcionamento de suas pesquisas (no
caso dos cientistas).

Um de nossos objetivos iniciais era conhecer a extensão do papel do médico
especialista na rede de pesquisa em soja e na construção do conceito de alimento
saudável. A pesquisa de campo - considerando suas limitações a três áreas de
especialização e a somente um alimento - sinalizou uma fraca vinculação desse ator a
essa rede. Isso pode ser explicado pelo fato de que o médico especialista (com
exceção do pediatra) ainda tem o medicamento como o cerne da sua intervenção
terapêutica e não se interessa pela alimentação. Outra suposta razão é a já
mencionada falta de pesquisas sobre a soja e a saúde humana no cenário nacional.
Mencionamos também o fato de que a produção cientifica em si não garante que seus
resultados se transformem em práticas médicas.

Uma questão que emergiu na análise da rede de pesquisa em soja foi o papel
que a mídia (e o marketing) representa, entre os especialistas, na construção do
conceito de alimento saudável. A mídia, de forma geral, apareceu como elemento
importante entre as fontes de informação sobre a soja, ao lado das (poucas) pesquisas
científicas. A relevância e a abrangência desse seu papel, influenciando os peritos,
merecem ser mais bem contextualizadas e conhecidas em futuras pesquisas.
Podemos aqui sugerir algumas questões norteadoras como: qual a amplitude do papel
da mídia e do marketing na sensibilização dos peritos (e leigos)? Quais são os
recursos que a mídia utiliza para promover determinado alimento como saudável?
Quais as mídias mais efetivas? De que forma a publicidade pode ser utilizada para
veicular informações cientificas e promover a reflexividade entre leigos e peritos?
Diante de todo este quadro, concordamos com diferentes autores já
mencionados na tese de que mais ciência não pode resolver os impasses que
envolvem o conceito de alimento saudável. A informação que precisamos "não é
sobre o conteúdo da ciência, é sobre a relação entre os especialistas e o político, os
meios de comunicação e o público" (COLLINS; PINCH, 2003, p. 196). É preciso
reconhecer a ciência como um processo social que inclui relações entre cientistas,
origens institucionais e interesses diversos em tornar um tema relevante ou irrelevante
(IRWIN, 2001).

Entre estes interesses diversos pensamos que o consumidor, o leigo, pode
ter um papel de maior destaque, como já acontece na arena de controvérsias
científicas em outros países (ainda pensando na soja). A reflexividade moderna, que
orienta as escolhas também no consumo, poderá se tornar um elemento propulsor
deste novo ator da arena de construção social do conceito de alimento saudável.
Para formar uma opinião sobre um alimento saudável ou de risco (ou qualquer
outra decisão que exige bases cientificas), o leigo precisa ter conhecimentos
suficientes sobre questões técnicas. Na maioria das vezes, tal conteúdo é de difícil
compreensão para ele. Como traduzir o conhecimento científico de forma a torná-lo
acessível ao leigo é um grande desafio da ciência hoje. Mas, como já vimos, o
conhecimento a respeito das pesquisas não é suficiente, e pode apenas confundir o
consumidor, como acontece com os especialistas e cientistas. O que precisa vir à tona
são as relações entre os cidadãos, os especialistas, os atores políticos e a mídia,
como tentamos explorar na tese. Quanto maior é a amplitude do conhecimento, mais
consistentes são as escolhas.

No caso da soja, isso significa que o cidadão possa querer comprar e consumir
produtos que contenham a soja, votar em políticos que apóiam a soja como
commodity ou optar por produtos isentos, apoiar políticas de agricultura familiar e
sustentável, procurar produtos locais e questionar a indústria alimentar. Antes de
escolher, o consumidor deve ser capaz de definir o que quer comer e conhecer o
contexto que deseja apoiar. Ambos os contextos são legítimos e a escolha só é
possível se for baseada na perspectiva da compreensão pública sobre o papel político
da ciência e da tecnologia.

Para Spaargaren (2006), a informação tornou-se constitutiva para práticas de
consumo sustentável que apresentam um caráter de cunho político. Segundo esse
autor, para que o consumidor possa fazer suas escolhas é preciso explorar novos
formatos de oferta de produtos e informações através de rotulagens simplificadas,
esquemas de certificação e grifes confiáveis, "in a consumer orientared way".

Lembramos que cada vez mais se valoriza a rotulagem dos alimentos como um
ato político132. Institutos de defesa do consumidor (como o IDEC, no Brasil, e o Public
Citizen, nos EUA) têm incentivado e defendido a rotulagem como um direito desse
mesmo consumidor e como uma forma dele se democratizar. Acreditamos também
que a mídia e o marketing educativo podem contribuir para a promoção de uma dieta
saudável, assim como já vêm atuando em campanhas antitabagistas e de controle do
consumo de álcool. As informações veiculadas por este meios podem ajudar a
promover a reflexividade e a construir um consumidor mais consciente e ativo133.

Marion Nestle (2002), que se debruça sobre o contexto da indústria de
alimentos influenciando as diretrizes da Nutrição e a saúde dos consumidores, aponta
a educação e a informação como estratégias centrais para fortalecer as ações dos
consumidores na escolha de alimentos saudáveis. Também é importante desenvolver
formas de organização que promovam os interesses dos consumidores, além de
novas arenas para ações políticas voltadas para os atores do mercado, consumidorescidadãos e práticas de comportamento sustentáveis.

No caso do consumo de alimentos, podemos ilustrar a expressão e amplitude
de tais práticas, citando a campanha da organização norte-americana Oldways
Preservation and Exchange Trust134, de 1999, "vote com seu garfo para um futuro
sustentável" (Nestle, 2002).

A democratização do consumidor com base na informação sobre a produção,
sobre a prática da ciência e sobre a desmonopolização do sistema perito é uma
estratégia importante para revelar a nova condição deste ator. É importante que
futuros estudos de consumo se concentrem nos meios através dos quais o consumidor
de alimentos poderá exercer seu papel político e influenciar na construção do conceito
de alimento saudável, junto às forças do mercado. Nesse contexto o ato de alimentarse
pode vir a tornar-se um ato verdadeiramente político, o qual este trabalho gostaria
de enfatizar.

Nossa expectativa é a de que a análise de riscos da soja tenha ilustrado a
complexidade da arena onde se constrói o conceito de alimento saudável e ajudado a
contextualizar o papel dos especialistas e de outros atores que podem fazer parte
dela. Assim, esperamos, também, que esta tese contribua para o debate dos riscos e
das controvérsias cientificas e que possa estimular futuros e férteis debates em torno
da construção do conceito de alimento saudável, inserindo neles o consumidor que
deseja se tornar um cidadão.

________________________________________

1 Tal fase é objeto de estudo de variados autores, que a denominam de diferentes modos: "modernidade tardia" ou "modernidade radicalizada" (também Anthony Giddens, 1991; 2002); "modernização da modernização" ou "segunda modernidade" (Ulrich Beck, 2006); "modernidade reflexiva" (Ulrich Beck, Anthony Giddens e Scott Lash, 1995); "modernidade ambivalente" ou "modernidade líquida" (Zygmunt Bauman, 2001); entre outros. Muitas destas expressões não são exatamente sinônimas, mas tal variedade de termos refere-se a diferentes formas de conceber as transformações das sociedades contemporâneas e os diferentes contornos do momento atual. Para manter certa coerência e evitar multiplicidade de termos, assumiremos, nesta tese, a (suposta) neutralidade do termo "sociedade contemporânea", bem como os de "sociedade reflexiva" ou "modernidade reflexiva".
2 Temos conhecimento dos debates em torno do conceito de reflexividade, inclusive do travado entre Giddens, Beck e Lash (1995). Neste trabalho, porém, optamos por não retomá-los e adotar a perspectiva desenvolvida por Giddens (1991) por achá-la mais clara e adequada ao tema do estudo.
3 Definida ainda por Giddens (1991) como um estilo de vida ou organização social que emergiu na Europa a partir do século XVII e que, posteriormente, se tornou mundial em sua influência.
4 A prática da reflexividade seria uma conseqüência do retorno da incerteza e dos riscos e serviria de instrumento para questionar o papel da ciência. Giddens (2002) enfatiza que a ciência depende do princípio metodológico da dúvida e deve estar aberta à revisão a partir do desenvolvimento de novas idéias ou descobertas. Essa condição de incerteza colocaria numa condição perturbadora não somente os leigos, mas também os peritos - os especialistas e os cientistas.
5 Nesse trabalho, o termo "alimentos convencionais" refere-se a alimentos produzidos dentro de tal modelo produtivo.
6 Guivant (2000, p. 297) remete a Giddens, para quem a indiferença é uma das formas de adaptação aos riscos, e ressalta que quando esses estão inseridos numa dimensão fora de controle, os atores sociais tendem a não reagir: "no referente à qualidade dos alimentos consumidos, os problemas parecem tão gigantescos que paralisia, indiferença e fatalismo tendem a predominar".
7 Dentro das discussões que envolvem a noção de estilo de vida, há pesquisas compiladas por Beardworth e Keil (1997) que relacionam o tema da alimentação saudável com a questão da br>imagem corporal e as disfunções ligadas ao desequilíbrio do peso corporal (obesidade, anorexia, bulimia). Essa dimensão, entretanto, foge do contexto central do nosso trabalho.
8 Marion Nestle é nutricionista, chefe do Departamento de Nutrição e Estudos Alimentares da Universidade de Nova York, consultora do Departamento de Saúde Federal. É consultora da Food and Drugs Administration, órgão que regula alimentos nos EUA. Suas duas principais publicações, Food Politics e Safe Food, abordam os aspectos políticos das indústrias de alimentos e as estratégias para mover a política oficial a favor de seus interesses, passando por cima da saúde pública.
9 Elizabeth A. Yetley, cientista responsável pelo Center for Food Safety and Applied Nutrition, ligado ao Food and Drugs Administration (FDA), ressalta em Henkel (2000, p. 1) que "todas as reivindicações dietéticas já publicadas apresentam estudos controversos".
10 A Nutracêutica pode ser considerada como uma nova disciplina científica, mas não há consenso a seu respeito na comunidade científica. Ela resulta da combinação dos termos "nutrição" e "farmacêutica" e estuda os compostos bioativos distribuídos nos alimentos em geral e seus benefícios na promoção da saúde e no tratamento de doenças. O termo foi cunhado por Stephen De Felice, presidente da Fundação de Inovação em Medicina, com sede em New Jersey, em 1989 (DE FELICE, 1996).
11 As restrições referem-se à presença de fitatos e oxalatos, fatores antinutricionais desativadores de enzimas e inibidores de crescimento, naturalmente encontrados no grão.
Além disso, mais recentemente, estudiosos alertam que megadoses de fitohormônios presentes nas fórmulas infantis à base de soja estimulam uma ação estrogênica natural, que pode afetar especialmente os neonatais masculinos, particularmente vulneráveis à ação dessas substâncias (FITZPATRICK; 19982000; IRVINE et al, 1995,1998). Estudos demonstram também que esses fitohormônios podem causar problemas na tireóide em crianças (FORT, 1990; ISHIZUKI, 1991; CHORAZY, 1995; JABBAR, 1997; DIVI, 1997); câncer de mama em mulheres (NISHIO et al, 2007; PETRAKIS et al, 1996; DEES et al, 1997; LEE et al, 1991); demência em idosos (HOGERVORST, 2008); e esterilidade em homens adultos (CHAVARRO et al, 2008).
12 Apesar de o termo dieta também se referir à privação total ou parcial de alimentos com objetivo terapêutico, neste trabalho optamos por utilizar esse termo como sinônimo de alimentação ou normas alimentares seguidas por um indivíduo ou por um grupo de indivíduos.
13 Na América Latina, essa preocupação aparece bem mais tarde. O marco histórico dos programas de Nutrição no Brasil foi a década de 50, como veremos a seguir.
14 Inicialmente, o beribéri, que ataca o sistema nervoso e o digestivo, foi relacionado a um agente infeccioso, até a descoberta das vitaminas. Durante o refinamento, a parte protéica do grão é perdida, junto com a maior parte das vitaminas do complexo B, cuja carência está relacionada à etiologia do beribéri.
15 O SAPS foi uma autarquia instituída em 1940, no primeiro governo de Getúlio Vargas. Sua proposta inicial era promover a melhoria das condições nutricionais da classe trabalhadora.
Para isso, foram criados restaurantes populares, com preços acessíveis para os trabalhadores, oferecendo refeições dignas e baratas à emergente mão-de-obra industrial. A primeira unidade foi instalada no Rio de Janeiro. Além de melhorar a qualidade da alimentação dos trabalhadores, os SAPS foram criados para atenuar os seguintes aspectos que acompanhavam o contexto social da época: o deslocamento da classe trabalhadora rural para o meio urbano em decorrência da política industrial; a politização da questão social; o desemprego conseqüente do crack de 1929; os riscos de desabastecimento oriundos da II Grande Guerra; e a expansão do assistencialismo embutido nas medidas do trabalhismo
(EVANGELISTA, 2008).
16 Essas intervenções persistem nessa tarefa até os dias atuais. Só mais recentemente, no Brasil, os programas de Nutrição e suas ações incorporaram a questão da qualidade do alimento e de sua origem.
17 A lei 480, de 1954 - Agricultural Trade Development and Assistance Act - estabeleceu as normas para esses excedentes. De acordo com Escoda (2006), essa atividade não pode ser, porém, entendida como programa de Nutrição, já que se caracterizava como doação de alimentos (leite em pó, açúcar, óleo e farináceo) às populações pobres, sem a observância de critérios nutricionais e/ou educativos.
18 Menção à queda de produção de cereais na Índia e na União Soviética, na década de sessenta, sucedida em 1970 pela Revolução Verde, que levou a um aumento substancial de alimentos. Em seguida, verificou-se outra grande baixa de produção junto com a seca mundial
de 1972 e a crise energética do petróleo. Essa crise provocou implicações para os países exportadores de cereais (e importadores de petróleo), que acabou por afetar a disponibilidade de alimentos no mundo (ESCODA, 2006).
19 O PRONAN objetivava contribuir para melhoria nutricional das populações de risco social ou biológico através de intervenções específicas: suplementação alimentar a gestantes, nutrizes e crianças; apoio ao pequeno produtor em áreas de baixa renda; programa de atividades de apoio; incentivo à alimentação do trabalhador. Outra linha do PRONAN criava mecanismos de incentivo à alimentação do trabalhador nas indústrias e aos trabalhadores rurais. E também desenvolvia atividades no campo da tecnologia para o enriquecimento de alimentos básicos, como medidas de proteção no combate às carências nutricionais de grande prevalência e incentivos à pesquisa nutricional. Na formação de recursos humanos, objetivava a educação nutricional da população fomentando inclusive os cursos de Nutrição no país. O I PRONAN teve sua vigência programada para o período de 1976 até 1979. O PRONAN II se estendeu até 1985, concentrando-se em três vertentes de atuação: suplementação alimentar a diversos grupos da população; racionalização do sistema de produção de alimentos com ênfase no estímulo ao pequeno produtor e combate às carências nutricionais apoiado em medidas de natureza técnica e tecnológica. Na linha de suplementação alimentar do PRONAN II incluíamse programas como o Programa de Nutrição em Saúde (PNS), o Programa de Complementação Alimentar (PCA), a Campanha Nacional de Alimentação Escolar (CNAE) e o Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) (ESCODA, 2006; UCHIMURA; BOSI, 2003). 20 Na linha de racionalização da produção de alimentos do PRONAN II, se destacam dois programas: o Projeto de Aquisição de Alimentos em Áreas de Baixa Renda (PROCAB) e o Programa de Abastecimento de Alimentos Básicos em Áreas de Baixa Renda (PROAB). O PROCAB voltava-se à viabilização da pequena produção a partir da criação de canais específicos de comercialização e o PROAB atuava no sentido de proporcionar subsídios aos pequenos varejistas de produtos alimentícios para a compra de produtos na Companhia Brasileira de Alimentos (COBAL) (UCHIMURA; BOSI, 2003).
21 Menção aos seguintes Programas: Programa de Incentivo ao Aleitamento Materno (PIAM);
Programas de Combate às Carências Nutricionais; Programa Nacional de Controle das Doenças Diarréicas (PNCDD).
22 Uchimura e Boal (2003) apontam a manutenção do PROAB, do PAT, do PNS, que passou a ser chamado de Programa de Suplementação Alimentar (PSA), e da distribuição de merenda escolar, que passou a ser chamado Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
Foram criados o Programa de Alimentação Popular (PAP), o qual previa a comercialização de alimentos básicos a preços reduzidos em áreas geográficas onde não havia o PROAB, e também o Programa Nacional do Leite para Crianças Carentes (PNL).
23 Durante a vigência do CONSEA, criou-se o Programa de Atendimento a Crianças
Desnutridas e Gestantes em Risco Nutricional - Leite é Saúde, que previa a distribuição de leite em pó e de óleo de soja a gestantes e crianças em situação de risco nutricional; houve também a criação do Programa de Distribuição Emergencial de Alimentos (PRODEA) e a descentralização das ações referentes à merenda escolar. Em 1995, o CONSEA foi substituído pelo Conselho da Comunidade Solidária. A partir de então, as intervenções no campo da alimentação e nutrição se resumiram ao PAT, PNAE e PRODEA, além da continuidade do Programa Leite é Saúde, substituído pelo Incentivo de Combate às Carências Nutricionais (ICCN), em junho de 1999 (UCHIMURA; BOSI, 2003).
24 Esse documento, elaborado pela Secretaria de Políticas Públicas do Ministério da Saúde, teve como propósito: "a garantia da qualidade dos alimentos colocados para consumo no país, a promoção de práticas alimentares saudáveis e a prevenção e o controle dos distúrbios nutricionais, bem como o estímulo às ações intersetoriais que propiciem o acesso universal aos alimentos". (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 1999; 2000).
25 Informações disponíveis no site: http://www.fomezero.gov.br/o-que-e
Acesso em: 5 nov. 2008.
26 Para uma análise mais aprofundada das atuais políticas de alimentação no Brasil, inclusive o Programa Fome Zero, sugerimos, além da leitura dos artigos de Valente (2003), também o de Belik; Grossi (2003).
27 A Lei de Biossegurança (Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005), sancionada no Congresso Nacional Brasileiro, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados - OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança- CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de
Biossegurança - CTNBio e dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança - PNB. Para
conhecer a lei na integra, sugerimos a consulta no site:
http://74.125.47.132/search?
q=cache:jNQtUKafOccJ:www.bahia.fiocruz.br
/resolucoes/LeiN11105_LeideBiosseguranca
.pdf+Lei+de+.Biosseguran%C3%A7a&hl=pt-
BR&ct=clnk&cd=7&gl=br
Acesso em: 5 nov. 2008.
28 Ressaltamos, porém, que as doenças inflamatórias persistem e a muitas enfermidades consideradas como não transmissíveis são atribuídos marcadores inflamatórios, como é o caso de alguns tipos de diabetes, obesidade e doenças coronarianas(NISHIDA et al, SALGADO FILHO et al, 2005; 2007; TRACY, 1999).
29 O Comitê de Alimentos e Nutrição (Food and Nutrition Board) do Institute of Medicine (IOM/FNB, 1994) definiu alimentos funcionais como qualquer alimento ou ingrediente que possa proporcionar um benefício à saúde, além dos nutrientes que ele contém normalmente.
30 O conceito de menu, em um sentido abstrato e geral, é explorado por Beardsworth e Keil (1997, p. 67), que apontam seus vários tipos de menu, entre eles o tradicional, o racional e o
pluralista. Esse conceito define o conjunto de princípios que guiam a seleção e a categorização de alimentos em diferentes momentos da humanidade. Segundo os autores, os menus tradicionais baseavam suas combinações e regras de escolha alimentar a partir das práticas cotidianas e das crenças que as suportavam.
31 Para diferenciar o termo "(in) segurança alimentar" - relacionado à falta ou escassez de alimentos, especialistas utilizam hoje o termo "(in) segurança sanitária dos alimentos" para designar riscos associados ao consumo de alimentos em geral (POULAIN, 2004).
32 Segundo uma definição clássica apresentada por Jodelet (1985), as representações sociais são modalidades de conhecimento prático orientadas para a comunicação e para a compreensão do contexto social, material e ideativo em que vivemos. São, conseqüentemente, formas de conhecimento que se manifestam como elementos cognitivos - imagens, conceitos, categorias, teorias -, mas que não se reduzem jamais aos componentes cognitivos. Sendo socialmente elaboradas e compartilhadas, contribuem para a construção de uma realidade comum, que possibilita a comunicação. Deste modo, as representações são, essencialmente, fenômenos sociais que, mesmo acessados a partir do seu conteúdo cognitivo, têm de ser entendidos a partir do seu contexto de produção.
33 Um exemplo: a questão em torno do fitoquímico de ação anticancerígena, licopeno, encontrado no tomate. A produção convencional de tomate ocorre no prazo de noventa dias e, dentro desse intervalo, o fruto chega a receber até trinta pulverizações com agrotóxicos, ou
seja, uma a cada três dias. Questiona-se se esse é um alimento adequado para prevenir câncer. Uma maneira muito comum de utilizar o tomate é como kechup, usado como guarnição em pratos não tão saudáveis, como hambúrgueres e batatas fritas. No entanto, a Cancer Research Foundation of America endossa o ketchup como alimento de ação preventiva de câncer.
34 Ver currículos de especialistas em Nutrição no site da Soy Connection: Disponível em:
www.soyconnection.com/speakers_experts
/health_experts.php?expert=8
Acesso: 15 out. 2007.
35 Nestle (2002) descreve as práticas de lobby no sistema político norte-americano como atividades legais, que excluem explicitamente a ação de suborno, e que são designadas para influenciar o congresso, agências federais e o governo, no sentido de fazerem leis que beneficiem as companhias alimentares. Os lobistas oferecem conselhos técnicos apoiados pela pesquisa científica e propõem legislação, regulação e práticas de educação, sem serem, entretanto, legalmente eleitos pelo voto dos cidadãos. Outros métodos de lobistas incluem contatos pessoais estabelecidos em ocasiões sociais, contribuições para campanhas políticas, organização de eventos de mídia e de demonstrações públicas.
36 Nestle (2002) menciona importantes periódicos norte-americanos, como o Journal of Nutrition e o American Journal of Clinical Nutrition e algumas das indústrias e associações que os apóiam financeiramente: Coca-Cola, Gerber, Nestlé, Monsanto, Roche Vitamins, The Sugar Association, Slim Fast Foods, entre outras. Entre os grupos e associações de renome que promovem a nutrição e a saúde, a autora cita, entre outras, a American Cancer Society, o American College of Nutrition, o American Council on Science and Health e a American Society for Clinical Nutrition apoiadas por empresas diversas como Dairy Council, Novartis, Mead Johnson, Coca-Cola, Nestlé USA e Kraft Foods (Philip Morris).
37 Referências aos estudos de Blumentahal et al (1996) e Wadman (1997). 38 No Brasil, o Nordeste está identificado como uma das áreas de carência de vitamina A mais importantes. Além do Nordeste, são consideradas áreas endêmicas, no Brasil, o Vale do Jequitinhonha, no Estado de Minas Gerais, e o Vale do Ribeira, no Estado de São Paulo. As áreas de hipovitaminose A estão localizadas nos chamados bolsões de pobreza espalhados por todo o país (PINHEIRO et al, 2004).
39 Todas as expressões literais de Alan Irwin utilizadas nesse capitulo foram traduzidas pela autora, a partir dos textos originais em língua inglesa. Assim, nos absteremos de repetir o termo " tradução nossa" quando citarmos esse autor.
40 Categorias que estariam, ao mesmo tempo, superadas em termos do poder designativo que possuíram em épocas relativamente recentes, mas ao mesmo tempo, também válidas porque ainda servem aos propósitos de trazerem alguma significação e inteligibilidade aos referentes que descreviam. Como exemplo dessas categorias, Bauman (2001) cita as classes e camadas sociais, a família nuclear, o Estado, a agricultura e os setores empresariais.
41 Para aprofundar o tema de repercussões do sistema agroalimentar moderno sobre a qualidade do alimento e sobre a saúde e qualidade de vida, ver os estudos de Azevedo (2004; 2006), que também explora os conceitos de saúde ambiental e saúde social na perspectiva da Agricultura Familiar Orgânica.
42 Para aprofundar a abordagem de Kuhn frente à Sociologia da Ciência, sugerimos a leitura do artigo de Rodrigues Junior (2002) e Lamo de Espinosa (1994).
43 Ressaltamos somente os estudiosos que fazem parte do nosso trabalho, mas quando se aborda a SCC é importante mencionar também as contribuições de Malcolm Ashmore, Michel Callon, Andrew Pickering, John Law, Steven Shapin, Nora Schaffer; Steven Woolgar, Barry Barnes, Trevor Pinch, Sheila Jasanoff, Karin Knorr-Cetina, entre outros (KUSCH, 1989).
44 Menção aos princípios de causalidade; imparcialidade; simetria e reflexividade. Para aprofundar sugerimos o livro de Bloor, de 1976, Knowledge and Social Imagery
45 Irwin (2001) analisa com especificidade a energia nuclear, a doença da vaca louca e os riscos por contaminações químicas. Os artigos de Guivant (2000; 2001; 2006;) que abordam os riscos dos agrotóxicos e transgênicos e o de Hinchliffe (2001) sobre a doença da vaca louca também contribuíram para delinear essa discussão sobre a característica dos riscos.
46 O principio da prevenção, não utilizado neste contexto, está relacionado mais a noção de perigo (o que é conhecido) do que à de risco (o que é ainda indeterminado). Segundo tal princípio, evitamos o uso da tecnologia quando suas repercussões são já conhecidas e comprovadas, como no caso dos efeitos dos agrotóxicos ou do fumo sobre a saúde humana.
47 Brian Wynne (1992) propõe uma ampliação das noções de risco, incerteza, ignorância e indeterminação. Quando o sistema de comportamento é bem conhecido, o autor fala em risco.
Ele assume a condição de incerteza quando conhecemos os parâmetros do sistema principal, mas não conhecemos as distribuições de probabilidades. A ignorância, por definição, refere-se ao que escapa ao reconhecimento. Ela é endêmica ao conhecimento científico, o qual tem que reduzir a estrutura do saber ao que é mais adequado para os métodos e modelos de análise. Por indeterminação, Wynne refere-se a cadeias ou redes causais abertas.
48 O livro de Aaron Wildavsky, Michael Thompson e Richard Ellis, Cultural Theory, de 1990, surgiu a partir do trabalho de Mary Douglas e apresenta quatro grandes tipologias que relacionam atitude e posição das pessoas frente aos riscos. Tais tipologias são utilizadas em áreas de pesquisa de percepção de risco e incluem: os individualistas, os igualitários, os hierárquicos e os fatalistas (uma quinta categoria, os autônomos, é pouco considerada).
49 Um modelo para a estruturação da rede de pesquisa em soja será proposto no capítulo 4.
50 Outros atores importantes na rede da ciência estão igualmente associados à indústria (lembremo-nos dos fios que ligam a indústria de alimentos e os conhecimentos em Tecnologia de Alimentos, Nutrição, Bioquímica, etc); e o Estado (que utiliza cada vez mais conhecimento perito para construir políticas públicas).
51 Para Attallah (1997), a Medicina Baseada em Evidências - ou em provas científicas rigorosas - utiliza as melhores evidências científicas da literatura médica para nortear as tomadas de decisões sobre os cuidados de saúde e dá especial atenção ao desenho da pesquisa, sua condução e à análise estatística. No tocante ao método de pesquisa, ele se baseia na associação de métodos epidemiológicos à pesquisa clínica chamada epidemiologia Clínica. Esse conjunto se completa com métodos bem definidos para avaliações críticas e revisões sistemáticas da literatura médica.
52 O primeiro princípio definido por Latour (2000, p. 423) para o estudo da ciência é o seguinte: "o destino de fatos e máquinas está nas mãos dos consumidores finais; suas qualidades, portanto, são conseqüência, e não causa, de uma ação coletiva.
53 A análise das implicações do uso de cada uma dessas abordagens pode ser mais bem conhecida na referida publicação, que analisa duas controvérsias: uma sobre o uso do flúor na água, e outra sobre a eficácia da vitamina C na prevenção do câncer (MARTIN; RICHARDS,
1995).
54 Há diferentes tipos de estudos científicos na área de saúde, entre eles, os estudos descritivos, observacionais, de intervenção e de revisão. A principal característica de um estudo descritivo é ter por objetivo detalhar a apresentação de um achado médico, sem se preocupar em buscar associações de fatores entre si. Este tipo de estudo descreve uma observação, sem, contudo, analisá-la. Os estudos observacionais pretendem avaliar se existe
associação entre um determinado fator e um desfecho, sem, entretanto, intervir diretamente na relação analisada. O estudo de intervenção é caracterizado pela presença de uma intervenção, ou seja, o pesquisador interfere diretamente na história natural da doença. Ou seja, ele tenta
avaliar a terapêutica de uma determinada condição. Mais recentemente, novos trabalhos começaram a ser realizados. Eles não investigam diretamente pacientes ou doenças, mas um conjunto de estudos e, por isso, são conhecidos como estudos de revisão. Os principais representantes desta classe são denominados como metanálise e revisão sistemática (TURA, 2002). A revisão sistemática é definida por Avezum (1999) como um "método quantitativo e qualitativo de combinar estudos similares, permitindo aumento de poder estatístico e precisão da estimativa de benefícios e riscos, redução de vieses, como também aumento da confiabilidade e acurácia das recomendações. Tal método pressupõe uma avaliação crítica metodológica dos estudos incluídos. Já a metanálise é uma revisão quantitativa que emprega métodos estatísticos para combinar e sumarizar os resultados de vários estudos similares (AVEZUM, 1999).
55 O caso das controvérsias que envolvem o consumo de soja, explorado a seguir, pode clarear tais afirmações.
56 Expressão usada por Halkier (1999) e citada por Portilho (2005 p. 212).
57 Powell e Leiss (2004) e Irwin (2003) demonstram as diferenças de percepções e linguagens dos leigos e peritos para tratar de riscos ao analisar o impacto da opinião publica da crise da doença da vaca louca na Inglaterra dos anos oitenta. Igualmente, outras discussões da percepção de riscos entre leigos e peritos (dos transgênicos, em Guivant, 2006; e riscos de agrotóxicos, em Wynne,1989) ilustram bem essas dicotomias.
58 Tradução de: How far should participation in technical decision-making extend"?
59 Irwin e Horst (2005), em seu artigo Science, Technology and Governance in Europe, também discutem modelos de governança que podem se mesclar ou se interrelacionar nos processos decisórios sobre riscos ambientais ou de tecnologia. Os autores apresentam uma tipologia de governança que inclui seis categorias que diluem a dicotomia no embate da ciência (peritos) versus público (leigos): governança discricionária (discretionary governance); governança corporativa (corporalist governance); modelos educacionais de governança (educational modes of govenance); governança de mercado (market governance); governança agonística (agonistic gorvernance); e governança deliberativa (deliberative governance).
60 As principais indústrias que produzem alimentos com soja no Brasil são: Yoki Alimentos S.A. (SP), Olvebra Industrial S.A. (RS), Unilever Bestfood Brasil Ltda(SP), Perdigão Agroindustrial S.A. (SC), Nutrimental S.A. (PR), Bunge Alimentos (RS), Nestlé Brasil Ltda (SP), Josapar (RS), Nutrisoy Alimentos (PR), Yakult Alimentos S. A. (SP), Sakura-Nakaya Alimentos Ltda (SP),
Agronipo Produtos Alimentícios Ltda (SP), Boa Fé Indústria de Alimentos Ltda (MG), Kinasoy do Brasil Ltda ( PR), J.J.M. Agrícola Ltda (SP ), Superbom Indústria e Comércio Ltda (SP ) e Caramuru Alimentos Ltda (GO e PR). Informação disponível no site da EMBRAPA:
http://www.cnpso.embrapa.br/html/
ind_alim_derivados.htm
Acesso em: 04 ago. 2007.
61 William Shurtleff e Akiko Aoyagi são historiadores vinculados ao Soyfoods Center em
Lafayette, Califórnia, EUA, cuja página na internet é www.soyfoodcenter.com. Pela qualidade de seus estudos e também por serem pesquisas de referência no campo da soja, usaremos
tais autores de forma extensiva neste capítulo.
62 Soyatech é uma empresa de publicidade, pesquisa de mercado e consultoria especializada em promover informações sobre a soja para apoiar indústrias alimentares. Ela publica o periódico anual Soya and Oilseed Bluebook com informações e pesquisas, além de boletins periódicos. O presidente da empresa, Peter Golbitz, é um perito na área da indústria de produtos processados de soja e já publicou numerosos artigos, livros e estudos sobre o consumo de soja, perfil do consumidor, estratégia de vendas, etc. O site da empresa
http://www.soyatech.com/
pode ser acessado para maiores informações.
63 Informações provenientes do site Organic Monitor, sob o título The European market for soya & non-dairy drinks. 2005. Disponível em: http://www.organicmonitor.com/100250.htm
Acesso em: 23 abr. 2008.
64 Esse tipo de modelo cereal-leguminosa aparece em várias culturas tradicionais como forma de equilibrar o consumo de aminoácidos essenciais: arroz e feijão no Brasil, milho e feijão no México, trigo e grão de bico ou lentilha no Oriente Médio e arroz e soja no Oriente (AZEVEDO, 2005).
65 Dados coletados em entrevista à autora, realizada nas dependências da Embrapa Soja, em Londrina, PR, no dia 02 mai. 2008.
66 Referência ao paper Soya Infant Formula: the health concerns, disponível em:
http://www.soyonlineservice.co.nz/
downloads/brief3.pdf
Acesso em: 5 mai 2007.
67 A Soy Connection é um infornativo on line sobre soja, nutrição e saúde mantido pela United Soy Bean Board, conselho formado por 64 diretores de produtores líderes de soja norteamericanos, que agem em nome dos 680.000 produtores do país e oferecem fundos de investimento para a pesquisa e a promoção do consumo de soja. Ver os sites:
http://www.unitedsoybean.org/ e
http://www.soyconnection.com/
speakers_expert/healthexperts.php?
expert=16
Acesso em: 20 out. 2007.
68 Esse simpósio acontece agora regularmente nos EUA, apoiado por diversas empresas e por conselhos estaduais. Dentre as empresas destacam-se: Archer Daniels Midland Co., Cargill Inc.-Protein Products, Central Soya, Co., Dr. Chung's Food Company, Monsanto, Personal Care Products Company, Protein Technologies International, SoGood Int., Solbar Plant Extracts, SoyLife/Schouten, Whitehall-Robins Healthcare, the United Soybean Board. Quanto aos Conselhos estaduais, podem ser citados: State Soybean Associations: Illinois Soybean Board, Indiana Soybean Board, Kentucky Soybean Promotion Board, Michigan Soybean Promotion Committee, Minnesota Soybean Research and Promotion Council, Nebraska Soybean Board, Ohio Soybean Council e South Dakota Soybean Research and Promotion Council (MESSINA; ERDMAN, 2000).
69Disponível em:
http://www.politicalfriendster.com/
http://www.politicalfriendster.com/showPerson.php?id=3547&name=Mark-J-Messina,-PhD
http://www.politicalfriendster.com/
showConnection.php?id1=3547&id2=5280
Acesso em 7 nov. 2007.
70 Caixa preta é um termo utilizado pela teoria de sistemas e Latour (2000) se apropria dele para explicar que um fato científico é, desde sua origem, resultado de inúmeras associações, disputas e controvérsias que, gradualmente, convergem até se tornarem algo que pode ser referenciado sem discussão, ou seja, como uma caixa-preta.
71 As isoflavonas (nome genérico para daidzeína, genisteína, gliciteína, entre outros tipos) são
substâncias presentes na soja e em seus derivados denominadas de fitoestrógenos (ou fitohormônios) por apresentarem semelhança estrutural com os hormônios estrogênicos, encontrados em maior concentração nas mulheres. Apesar de não serem hormônios, os fitoestrógenos têm uma estrutura similar que os fazem agir como hormônios e se conectar com receptores estrogênicos no organismo e apresentar altos níveis de atividade estrogênica (BOUE et al, 2003). Por isso são utilizados em terapias hormonais como uma opção aos hormônios sintéticos. Mas seu uso é polêmico, na medida em que uma alta concentração de estrógenos no organismo é desaconselhável, pois pode ocasionar efeitos adversos, como sangramentos uterinos irregulares e aumento do risco relativo para neoplasias (tipo de câncer) de mama e endométrio (WOLFF et al, 2006).
72 Jorge Chavarro é do Departamento de Nutrição da Havard School of Public Health,.
Informação disponível em:
http://www.asrm.org/Professionals/
Meetings/washingtondc2007/final_program/
2007finalprogram.pdf
Acesso em 17 mai. 2008.
73 Documento disponível em: http://www.idfa.org.uk/publications/
Soya.info.hp.doc.pdf
Acesso em: 6 mar. 2006.
74 Informações coletadas em entrevista à autora, realizada nas dependências da Embrapa Soja, em Londrina, PR, no dia 02 mai. 2008.
75 Contato feito por e-mail, em 05 out. 2007. Ver cópia no Anexo I.
76 Dados coletados em entrevista à autora, realizada nas dependências da Embrapa Soja, em Londrina, PR, no dia 02 mai. 2008.
77 Em se tratando dos ácidos ômega 3 e 6 não se pode falar dos efeitos indesejáveis de um ou de outro. É essencial que esses dois tipos de ácido linoleico estejam presentes de maneira equilibrada e inter-relacionada nos alimentos. Segundo Kinsela (1988), a presença unilateral de ômega-6 na dieta contemporânea cria um desequilíbrio na produção de prostaglandinas. Horrobin (1983), Fallon e Enig (1996) relacionam esse desequilíbrio ao aumento da tendência de formar coágulos e produzir inflamações. Além disso, a pressão alta, a irritação do trato digestivo, a depressão do sistema imunológico, a esterilidade, alguns tipos de câncer e o ganho de peso são também sintomas associados à baixa produção de prostaglandinas. Por outro lado, o ácido linolênico ômega-3 é necessário para a oxidação celular, para o metabolismo de aminoácidos e para o equilíbrio na produção de protanglandinas. Mc Cully (2000) ressalta que sua deficiência tem sido associada à asma, a doenças coronarianas e a deficiências de aprendizado.
78 Menção aos projetos de lei dos deputados Paulo Lima (PL.5854/2001) e Ciro Pedrosa (PV. 684/07-MG) que tornariam obrigatória a utilização de produtos derivados da soja no cardápio do Programa Nacional de Alimentação Escolar e nas cestas básicas. Os projetos se embasam na qualidade dos alimentos à base de soja para a saúde das crianças, e são questionados por favorecer as empresas de alimentos processados à base de soja, interessadas no nicho de mercado da alimentação escolar, em detrimento dos produtos regionais e frescos oferecidos por agricultores familiares locais.
79 Dentre as quais destacam-se: Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais e a Universidade Federal de Viçosa em Minas Gerais; a Empresa de Pesquisa Agropecuária em Goiás; a Embrapa Cerrados no Distrito Federal; a Cooperativa Central de Pesquisa Agrícola e a FT-Sementes no Paraná; a Fundação Centro de Experimentação e Pesquisa no Rio Grande do Sul; a Embrapa Agropecuária Oeste e a Empresa Mato-Grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural no Mato Grosso do Sul.
80 Informação obtida durante entrevista à autora, realizada na Embrapa Soja, Londrina, PR, em 02 mai. 2008.
81 A DuPont Protein Technologies International Inc., localizada em a St. Louis, EUA, é uma marketer de proteína de soja e ingredientes à base de fibras. As empresas norte-americanas Solae, Suprem e Basis são trademarkers da Protein Technology International Inc. Informação
disponível em:
http://www2.dupont.com/DuPont_Home/en_USA
Acesso em 19 mai. 2007.
82 Referência ao relatório IEH Assessment on Phytoestrogens in the Human Diet. Final Report
to the Ministery of Agriculture, Fisheries and Food, UK, nov 1997, p.11.
83 Menção ao documento de Daniel Sheegan e Daniel Doerge: Letter to Dockets Management
Branch (HFA-305) de 18 fev.1999.
84 Informações sobre as controvertidas pesquisas e o contexto político que circunda a questão
da soja podem ser encontradas em sites especializados, como o Soy On Line Service
(http://www.soyonlineservice.co.nz/
Acesso em 12 fev. 2007), produzido na Nova Zelândia e mantido por cidadãos neozelandeses. O site fornece informações e busca promover uma
conscientização sobre os efeitos do consumo de soja para a saúde humana, com o apoio técnico de vários cientistas e médicos. É possível também obter pesquisas e informações
sobre a questão política que envolve o incentivo ao consumo de soja em vários países do mundo.
85 Informações coletadas no site do Programa: Soybean Promotion and Research Program.
Disponível em:
http://www.ams.usda.gov/lsg/mpb/
rp-soy.htm
Acesso em: 12 fev. 2007.
86 Menção ao documento citado em Fallon e Enig (2000): Sheegan, Daniel M. and Daniel Doerge, Letter to Dockets Management Branch (HFA-305). 18.fev.1999.
87 Menção a Food Comission baseada em Londres e a Weston A.Price Foundation de Washington D.C.
88 Informação disponível em:
http://www.organicmonitor.com/100250.htm
Acesso em: 23 abr. 2008.
89 Nesse trabalho analisamos o entrelaçamento entre qualidade de vida e Agricultura Familiar
Orgânica, partindo da premissa de que os aspectos subjetivos e objetivos presentes nas discussões sobre qualidade de vida também aparecem nos estudos sobre a Agricultura Familiar Orgânica. Diante da análise das repercussões do Padrão Técnico Moderno em diferentes dimensões, ressaltamos a importância de se considerar o padrão produtivo como um agente determinante das condições de saúde e de qualidade de vida do planeta. Por sua vez, a Agricultura Orgânica (AO), ao se apresentar como um sistema produtivo que objetiva a autosustentação da propriedade agrícola, a oferta de alimentos saudáveis e a preservação da saúde ambiental e humana, questiona as repercussões negativas do padrão moderno de produção e torna-se capaz de mobilizar relações com a promoção de qualidade de vida.
Enfatizamos ainda a racionalidade da agricultura familiar como propícia para o desenvolvimento da Agricultura Orgânica, por priorizar a maximização dos benefícios sociais para o agricultor e o respeito à sua integridade cultural. A partir dessa relação, a AO vinculada à agricultura familiar, torna-se, no meio rural, uma ferramenta de promoção de valores sociais e qualidade de vida (AZEVEDO, 2004).
90 Ver site da Articulação Soja Holanda:
http://www.aidenvironment.org/soy/
10_sojabrochure_pt.pdf
Acesso em: 21 jun. 2007.
91 Ver site:
http://www.conservation.org.br/
Acesso em: 10 fev. 2007.
92 O Instituto Observatório Social é uma organização que analisa e pesquisa o comportamento de empresas multinacionais, nacionais e estatais em relação aos direitos fundamentais dos trabalhadores. Esses direitos estão assegurados, principalmente, nas convenções da OIT (Organização Internacional do Trabalho) que tratam da liberdade sindical, negociação coletiva, trabalho infantil, trabalho forçado, discriminação de gênero e raça, meio ambiente, saúde e segurança ocupacional. Mais informações no site:
http://www.observatoriosocial.org.br/
acessado em 2 jun. 2007.
93 A Articulação Soja é uma iniciativa da Coalizão Rios Vivos em conjunto com o Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente (FBOMS), do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e da Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do Sul do país (FETRAF-Sul). Esse projeto está sob a responsabilidade da Fundação CEBRAC e tem o apoio financeiro da Fundação DOEN, da Cordaid e da Solidaridad (organizações da Holanda), da FETRAF-Sul, do CEBRAC e das organizações do FBOMS, que fazem parte do Grupo de Trabalho Floresta.
Informação disponível em:
http://www.cebrac.org.br/forumnovo/
docs/CriteriosResponsSoja.pdf
Acesso em: 5 nov. 2007.
94 Flavio Trigueirinho é secretário geral da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (ABIOVE). A Mercosoja-2006 foi um evento promovido por companhias como Bunge, Cargill e BASF e organizada pela ACSOJA (Argentinean Soybean Chain Association) com o objetivo de apresentar trabalhos e pesquisadores envolvidos em pesquisas na área de soja, considerando a importância dos países do Mercosul envolvidos na produção. Mais informações sobre evento e a ACSOJA podem ser colhidas nos sites acessados em 5 de julho de 2007:
http://www.acsoja.org.ar/mercosoja2006/home
.asp?lg=1 e http://www.planetasoja.com/
95 A entrevista diz seguinte: "O artigo de Evaristo Eduardo de Miranda (Campeões de desmatamento, O Estado de S. Paulo, 17/01/2007) tem também dados recentes para provar que o Brasil é um dos países que mais preservam sua cobertura florestal. Detemos ainda cerca de 70% das florestas primitivas. Por isso, temos muita moral para reagir contra ataques gratuitos de lobistas de grupos suspeitos É claro que devemos fazer o melhor. A proteção do meio ambiente é condição essencial para o desenvolvimento econômico e social. Há muita coisa errada que precisa ser corrigida. Mas, de jeito algum, podemos ser incluídos entre os países que mais prejudicam a natureza. Lamentável exagero." (MORAIS, 2007).
96 O Plantio Direto compreende um conjunto de técnicas integradas que visam melhorar as condições ambientais para explorar da melhor forma possível o potencial genético de produção das culturas. Respeita três requisitos mínimos: não revolvimento do solo, rotação de culturas e uso de culturas para cobertura do solo, e é frequentemente associado ao manejo integrado de pragas, doenças e plantas daninhas (PRIMAVESI, 2000).
97 Trigueirinho utiliza o termo defensivo para se referir a agrotóxicos ou agroquímicos.
98 O manejo integrado de pragas (MIP) e doenças é uma estratégia de controle múltiplo de
infestações que se fundamenta no controle ecológico e nos fatores de mortalidade naturais,
procurando desenvolver táticas de controle que interfiram minimamente com esses fatores, com o objetivo de diminuir as chances dos insetos ou doenças de se adaptarem a alguma prática defensiva em especial. Quando bem empregada, a técnica MIP limita os efeitos potenciais prejudiciais dos agrotóxicos (BIONDI, 2007).
100Informações disponíveis em:
http://www.greenpeace.org/brasil/amazonia/
noticias/monitoramento-comprova-morat
Acesso em 5 abr. 2008.
101 O GTS é composto pelas entidades ABIOVE e ANEC, as empresas ADM, Amaggi, Bunge e Cargill e as organizações da sociedade civil Conservação Internacional Brasil, Greenpeace, IPAM, TNC e WWF Brasil.
102 Desde meados da década de 90, muitos agricultores familiares especialmente do sul do Brasil optaram pelo cultivo de soja orgânica. No Paraná, o número passou de 450 produtores em 1996, para 800 em 1997; 1200 em 1998; 2310 em 1999. Em 2000, já eram 3 077 produtores de soja orgânica, dos 10 mil agricultores orgânicos do Paraná. Os agricultores parecem perceber a soja orgânica como um passo intermediário no retorno a uma condição de diversificação da lavoura. Uma vez que a maioria dos agricultores familiares que plantam soja orgânica no Paraná possui terras marginais (solo rochoso e relevo acidentado), a mecanização geralmente não é possível e eles acabam preservando a agrobiodiversidade (VANKRUNKELSVEN, 2007).
103 Durante a última década, a regulação européia tem passado por um processo de elaboração da precaução como princípio geral e como abordagem usada em casos específicos. Tal abordagem reconhece os limites de avaliação do conhecimento cientifico e, portanto, da regulação baseada na ciência. O documento elaborado pela Comissão Européia intitulado Strategy for Europe on Life Sciences and Biotechnology (disponível em:
http://ec.europa.eu/biotechnology/pdf/
com2002-27_en.pdf
Acesso em: 25 nov. 2007), refere-se à incerteza e à necessidade de se considera o princípio em algumas situações nas quais a ciência não pode responder pelas conseqüências dos riscos: "a avaliação de risco deveria continuar a ser baseada na ciência; nos casos em que a evidencia cientifica é insuficiente, inconclusiva ou incerta as medidas deveriam ser tomadas com base no princípio da
precaução".
104 Informação disponível no site da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater/DF):
www.emater.df.gov.br/sites/200/229/
00001271.doc
Acesso em: 12 dez. 2008.
105 Mesmo diante dessa afirmativa da autora, os pesquisadores do estudo "Soja Transgênica versus Soja convencional" concluem que "as análises comparativas de desempenho técnico e econômico entre as culturas de soja convencional e transgênica não têm apresentado, ainda, dados conclusivos, que possam confirmar a superioridade de uma tecnologia de melhoramento genético sobre a outra. Isso se deve principalmente ao fato de que quase todas as comparações existentes baseiam-se em uma análise estática, que retrata o desempenho de uma única safra (...) os impactos que se deseja conhecer para esse tipo de tecnologia somente podem ser confirmados, efetivamente, a partir de uma série histórica de dados obtidos por um período de pelo menos 5 anos consecutivos (...) Conclusões definitivas sobre vantagens e desvantagens da soja transgênica em relação à convencional seriam, portanto, prematuras neste momento, em razão da inexistência de dados consistentes que corroborem qualquer resultado. Os dados de desempenho da soja transgênica apresentados neste artigo refletem, na realidade, uma fase pré-paradigmática desse tipo de tecnologia, a despeito de sua ampla difusão entre os principais países produtores" (PELAEZ et al, 2004, p. 304).
106 Texto na íntegra disponível no Conselho de Segurança Alimentar - CONSEA: Princípios e Diretrizes de uma Política de Segurança Alimentar e Nutricional. Disponível em:
www.fomezero.gov.br/download/
principios_pnsan.pdf Acesso em 5 mai. 2008.
107Disponível em:
http://www.royalsoc.ac.uk/templates/
press/showpresspage.cfm?file=447.txt
108 Informações disponíveis nos sites da CTIC e CAST/ EUA :
http://www.cast-science.org e
http://www.ctic.purdue.edu/CTIC/
Biotech.html.
Acesso em: 6 jun. 2007.
109 Informações disponíveis no site:
http://www.ars.usda.gov/is/br/btcorn/
index.html#bt1
Acesso em: 6 jun. 2007.
110 Para conhecer mais sobre o debate da liberação dos transgênicos (bem como a coalizão contra ) no Brasil, sugerimos a leitura de Guivant (2006).
111 O termo especialista, utilizado no nosso referencial teórico, a partir do termo em inglês expert, representa aqui nossos informantes os médicos clínicos entrevistados.
112 Não desconsideramos o fato de que a produção cientifica em si não garante que seus
resultados se transformem em práticas médicas.
113 Ver roteiro no Anexo II.
114 Informações disponíveis no site da Embrapa Soja:
http://www.cnpso.embrapa.br/index.php?
op_page=2&cod_pai=1
Acesso em: 4 dez. 2008.
115 Mesmo diante desta realidade, parte das informações coletadas durante essas entrevistas foi utilizada no Capítulo 3.
116 A especialidade em Nutrição Funcional - que investiga os prováveis fatores alimentares e ambientais relacionados a uma grande variedade de distúrbios no organismo do indivíduo e trata-os de forma personalizada, com base na individualidade bioquímica - poderia ser uma opção. Mas ela ainda é muito recente no país e tememos enfrentar os mesmos obstáculos encontrados junto aos pesquisadores da Embrapa Soja.
117 Ver capitulo3, item 3.2.
118 Dentre eles, apenas três dos contatados via email não retornaram nossa solicitação; as secretárias conversaram com outros três, e somente uma delas retornou, com a posição de que o profissional não se disponibilizava para a pesquisa, por "não conhecer o tema"; outro médico também não aceitou responder as entrevistas.
119 No Anexo II se encontram os dados sobre a data e o local referentes a cada entrevistado, cujos nomes foram omitidos para garantir a confidencialidade das informações.
120 Ver Anexo IV.
121 Ressaltamos que entre os ginecologistas houve restrições e discussões quanto ao uso da isoflavona em cápsulas, utilizada como medicamento na reposição hormonal, mas tais preocupações ou riscos foram descartados, uma vez que o enfoque do trabalho é no consumo de soja como alimento.
122 As indicações Pediatra, Ginecologista e Cardiologista, numeradas de 1 a 5, remetem à ordem das entrevistas com cada especialista (ver Anexo II).
123 Em maio de 2009, está prevista a realização do V Congresso Brasileiro de Soja e Mercosoja, promovido pela Embrapa-Soja e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e patrocinado pela Syngenta, uma empresa líder mundial de agronegócios. Um dos temas do encontro é "Segurança alimentar: soja na alimentação e saúde", mas nenhuma menção sobre as controvérsias na pesquisa foi encontrada na programação preliminar do evento. Informações no site:
http://www.cbsoja.com.br/pt/
apresentacao.php/
Acesso em: 24 nov. 2008.
124 Porque a informação veiculada pela indústria em geral no Brasil também parece ignorar o contexto de incertezas que se ampliam fora do país e segue vendendo produtos à base de soja com inquestionáveis apelos à saúde humana, enquanto as agências de vigilância brasileiras parecem não se mobilizar diante da questão.
125 Citamos alguns destes sites, acessados em dezembro de 2008.
http://motivatethyself.com/2008/11/03/m2a-
november-week1-the-soy-controversy-
continues/
http://www.keepkidshealthy.com/nutrition/
soy_protein.html
http://www.womentowomen.com/nutritionandwei
ghtloss/soycontroversy.aspx
http://www.greenlivingonline.com/
HealthNutrition/dangers-of-soy/
http://findarticles.com/p/articles/
mi_m1370/is_/ai_62298457
http://www.herword.com/healthdesk/
main.php?id=ob_soya20040622
http://www.fitnessforoneandall.com/
nutrition/article/soy/part_one.htm
http://answers.yahoo.com/question/
index?qid=20081114132838AAAhZWB
http://www.diseaseproof.com/archives/
healthy-food-too-much-soy.html
Ressaltamos que há sites brasileiros que veiculam algum tipo de informação sobre as controvérsias, estimuladas por médicos e estudiosos da alimentação, a saber:
http://correcotia.com/soja/soja-feldman.htm
http://correcotia.com/soja/
soja-entrevista.htm
Acesso em: 5 dez. 2008.
126 Mesmo se o presente estudo optou por restringir sua análise ao caso da soja, acreditamos que apesar de algumas peculiaridades que dizem respeito somente a esse grão, ele possibilita desvendar algumas das dimensões que fazem parte da construção social de qualquer alimento definido como saudável.
127 A grande maioria da soja consumida é na forma de produtos não integrais e processados de forma percebida por alguns pesquisadores como inadequada ao consumo humano (farinha, extrato e proteína de soja). Alega-se que as técnicas de fermentação (transformando a soja em misso, tempeh, natto, shoyo), bem como seu uso como grão verde (ededame) utilizados por orientais tradicionais, minimizaria alguns dos riscos da soja para a saúde humana,
128 Remetemos à quantidade de soja preconizada pelo FDA (25g/dia), considerada por alguns pesquisadores como alta. Além disso, existe a preocupação com indivíduos que utilizam a leguminosa como fonte substitutiva de proteína animal e também os questionamentos do seu uso "invisível" na indústria, como produto barato e versátil, que pode fazer parte da composição de mais de 60% dos alimentos processados.
129 Como o título de alimento preventivo de doenças cardiovasculares, ou heart heathy food, alcançado através de petição submetia ao FDA (1999), em detrimento de seus possíveis efeitos colaterais em algumas fases da vida (como na primeira infância), ou em alguns tipos de disfunções ou enfermidades (como problemas na tireóide, infertilidade, demência e câncer de mama em adultos).
130 Menção à contaminação por agrotóxicos e adubos sintéticos utilizados no cultivo da soja; destruição de áreas de preservação e da biodiversidade para o seu plantio, e também os riscos ambientais relacionados aos transgênicos.
131 Destaque para os riscos sociais da sojicultura, como as denúncias de trabalho escravo e a problemática da exclusão de povos nativos e de pequenos produtores do processo produtivo.
132 A título de ilustração, o direito à informação do consumidor é uma das razões que embasa a luta pela rotulagem dos transgênicos no Brasil. Acredita-se que ela é uma das estratégias para que o consumidor possa participar do processo decisório e eleger o transgênico como alimento saudável ou de risco Rotulagens detalhadas têm sido utilizadas para os alimentos de origem familiar orgânica, como apelo de marketing e em consideração aos direitos do consumidor em saber a origem do que ele está ingerindo. Nestle (2002), por exemplo, reconhece que os apelos ambientais relacionados ao cultivo de alimentos podem promover resultados positivos na hora do consumidor escolher uma dieta mais saudável.
133 É possível prever acirrados e polêmicos debates que campanhas publicitárias do tipo antisoja, anti-açúcar, anti-gorduras, tomando alguns exemplos aleatórios, podem gerar nas áreas da saúde e dentro da poderosa e influente indústria de alimentos.
134 Site da organização: http://www.oldwayspt.org/
Acesso em: 5 dez. 2008.
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ZHUO, X.G.; MELBY, M.K.; WATANABE, S. Soy isoflavone intake lowers serum LDL cholesterol. Journal of Nutrition; v. 134, p. 2395, 2004.
ZHUO, J-R; GUGGER,E.T; TANAKA, T; GUO, Y; BLACKBURN, G,L; CLINTON,S.K. Soybean Phytochemicals Inhibit the Growth of Transplantable Human Prostate Carcinoma and Tumor Angiogenesis in Mice. American Journal of Clinical Nutrition; v. 71, n. 6, p. 1705S-1707s, 2000.
ZREIK, M. The Great Soy Protein Awakening. Total Health; p. 52-4, 2000.

ANEXOS

Anexo I

Email trocado com Dr. Gerald Moy, especialista da Organização Mundial
da Saúde/ OMS

Dear Ms Azevedo,
The deficiency in thiamine was a manufacturing quality control problem and not a general
problem with soy based infant formula.
We are aware of the possible problem of phytoestrogens in soy and some countries, such as
the UK, have taken steps to remove these from soy-based infant formulas. However, no action
has been initiated with in Codex concerning this issue.
Regards,
Gerald Moy
-------- Message d'origine--------
De: Elaine [mailto:Elaine.Azevedo@unisul.br]
Date: jeu. 5/10/2007 3:30
À: Moy, G. moyg@who.int
Cc: Hartl, Gregory Anton
Objet : info
Dear Mr Moy
I am a nutritionist from Brazil and I a doing my PHD at the Federal University of Santa Catarina
(UFSC/ Florianopolis) in Sociology. My theme is the sociological construction of healthy food
concept (focusing at the scientific research on soy beans/ human consumption and its scientific
conflicts).
I found out in the WHO web the article about thiamine deficiency in infant soy products and I
would like to know if this was an specific deficiency associated to Remedia brand soy or if this
deficiency can be associated to general infant soy formulas. Was there further problems related
to this vitamin deficiency known by the WHO?
Another question is if the WHO has published / or known other scientific research concerned
conflicts or advantages and obstacles of the soy consumption and effects on humans. If you
don not know could you indicate me any WHO specialist on soy beans subject who I could
contact with?
I appreciate if you could help me.
Thanks a lot,
Elaine de Azevedo
Universidade do Sul de Santa Catarina/UNISUL
Elaine.Azevedo@unisul.br
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ANEXO II

ROTEIRO DA ENTREVISTA COM PESQUISADORES DA EMBRAPA SOJA
DATA E LOCAL DA ENTREVISTA:

DADOS PESSOAIS:
Nome, curso, local, ano de graduação e atuação profissional.

PERFIL DO CONSUMIDOR
1. Como o sr/sra vê o programa Embrapa Soja?
2. Quais são seus objetivos?
3. A forte rede política de apoio a pesquisa, marketing e consumo da soja é
encontrada em algum outro tipo de produto alimentar? Como o sr/sra vê essa
dimensão?
4. Em sua opinião, porque o consumo de soja "visível" (grão, farinha, extrato ou
proteína texturizada) ainda é considerado baixo no país (em relação a produção)?
5. Como a pesquisa em soja contribui para o crescimento do consumo?
6. Há alguma regulação formal do consumo (dose diária recomendada ou restrição?)
7. Qual o perfil do consumidor de soja do Brasil? "
8. Como o sr/sra percebe os brasileiros receptíveis a soja?
9. Há pesquisas de quantidade de consumo de soja entre brasileiros?
10. Qual a porcentagem de soja invisível (em produtos industrializados) que está nos
alimentos?
11. Existem estudos ou iniciativas que apontem estratégias para aumentar o consumo
de soja no Brasil (na forma visível?)
198
12. Quais as perspectivas para aumentar ainda mais o consumo de soja visível entre
os brasileiros?

PESQUISA EM SOJA
13. Qual é sua área principal de pesquisa?
14. Como o sr/sra avalia a situação da pesquisa em soja para consumo humano no
Brasil em termos de :
Qualidade?
Apoio institucional.
Financiamentos para pesquisa?
Reconhecimento internacional?
15. Há outros países nos quais essa área de pesquisa é mais avançada? Quais?
16. Se positivo, em que aspectos? E por quê?
17. No meu trabalho eu identifiquei algumas controvérsias nas pesquisas científicas
que apóiam e também questionam o consumo de soja. Aqui está um quadro que eu
organizei para expor tais pesquisas. Como o sr/sra vê tas controvérsias das pesquisas
em soja para consumo humano? Qual sua opinião?
18. O sr/sra considera que essas controvérsias têm fundamento cientifico?
19. Como o sr/sra vê a questão de uso de cobaias para realizar os estudos?
Esclarecendo: nos meus estudos sobre tais controvérsias, alguns cientistas falam que
o uso de cobaias encobre efeitos negativos de soja quando transferidos para o ser
humano. Outros dizem que o resultado de estudos realizados em animais não é
efetivo para proibir ou questionar o consumo da soja. O que tem a dizer a respeito?
20. A seu ver quais são os tipos de estudos mais efetivos para mostrar que a soja é
um alimento seguro (ou inseguro) para o ser humano?
21. Há suficiente evidência cientifica de potenciais riscos a saúde no consumo de soja
pelos seres humanos?
22. Se o sr/sra considera algum tipo de risco, existe alguma condição que recomenda
o consumo de soja sem nenhum tipo de risco a saúde?
23. Como pesquisador (a) o sr/sra indicaria algum tipo de restrição (faixa etária, modo
de utilização especifico da soja, dose diária recomendada) ao consumo de soja?.
24. Em Israel (2005), a partir de um acontecimento que levou a morte de bebês
alimentados exclusivamente com fórmula à base de soja pobre em tiamina, foi
formado um comitê de pesquisadores do Ministério da Saúde. Eles analisaram
diversos estudos sobre soja e acabaram por divulgaram orientações a população no
sentido de que a soja deve ser consumida com cuidado por parte dos neonatais e
crianças e nunca como substituto da proteína animal. O sr/sra conhece tais restrições?
Como vê tas restrições de consumo? .

ASPECTOS POLITICOS DA PESQUISA
25. Onde o sr/sra recebe ou busca informações e estudos sobre soja e consumo
humano (congressos periódicos, mídia, etc)?
26. Onde o sr/sra publica suas pesquisas?
27. Como os especialistas clínicos da área da saúde (aqueles que orientam pacientes
e leigos?) têm acesso a tais resultados?
28. Como o público leigo tem acesso a tais resultados?
29. Qual é a sua relação com a mídia?
30. E com a indústria de alimentos à base de soja?
31. Em sua opinião, qual é a melhor maneira de um cientista se comunicar com
público? (em termos de viabilizar informações cientificas para os leigos)
32. Como o sr/sra vê o papel da mídia nessa ligação ciência - público?
33. Como o sr/sra vê o papel dos profissionais clínicos da área da saúde nessa ligação
ciência - público ?
34. Como o sr/sra vê o papel das empresas de alimentos nessa mesma ligação?
35. Como é a questão do financiamento das suas pesquisas? Qual o processo para
que surjam fundos de apoio? Quem se interessa por financiar?
36. Como pesquisador (a) como o sr/sra vê a relação entre pesquisas de fundo
particular (empresas) e público (universidades, instituições de saúde).
37. Como o pesquisador (e a pesquisa) é influenciado pelos fundos de pesquisa?
38. Como o sr/sra considera o estado das relações entre pesquisa e indústria? Há
estimulo da indústria para pesquisa pública ou grande parte da pesquisa se dá no
âmbito dos laboratórios empresariais transnacionais?
39. Nos EUA, O Programa Norte-Americano de Promoção ao Consumo e Pesquisa de
Soja decretou a autorização do programa nacional de informação ao consumidor e
promoção da pesquisa nacional sobre a soja. O objetivo do programa foi fortalecer a
posição do grão, manter e expandir o mercado local e estrangeiro e todos os
produtores devem obrigatoriamente bancar 0,5 a 1% do preço líquido de mercado da
soja. O total desse valor gira em torno de U$80 milhões anualmente destinados para
fundos de pesquisa e informação ao consumidor que fortalece e expande o consumo
de produtos à base de soja. Como o sr/sra vê essa prática? Em que sentido ela pode
influenciar e estimular pesquisas?
40.Grande parte da soja brasileira é plantada na forma de monocultura com grande
quantidade de agrotóxicos e insumos o que gera repercussões ambientais e sociais.
Como o sr/sra vê o conceito de soja como alimento saudável nesse contexto?

ANEXO III

ENTREVISTADO DATA DA ENTREVISTA LOCAL DA ENTREVISTA

Pediatra 1 25 abr. 2008 Secretaria da Saúde de
Santa Catarina/ Florianópolis/
SC
Pediatra 2 23 jun. 2008 Ambulatório de Pediatria do
Hospital Universitário/ UFSC/
Florianópolis/ SC
Pediatra 3 05 ago. 2008 UTI Infantil do Hospital
Infantil Joana de Gusmão/
Florianópolis/ SC
Pediatra 4 21 ago.2 008 Ambulatório de Pediatria do
Hospital Universitário/ UFSC/
Florianópolis/ SC
Pediatra 5 04 set. 2008 Ambulatório de Pediatria do
Hospital Universitário/ UFSC/
Florianópolis/ SC
Ginecologista 1 25 abr. 2008 Ambulatório Ginecologia e
Obstetrícia do Hospital
Universitário/ UFSC/
Florianópolis/ SC
Ginecologista 2 25 ago. 2008 Centro de Saúde de
Canasvieiras/ PMF/UFSC/
Florianópolis/ SC
Ginecologista 3 22 ago. 2008 Clinica Prontomed/ Lagoa da
Conceição/ Florianópolis/ SC
Ginecologista 4 05 set. 2008 Ambulatório Ginecologia e
Obstetrícia do Hospital
Universitário/ UFSC/
Florianópolis/ SC
Ginecologista 5 09.set. 2008 Consultório Particular
Florianópolis/ SC
Cardiologista 1 06 mai. 2008 Clínica Cardiosoport/Centro/
Florianópolis/ SC
Cardiologista 2 06 mai. 2008 Clínica Cardiosoport/Centro/
Florianópolis/ SC
Cardiologista 3 02 mai. 2008 Clínica Cardiosoport/Centro/
Florianópolis/ SC
Cardiologista 4 26 jul. 2008 SOS Cardio/ Centro/
Florianópolis/ SC
Cardiologista 5 21 nov. 2008 Ambulatório de Cardiologia
do Hospital Universitário/
UFSC/ Florianópolis/ SC
Dra Mercedes C. Panizzi 02 mai. 2008 Embrapa Soja/ Londrina/ PR
Msc. José Marcos Contijo
Mandarino
02 mai. 2008 Embrapa Soja/ Londrina/ PR
Nutricionista Piloto 02 mar. 2008 Centro de Ciências da
Saúde/ UFSC/ Florianópolis/
SC

ANEXO IV

ROTEIRO DE ENTREVISTA COM MËDICOS E A NUTRICIONISTA- PILOTO
DATA E LOCAL DA ENTREVISTA:

DADOS PESSOAIS:
1. Curso, local, ano de graduação e atuação profissional.
2. Há quanto tempo atua nessa área clínica?
3. Tem algum cargo administrativo ou atuação em docência, associações
médicas, etc.?

CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE SOJA E SAÚDE
4. De forma geral, como o sr/sra. percebe a relação soja - saúde humana?
5. Se não foi mencionado anteriormente: E como o sr/sra vê essa relação na
sua área específica (Cardiologia, Ginecologia ou Pediatria)?

FONTES DE INFORMAÇÃO
6. Qual a principal fonte/ou principais fontes de informação que lhe
permitiu/permitiram construir (ou mudar/ ampliar) tal ponto-de-vista (alimento
saudável ou de risco)?
7. O sr/sra. considera que a(s) evidência(s) científica(s) são suficientes para
convencê-lo/a sobre a opinião que tem sobre a soja (como alimento saudável ou de
risco, conforme expressa nas respostas 4 e 5). Por quê?
Se a soja for vista como alimento saudável:
8. O Sr./a Sra recomenda alimentos à base de soja para seus pacientes?

CONTROVÉRSIAS
9. O sr/sra conhece as controvérsias que rondam o tema de soja e saúde
humana? Em caso positivo: o que acha delas?


Fonte: Profa. Dra. Elaine de Azevedo
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS- GRADUAÇÃO EM SOCIOLOGIA POLÍTICA

RISCOS E CONTROVÉRSIAS NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE ALIMENTO SAUDÁVEL:
O CASO DA SOJA

ELAINE DE AZEVEDO
Florianópolis, março de 2009

AZEVEDO, Elaine de
Riscos e Controvérsias no processo de construção do conceito de Alimentação Saudável: o caso da soja /Elaine de Azevedo - Florianópolis, 2009. 187f.
Tese (Doutorado em Sociologia Política) - Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina.
Orientadora: Drª Julia S. Guivant
Co-orientadora: Prof.a Drª Tamara Benakouche
1. Riscos 2. Controvérsias 3. Alimentação Saudável 4. Soja

ELAINE DE AZEVEDO

RISCOS E CONTROVÉRSIAS NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE ALIMENTO SAUDÁVEL:
O CASO DA SOJA

Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Sociologia Política do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade federal de Santa Catarina como requisito parcial para a obtenção do grau de Doutora em Sociologia Política

Orientadora: Prof.a Drª. Julia Silvia Guivant
Co-orientadora: Prof.a Drª Tamara Benakouche

FLORIANÓPOLIS
2009

RISCOS E CONTROVÉRSIAS NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE ALIMENTO SAUDÁVEL:
O CASO DA SOJA

Esta tese foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Doutora em Sociologia Política no Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política, no Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Santa Catarina.
______________________________
Prof.a Dr.a Julia Sílvia Guivant
Orientadora (CFH/UFSC)
_____________________________
Prof.a Dr.a Tamara Benakouche
Co-orientadora (CFH/UFSC)
_____________________
Prof.a Dr.a Marcia Grisotti
PPGSP/UFSC - Membro
_____________________________
Cécile Hélène Jeanne Raud
PPGAS/UFSC - Membro
______________________________________
Prof.a Dr.a Maria de Fátima Ferreira Portilo
CPDA/UFRRJ - Membro
____________________________________
Prof..Dr. João Ferto Neto
UDESC- Membro
_____________________________
Prof.a Dr.a Lígia Helena Hahn Luchmann
Coordenadora do PPGSP/ CFH/UFSC

Florianópolis, 25 de março de 2009

DEDICATÓRIA
Ao Yiftah, pelas trocas e pelo incentivo.
Às minhas filhas, Rayana e Shay,que me ensinam diariamente importantes qualidades utilizadas nesta tese: paciência, dedicação e a prática do aprender fazendo.
A vocês, dedico esta tese e agradeço por estarem ao meu lado.

AGRADECIMENTOS
À Universidade Federal de Santa Catarina, que me proporcionou quatro anos de estudos gratuitos. Espero que a oportunidade de acesso a uma universidade pública de qualidade possa privilegiar ainda muitos brasileiros.
Ao apoio financeiro do CNPQ durante o período de 2008-2009, que me permitiu um ano de dedicação exclusiva aos estudos.
Ao Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política, representado por seus professores, funcionários e alunos, que ofereceram estrutura e suporte para a realização desta tese.
À professora orientadora, Dra. Julia S. Guivant, que acatou este tema e me introduziu ao fascinante mundo dos riscos e das controvérsias na ciência.
À professora Tamara Benakouche, por aceitar me orientar nos momentos finais (e cruciais) da tese. Mantenho a formalidade de citá-la como co-orientadora, mas aqui deixo registrada sua importância para a conclusão deste trabalho, atuando como orientadora disponível, generosa e delicada.
Aos médicos e médicas entrevistados, por sua disponibilidade, bem como aos pesquisadores Msc. José Marcos Gontijo Mandarino e Dra Mercedes Panizzi, da
Embrapa Sopa, por sua atenção.
À Bébhinn Ramsay, pela revisão do abstract.
À Doroti Jablonski, amiga especial, por estar sempre presente.
A todos, meu agradecimento.

SUMÁRIO

LISTA DE QUADROS........................4
LISTA DE FIGURAS.......................10
LISTA DE SIGLAS........................11
RESUMO.................................14
ABSTRACT...............................15
INTRODUÇÃO.............................16

CAPÍTULO 1: AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS DAS DIETAS
SAUDÁVEIS..............................27
1.1. Racionalização do saudável na modernidade............................28
1.2. A dieta saudável na contemporaneidade......................44
1.2.1. Era da (too much) information...48
1.2.2. A orientação das pesquisas em alimentação............................51

2. CAPÍTULO 2: A CIÊNCIA E A CONSTRUÇÃO SOCIAL DOS SCOS...............................58
2.1. A ciência e a reflexividade frente aos riscos ................................59
2.2. A Sociologia do Conhecimento Científico.............................63
2.3. A perspectiva da SCC frente aos riscos ambientais ..........................67
2.4. A rede de participantes na construção do conhecimento -
controvérsias e a democratização da ciência................................77
2.4.1. Os especialistas e as controvérsias na rede de ciência........................78
2.4.2. Os leigos na rede da ciência................................84

CAPITULO 3: A CONSTRUÇÃO SOCIAL DO CONCEITO DA SOJA COMO ALIMENTO SAUDÁVEL............89
3.1. A trajetória da soja e a sua multipresença no mercado de alimentos..91
3.1.1. A soja no Ocidente.............95
3.1.2. A pesquisa em soja................................99
3.2. Soja: food or fraud?..............................102
3.2.1. Controvérsias da pesquisa em soja................................106
3.2.2. Do natural ao industrial..........................114
3.3 O contexto político da produção e consumo de soja .....................116
3.3.1. O contexto político da produção e consumo de soja no
Brasil.............................116
3.3.2. O contexto político norte-americano da produção e consumo de
soja..............................118

CAPITULO 4: A SOJA COMO RISCO SOCIOAMBIENTAL.................124
4.1. As controvérsias na discussão socioambiental da
sojicultura..................125
4.2. A soja transgênica....... 136
4.2.1. Análise de riscos dos alimentos transgênicos........................137
4.2.2. Transgênicos: argumentos de positividade.......................143

CAPITULO 5: A PERCEPÇÃO DOS ESPECIALISTAS FRENTE À SOJA
E À SAUDE HUMANA................................147
5.1. Metodologia da pesquisa..........135
5.1.1. Problemas iniciais no campo da pesquisa de soja e saúde
humana.............................149
5.1.2. Redefinindo os informantes no campo da saúde..........................150
5.2. Que assim soja...: análise de dados..............................155
5.2.1. Tipologias e percepção dos especialistas frente à relação soja e
Saúde humana.......................155
5.2.2. As especialidades e a soja.......................160
5.2.3. Percepção dos especialistas frente às controvérsias que envolvem
a soja ......................162
5.2.4. Fontes de construção do conhecimento cientifico ......................164
5.2.5. Considerações sobre a pesquisa de campo.................................165

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS............................... 170
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............177
ANEXOS ...............................195
ANEXO I...............................196
ANEXO II..............................197
ANEXOIII............................. 201
ANEXO IV.............................202

LISTA DE QUADROS
QUADRO 1.1 - CONTROVÉRSIAS NA PESQUISA CIENTÍFICA EM ALIMENTAÇÃO............49
QUADRO 1.2 - CITAÇÕES DE ESTUDOS CIENTÍFICOS E A ORIGEM DE SEUS AUTORES .............52
QUADRO 2.1 - RESUMO DOS ELEMENTOS DE ANÁLISE DE RISCOS NA
PERSPECTIVA DA SCC..................75
QUADRO 4.1 - RESUMO DO RELATÓRIO PARA OS DIREITOS HUMANOS À
ALIMENTAÇÃO ADEQUADA, ÁGUA E TERRA RURAL E PARA O DIREITO
HUMANO AO MEIO AMBIENTE, NA MISSÃO REALIZADA EM BAIXO PARNAÍBA.....................130
QUADRO 4.2 - PROPOSTA DE CRITÉRIOS DE COMPRA PARA REDUÇÃO DE IMPACTOS NEGATIVOS NA PRODUÇÃO DE SOJA...........................131
QUADRO 4.3 - RESUMO DOS RISCOS DOS TRANSGÊNICOS.............................153

LISTA DE FIGURAS
FIGURA 3.1 - NÚMERO DE PATENTES DE PROCESSOS E DE PRODUTOS
ALIMENTÍCIOS À BASE DE SOJA, BRASIL, 1998-2000 A 2004-2006.......................90
FIGURA 4.1 - ÁREA DE SOJA CULTIVADA NO BRASIL 2003.................................128
FIGURA 4.2 - FOTO DE PROPRIEDADES PRODUTORAS DE SOJA NO
BRASIL...............................129
FIGURA 5.1 - FIGURA ILUSTRATIVAO DA REDE DA AUTORIDADE
CIENTÍFICA...........................148
FIGURA 5.2 - RESUMO DAS ALEGAÇÕES E CONTROVÉRSIAS CIENTÍFICAS QUE
ENVOLVEM A RELAÇAO SOJA E SAÚDE HUMANA E SUAS ÁREAS DE
ESPECIALIZAÇÃO.......................151

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABIA - Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação
ABIOVE - Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais
AO - Agricultura Orgânica
ACSOJA- Argentinean Soybean Chain Association
ANEC- Associação Nacional dos Exportadores de Cereais
ANVISA - Agência Brasileira de Vigilância Sanitária
APROSOJA - Associação Brasileira dos Produtores de Soja
ARS- Serviço de Pesquisa Agrícola
BBI- Bowman-Birk
BBS- Bebidas à base de soja
CEBRAC - Centro Brasileiro de Referência e Apoio Cultural
CNA- Comissão Nacional de Alimentação
CNAE- Campanha Nacional de Alimentação Escolar
CNBS- Conselho Nacional de Biossegurança
CNME- Campanha Nacional de Merenda Escolar
CNSAN- Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
CTNBio -Comissão Técnica Nacional de Biossegurança
COBAL- Companhia Brasileira de Alimentos
CONSEA- Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional
CoT- Committee on Toxicity in Food
CTIC - Conservation Tecnology Information Center
DCNT- Doenças Crônicas não-Transmissíveis
EMATER - Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural
EMBRAPA- Empresa Brasileira em Pesquisa Agropecuária
EPAGRI- Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina
EUA- Estados Unidos da América
FAO - Food and Agriculture Organization
FBOMS- Movimentos Sociais para o Meio Ambiente
FDA - Food and Drugs Administration
FETRAF-Sul- Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do Sul
FNB - Food and Nutrition Board
GTA- Grupo de Trabalho Amazônico
GTS- Grupo de Trabalho da Soja
12
IAC- Instituto Agronômico de Campinas
IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICCN- Incentivo de Combate às Carências Nutricionais
IDEC- Instituto de Defesa do Consumidor
IEA- Instituto de Economia Agrícola
INAN - Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição
INPE- Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
INPI- Instituto Nacional de Propriedade Industrial
IOM - INSTITUTE OF MEDICINEIPAM- Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
ITA- Instituto de Tecnologia Alimentar
KT- Inhibitor de Kunitz
MIP- Manejo integrado de pragas
NCI- National Cancer Institute
NISRA- Núcleo Interdisciplinar em Sustentabilidade e Redes Agroalimentares
OGMs- Organismos geneticamente modificados
OIT - Organização Internacional do Trabalho
OMS/ WHO- Organização Mundial da Saúde / World Health Organization
PAP- Programa de Alimentação Popular
PAT- Programa de Alimentação do Trabalhador
PCA- Programa de Complementação Alimentar
PCCN- Programas de Combate às Carências Nutricionais
PIAM- Programa de Incentivo ao Aleitamento Materno
PINA - Plano Integrado de Alimentação e Nutrição
PMF - Prefeitura Municipal de Florianópolis
PNA- Plano Nacional de Alimentação
PNAE- Programa Nacional de Alimentação Escolar
PNAN- Política Nacional de Alimentação e Nutrição
PNB-Política Nacional de Biossegurança - PNB.
PNCDD- Programa Nacional de Controle das Doenças Diarréicas
PNL- Programa Nacional do Leite para Crianças Carentes
PNME- Programa Nacional de Merenda Escolar
PNS- Programa de Nutrição em Saúde
PTS - Proteína Texturizada de Soja
PROAB- Programa de Abastecimento de Alimentos Básicos em Áreas de Baixa Renda
PROCAB- Projeto de Aquisição de Alimentos em Áreas de Baixa Renda
PRODEA- Programa de Distribuição Emergencial de Alimentos
PRONAN - Programa Nacional de Alimentação e Nutrição
13
PSA - Programa de Suplementação Alimentar
PTS- Proteína texturizada de soja
RDAs- Recommended Daily Allowances
RR - Roundup Ready
SAN- Segurança Alimentar e Nutricional
SAPS- Serviço de Alimentação da Previdência Social
SCC- Sociologia do Conhecimento Científico
SEAB- Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Paraná
SEE - Studies of Expertise and Experience
SERNS- Serviços de Recuperação Nutricional
SIVAN- Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional
STAN- Serviço Técnico de Alimentação Nacional
STC - Science and Technology Studies
TNC- The Nature Conservancy
UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina
USDA - U. S. Department of Agriculture
WWF- Forest Conversion Initiative

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