Helicobacter Pylori , O Vilão do Estômago

Até pouco mais de uma década, a patogênese da gastrite, úlcera gástrica, duodenite e úlcera duodenal era atribuída basicamente ao desequilíbrio entre mecanismos de defesa do hospedeiro e secreção ácida do trato gastrointestinal.

No início dos anos 80, Marshall e Warren isolaram, pela primeira vez, o Helicobacter pylori (Hp) na mucosa gástrica de um paciente com gastrite crônica. Esse fato desencadeou profundas alterações em muitos princípios básicos da gastroenterologia.

A Hp é uma bactéria Gram negativa de forma espiralada com distribuição universal, sendo considerada a causa de infecção crônica mais freqüente em humanos. Estima-se que cerca de 60% da população global esteja acometida por esse microorganismo.

A infecção pelo Hp provoca grande desconforto e leva à morte pelo menos 1 milhão de indivíduos anualmente dada sua abrangência (Kodaira, 2002). Atualmente, a infecção pelo Hp é considerada a principal causa de gastrite crônica ativa. Adicionalmente a este fato, estudos sugerem que esse agente desempenha importante papel na gênese da úlcera péptica. Após a constatação de que a erradicação do H. pylori acarreta a cicatrização da doença ulcerativa péptica, estabeleceu-se (em 1987) que todos os pacientes com doença ulcerativa péptica relacionada a Hp devem receber tratamento específico para o agente. Atualmente, esse é o único consenso a que se chegou quanto ao tratamento da infecção pela Hp.

A Hp sobrevive abaixo da camada de muco (tipo de saliva que os órgãos do aparelho digestivo produzem) para se protegerem da ação ácida do estômago, a qual não resistiriam, ou ainda entre as células do estômago, sendo que a preferência da bactéria é um tipo especial de célula gástrica que se encontra no antro gástrico -porção do estômago anterior ao duodeno.
Embora metade da população mundial esteja infectada com este organismo, 80% desses indivíduos permanecem sem nenhuma evidência clínica da doença (Sousa, 2001). Portanto, vários fatores, entre eles a aquisição na infância, o tipo de cepa da bactéria, a predisposição genética do hospedeiro e o meio-ambiente, parecem estar relacionados à sua fisiopatogenia (Sousa, 2001).


Como é transmitida

A Hp é transmitida na maior parte das vezes na infância. O homem é o principal reservatório natural da Hp, entretanto recentes estudos demonstram colonização da bactéria em gatos domésticos, sugerindo que os mesmos possam servir como reservatórios e vetores para o agente (Kodaira, 2002). O mecanismo exato da transmissão do H. pylori é desconhecido; o único fato universalmente aceito é que a bactéria só consegue alcançar a mucosa gástrica pela boca, pois trata-se de um microorganismo não-invasivo.
As altas taxas de prevalência em indivíduos que vivem em condições de aglomeração humana sugerem que a transmissão pessoa-pessoa seja um mecanismo importante na transmissão do agente. Entretanto, ainda não é possível determinar se a principal via de transmissão é oral-oral ou fecal-oral. É provável que ambas atuem simultaneamente em níveis populacionais.

Incidência

Em razão da impossibilidade de se detectar o início da infecção pela Hp sua incidência geralmente é determinada de forma indireta, com base nos dados da prevalência. Nos países industrializados a taxa de incidência da infecção pela Hp em crianças (percentual de crianças susceptíveis ao ano) é de 1,9% nos EUA, de 1,1% no Japão, de 2,7% na Inglaterra e de 0,3% na Finlândia. Em países em desenvolvimento como a Tailândia, a taxa de incidência é significativamente maior, atingindo índices de até 5% ao ano (Kodaira, 2002).
Estudos brasileiros encontraram as seguintes prevalências: 59,5% no Rio de Janeiro (RJ) (68); 76,3% em São Paulo (SP) (23); 83% em Santa Maria (RS) (50); 84,7% em Nossa Senhora do Livramento (MT) (69); 85,18% em Botucatu (SP) (39); 87% em Araçuaí (MG) (52); 89,6% em Campinas (SP) (45) e 96% em São Luís (MA) (Kodaira, 2002).

Em adultos de países industrializados a incidência extrapolada é de 0,1% a 1% das pessoas susceptíveis ao ano, índices semelhantes aos encontrados nos países em desenvolvimento. (Kodaira, 2002).


Quais são os sintomas

Os indivíduos acometidos pela Hp podem não apresentar qualquer sintoma ou apresentar sintomas chamados dispépticos como náusea ,inapetência, estufamento, digestão difícil dos alimentos, gases, etc. Outros sintomas incluem dor intensa tipo queimação ou vazio no estômago geralmente secundário a uma gastrite ou úlcera que pode ser gástrica ou duodenal.

Diagnóstico Os principais métodos para diagnóstico da Hp são: - Testes que exigem endoscopia:

* Teste rápido da urease ( CLOtest e outros )
* Observação ao microscópio
* Exame cultural

- Testes que não exigem endoscopia:

* Teste respiratório
* Pesquisa de anticorpos no sangue (embora de pouco valor clínico e sem valor para verificar o êxito do tratamento é, no entanto, útil em estudos epidemiológicos)


Relação com o câncer de estômago

Várias evidências apontam para possível papel do H. pylori na patogênese do adenocarcinoma gástrico. Em 1994, a bactéria foi classificada como carcinógeno do tipo 1 para câncer de estômago pelo International Agency for Research on Cancer (órgão subordinado à Organização Mundial da Saúde). O câncer gástrico é a segunda causa de morte no mundo, com incidência de 800.000 casos por ano. Kodaira et al (2002), em metanálise envolvendo 42 estudos, determinaram que a infecção pelo H. pylori está associada a um risco duas vezes maior para o desenvolvimento de adenocarcinoma gástrico. Acredita-se que mais de um terço dos carcinomas gástricos seja atribuído à infecção pelo H. pylori.

Como é feito o tratamento?

O tratamento é feito com antibióticos. Enquanto a vacina contra a infecção pelo H. pylori não estiver disponível, somente o melhor conhecimento da epidemiologia da bactéria poderá contribuir para a elaboração de estratégias de prevenção da infecção. O controle da disseminação do agente em crianças certamente causará grande impacto na prevalência da infecção pelo H. pylori em adultos, bem como das doenças a ela relacionadas.

Referêcias
KODAIRA, M.S.; ESCOBAR, A. e GRISHI. S. Aspectos epidemiológicos do Helicobacter pylori na infância e adolescência. Rev. Saúde Pública, Jun 2002, vol.36, no.3, p.356-369.

LADEIRA, M. S. P.; SALVADORI, D. M e RODRIGUES, M. A. S. Biopatologia do Helicobacter pylori. J. Bras. Patol. Med. Lab., 2003, vol.39, no.4, p.335-342.

SOUSA, M.B.; LUZ, L. P.; MOREIRA, O. M.; BACHA, R. M.; EDELWEISS, M. I. Prevalência de infecção por Helicobacter pylori em crianças avaliadas no hospital de clínicas de porto alegre, RS, Brasil Arq Gastroenterol 2001; 38(2):132-137.

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