Pesquisa indica que bactérias alteradas causam obesidade, mas tratamento com antibióticos ainda não é viável

Por muito tempo, hambúrgueres, batatas fritas, milkshakes, salgadinhos, sorvetes, pizzas e chocolates foram culpados pelo grande aumento da obesidade no mundo. Agora o fast-food tem com quem dividir a culpa: as bactérias intestinais. Um recente estudo norte-americano traz evidências de que alterações nas bactérias que vivem nos intestinos levam a um aumento acentuado do apetite e, consequentemente, à obesidade.

Mas nada de se animar e ir procurar um médico para tomar antibiótico para combater as tais bactérias. Os estudos ainda são iniciais e o tratamento contra obesidade continua o mesmo: dieta alimentar e exercício físico.

“Se houver realmente alguns casos de obesidade relacionados com alterações bacterianas intestinais, tratamentos com antibacterianos ou com reguladores da microbiota intestinal poderiam, em teoria, ser utilizados. Mas no momento atual, não há evidências científicas suficientes para sustentar tal teoria”, afirma Josivan Lima, professor de Endocrinologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e secretário da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).

A pesquisa

A conexão entre as bactérias intestinais e a obesidade não é nova, mas ganhou mais peso com uma nova pesquisa publicada na edição de março da revista norte-americana Science, uma das mais prestigiadas revistas de ciência do mundo.

E tudo começou por acaso, quando estudando outra doença, os pesquisadores perceberam que camundongos com determinada deficiência no sistema imunológico eram mais “gordinhos” do que seus companheiros saudáveis. Quando os animais tiveram sua dieta controlada, eles perderam peso, porém menos que os outros camundongos. E quando sua dieta passou a ser rica em gordura, eles engordaram mais do que os outros, desenvolvendo também mais doenças relacionadas à obesidade. Isso fez os cientistas desconfiarem de que havia algo a mais que merecia ser investigado.

O imunologista Andrew Gewirtz e o microbiologista Matam Vijay-Kumar, da Universidade Emory, em Atlanta (EUA), estudaram uma linhagem de camundongos com deficiência no gene TLR-5, responsável pelo reconhecimento de várias bactérias. Eles descobriram que esses camundongos eram em média 20% mais pesados que os outros. Eles também comiam muito mais, tinham pressão alta, colesterol alto e resistência à insulina (isso significa que o corpo não usa a insulina de modo eficiente para quebrar os alimentos e transformá-los em energia, podendo resultar em diabetes e obesidade).



Deficiência genética seria chave

“Em suma, esses camundongos apresentam a chamada ‘síndrome metabólica’, um conjunto de distúrbios que, em humanos, aumenta o risco de desenvolver obesidade, doenças cardíacas e diabetes”, explica a endocrinologista Mônica Cabral.

Após essas constatações, as bactérias intestinais desses camundongos foram transplantadas para camundongos sem a deficiência, que também passaram a apresentar o mesmo quadro. Os transplantes mostram que as bactérias não são parte do efeito, mas sim causa do aumento do apetite e da obesidade.

Alguns dos camundongos com deficiência no gene TLR-5 foram tratados pela equipe com antibióticos, para controlar a quantidade de bactérias intestinais. O tratamento reduziu grande parte dos distúrbios metabólicos dos camundongos.

De acordo com a endocrinologista Rosana Radominski, presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO), a pesquisa aponta que realmente pode haver uma conexão entre a flora intestinal e a obesidade., mas enfatiza: “Estes são achados iniciais, e há muito trabalho pela frente para comprovar que este mecanismo é importante nos humanos. E estes estudos não permitem que se comece a tratar obesidade com antibióticos, não é este o caminho”.

Obesidade não é contagiosa

Os pesquisadores norte-americanos ressaltam que suas conclusões não apontam que a obesidade possa ser contagiosa. As bactérias intestinais, também chamadas de flora intestinal, habitam naturalmente o intestino, ajudando na digestão de alimentos e protegendo o organismo contra microrganismos que podem causar doenças. Os cientistas acreditam que essas bactérias são adquiridas no nascimento, mas podem sofrer alterações durante a vida da pessoa, ocasionadas pela alimentação ou pelo uso de medicamentos.

Os cientistas ainda não sabem como as bactérias produzem essas mudanças metabólicas. Os camundongos usados na pesquisa não são um modelo exato de como funciona o corpo humano, mas podem apontar ligações entre sistema imunológico, alteração das bactérias e obesidade, assim como nas pessoas.

Para confirmar sua ideia de que o mesmo acontece nos seres humanos, Gewirtz e sua equipe vai começar a investigar pessoas com a síndrome metabólica. “Temos que lembrar que a obesidade é uma doença multifatorial (daí a dificuldade de tratá-la de modo eficaz). Sendo assim, alteração na flora intestinal seria apenas mais uma peça deste quebra-cabeça, sendo improvável que seja o fator causal único e definidor do ganho ponderal”, ressalta Josivan Lima.

Novos caminhos

Cada vez mais pesquisas estudam a conexão entre as bactérias intestinais e a obesidade. Um estudo publicado no ano passado, levado a cabo pela Universidade de Cornell, em Nova Iorque (EUA), apontou que camundongos franzinos se tornavam obesos quando recebiam bactérias intestinais de camundongos obesos.

Em 2006, pesquisadores da Universidade de Washington, liderados pelo microbiologista Jeffrey Gordon, já haviam documentado uma alteração nas bactérias intestinais de camundongos que ficaram obesos. “Alguns resultados de estudos experimentais utilizando camundongos submetidos a diferentes dietas ou substâncias probióticas, ou até mesmo a antibióticos que agem na colonização bacteriana do intestino, sugerem haver uma associação entre regulação do apetite e o intestino”, aponta Mônica Cabral.

“A ligação é fácil de ser demonstrada em animais de laboratório, mas é mais difícil de ser reproduzida em seres humanos, pois é mais fácil controlar de maneira rigorosa a dieta de um do que outro. Dessa forma ainda não se sabe o verdadeiro papel dessas bactérias intestinais no desenvolvimento dessas doenças em seres humanos”, ressalta.

Fonte: http://noticias.uol.com.br/
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