A Arquiteta do Sabor

A trajetória da chef especialista em criar cardápios de sucesso e comandante de um harmoniosa produção artesanal de massa

Ana Soares sempre teve apetite por comida e trabalho. Até que um dia, inspirada pelos ares de Paris – onde morou no final da década de 1970 -, ela descobriu que poderia saciar sua fome unindo as duas paixões. De volta ao Brasil, guardou o diploma de arquiteta e trocou régua e compasso por facas e panelas.

Logo de cara, as primeiras aulas numa cozinha profissional foram com chefs renomados como Laurent Suaudeau e Emmanuel Bassoleil. Mas bem antes disso, na infância em Guararapes, interior de São Paulo, Ana também já havia aprendido boas lições de culinária com a mãe: “A cozinha nunca foi um lugar de castigo na minha casa. Ao contrário, era refúgio para longas conversas ao redor do fogão”, conta a chef.

Somadas as experiências – e uma boa dose de autodidatismo –, Ana abriu em 1995 o Mesa III, um pastifício artesanal que passou a fornecer vários tipos de massa para dezenas de restaurantes paulistanos: “É como um serviço de alfaiataria, feito na medida do gosto dos clientes”, garante Ana. Não há limites na cozinha, diz Ana Soares

A chef ensina a receita do maltagliati

Em 1997, sua pequena fábrica ganhou um balcão de vendas e virou também uma rotisserie aberta ao público. Para atender à demanda atual, são preparados diariamente cerca de 150 quilos de massas secas e recheadas. Há desde um singelo fettuccine até opções mais sofisticadas como o tortelli de queijo brie com pera seca e o capelete de vitela e amêndoas (os preços variam de 12,50 a 76 reais, o quilo).

Incansável, Ana não parou por aí. Tornou-se uma espécie de Midas da gastronomia, atuando como consultora na criação de cardápios para bares, lanchonetes e restaurantes de São Paulo e de outras capitais. Com rara desenvoltura, aprendeu a dar vida a menus de diferentes especialidades.

“A Aninha é extremamente comprometida”, diz Edgard Bueno da Costa, sócio da Cia Tradicional, empresa que reúne uma série de endereços badalados da cena paulistana. Ele conta que a parceria com a chef nasceu há quase quinze anos e foi decisiva para o sucesso de suas casas. “Certa vez, ela peregrinou pelos bares do subúrbio carioca só para provar bolinho de bacalhau”, lembra Costa. A partir da pesquisa, conseguiu criar uma nova versão do quitute, que ganhou um gostinho especial de vinho do Porto. “Nasci com o desejo de criar, mas é preciso ter critério e entendimento sobre o que está sendo testado”, pondera a chef.

“Ela tem muita sensibilidade na hora de inventar um prato. O salmão com molho de pitanga que fez para os meus restaurantes é um sucesso”, elogia a restauratrice Regina Diógenes, proprietária de dois bufês em Fortaleza. Além da pesquisa e da elaboração do cardápio, o pacote de serviços oferecidos por Ana Soares inclui a indicação de fornecedores, o treinamento dos funcionários e a supervisão da cozinha por pelo menos dois meses – ou até que o cliente consiga andar com as próprias pernas. “Ela é paciente, mas é também muito rígida no treinamento”, recorda Regina.

Pois é. A chef tem mesmo nervos de aço quando está no batente. “Sou mandona, gosto das coisas do meu jeito”, reconhece. Quase nem dá para acreditar, mas neste corpo frágil e delgado, de mãos delicadas e pequenas, mora, sim, uma cozinheira enérgica e austera. Quando circula pela cozinha, o diminutivo fica só no nome porque Aninha se agiganta e domina a função. Dá ordens, põe a mão na massa, incentiva a equipe. Tal qual uma boa mãe, que sabe ser dura sem perder a ternura.

Mesa III. Rua Alves Guimaraes, 1464, Pinheiros, São Paulo, (11) 3868-5505
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