Efeito da Ingestão de Óleo de Peixe Sobre o Risco Cardiovascular

Como uma das conseqüências, temos o aumento do índice das chamadas “Doenças Crônicas Não Transmissíveis” (DCNT), aquelas que não possuem cura, apenas tratamento, e que frequentemente colocam a vida do seu portador em risco, dependendo do seu grau de evolução. A obesidade, o diabetes mellitus, as dislipidemias (alterações nos níveis sanguíneos de gordura) e as doenças cardiovasculares são exemplos de DCNTs, que atualmente atingem até mesmo crianças e adolescentes.
Segundo dados recentes do Ministério da Saúde, as doenças cardiovasculares são a maior causa de morte no Brasil, tendo sido responsáveis, em 2005, por 31,5% do total de mortes no país. A projeção da OMS é que este grupo de doenças seja a primeira causa de morte em todos os países em desenvolvimento até 2010 (WHO, 2002; BRASIL, 2007).
As doenças cardiovasculares caracterizam – se por alterar o funcionamento normal do sistema circulatório, o qual é composto pelo coração, os vasos sanguíneos (veias e artérias), e os vasos linfáticos. A hipertensão, o acidente vascular cerebral (AVC), a doença cardíaca reumática e a doença arterial coronariana (DAC), são as principais delas, sendo essa última, também chamada infarto do miocárdio, a mais mortal delas (MAHAN & ESCOTT-STUMP, 2002).
Apesar de a dieta ser um dos grandes fatores de risco para o desenvolvimento das DCNTs, ela também pode, contanto que adequada e equilibrada, se tornar um grande aliada na prevenção e até mesmo no tratamento destas e outras doenças.
De alguns anos para cá, vem sendo muito estudada a relação dos ácidos graxos (gorduras) presentes na dieta com o desenvolvimento de doenças cardiovasculares. Estes nutrientes podem ser classificados em três grandes categorias: os ácidos graxos insaturados, os saturados, e os mais recentemente descobertos ácidos graxos trans, sendo os dois últimos os mais prejudiciais à saúde e, ironicamente, encontrados em larga escala nos alimentos industrializados. Tal classificação se dá com base na presença ou não de duplas ligações entre os carbonos da molécula (insaturados possuem duplas ligações, enquanto que os saturados não possuem) ou, ainda, se baseia na localização dos hidrogênios da dupla ligação (na configuração trans, os hidrogênios apresentam-se em lados opostos) (LOTEMBERC, 2009).
Os ácidos graxos insaturados podem ainda ser divididos em monoinsaturados, que possuem apenas uma dupla ligação e são denominados MUFA, segundo a sigla em inglês, e poliinsaturados, que possuem mais de uma dupla ligação, também chamados PUFA (MARTIN e col., 2006).
Em meio aos ácidos graxos poliinsaturados, encontramos os famosos ômega-3 e ômega-6, que na verdade também são famílias de ácidos graxos que possuem uma característica em comum: os ω-3 apresentam sua primeira dupla ligação no terceiro carbono a partir do grupo metil, e os ω-6 apresentam-na no sexto carbono (MARTIN e col., 2006).
Dentro da família ω-3, encontramos os ácidos graxos eicosapentenoico (EPA) docosa-hexenoico (DHA), que apresentam o maior comprimento de cadeia e são altamente poliinsaturados. Estes compostos são encontrados na gordura dos peixes de águas frias e profundas e vêm sendo cada vez mais estudados e reconhecidos por sua ação preventiva das doenças cardiovasculares, principalmente em estudos observacionais (SIMÃO e col., 2007).
As ações do EPA e do DHA ocorrem em vários processos fisiológicos, tais como na diminuição moderada do teor sanguíneo de triglicérides, na possível remoção de radicais livres, na atuação no núcleo de células sobre os genes envolvidos na diminuição da lipogênese (produção de gorduras), na ação antiinflamatória, entre outros. Esta última ação citada é muito positiva já que indivíduos obesos, por exemplo, são chamados “inflamados crônicos”, pois neles ocorre um processo de micro inflamação constante que induz à ocorrência de aterosclerose, a qual aumenta muito o risco de eventos cardiovasculares como infarto e trombose (SIMÃO e col., 2007; GERALDO e col., 2008; LOTEMBERC, 2009).
Como resultados dessas ações, diversos estudos mostram uma relação entre o consumo adequado de ácidos graxos ω-3 e a proteção cardiovascular, diminuindo os eventos cardiovasculares (infarto, AVC, trombose) e a mortalidade decorrentes deles. O Nurses Health Study, um estudo de grandes proporções desenvolvido com enfermeiras nos EUA, avalioua associação entre o consumo de peixes e o risco de doenças cardíacas em mulheres de 34 a 59 anos, durante 16 anos. As que comeram peixes duas a quatro vezes por semana tiveram um risco 31% menor de doença cardíaca do que aquelas que comeram peixes menos de uma vez pôr mês. As mulheres que comeram peixes cinco vezes por semana tiveram um risco 45% menor de morrer de doença cardíaca do que aquelas que comeram menos peixes (SIMÃO e col., 2007; LOTEMBERC, 2009).
A recomendação de ingestão diária de ω-3 associada à redução de risco de DCNTs é de 0,6 a 1,2 g/dia, para ambos os sexos e em todas as faixas etárias. (DRIs, 2002).
Na tabela abaixo podemos visualizar o teor de EPA e DHA em alguns peixes que encontramos para comercialização em nosso país.
| EPA (mg/g) | DHA (mg/g) |
Salmão cozido | 4,1 | 14,3 |
Sardinha | 4,7 | 5,1 |
Truta cozida | 2,6 | 6,7 |
Tilápia cozida | - | 1,3 |
Fonte: MARTIN e col, 2006.
É interessante notar que a sardinha, acessível pelo preço e facilidade de encontrar em qualquer rede de supermercados, e de preparo de alta praticidade, apresenta consideráveis quantidades de ambos os ácidos graxos. Aproveite!
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Ministério da Saúde, Secretaria de Vigilância em Saúde. Saúde Brasil 2007: uma análise da situação de saúde. Brasília, 2007.
INSTITUTE OF MEDICINE (IOM). Dietary Reference Intakes for Energy, Carbohydrate, Fiber, Fat, Fatty Acids, Cholesterol, Protein and Amino Acids. Chapter 5. Washington DC: National Academic Press, 2002.
LOTEMBERC, AMP. Importância da gordura alimentar na prevenção e no controle de distúrbios metabólicos e da doença cardiovascular. Arq. Bras. Endocrinol. Metab. v.53, n.5; 2009.
MAHAN, LK; ESCOTT-STUMP, S. Krause - alimentos, nutrição e dietoterapia. 10 ed. São Paulo: Roca, 2002.
MARTIN, CA; ALMEIDA, VV; RUIZ, MR; VISENTAINER, JEL; MATSHUSHITA, M;
SOUZA, NE; VISENTAINER, JV. Ácidos graxos poliinsaturados ômega-3 e ômega-6: importância e ocorrência em alimentos. Rev. Nutr., Campinas, v.19, n.6, p.761-770, nov./dez., 2006.
Noncommunicable Diseases and Mental Health, World Health Organization. Integrated management of cardiovascular risk: report of a WHO meeting. Geneva 9-12, July 2002. Geneva: World Health Organization; 2002.
SIMÃO, ANC, BARBOSA, D S, NUNES, L.B, GODENY, P, LOZOVOY, MAB, DICHI, I. Efeitos e mecanismos de ação dos ácidos graxos poiinsaturados N-3 na prevenção de doenças cardiovasculares. Arq. Ciênc. Saúde Unipar, Umuarama, v. 11, n. 3, p. 225-233, set./dez. 2007.
GERALDO, JM. ALFENAS, RCG. Papel da Dieta na Prevenção e no Controle da Inflamação Crônica – Evidências Atuais. Arq Bras Endocrinol Metab., v.52, n.6, p.951-967, 2008.
Fonte: RGNutri
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